sábado, 20 de maio de 2017

A surpreendente cidade australiana onde os habitantes vivem embaixo da terra

A surpreendente cidade australiana onde os habitantes vivem embaixo da terra

Coober Pedy é uma pequena cidade cheia de minas na Austrália. Ela é conhecida como a capital mundial da opala, uma pedra preciosa muito usada por reis na antiguidade. Os antigos acreditavam que uma pessoa poderia ficar invisível se enrolasse uma opala em folha de louro fresco e a portasse junto de si para onde fosse.
Hoje, a região carrega mais do que apenas a lenda dessa pedra misteriosa. Cerca de 3 mil pessoas moram em Coober Pedy. É uma cidade com uma particularidade: é praticamente subterrânea, e quem vive ali precisa se adaptar a essas características. O que sobressai nessa paisagem plana e indiferente são algumas chaminés que brotam da terra no meio do caminho.
São poços de ventilação para a maioria das casas que, na verdade, estão embaixo da terra. São as chamadas “dugouts”, covas escavadas para os moradores escaparem do calor sufocante do deserto. Tudo em Coober Pedy é subterrâneo: não só as casas, como também as lojas, os hotéis, os bares, galerias de arte e até as igrejas.
O interior delas é fresco e agradável – imagino que isso seja um incentivo para as pessoas a irem à missa. ”Com certeza”, me diz o padre. “Essa é a ideia. No deserto, tudo é muito extremo: ou muito frio, ou muito quente. Por isso, se proteger debaixo da terra ajuda a amenizar um pouco as temperaturas. Assim a vida fica suportável e a igreja se torna um bom refúgio.”

A tentação de se mudar para Coober Pedy, obviamente, não é o clima. O que atrai as pessoas é o sonho de enriquecer encontrando a opala, cuja gema pode valer milhares de dólares.
O local foi descoberto em 1915 por um jovem de 14 anos chamado William Hutchison. Ele havia viajado para o meio do nada no Sul da Austrália com seu pai e seus dois sócios em busca de ouro – que não tinham encontrado.
No dia 1º de fevereiro, William deveria ter ficado no acampamento para cuidar das coisas, mas desobedeceu as ordens de seu pai, saiu para procurar água e se perdeu.

uando escureceu e o menino ainda não havia aparecido, os adultos começaram a se preocupar. Mas, pouco depois, ele chegou com um sorriso de orelha a orelha e uma bolsa cheia de opalas.
Claro que tudo isso foi apenas um acaso. Mas William também descobriu lá o que havia ido buscar: água doce, coisa igualmente rara de se encontrar naquela região.

Um mar que já não existe

As opalas preciosas da Austrália são resultados de condições muito especiais que datam de mais de 100 milhões de anos atrás, quando o grande mar da Eromanga, que até então cobria o centro da Austrália, começou a secar.
Fluidos muito ácidos se dissolveram em areia de sílica rica em quartzo e em seguida se transformaram em opalas preciosas.

Essas circunstâncias são muito específicas e pouco comuns. A outra origem das opalas – mais comum – é a vulcânica.
Mas encontra-las não é fácil. Por isso, seu valor segue provocando a mesma “febre” que contagia milhares de pessoas desde 1915.
E foi essa febre que manteve Sandy Williams na indústria por 20 anos, até ela se dar por vencida e aceitar um emprego fixo como guia turística local.
“Nunca dá para saber o valor que tem a opala quando você a desenterra. Ela sempre parece maior, melhor, mais brilhante embaixo da terra, mas na superfície você não a vê da mesma forma que da primeira vez”, diz.
“A imaginação e as expectativas acabam influenciando o que se enxerga na mina de opala.”

Mas que tipo de pessoa é mais comum aqui, eu pergunto. “Provavelmente é o mais romântico e aventureiro. Essa é a última fronteira. Um lugar onde você pode trabalhar para você mesmo, pode trabalhar o quanto que quiser – e encontrar um milhão de dólares. Já morei lá antes e pretendo voltar um dia.”
“Mas no fim a pobreza me mandou de volta ao papel de funcionária em vez de patroa.”

Esperança

A atividade de mineiração nos campos de opala é evidente – é possível ver pequenos montes de areia e buracos que se estendem até o horizonte.
Essas minas seguem se multiplicando diariamente com as escavações de mineiros como Teles, um chef aposentado que está dedicando seu tempo à busca do tesouro.
Ele não revela seu nome completo – os mineradores aqui são discretos -, mas se oferece para me levar a explorar sua mina.
“Comecei nesta mina há cerca de 5 ou 6 semanas, mas tive problemas com a pá. Ela falha de vez em quando”, conta ele, frustrado.
“Quando me aposentei, passei a ficar em casa. Até que pensei: ‘Chega! Vou para a mineração algumas horas por semana’. Sou diabético, e isso é um exercício muito bom.”
“Sou chef e administrei o hotel Opal por alguns anos para pagar as contas. Tenho nove filhos e paguei colégio e faculdade para eles. Agora todos trabalham e assim eu posso relaxar.”

Para relaxar

Teles começou a se dedicar a mineração há 26 anos.

“Cheguei tarde a esse negócio da opala. Os melhores lugares para explorar já estavam tomados e só sobraram esses mais afastados, na periferia. Realmente, não há nenhuma chance de encontrar algo que te dê muito dinheiro, a não ser que você tenha muita sorte.”
A mina em que ele está trabalhando não é nova. Muitos mineradores já escavaram ali, o que também aumenta os riscos no local.
“O que eu faço é trazer o túnel para cima e fazer uma cúpula, para que toda a pressão fique para os lados. Quando um coelho faz sua toca, é sempre em forma de arco. A natureza tem sua sabedoria e, se você a imita, não deve ter problemas.”
Mas Teles já passou por apuros, quase soterrado em sua própria mina. Da última vez, foi sua pá mecânica que o salvou. O fato de estar escavando a terra sozinho é algo que torna sua tarefa ainda mais arriscada.
“Eu tenho 72 anos de idade. Se algo acontecer…tudo bem. Um dia todo mundo vai morrer, e eu prefiro morrer enterrado aqui a morrer no deserto”, afirma.
É uma deixa para uma reflexão mais profunda, quase filosófica, sobre viver e sonhar.
“Esse corpo que tenho está em agonia. Sempre depois de trabalhar, os ossos e os músculos doem. Mas fazemos isso porque nos fascina”, admite.
“Quem sabe eu possa me tornar uma opala daqui 50 milhões de anos…”
Fonte: BBC

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