quinta-feira, 17 de outubro de 2013

Minas investe na coloração de gemas

Pedras preciosas


Minas investe na coloração de gemas


Matéria-prima é o que não falta. Minas Gerais é o maior produtor mundial de gemas coradas, mais conhecidas como pedras preciosas. Mas, apesar de ser responsável por cerca de 25% da produção mundial, quando se trata de exportação de jóias, Minas não atinge a marca de 5% do mercado brasileiro, quantia insignificante no cenário mundial. Parte das gemas mineiras são incolores em seu estado natural e necessitam de tratamentos especiais para adquirir cor, beleza e valorização no mercado.

O grande problema é que a maioria das pedras preciosas de Minas Gerais sai daqui em seu estado bruto. O tratamento e a lapidação são feitos fora do estado, na maioria das vezes no exterior. É fácil perceber os prejuízos com a venda da pedra bruta, muito barata em relação à mesma pedra depois de beneficiada (veja o quadro de preços). O lucro é transferido para quem agrega valor ao produto. No caso das pedras preciosas, muitas vezes elas retornam para o Estado tratadas e lapidadas ou em forma de jóias.


João Bosco da Silva mostra pedra de US$ 15 mil
Através do desenvolvimento da pesquisa científica e tecnológica, incentivada pelo governo estadual, este quadro está mudando. O Programa de Gemas e Jóias é uma das metas prioritárias estabelecidas pelo Conecit - Conselho Estadual de Ciência e Tecnologia, responsável pela formulação da política pública em C&T e P&D em Minas Gerais. Esta iniciativa, coordenada pela Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia, com financiamento da FAPEMIG, está gerando uma série de pesquisas na área, com formação de recursos humanos, e que deve resultar em mais empregos nas atividades de garimpo, lapidação, tratamento, coloração, designer e comércio de pedras preciosas em Minas Gerais. O objetivo final é promover a capacitação para tratamento de gemas, além de formar recursos humanos adequados para reforçar a interface entre a iniciativa privada e os centros de pesquisa envolvidos no projeto.

A importância social deste projeto ganha maiores proporções ao considerarmos os possíveis benefícios para regiões como o Vale do Jequitinhonha, uma das mais pobres do país, mas rica em recursos naturais de pedras coradas, turmalina e diamante. Quanto ao retorno econômico para o Estado, ele certamente se dará através da arrecadação de impostos.

Segundo o Instituto Brasileiro de Gemas e Metais Preciosos - IBGM -, o mercado internacional de pedras coradas, que não inclui o diamante, é de R$1,5 bilhão/ano. O Brasil participa com 4%, embora a estimativa é a de que seja responsável por 30% da produção comercializada no mercado internacional. Minas Gerais, conforme cálculos do instituto, produz metade das pedras coradas brasileiras.

Tratamento de gemas

Garimpeiros buscam topázio imperial em mina de Ouro Preto.
Tingimento, impregnação, recobrimento, irradiação, tratamento térmico e outros. São muitas as técnicas de tratamento e coloração de pedras preciosas. A mais usada no mundo é a irradiação. A FAPEMIG financia projetos mineiros considerados dos mais importantes desenvolvidos no país: o Projeto Corgema, desenvolvido em parceria pelo CDTN - Centro de Desenvolvimento de Tecnologia Nuclear - e a UFMG - Universidade Federal de Minas Gerais -, que abrange várias ocorrências geológicas de Minas Gerais e atua com ênfase para o processo de irradiação, e o projeto de Tratamento Termoquímico do Topázio, inédito no país, realizado pela Ufop - Universidade Federal de Ouro Preto.

Seja por irradiação ou processo termoquímico, o objetivo das tecnologias é o de agregar valor à pedra preciosa. A escolha depende da característica e finalidade da gema. Algumas pedras não suportam as temperaturas elevadas do tratamento termoquímico, como o quartzo, por exemplo. Outras, como o topázio, são difíceis de “pegar” a cor por irradiação. Independente do processo, quem manda no final das contas é o mercado. “Os processos não são concorrentes. Pelo contrário, muitas vezes, se complementam”, é o que diz o Prof. Fernando Lameiras, do CDTN, um dos coordenadores do Corgema. Dependendo da origem e da característica da gema, o melhor resultado pode surgir da combinação de técnicas diferentes, segundo o Prof. Luiz Orlando Ladeira do Departamento de Física da UFMG, também coordenador do Corgema. A pesquisa da Ufop, coordenada pelo Prof. Antônio Claret Sabioni, possibilita a produção de topázios das mais diversas cores.

As pesquisas envolvem técnicas diferentes mas têm vários aspectos em comum. Ambas são interdisciplinares - gemologia, geologia, mineralogia, química, física, engenharia de materiais e engenharia nuclear -, e têm a finalidade de desenvolver tecnologia para as pedras encontradas (ocorrências geológicas) em Minas Gerais, agregando valor ao produto e formando recursos humanos para o setor.

Projeto Corgema

Segundo os coordenadores do Corgema, o projeto abrange várias gemas com ocorrência no Estado - quartzo, topázio, turmalina, água-marinha, diamantes, alexandritas e outras - e prevê etapas que começam na localização da ocorrência geológica, seguida pela caracterização física e química da gema e a engenharia da cor, com o objetivo de estabelecer o tratamento mais adequado para cada gema, até o desenvolvimento de processos de coloração, quando for o caso. Eles garantem que o processo, quando bem aplicado, resulta em gemas estáveis e duráveis, ou seja, não perdem a cor e não quebram.

Na coloração por irradiação de raios gama, a cor é definida pela dose de radiação e pelas impurezas da pedra. Existem mitos que rondam este processo, especialmente os relacionados com a radioatividade que causa danos à saúde. Os pesquisadores explicam que a origem do preconceito pode estar no processo de irradiação por nêutrons, proibido pelas normas brasileiras. “Dependendo da impureza da pedra, este tipo de radiação pode gerar radioatividade residual, sendo necessário manter a pedra tratada em um longo período de quarentena”, diz o Prof. Lameiras. A irradiação por feixe de elétrons - carga elétrica muito forte que dá a tonalidade azul ao topázio -, feita no Brasil apenas em escala de laboratório, também pode exigir a quarentena.

Mas a irradiação por raios gama - usada no Brasil em larga escala - não oferece perigo. “É como se fosse um banho de luz na pedra”, dizem os pesquisadores, exemplificando que até frutas passam por este processo, para a eliminação de microrganismos passíveis de deterioração, sem causar nenhum mal à saúde de quem as consome. É neste tipo de irradiação que a pesquisa do Corgema se concentra. A expectativa dos pesquisadores agora é a compra de um espectrômetro de ressonância magnética e ótica, que permite detectar o tipo de impureza e a cor que ela determina, e de um novo irradiador, que serão de grande utilidade na caracterização das gemas e na coloração, respectivamente.

UFOP - pioneira no processo termoquímico
Atualmente, o topázio imperial só é encontrado em Ouro Preto. A cidade é a única no mundo que produz esta pedra preciosa. Há algum tempo podia ser encontrada também no Paquistão, que hoje está com as suas reservas praticamente esgotadas. A característica desta gema é a cor amarelada - os tons variam do alaranjado ao champagne - e, quanto mais forte a cor, mais valiosa é a pedra. O topázio azul também existe na natureza, mas, além de raro, apresenta tonalidades muito pálidas.

Já o topázio incolor é encontrado em todo o país, especialmente em Minas Gerais e Rondônia, e pode adquirir praticamente todas as cores do espectro a partir do tratamento termoquímico, como explica o Prof. Claret. O projeto foi totalmente financiado pela FAPEMIG, inclusive na infra-estrutura do Laboratório de Difusão em Materiais do Departamento de Física da Ufop onde é desenvolvido. O resultado da pesquisa é inédito no país e tem importância estratégica para Minas Gerais e, por enquanto, é sigiloso para garantir a patente. O Prof. Claret ingressou em abril deste ano com o depósito de patentes junto ao INPI - Instituto Nacional de Propriedade Industrial - em nome da Universidade.

Antes da pesquisa desenvolvida pela Ufop, o tratamento térmico de gemas era realizado de maneira empírica, com baixos rendimentos e perdas elevadas. Baseado na pesquisa científica, o processo termoquímico - combinação de temperatura com reações químicas - permite maior aproveitamento da gema, com melhor rendimento, além de possibilitar a reprodução exata das cores que podem ser até mesmo definidas em catálogo. O Professor Claret afirma que a cor da gema através do processo termoquímico é mais estável do que a obtida por irradiação e, até mesmo, do topázio colorido natural.

Em comparação com o processo de irradiação, o pesquisador enumera outras vantagens, como o baixo custo no processo de coloração, que não necessita de equipamentos sofisticados, o que facilita na formação de recursos humanos para a execução do trabalho.


Jóia com topázio imperial
A Ufop está se preparando para comercializar o produto. Segundo o Prof. Claret, a instituição pretende atuar desde a captação de matéria-prima até a venda das pedras coradas com o selo da instituição, passando pelo processo de lapidação com design exclusivo e, é claro, pelo tratamento termoquímico.

A pesquisa movimentou a pós-graduação da universidade. No ano passado os cursos de mestrado e doutorado em Geologia integraram a disciplina Tratamento Térmico de Gemas. O interesse extrapolou as fronteiras do país: já há solicitação de pesquisador estrangeiro para pós-doutorado na área de tratamento térmico de gemas.

Mercado de pedras coloridas

Ouro Preto, patrimônio da humanidade, recebe turistas o ano inteiro. Grande parte são estrangeiros que se encantam com as pedras preciosas. Maria Helena Coelho, proprietária de uma das mais tradicionais joalherias da cidade, conta que a pedra mais procurada pelos turistas é o topázio imperial. O topázio azul também é bastante procurado, segundo ela, seguido pelo branco ou incolor. A cor similar ao topázio azul que passa pelo processo de coloração é encontrada na água-marinha em sua forma natural. O preço é bastante diferente. Enquanto o topázio azul custa de R$10 a R$ 20 o quilate, a água-marinha varia de R$ 50 a R$ 2.700 o quilate, dependendo da tonalidade e da lapidação.

Ela acredita no mercado para o topázio das diversas cores que o processo termoquímico possibilita, mas acha essencial identificá-lo junto aos clientes, que pedem inclusive explicações sobre os processos, a estabilidade da cor e a durabilidade da pedra.

I Simpósio Brasileiro de Tratamento e Caracterização de Gema

Ouro Preto - MG
Pesquisadores, professores, estudantes e profissionais que atuam na área de gemologia vão se reunir Simpósio Brasileiro de Tratamento e Caracterização de Gemas, promovido pela Universidade Federal de Ouro Preto, com o apoio da FAPEMIG. O seminário vai discutir a importância econômica das gemas tratadas, os diversos tipos de tratamento, as técnicas de fabricação de gemas sintéticas e artificiais, além da identificação e caracterização das pedras. O objetivo do encontro é estabelecer o estado da arte do tratamento e caracterização de gemas no Brasil e no exterior, a integração entre os setores acadêmico e produtivo e a gemologia nacional e internacional.

Rochas ultramáficas plutônicas do greenstone belt Rio das Velhas na porção central do Quadrilátero Ferrífero, Minas Gerais

Rochas ultramáficas plutônicas do greenstone belt Rio das Velhas na porção central do Quadrilátero Ferrífero, Minas Gerais, Brasil

Plutonic ultramafic rocks of the greenstone belt Rio das Velhas in the central portion of the Quadrilátero Ferrífero, State of Minas Gerais, Brazil







RESUMO
Em Amarantina, distrito de Ouro Preto, encontram-se rochas ultramáficas expostas em duas áreas com cerca de 500 m2 cada. As rochas afloram no Complexo do Bação, que é o embasamento gnáissico do greenstone belt Rio das Velhas, na porção central do Quadrilátero Ferrífero (QF). O interesse no estudo petrogenético desses corpos deve-se à preservação parcial de minerais ígneos, ausentes na maior parte das rochas ultramáficas totalmente metamorfizadas do QF. Entre essas rochas, destacam-se os esteatitos e os serpentinitos, devido a sua importância econômica. As rochas ultramáficas de Amarantina possuem textura equigranular, fato que as caracteriza como tendo origem plutônica, isto é, trata-se de metaperidotitos. Possuem grãos maiores de olivina, piroxênio e espinélio da rocha ígnea original distribuídos em matriz metamórfica fina com talco, serpentinas, cloritas, anfibólios e minerais opacos. Escassas arita (NiSbAs) e breithauptita (NiSb) foram formadas a partir de pentlandita durante o metamorfismo associado a hidrotermalismo. A comparação da composição química com a de um metakomatiito com textura spinifex do QF, bem como com rochas komatitiiticas de outras partes do mundo, mostra que os metaperidotitos são, quimicamente, semelhantes aos komatiitos não-desfalcados em alumínio. Portanto é provável que as rochas ultramáficas estudadas correspondam à porção plutônica do magmatismo komatitiitico do Grupo Nova Lima, que é a unidade basal do greenstone belt Rio das Velhas.
Palavras-chave: Rocha ultramáfica, greenstone belt Rio das Velhas, peridotito komatiitico, geoquímica, Quadrilátero Ferrífero, Minas Gerais.

ABSTRACT
In Amarantina, district of Ouro Preto (State of Minas Gerais, Brazil), ultramafic rock exposures are found along two areas of about 500 m2 each. The rocks crop out in the Bação complex, which is the gneissic basement of the Rio das Velhas greenstone belt in the central portion of the Quadrilátero Ferrífero (QF). The interest in a petrogenetic study of the ultramafic rocks is the partial preservation of igneous minerals, which are not observed in most of the completely metamorphosed ultramafic rocks in the QF. Among them, the steatites and the serpentinites are the best studied because of their economic importance. The ultramafic rocks from Amarantina are classified as metaperidotites due to the equigranular texture characteristic of plutonic origin. The rocks are made up of large grains of olivine, pyroxene, and spinel preserved from de original magmatic rock, which are distributed in a fine grained mass with talc, serpentine, chlorite, amphibole, and opaque minerals. Scarce arite (NiSbAs) and breithauptite (NiSb) were generated after pentlandite during hydrothermal metamorphism. Comparison of the chemical composition with a metakomatiite with spinifex texture from de QF as well as with known komatiitic rocks from other parts of the world reveals that the metaperidotites are chemically similar to non Al-depleted komatiites. Therefore it is probable that the studied ultramafic rocks correspond to the plutonic portion of the komatiitic magmatism of the Nova Lima group, at the base of the Rio das Velhas greenstone belt.
Keywords: Ultramafic rock, Rio das Velhas greenstone belt, komatiitic peridotite, geochemistry, Quadrilátero Ferrífero, Minas Gerais.



1. Introdução
O Quadrilátero Ferrífero (QF) tem sido, desde o século XIX, objeto de pesquisas e estudos geológicos devido aos bens minerais nele presentes, entre os quais se destacam as mineralizações de ferro e ouro. Quanto a bens minerais não-metálicos, são explotadas, entre outras, rochas metaultramáficas do tipo esteatito/serpentinito, de grande importância econômica. Entre as ocorrências de rochas de natureza ultramáfica, encontram-se, muito raramente, corpos que preservam algum mineral ou textura ígnea da rocha original, que são de grande relevância para estudos petrogenéticos, pois podem representar o protólito dos esteatitos e serpentinitos. Nas circunvizinhanças do QF, rochas com minerais ígneos preservados foram descritas por Jordt-Evangelista e Silva (2005), na região de Lamim, ao sul, Fonseca e Pereira (2008), em Lagoa Dourada, a sudoeste, Braga (2006), em Queluzito, também a sudoeste, e Medeiros Júnior e Jordt-Evangelista (2010), em Acaiaca, a leste do QF. O presente estudo visa à caracterização de dois corpos ultramáficos com minerais ígneos parcialmente preservados, localizados em Amarantina, distrito de Ouro Preto.
As rochas metaultramáficas da região do Quadrilátero Ferrífero pertencem ao Supergrupo Rio das Velhas, que constitui um greenstone belt arqueano (Dorr, 1969; Ladeira, 1980; Ladeira & Roeser, 1983; Roeser et al., 1980). O Supergrupo Rio das Velhas é constituído pelo Grupo Nova Lima, inferior, e pelo Grupo Maquiné, superior.
O Grupo Nova Lima é composto, na sua porção basal, principalmente, por esteatitos e serpentinitos derivados de protólitos ígneos ultramáficos (Ladeira & Roeser, 1983), por meio de processos metamórficos associados a transformações metassomáticas. A preservação de texturas spinifex, embora muito rara (Ladeira, 1980; Noce et al., 1990; Pinheiro & Nilson, 1997; Andreatta e Silva, 2008), atesta que, pelo menos, uma parte das rochas ultramáficas primárias era de natureza vulcânica, originada de komatiitos.
O Complexo do Bação, no qual estão inseridas as rochas metaultramáficas de Amarantina, é constituído, predominantemente, por gnaisses de composição tonalítica e granodiorítica (Gomes, 1986 e 1987). O referido complexo compõe o embasamento das rochas supracrustais do greenstone belt Rio das Velhas, que o rodeiam. Subordinadamente ocorrem xistos de derivação pelítica e anfibolitos.
O objetivo desse trabalho é o de caracterizar, mineralogicamente e de forma textural e geoquímica, os litotipos presentes nos corpos metaultramáficos de Amarantina e, também, o de empreender sua interpretação petrogenética. A importância do estudo desses corpos se deve a sua localização geográfica, pois estão inseridos dentro do Complexo do Bação, na região central do QF, o que os distingue das ocorrências anteriormente citadas, que se localizam fora do QF e que, portanto, podem não pertencer ao Grupo Nova Lima.

2. Materiais e métodos
Realizaram-se trabalhos de campo para coleta de amostras, que foram descritas macro e microscopicamente. As lâminas delgadas foram descritas sob microscópio de polarização por luz incidente e luz transmitida. Para se obterem as análises de química mineral, utilizou-se o microscópio eletrônico de varredura (MEV) de marca JEOL, modelo JSM com EDS (espectrometria por dispersão de energia) Thermo Electron acoplado no Laboratório de Microanálise (MICROLAB) do DEGEO-UFOP, que operou sob condições analíticas de 20 kV, com largura de feixe 10 µm e 2000 contagens. Também foram realizadas análises por microssonda eletrônica em equipamento da marca JEOL, modelo JCXA-8900RL no Laboratório de Microanálises do consórcio Física-Química-Geologia da UFMG e CDTN-CNEN. O aparelho operou com uma tensão de 15 kVe corrente de feixe de 20 nA. Análises químicas em rocha total foram obtidas via Espectrômetro de Fluorescência de Raios X (FRX), de marca Philips PW2404, modelo MagiX com amostrador automático PW2504 e tubo de Rh a 2,4 kW, no Laboratório de Preparação de Amostras para Geoquímica e Geocronologia (LOPAG) do DEGEO-UFOP e em Espectrofotômetro de Emissão Atômica com Fonte Plasma (ICP-OES), de marca Spectro e modelo Ciros CCD, no Laboratório de Geoquímica Ambiental (LGqA) do DEGEO-UFOP. O tratamento dos dados geoquímicos foi feito no software Minpet versão 2.02 (Richard, 1995).

3. Corpo metaultramáfico de Amarantina
As rochas metaultramáficas de Amarantina foram encontradas em duas áreas distintas, uma à nordeste e a outra à sudoeste da rodovia BR-352 (Figura 1), distanciadas, aproximadamente, 2,5 km. Elas ocorrem em afloramentos e blocos soltos com tamanho de metros a decâmetros (Figura 2). São rochas maciças, de granulometria fina a média, e que podem apresentar dobras (Figura 2 D). Não se encontraram afloramentos que permitissem verificar as relações de contato com os gnaisses do Complexo do Bação. A área superficial do corpo a leste de Amarantina (Figura 1) é de, pelo menos, 500 m2, conforme indica a distribuição dos afloramentos in situ e dos blocos dispersos pelo terreno. O outro corpo tem dimensões semelhantes.

4. Aspectos petrográficos e química mineral
No corpo metaultramáfico de Amarantina, foram amostrados três litotipos, a saber, espinélio metaperidotito, metaperidotito e tremolita-clorita-serpentina granofels, sendo que este último representa o produto do total metamorfismo dos anteriores. As amostras estudadas foram coletadas nos pontos AM-1 a AM-4, mostrados na Figura 1. Além dos litotipos citados, são encontrados, também, esteatitos, que, devido ao elevado grau de alteração intempérica, não foram amostrados.
O metaperidotito AM-1 (Figura 3 F) possui até 20% de olivina, que ocorre em grãos maiores distribuídos em matriz fina composta por clinoanfibólio, serpentina, clorita, talco, magnetita e ilmenita. Os grãos de olivina, que ficaram preservados da rocha ígnea, são arredondados, medem cerca de 0,8 mm e possuem alteração nas fraturas e bordas em serpentina e talco. A fórmula estrutural média da olivina, obtida por meio de análises de microssonda, é Mg1,6Fe0,4Si0,99 O4, com 80% do componente forsterita. O clinoanfibólio apresenta-se em cristais prismáticos e incolores, que foi identificado por MSE e MEV/EDS como magnésio-hornblenda. Pela inexistência de feições texturais do tipo spinifex e tendo em vista o hábito da olivina, interpreta-se que a textura original da rocha é plutônica e não vulcânica.
O tremolita-clorita-serpentina granofels AM-2 encontra-se com cerca de 200 m do metaperidotito AM-1. Embora não apresente minerais ígneos preservados, é provável, pela proximidade, que seja produto do metamorfismo do metaperidotito. Tem microestrutura decussada e é constituído por tremolita (15%), serpentina (55%), clorita (20%), talco (5%) e Cr-magnetita (5%).
O espinélio metaperidotito AM-3 (Figura 3 A, B, C, D) possui minerais de origem ígnea, como olivina, ortopiroxênio e espinélio, que somam até 30% do volume da rocha, e proporções variáveis de tremolita, serpentina, clorita, talco, ilmenita, Cr-magnetita, breithauptita e arita, que, juntos, constituem os restantes 70% da rocha. A olivina aparece em cristais anédricos de até 0,8 mm, com alteração para talco e serpentina. A fórmula estrutural média da olivina, obtida por meio de análises de MSE (Tabela 1), é Mg1,7Fe0,3 Si0,99 O4, que corresponde a 85% do componente forsterita. O ortopiroxênio, com fórmula estrutural Ca0,33(Mg1,71Fe0,29)Si1,97O6, isto é, com En 85, encontra-se substituído, parcialmente, por talco, serpentina e tremolita, gerados por reações metamórficas em condições da fácies xisto verde. O espinélio ocorre em grãos anédricos, medindo cerca de 0,2 mm, tem cor verde-escura e encontra-se sempre rodeado por clorita. A sua fórmula estrutural média é (Mg0,65Fe0,35)Cr0,1Al1,9O4, o que corresponde a uma composição intermediária entre espinélio s.s. e hercinita, sendo, por isso, classificado como pleonasto.
O metaperidotito AM-4 (Figura 3 E) apresenta-se com cerca de 30% de olivina, que ocorre em grãos maiores distribuídos em matriz fina composta por tremolita, serpentina, clorita, talco e minerais opacos, classificados por MSE e MEV/EDS como ilmenita, magnetita, Cr-magnetita, pirita, pentlandita, breithauptita e arita. Olivina apresenta-se, parcialmente, alterada. Em geral, os grãos estão envoltos por massa fibrosa formada por serpentina, menos frequentemente observa-se clorita e talco. Os grãos chegam até a 1,5 cm. A porcentagem de componente Fo é 87% e sua fórmula estrutural é Mg1,7Fe0,3Si0,99O4.
Localmente verifica-se que a rocha apresenta-se bandada e dobrada (Figura 4). O bandamento mineralógico é dado pela alternância de bandas, onde a olivina está preservada com bandas ricas em minerais metamórficos, como serpentinas, cloritas, talco ou tremolita. Essas bandas, provavelmente, representam descontinuidades, por onde houve a infiltração dos fluidos aquosos durante o metamorfismo. A ausência de extinção ondulante, nos grãos de olivina, sugere que o peridotito original não estava dobrado, mas que o processo tectonometamórfico levou à geração de dobras por deslizamento ao longo das descontinuidades, onde se formaram os minerais mais dúcteis, como serpentinas, clorita ou talco.
Minerais contendo antimônio e arsênio, como breithauptita e arita (Figura 5), não são comuns. A arita (NiSbAs) representa o membro de composição intermediária da solução sólida niquelina (NiAs) - breithauptita (NiSb), estudada, experimentalmente, por Hewitt (1948). A composição química média de porcentagem em peso encontrada para a pentlandita foi de 36% de Fe, 28% de Ni e 37% de S, para a breithauptita foi de 34% de Ni e 66% de Sb e para a arita de Ni (42-37%), de As (39-32%) e de Sb (25-16%). Breithauptita, arita e pentlandita aparecem com intercrescimento (Figura 5). O intercrescimento da breithauptita com arita e pentlandita reflete processos substitucionais, provavelmente decorrentes de variações na concentração de elementos como As, S e Sb, onde a pentlandita cede ao Ni. Breithauptita pode ser encontrada em depósitos minerais formados em altas pressões e temperaturas, como em peridotitos, em pegmatitos niquelíferos com pirrotita e disseminada em veios de galena-esfalerita. Entretanto sua ocorrência é mais comum em veios hidrotermais com Co-Ni-Ag (Ramdhor, 1969).
Embora minerais de Ni-As-Sb sejam relativamente raros na natureza, eles não são incomuns em variadas mineralizações relacionadas a remobilizados hidrotermais, onde ocorrem associados com minerais de ouro (Cook, 1996). No entanto, a presença de Au, Co e Ag não foi verificada nas rochas estudadas nesse trabalho.
Para fins de comparação com as rochas de Amarantina, coletou-se e analisou-se uma amostra de metakomatiito de Rio Manso, na região noroeste do QF (Andreatta e Silva, 2008). A amostra SPF possui textura spinifex preservada e é composta por 35% em volume de talco, 25% de clorita, 20% de clinoanfibólio, 15% de serpentina, 5% de carbonatos e 5% de minerais opacos.

5. Geoquímica
A Tabela 2 apresenta os resultados das análises químicas das amostras estudadas e rochas similares selecionadas da literatura para comparação. As rochas da literatura são o komatiito peridotítico de Yakabindie, na Austrália (Naldrett & Turner, 1977 in Naldrett & Cabri, 1976) e o komatiito de Abitibi, no Canadá (Sun & Nesbitt, 1978 in Arndt, 2008). Embora totalmente metamorfizada, a amostra de metakomatiito SPF, da região de Rio Manso no QF, foi incluída por ainda preservar a textura spinifex e, portanto, por ser uma rocha representativa dos derrames ultramáficos do Grupo Nova Lima.
Verifica-se que as rochas de Amarantina, tal como o metakomatiito de Rio Manso e as rochas da literatura, possuem altos teores de MgO, de 25 a 33% em peso e Cr e Ni muito elevados (Cr: 1771 a 3555 ppm; Ni: 843 a 1572 ppm). Os teores anômalos de As e Sb, em média, 470 e 500 ppm, respectivamente, são devidos à presença dos minerais breithauptita (NiSb) e arita (NiSbAs).
Segundo Arndt e Nisbet (1982), peridotitos komatiiticos caracterizam-se, quimicamente, por teores de MgO acima de 18% em peso e TiO2 abaixo de 0,9%. Dentro desses critérios, todas as rochas analisadas são peridotitos komatiiticos (Tabela 2), pois o teor de MgO varia entre cerca de 25 e 33% em peso e o TiO2 é inferior a 0,3%.
Segundo Viljoen e Viljoen (1982) e Arndt e Nisbet (1982), outro aspecto importante na definição da suíte komatiitica diz respeito à razão CaO/Al2O3 que deve estar situada no intervalo entre 0,8 e 1,0. Nos litotipos estudados, as razões de CaO/Al2O3 estão entre 0,6 e 2,73 (Tabela 2). Os litotipos que apresentam razões relativamente elevadas são rochas com grande quantidade de tremolita (AM-1, AM-3). No caso dos litotipos com baixas razões de CaO/Al2O3 (0,6), trata-se de amostras com altos teores de clorita. Portanto a razão CaO/Al2O3 não é primaria nas rochas estudadas, possivelmente devido à mobilidade do cálcio durante o processo de metamorfismo acompanhado de infiltração de fluidos aquosos, que propiciaram a geração de minerais hidratados como talco e serpentinas à custa de minerais anidros como olivina e piroxênios.
Nesbitt et al. (1979) e Beswick (1982, in Arndt & Nisbet, 1982) propõem uma classificação para os komatiitos em dois grupos baseados na razão Al2O3/TiO2. O primeiro grupo apresenta valores aproximadamente condríticos com razão Al2O3/TiO2 em torno de 20,4, o que caracteriza a suíte de komatiitos não-desfalcados em Al. O segundo grupo, classificado como dos komatiitos Al-desfalcados, é caracterizado por apresentar razões próximas da metade dos valores condríticos, o que o ocorre nos komatiitos do oeste da Austrália (Beswick 1982). A maioria das amostras estudadas apresenta razão Al2O3/TiO2 próximas ou maiores do que 20,4 correspondendo à suíte de komatiitos não-desfalcados em Al.
Para caracterizar, quimicamente, as rochas de Amarantina, as análises foram lançadas em diagramas discriminantes (Figura 6 A); para fins de comparação também foram utilizadas as análises da literatura e o metakomatiito de Rio Manso. No diagrama de Jensen (1976), verifica-se que as amostras possuem características químicas de peridotitos komatiiticos, com exceção do tremolita-clorita-serpentina granofels (AM-2), que se situou no campo de Basalto Komatiitico, provavelmente por ter sido mais afetado pelo processo metamórfico/metassomático.
No diagrama MgO-CaO-Al2O3 (Figura 6 B) de Viljoen e Viljoen (1969), também se verifica que as rochas estudadas possuem características geoquímicas de peridotitos komatiiticos.

6. Discussão e conclusões
Por se localizarem no Complexo do Bação, que é o embasamento das rochas supracrustais da porção central do Quadrilátero Ferrífero, os dois corpos estudados de Amarantina constituem uma ocorrência ímpar para o estudo das rochas ultramáficas da região. A textura equigranular das amostras, que ainda preservam minerais ígneos, como olivina, indica que as rochas são de origem plutônica, isto é, que não se trata de derrames de komatiito que se caracterizam pela textura spinifex, conforme encontrados localmente no QF. Os resultados de análises químicas mostram que as rochas estudadas são, quimicamente, semelhantes a komatiitos não-desfalcados em Al. Portanto as rochas ultramáficas de Amarantina, provavelmente, correspondem à porção plutônica do magmatismo que deu origem ao Grupo Nova Lima, que é a unidade basal do greenstone belt Rio das Velhas. Ao atravessar a crosta primitiva gnáissica, parte do magma gerador das rochas ultramáficas vulcânicas komatiiticas pode ter preenchido condutos, fraturas ou formado corpos de pequeno porte, conforme os encontrados em Amarantina, cristalizando-se como rocha plutônica. A transformação metamórfica foi somente parcial em talco, serpentinas, anfibólios e/ou carbonatos, o que contrasta com a esteatitização ou serpentinização completa da maior parte das rochas ultramáficas encontradas no QF. A referida transformação deve ser decorrente do aporte insuficiente de fluidos aquosos durante o ciclo tectonometamórfico do Transamazônico.

Prospecção aluvionar aplicada a alguns minerais gemológicos de Minas Gerais: diamante, crisoberilo e topázio*

Prospecção aluvionar aplicada a alguns minerais gemológicos de Minas Gerais: diamante, crisoberilo e topázio*
 



Prospecção aluvionar foi efetuada em drenagens de reconhecida ocorrência de três minerais gemológicos (diamante, crisoberilo e topázio), visando a contribuir para o conhecimento de suas associações mineralógicas e tendências de distribuição no meio aluvionar. Sob condições semelhantes, observou-se uma "taxa de dispersão" relativa para cada um dos três minerais, com provável decréscimo do diamante para o topázio. Essa técnica prospectiva, combinada com métodos analíticos modernos, é considerada uma ferramenta de importância fundamental na detecção e avaliação de áreas aluvionares mineralizadas.
Palavras-chave: prospecção mineral em aluviões, diamante, crisoberilo, topázio.
Abstract
Alluvial prospecting carried out in drenages in which three gem minerals (diamond, chrysoberyl and topaz) are mined, aimed to contribute to the knowledge of mineral associations and to the distribution trends in the fluvial systems. Under similar conditions, a "dispersion rate" relative to each mineral has been found, showing probably decreasing values from diamond to topaz. This technique, if improved by modern analytics, is of primary importance for determining and evaluating alluvial mineralized areas.
Keywords: alluvial mineral prospecting, diamond, chrysoberyl, topaz.


Introdução
A prospecção no meio aluvionar de minerais pesados com interesse econômico tem se revelado um importante instrumento na descoberta de novos depósitos, de modo particular em regiões intertropicais como a nossa, onde, em geral, o manto intempérico é bastante espesso. A aplicação dessa técnica, no entanto, é quase restrita a empresas que prospectam diamante, ouro, cassiterita e poucos outros bens minerais, limitando, assim, sua difusão na literatura geológica. Pesquisas efetuadas durante as décadas de 1970-80 mostraram, também, a utilidade dessa técnica em estudos, com ênfase nos minerais pegmatíticos de Minas Gerais (e.g., Cassedanne, 1972, Cassedanne & Baptista, 1984). No presente trabalho, através da amostragem sistemática de aluviões contendo minerais com interesse gemológico, objetivou-se conhecer as suas distribuições ao longo das drenagens atuais, bem como os seus comportamentos "relativos" na evolução do registro geológico.

Metodologia de estudo
A prospecção aluvionar tem por fim a obtenção de um resíduo mineral pesado, por bateiamento de sedimentos inconsolidados aprisionados em armadilhas naturais presentes no leito vivo dos rios. Objetivando futuras comparações, a mesma quantidade de material deve ser coletada nos pontos de amostragem (Cassedanne, 1972). No estudo, em cada ponto, 20 litros de aluvião foram amostrados e lavados, para retirada do material argiloso, e, logo após, peneirados a 2mm (com determinação à vista desarmada dos grãos mais grossos) e o resíduo fino foi concentrado em bateia. O pó mineral resultante, ou "fundo-de-bateia", foi utilizado para posterior estudo qualitativo e semi-quantitativo.
Em laboratório, esses minerais foram novamente peneirados e a fração entre 0,25-0,50mm foi submetida a tratamento com bromofórmio (d=2,89) para eliminação do material leve. As distintas populações foram separadas com lupa binocular, sendo os minerais de identificação duvidosa estudados por microssonda eletrônica. No tratamento estatístico dessas populações, utilizou-se a seguinte convenção de percentagens, seguindo a metodologia proposta em Chaves, (1997): Abundante (A): 75-100%, Comum (C): 25-75%, Raro (R): 1-25% e Muito raro (M): <1%.

Minerais pesados pesquisados
O estudo foi dirigido a três minerais gemológicos, ocorendo nas porções leste/nordeste de Minas Gerais (Figura 1) - diamante, crisoberilo e topázio. Foram visadas as áreas de cabeceiras de drenagens, onde a prospecção e/ou lavra desses minerais tem sido importante, em termos comerciais, ao longo das últimas décadas.


Figura 1 - Áreas onde foram desenvolvidos os trabalhos de prospecção aluvionar no centro-nordeste de Minas Gerais. 1) Alto/Médio Rio Jequitinhonha, 2) Ribeirão Santa Cruz e Rio Marambaia e 3) Ribeirão Maracujá.

Minerais pesados nos aluviões diamantíferos do rio Jequitinhonha
O rio Jequitinhonha nasce na serra do Espinhaço a leste de Diamantina, percorrendo um longo caminho pelo norte do Estado de Minas Gerais rumando para nordeste. Da nascente até a vila de Mendanha, o Jequitinhona desenvolve o seu alto curso, onde os vales são apertados, com freqüência formando canyons e sumidouros ao atravessarem domínios formados por quartzitos do Supergrupo Espinhaço (Mesoproterozóico). A partir de Mendanha (Figura 2), fora do Espinhaço, os vales tornam-se progressivamente mais abertos, aparecendo, em suas bordas, antigos terraços e extensa planície de inundação (Chaves & Uhlein, 1991).


Figura 2 - Esboço geológico (segundo Chaves 1997) e áreas de prospecção aluvionar no Rio Jequitinhonha ao norte de Diamantina.

Diamantes são lavrados nessa bacia desde suas cabeceiras até próximo de Grão Mogol, quase 600km rio abaixo, tanto por processos de garimpagem (no alto curso), como por dragas de grande porte (no médio curso), definindo a principal atividade econômica regional. Os diamantes do rio Jequitinhonha caracterizam-se por constituir populações onde os cristais são predominantemente pequenos (média de 0,20-0,30ct de peso), porém, bem formados e livres de jaças e/ou inclusões. Tipos geminados, agregados e borts são muito raros, denunciando o elevado grau de selecionamento dessas populações.
Nos depósitos aluvionares do rio Jequitinhonha, deu-se preferência às amostragens dos rejeitos de garimpos, mais ricos em minerais pesados. Como em geral as áreas de garimpagem envolvem trechos extensos ao longo da drenagem, em cada ponto o material foi sempre coletado em dois ou até em cinco locais diferentes. Apresentam-se as diversas espécies determinadas na Tabela 1. O diamante, por ser uma fase de extrema raridade (improvável de "aparecer" em uma prospecção desse tipo), não foi encontrado no estudo.


Tabela 1 - Freqüências dos minerais pesados nos aluviões diamantíferos do rio Jequitinhonha. 1, Almandina; 2, Anatásio; 3, Andalusita; 4, Cianita; 5, Crisoberilo; 6, Diásporo; 7, Estaurolita; 8, Euclásio; 9, "Favas" (fosfatos); 10, Hematita; 11, Ilmenita; 12, Lazulita; 13, Magnetita; 14, Monazita; 15, Ouro; 16, Pirita; 17, Rutilo; 18, Sillimanita; 19, Turmalina; 20, Xenotímio; 21, Zircão (A=abundante, C=comum, R=raro, M=muito raro).

Na região, o conhecimento dos minerais pesados teve como principal objetivo a caracterização de granadas supostamente relacionáveis a intrusões ultrabásicas, conforme aceito por diversos geólogos prospectores que atuam na serra do Espinhaço. Essa suposição não foi confirmada, pois as granadas estudadas apresentam quimismo incompatível com rochas ultrabásicas (25 grãos em WDS-Microssonda Eletrônica resultaram ser almandinas, de origem ácida). Entretanto diversos outros minerais quase desconhecidos, em termos regionais, como andaluzita, crisoberilo, diásporo e estaurolita, foram identificados no estudo (Tabela 1).

Crisoberilo (e topázio) nos minerais pesados dos rios Santa Cruz e Marambaia
A região de Catugi, ao norte de Teófilo Otôni (Figura 1), é cortada pelo ribeirão Santa Cruz, afluente do rio Marambaia. Este último é um tributário do rio Mucuri. Tal região, pouco estudada em termos geológicos, apresenta um grande número de depósitos aluvionares ricos em crisoberilo (localmente alexandrita), incluindo ainda outras drenagens importantes (do ponto de vista da presença desse mesmo mineral), tais como o ribeirão Faísca e o rio Americaninhas (Figura 3).


Figura 3 - Esboço geológico (segundo Fontes et al. 1978) e áreas de prospecção aluvionar no Ribeirão Santa Cruz e no Rio Marambaia a leste de Catugi.

Ao sul de Catugi, predominam rochas de natureza gnáissica, que constituem colinas extensas, localmente entrecortadas por morros altos com formas de pão-de-açúcar, as quais denunciam a presença de intrusões graníticas. O embasamento regional, gnáissico, é de idade pré-cambriana, mas ainda necessita de determinações geocronológicas mais acuradas, sendo constituído de gnaisses, gnaisses granitóides e migmatitos, além de charnockitos.
O "Complexo Gnáissico-Migmatítico" (Fontes et al., 1978) apresenta associações mineralógicas de grau metamórfico médio-alto, onde se deram intensos processos tectônicos e granitizantes. Gnaisses kinzigíticos mostram bandamento característico, com alternâncias de bandas leucocráticas, na maioria das vezes boudinadas, e bandas mesocráticas, com predomínio de minerais máficos. A granada almandina está quase sempre presente nos níveis félsicos, junto a quartzo, feldspatos e biotita. Como acessórios ocorrem cordierita, sillimanita e grafita. Rochas charnockíticas ocorrem intimamente associadas a esse complexo.
Os granitos, intrusivos nas rochas anteriores, são porfiríticos, isotrópicos e de granulação grossa, nos quais salientam-se cristais centimétricos de feldspato branco, determinado como albita, ou, ainda, feldspato rosado, potássico. A matriz é constituída de quartzo, feldspatos, biotita e, mais raramente, granada. Os pegmatitos podem ser considerados incomuns nessa região e os poucos observados são do tipo homogêneo, os quais não apresentam zoneamento interno.
Os rios da área possuem larguras variáveis entre 5-20m, com cascalhos basais que podem atingir mais de 1m de espessura. Apesar de os serviços de garimpagem também ocorrerem nos depósitos aluvionares, pela maior facilidade de lavra deu-se preferência aos depósitos coluvionares, que estão nas proximidades dos rios. Corpos pegmatíticos em lavra não foram considerados no estudo. A Tabela 2 relaciona os minerais encontrados na prospecção aluvionar.


Tabela 2 - Freqüências dos minerais pesados nos aluviões ricos em crisoberilo dos rios Santa Cruz e Marambaia. 1, Almandina; 2, Anatásio; 3, Andalusita; 4, Cordierita; 5, Coríndon; 6, Coríndon (safira); 7, Crisoberilo; 8, Crisoberilo (alexandrita); 9, Espodumênio; 10, Estaurolita; 11, Hematita; 12, Ilmenita; 13, Magnetita; 14, Monazita; 15, Ouro; 16, Pirita; 17, Rutilo; 18, Sillimanita; 19, Topázio; 20, Turmalina; 21, Xenotímio; 22, Zircão.

Nas amostragens, efetuadas ao longo dos rios Santa Cruz e Marambaia (Figura 3), verificaram-se minerais pesados com diferentes graus de arredondamento (mesmo os da mesma espécie), indicando processos de reciclagem, porém as espécies não apresentaram diferenças significativas entre si nos diversos pontos. Como os pegmatitos são raros na região e os minerais encontrados, como crisoberilo, coríndon (safira) e zircão, são bastante resistentes ao transporte fluvial, acredita-se que suas áreas-fontes situem-se à razoável distância e que os processos de concentração devem estar associados a retrabalhamentos de depósitos coluvionares sub-recentes.

Minerais pesados do ribeirão Maracujá
O ribeirão Maracujá tem as suas nascentes na serra do Rodrigo Silva, que integra o complexo metamórfico do Quadrilátero Ferrífero, constituindo uma das cabeceiras da bacia do Rio das Velhas. O longo período de colonização, iniciado no século XVII com a descoberta de aluviões auríferas (atualmente exauridas), deixou as encostas desnudas, aumentando as taxas de assoreamento no sistema aluvial, de direção geral N-S, perpendicular à estruturação E-W das seqüências metamórficas (Figura 4).


Figura 4 - Esboço geológico (segundo Dorr II 1969) e áreas de prospecção aluvionar no ribeirão Maracujá nas cercanias de Cachoeira do Campo.

O alto curso do ribeirão é desenvolvido sobre várias unidades de metamorfitos, datadas do Arqueano ao Paleoproterozóico, pertencentes respectivamente aos supergrupos Rio das Velhas e Minas. Em seus médio e baixo cursos afloram rochas do complexo basal arqueano, na região designado de "Complexo do Bação" (Dorr II 1969). Essa unidade na área é composta por gnaisses com estruturas migmatíticas e, raramente por rochas de composição granítica mais homogêneas, pouco ou não orientadas, que cortam os migmatitos mostrando contatos intrusivos.
O Supergupo Rio das Velhas, principal fonte do ouro aluvionar da região, aflora em discordância angular sobre o embasamento cristalino, sendo na área constituído por xistos e filitos intensamente meteorizados. O Supergrupo Minas ocorre em discordância angular sobre esta última unidade, sendo formado, na base, por uma estreita faixa do Grupo Caraça (quartzitos e xistos quartzosos), na porção intermediária, pelo Grupo Itabira com suas formações Cauê (itabiritos) e Gandarela (filitos e rochas metacarbonáticas) e, no topo, por uma extensa porção de rochas do Grupo Piracicaba (filitos com intercalações de quartzitos).
A prospecção aluvionar na região do Quadrilátero Ferrífero torna-se prejudicada pela abundância de óxidos de ferro nos concentrados, podendo constituir mais que 95% deles. Mesmo nas porções do ribeirão Maracujá que estão acima do nível itabirítico (Formação Cauê), a presença de óxidos é abundante pela presença de lentes de quartzitos ferruginosos intercaladas no Grupo Piracicaba. A existência desses minerais tornou mais demorado o processo de separação dos concentrados no laboratório.
A amostragem, em seis pontos ao longo da drenagem (Figura 4), indicou a presença de topázio, comum na cabeceira, diminuindo progressivamente em direção aos outros pontos. O euclásio assim como cinábrio são acompanhantes raros do topázio na área, só encontrados nas partes altas. Isto indica que a rocha-fonte está na serra do Rodrigo Silva, não havendo novas contribuições a partir dos subafluentes. Interessante ainda observar que o topázio desaparece de todo a curta distância (±10km), devendo refletir seu esfacelamento na clivagem basi-pinacóide perfeita. O ouro é um outro mineral característico da área (Tabela 3).


Tabela 3 - Freqüências dos minerais pesados nos aluviões topazíferos do ribeirão Maracujá. 1, Almandina; 2, Anfibólio; 3, Cianita; 4, Cinábrio; 5, Estaurolita; 6, Euclásio; 7, Goethita; 8, Hematita; 9, Ilmenita; 10, Magnetita; 11, Monazita; 12, Olivina; 13, Ouro; 14, Óxido de manganês; 15, Pirita; 16, Pirita limonitizada; 17, Rutilo; 18, Topázio (imperial); 19, Turmalina; 20, Zircão.

Discussões
Os minerais pesados de interesse econômico constituem fases acessórias em rochas ígneas, metamórficas e sedimentares. Sua ocorrência e dispersão nos sedimentos varia em função das condições de intemperismo da área-fonte e dinâmica de transporte. Da maior importância, ainda, são os teores e as granulometrias originais dos minerais na fonte e, principalmente, da resistência física e química deles aos agentes naturais. Logo, a identificação das espécies presentes em certo sedimento permite não só conhecer sua(s) fonte(s), como também os diversos estágios da evolução do registro sedimentar, visto que tal evolução atua no sentido da eliminação progressiva dos tipos menos resistentes. Pettijohn (1957) apresentou uma escala de estabilidade química, destacando zircão e rutilo como as fases mais estáveis in situ (Tabela 4), desconsiderando, porém, os fatores que agem no transporte aluvionar.


Tabela 4 - Séries de estabilidade de alguns minerais pesados em função do ataque de agentes químicos em sedimentos in situ (Pettijohn, 1957).

Os dados obtidos sobre a distribuição dos minerais estudados trouxeram importantes deduções a respeito da formação dos depósitos onde se encontram. Dessa maneira, as propriedades físicas e químicas particulares do diamante, tais como dureza inigualável e alta estabilidade química (que o fazem resistir aos processos intempéricos e metamórficos), permitem que esse mineral sobreviva continuamente ao longo do registro geológico. Entretanto existe uma sistemática redução no tamanho médio dos cristais a partir de sua área-fonte, como resultado do transporte fluvial. Tal redução no tamanho, porém, é acompanhada pela melhoria gemológica dos diamantes, visto que os tipos de qualidade inferior são destruídos (Sutherland, 1982).
Assim, depósitos de diamantes economicamente viáveis podem ocorrer em locais a centenas de quilômetros desde sua área-fonte primária e o rio Jequitinhonha é um bom exemplo de tal fato. O único fornecedor do mineral para este rio é o Conglomerado Sopa, do Supergrupo Espinhaço. No entanto, tal rocha já é um "paleo" sedimento aluvionar e, provavelmente, sobreveio antes desse outros ciclos sedimentares (Chaves, 1997, Chaves et al., 1998). Ao longo do Jequitinhonha, os teores médios de diamante decrescem de 0,5-1,0ct/m3 nas cabeceiras até cerca de 0,008ct/m3 na zona de dragagem da Cia.Tejucana, quase 100km abaixo de Mendanha. Conforme mostrado no estudo, nenhum outro possível mineral cogenético sobreviveu aos múltiplos processos de erosão e sedimentação ocorridos.
Em relação ao crisoberilo, os estudos demonstraram que tal mineral, apesar de sofrer arredondamento, é muito mais resistente do que já descrito. Sua ocorrência no Médio Jequitinhonha, a dezenas de quilômetros das áreas de afloramento de rochas graníticas ácidas (Complexo Basal da região de Gouveia), onde não se conhecem pegmatitos mineralizados, faz supor que essas últimas rochas foram em grande parte erodidas preteritamente à sedimentação cenozóica. Deve ser destacado, que, nas zonas mais próximas ao Complexo Basal, tem sido encontrado euclásio (Chaves & Karfunkel, 1994), outro mineral gemológico de fonte pegmatítica, que, possuindo várias direções de clivagem perfeita, é facilmente pulverizado durante o transporte fluvial.
Ao longo dos rios Santa Cruz e Marambaia, o mesmo processo se verifica. Embora as zonas pegmatíticas mineralizadas nessa região terem sido em grande parte erodidas (Cassedanne & Baptista, 1986), o crisoberilo (e sua variedade alexandrita) ocorre em depósitos economicamente importantes em muitas áreas, pois numerosos afluentes drenaram ou drenam as suas (paleo) áreas-fontes. Essa proximidade relativa da(s) fonte(s) é corroborada pela existência comum de topázio (incolor/azul), inclusive em seixos rolados, além de outros minerais "frágeis", como xenotímio e outros fosfatos.
No conhecimento da distribuição de topázio no ribeirão Maracujá, a prospecção aluvionar mostrou-se também de grande utilidade. Na zona serrana do alto curso desse rio, ocorre sua rocha-fonte entre as formações Cercadinho e Fecho do Funil (Gandini, 1994). Os depósitos aluvionares mais ricos no mineral estão concentrados até o sopé da serra, sendo, inclusive, verificados pequenos serviços de garimpagem clandestina (as áreas são de concessão para pesquisa e/ou lavra de mineradoras de ferro). Entretanto, em espaço bastante curto, a mineralização desaparece, indicando que não existem novos aportes de topázio a partir dos afluentes.

Conclusão
O estudo procurou demonstrar que, principalmente em função de suas propriedades físico-químicas, cada mineral vai possuir a sua "taxa de dispersão" própria e que o conhecimento dessa taxa pode definir critérios para a pesquisa aluvionar. Assim, corroborando outros estudos (e.g. Chaves, 1997; Chaves et al., 1998), o diamante é registrado em locais onde inexistem rochas-fontes, o crisoberilo pode apresentar fontes longínquas e o topázio só ocorre em sítios com área-fonte próxima. A prospecção enfocando bens gemológicos em regiões onde suas ocorrências são bem conhecidas, é uma técnica de grande utilidade, não só visando determinar a distribuição espacial da mineralização, como também, em províncias minerais onde achados "casuais" são freqüentes, para ser aplicada na busca sistemática de novos depósitos. Deve-se, ainda, salientar que a mesma técnica pode também servir na cubagem dos depósitos, bastando o adensamento da malha dos pontos de amostragem de campo.

Transgarimpeira sobrevive à escassez de ouro com saudades dos velhos tempos

Transgarimpeira sobrevive à escassez de ouro com saudades dos velhos tempos

Nos anos 80, milhares de quilos ao mês eram retirados dessa região do PA.
Hoje o ouro diminuiu, mas ainda é o principal meio de sobrevivência.

No distrito de Moraes Almeida, no Pará, a época de ouro farto deu lugar à extração ilegal de madeira. "Eles trabalham clandestinos pra sobreviver. Às vezes trabalham à noite, trabalham escondido, né? Se não fosse os madeireiros aqui era muito pior", comenta o mecânico Francisco Almeida.

O local já foi um dos pontos mais movimentados da BR-163, rodovia que liga Cuiabá a Santarém. Era o principal ponto de abastecimento dos garimpos de ouro que se espalhavam pelo Alto Tapajós. Até o fim da década de 80, a rodovia na altura de Moraes Almeida era usada como pista de pouso e chegava a receber mais de cem voos por dia.




Depois foi aberta a Transgarimpeira, que permitiu que os garimpos fossem abastecidos por terra. Com isso, aviões deixaram de pousar por ali. Um sobrevoo da região mostra que a exploração do ouro fez mal ao meio ambiente. O Rio Novo ficou marrom de tão poluído. O Rio Jamanxim, que passa ao lado, é bem mais claro porque não teve garimpo.



Do alto, ainda se avitam pequenos garimpos em atividade. Mas onde ficava Ourolândia, no km 140 da Transgarimpeira, hoje só resta a antiga casinha de apoio na pista de pouso abandonada. Nos tempos áureos, ali eram vendidos 700 mil litros de óleo diesel por ano para movimentar os motores dos garimpos."Na época eu voava de comissão, ganhava em média trezentos gramas [de ouro] por dia de comissão", relembra saudoso o piloto de avião Antônio dos Santos.


Creporizinho


Creporizinho é outro lugar que não é nem sombra do que já foi no passado. Na década de 80, auge da vila, cinco mil dragas retiravam duzentos quilos de ouro por dia. Atualmente, não passam de cinco quilos."Era festa todo dia, muita cerveja, muita cachaça, muita gente. Você quer ter uma idéia, aqui tinha 160 boates", conta José Rodrigues, que viveu aqueles dias áureos. Movimento na Transgarimpeira só há em Creporizão, que tenta sobreviver à escassez de ouro.

Segundo o subprefeito do distrito, mais de 70% dos moradores não têm registro de nascimento. Mas há quem veja em Creporizão o paraíso. A professora Núbia deixou Santarém, umas das maiores cidades do Pará para morar aqui com seus três filhos e o marido, que conserta motores para garimpar. "Não temos assaltos, não temos ladrões, então não existe lugar melhor pra se viver do que aqui", argumenta.

Em Creporizão há cinco lojas que compram ouro. Por mês, esses estabelecimentos movimentam 90 quilos do metal precioso, que virou moeda corrente para comprar outros bens. "Pra comprar óleo diesel, arroz, gás... todo esse tipo de coisas pra vender aí no garimpo. Tudo em ouro", diz José Deosdete da Silva, comerciante local.

Ouro por aqui é uma fixação e vale tudo para consegui-lo. No Rio Crepori, onde não há mais peixes por causa do excesso de mercúrio usado para separar o ouro, homens arriscam a vida diariamente.

O trabalho mais perigoso no garimpo é o do mergulhador. Ele fica três horas debaixo d'água, numa escuridão total. Com uma mangueira ele suga a terra, que é peneirada em busca do ouro. Essa técnica forma barrancos no fundo do rio. "Já fui soterrado duas vezes", conta Domingos Benício Alves. "Outra balsa me salvou".

Nas dragas há um sistema de sucção que substitui o mergulhador, mas ainda assim a vida não é fácil, pois as pessoas passam meses nelas sem pisar em terra seca.

Luiz Nascimento já viu muito ouro, mas não poupou nada. Com o que gastou tudo? "A 'mulhezada'", diverte-se. É por causa de clientes como Luiz que ainda existem sete cabarés em Creporizão. Garimpeiros são bem mais "generosos", garante uma prostituta local. Com alguns deles, "acontece de passar até três dias", conta.

Mas o tempo de aventuras do garimpeiro Luiz está com os dias contados, pois o ouro da superfície da terra e no leito dos rios está acabando. Depois, só haverá espaço para as grandes empresas, com seus altos investimentos para tirar o minério de 80 ou 100 metros de profundidade.

Estudo avalia mineração de ouro na Amazônia

Mineração no Suriname. Foto: Gomiam
Cerca de dez cientistas – maioria de antropólogos - estão envolvidos em pesquisas do projeto Gomiam com a finalidade de compreender conflitos causados pela mineração de ouro em pequena escala em cinco países da região amazônica (Bolívia, Brasil, Colômbia, Peru e Suriname). A primeira fase do projeto, de 2011 a 2013, será dedicada a analisar comparativamente diferentes situações políticas e ambientais das populações locais e dos próprios mineiros.

Marieke Heemskerk. Foto: Gomiam
"Sem entender relações sociais não há como colocar a informação em contexto", diz a antropóloga Marieke Heemskerk, que faz pesquisas no Suriname. "Por isso queremos saber quem está envolvido na mineração de pequena escala, como os vários grupos das aldeias e arredores estão envolvidos, quais são seus interesses e o que pensam uns dos outros", diz. De acordo com a antropóloga holandesa Marjo de Theije, que teve a ideia do projeto, o foco na bacia Amazônica é importante porque a mineração de ouro em pequena escala enfrenta uma série de graves problemas ambientais que afetam os ecossistemas em escala global, mas que também traz grande benefício econômico.

Ela explica que a mineração de ouro é uma das mais importantes atividades econômicas na região e corresponde à subsistência de aproximadamente 12% da população do Suriname. “Peru é quinto produtor mundial de ouro, ao passo que Bolívia, Brasil, Colômbia e Suriname estão entre os top trinta. Além disso, a abertura de grandes minas (Yanacocha no Peru, Gros Rosebel no Suriname) e o aumento expressivo no preço do ouro elevou a produção na maioria dos países da América do Sul", afirma. Segundo Marjo, em 2008 a produção de ouro registrada nos cinco países foi de quase 300 mil quilos, cifra que não inclui a maior parte do ouro produzido pelos mineradores de pequena escala.



Suriname

Marieke começou a primeira fase da pesquisa há um mês na comunidade mineira de Brownsweg, situada no distrito de Brokopondo, a cerca de 100 km ao sul da capital, Paramaribo. Seu pesquisador adjunto é o engenheiro de minas Ramon Finki. Ele analisa a parte da pesquisa referente à mineração, juntamente com os alunos da Universidade Anton Kom, do Suriname. "Nós registramos métodos, técnicas e custos operacionais de empresas que trabalham com mineração em pequena escala para saber se é possível minimizar os custos operacionais. É difícil descobrir o rendimento exato de cada uma. Também iremos analisar a poluição ambiental da água e do solo". Neste país, cerca de 20% a 30% dos homens adultos trabalham com mineração de ouro em pequena escala.

O que o projeto diz sobre os outros quatro países

Mapa da região estudada no Brasil. Imagem: Gomiam
Bolívia

"Bolpebra é uma pequena aldeia no nordeste da Bolívia (província de Pando). Recentemente, a mineração informal de ouro em pequena escala tem se expandido e a população relata a ‘invasão’ de peruanos no território que, juntamente com imigrantes brasileiros e mineiros bolivianos, formam acampamentos internacionais de 35 mil a 40 mil mineiros. A região apresenta um número considerável de casos de malária e dengue".

Brasil

"Tapajós é a região de mineração de ouro mais importante do Brasil. Hoje em dia cerca de 20 mil mineiros trabalham na região, produzindo de 20kg a 30 kg de ouro por dia. Tanto a produção em larga como em pequena escala foram afetadas por uma decisão do governo federal em 2005 que limitou o uso da terra nos arredores da BR 163. Parte do território foi declarado área protegida para a conservação da natureza. Apesar deste novo contexto legal, a mineração em pequena escala continua, mas de forma não legalizada”.

Colômbia

"Oro Verde é um projeto-piloto de mineração certificada, que diferencia o ouro e a platina extraídos de forma responsável para que sejam vendidos como metais ecológicos e parte de um comércio justo. A iniciativa atualmente conta com cerca de 700 garimpeiros artesanais certificados da população afro-colombiana local, que protegem 4.500 hectares de floresta tropical. Apesar do sucesso Oro Verde, para que um mineiro seja certificado é necessário que sobreviva da mineração artesanal ou que tenha a mesma concessão de mineração exigida das grandes corporações mineiras”.

Peru

"A área mais importante de mineração informal de ouro em pequena escala no Peru está localizada na província de Madre de Dios, onde a mineração interage com a conservação da natureza e com o início da infraestrutura na Amazônia. No entanto, na última década, a invasão de imigrantes mineiros e trabalhadores pobres dos Andes têm tornado a situação crítica e insustentável. A situação foi agravada pela construção da Rodovia Interoceânica, que liga a capital regional de Puerto Maldonado à costa do Peru e à fronteira brasileira. O fácil acesso gerou uma nova corrida do ouro de magnitude que vai além da capacidade de controle das autoridades locais do Estado".


Impactos de mineração

Mineiros bolivianos. Foto: Gomiam
A técnica de mineração de ouro tem inúmeros impactos ambientais, como turvação do rio, contaminação de mercúrio, assoreamento do rio, poluição por drenagem de ácidos das minas, degradação da terra e erosão do solo, desmatamento e redução da paisagem. Os danos têm impacto na saúde humana e na biodiversidade - sua perda impacta comunidades locais.



No Suriname, por exemplo, não há acesso a água potável do rio e riachos e há perda de área de solo agrícola. A subsistência encontra cada vez mais dificuldades. A qualidade dos peixes é afetada pela água turva e a poluição dos rios com mercúrio faz com que os peixes apresentem altos níveis do metal, ameaçando a saúde da população. Os pesquisadores descobriram altos níveis de mercúrio em mulheres indígenas Wajana da aldeia Apetina, no rio Tapanahony, sul do Suriname. Durante as operações de mineração, muitos conflitos surgem entre os mineiros, moradores das aldeias, governo e grandes empresas de mineração de ouro em larga escala.