domingo, 13 de setembro de 2015

Recomeçou a corrida do Ouro no Tapajós?

Recomeçou a corrida do Ouro no Tapajós?

Mentor intelectual do movimento que resultou na criação, em 1990, da Associação dos Mineradores de Ouro do Tapajós (Amot), que dirige até hoje, diretor da Associação Nacional do Ouro (Anouro) e atualmente dono de nove garimpos, três dos quais ativos, o empresário Dirceu Frederico, com escritório de compra de ouro na cidade de Itaituba, garante que está começando uma nova corrida do ouro no vale do Tapajós - região que já foi a maior produtora do Brasil em boa parte da segunda metade do século passado e cujo ápice ocorreu na década de 1990. E mais: mesmo com a decadência da garimpagem, hoje reduzida a menos de dez por cento do que foi no passado, a atividade ligada ao ouro injeta ainda hoje, na economia da região, entre 10 e 11 milhões de reais por mês.

Segundo Frederico, apontado em Itaituba como "um baú de memórias da garimpagem no Tapajós", o ciclo do ouro tem sua origem nos idos de 1948, data do primeiro relato de que se tem notícia da ocorrência do metal. Da chegada dos primeiros faiscadores, nessa época, até o início da década de 1980, a extração do ouro se processava exclusivamente pelo método manual.

Ele lembra que foi a partir de 1982 que teve início a mecanização dos garimpos, com a chegada dos primeiros motores, bico-jatos e "chupadeiras" ao rio Marupá, inaugurando em território paraense técnicas até então restritas ao rio Madeira, em Rondônia. Continuando a imitar os procedimentos adotados pelos produtores de ouro de Rondônia, os garimpeiros do Tapajós introduziram, pouco tempo depois, uma novidade: as dragas de rio, com as quais passaram a revolver os "baixões" (vales e drenagens naturais do Tapajós e de alguns de seus afluentes).

Dois fatores se combinaram nessa época para provocar o que ficou conhecido então como "a febre do ouro" no vale do Tapajós. Ainda que um tanto rudimentar, a mecanização da atividade garimpeira provocou, de imediato, um extraordinário crescimento na produção. "O volume produzido foi multiplicado por dez", garante Frederico.

Ao mesmo tempo em que as máquinas impulsionavam a produção, o mercado internacional, surpreendentemente aquecido, registrava um grande aumento na cotação do ouro, induzindo com isso novos investimentos nas atividades de exploração. Ou seja, os preços do ouro compensavam os gastos com a aquisição de máquinas, que, por sua vez, resultavam em mais crescimento na produção.

Para Frederico, o vale do Tapajós abriga em seu subsolo muitos minérios, o que a coloca como uma província polimetálica. A província aurífera, porém, está confinada a uma área de 98 mil quilômetros quadrados delimitada pelos rios Tapajós, Iriri (afluente do Xingu) e rio das Tropas. Nessa área chegaram a funcionar mais de dois mil pontos de garimpo, cuja produção na época pode ter superado a casa de 700 toneladas de ouro.

No auge da produção garimpeira, entre 1982 e 1990, a CPRM (Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais, do Ministério de Minas e Energia) chegou a catalogar na região 432 pistas de pouso. "Provavelmente havia mais, já que não existiam os modernos recursos de hoje, como imagens de satélites", afirma Frederico. Em Itaituba, o que se diz é que o município chegou a ter perto de 700 campos de pouso em operação.


Descobertas Novas Jazidas

Dirceu Frederico observa que, historicamente, o ouro sempre valeu como ativo financeiro em torno de US$ 10 a 11 mil o quilo, o equivalente a cerca de US$ 340 a onça troy. Em 1983, coincidindo com um período de grande turbulência na economia mundial, o ouro chegou a valer US$ 800 a onça troy, o equivalente a perto de US$ 25 mil o quilo. Ou seja, quase duas vezes e meia a sua cotação histórica, o que resultou, aqui, numa febre de investimentos em abertura de pistas e compra de maquinário.

Mais de vinte anos depois, embora a época e as condições sejam diferentes, conforme o diagnóstico de Frederico, está se repetindo algo semelhante, com a cotação do ouro já atingindo um valor próximo à casa de US$ 30 mil o quilo. "O resultado disso é que já está ocorrendo uma nova corrida do ouro em Itaituba", garante.

Ele destaca que, até 1995, por dispositivo da Constituição Federal de 1988, a legislação brasileira não permitia a entrada direta de capital estrangeiro para investimento no setor mineral. A aprovação de uma emenda constitucional em 1995, no início do governo Fernando Henrique, eliminou essa restrição. A partir daí, a convite do governo brasileiro, através do Ministério de Minas e Energia, a Amot integrou comissões internacionais para tentar atrair, principalmente nos EUA, empresas dispostas a atuar em pesquisas no Brasil.

Dirceu Frederico calcula que cerca de trinta empresas americanas se interessaram pelo projeto e, delas, aproximadamente a metade se fixou na região para o desenvolvimento de projetos de pesquisa.

Do trabalho dessas poucas empresas já é possível concluir, segundo o diretor da Amot, que no vale do Tapajós existe ainda muito ouro. Ele confirma, inclusive, a descoberta de algumas jazidas de classe mundial.


"Restrições Ambientais engessam uso de riquezas"


Depois da morte de Irmã Dorothy Stang, em Anapu, em 2005, o governo brasileiro decidiu responder, da pior maneira possível, à intensa pressão da comunidade internacional: passou a criar unidades de conservação às pressas e sem o menor critério, que viram engessar perigosamente a Amazônia.

A opinião é de Dirceu Frederico, que, como diretor da Anouro, acompanhou as discussões em torno das restrições ambientais planejadas para a região. Representando os mineradores do Tapajós, ele chegou a participar de várias reuniões em Brasília e de audiências públicas realizadas na própria região oeste do Pará.

"A morte de Dorothy fez com que as unidades de conservação nascessem antes da hora", afirma. O resultado, segundo Frederico, somente hoje está sendo percebido. "As áreas onde existem grandes reservas minerais estão se transformado em reservas indígenas ou unidades de conservação".

O diretor da Amot observa que é assim na reserva Roosevelt, em Rondônia, área riquíssima em diamantes e que foi palco, no dia 7 de abril de 2004, de um massacre em que 29 garimpeiros foram trucidados por índios. Áreas ricas em minério estão hoje interditadas também em Mato Grosso, no Pará e em Roraima.

O grande problema, segundo Frederico, é que se tem hoje uma visão caolha da questão ambiental no Brasil. "O foco é única e exclusivamente na questão da biodiversidade. Não há a mesma preocupação com a população estabelecida nessas áreas, e muito menos com a geodiversidade, que tem para o futuro do Brasil importância estratégica".

As crescentes restrições ambientais impostas à região, segundo ele, ignoram o fato de que a riqueza mineral existente no subsolo é um patrimônio da nação e, como tal, deve ser aproveitada em benefício de toda a sociedade. "Não se leva em conta nem o fato de que uma empresa de mineração, para obter o alvará de lavra, tem que assumir o compromisso prévio de regeneração da área impactada".


Os que levam o nosso ouro



Os que levam o nosso ouro

No dia 18 de outubro, com o título de A Golden Solution for Europe´s Sovereign-Debt Crisis, o Wall Street Journal voltou a chamar a atenção para uma verdade tão simples quanto milenar: a importância estratégica do ouro para o poder nacional, e como reserva real de valor em épocas de crise.A ideia, agora, segundo o diário econômico norte-americano, seria utilizar as reservas em ouro de alguns dos países europeus mais endividados, como garantia parcial da dívida soberana desses países, para baixar o custo dos juros que são pagos aos investidores.
Essa estratégia faria pouca diferença no caso da França e da Alemanha, que continuam pagando juros baixos, apesar da crise. E de quase nada serviria no caso de países que têm baixas reservas em ouro com relação a suas pesadas dívidas, como a Espanha, com  282 toneladas; e a Grécia, com 112. Mas traria grande alívio para países como a Itália,  com 2.450 toneladas — o segundo maior possuidor de ouro da Europa  ou mesmo para Portugal, cujas 382 toneladas representam valor ponderável com relação ao tamanho da sua economia.
No caso da Itália, suas reservas em ouro poderiam garantir 24% de suas necessidades de endividamento para enfrentar a crise nos próximos dois anos.  Portugal supriria, com seu ouro, 30% do que necessita, o que o ajudaria a baixar os juros que remuneram seus bônus soberanos a patamares mais próximos das taxas anteriores à crise.
Enquanto os bancos centrais do mundo inteiro promoveram nova corrida ao ouro, desde o início da crise, em 2008 o México, por exemplo, passou de sete toneladas para mais de cem toneladas em poucos meses  esse não foi o caso do Brasil. Do país saiu grande parte do ouro que está nas reservas de Portugal e do que foi parar na Inglaterra, financiando a Revolução Industrial Inglesa e, por meio dela, a indústria norte-americana.  Foi o ouro de Minas  conforme a lúcida observação do historiador alemão Sombart  que assegurou o poderio geopolítico anglo-saxão nos séculos 18 e 19 e, em consequência, no século passado.
O Brasil, no entanto,  não só não aumentou suas reservas de ouro nos últimos dez anos  que continuam sendo absurdas escassas 33,3 toneladas  como ignora o ouro como fator estratégico nacional. O ouro quintuplicou seu valor nos últimos 15 anos (de U$ 300 para U$ 1.600 a onça-troy). Mesmo com o esgotamento de nossas jazidas históricas de superfície, somos o décimo produtor do planeta  e há reservas, ainda não avaliadas, em veios profundos.
Hoje, o ouro que temos representa, em valor, menos de 5% das nossas reservas internacionais, aplicadas principalmente em títulos do Tesouro dos Estados Unidos. Mais relevante do que saber se é importante, ou não, aumentá-las comprando ouro, é saber qual é a estratégia  se é que ela existe  do Brasil com relação ao metal que sempre teve e  continuará a ter importância maior na economia do mundo.
O ouro é tão importante, do ponto de vista da soberania e do desenvolvimento nacional, que a sua administração não pode ser deixada, como ocorre  hoje, apenas ao Banco Central, como condutor da política monetária, ou ao DNPM (Departamento Nacional de Produção Mineral).
Estamos tratando do ouro como se trata do minério de ferro ou da bauxita. Cinco grandes multinacionais controlam 90% da produção industrial de ouro no Brasil. Quatro, por “coincidência”  são do Canadá:  Kinross, Yamana, Jaguar Mining e Aura Gold, e a quinta é a AngloGold Ashanti, com sede na  África do Sul. A maior delas, a Kinross, atua em Paracatu, Minas Gerais. Nesse município mineiro, de onde saiu muito ouro no tempo do Brasil Colônia, a multinacional é dona de 10.942 hectares e fatura aproximadamente um bilhão de dólares por ano.
Mas a corrida em busca do ouro  pelos estrangeiros  está longe de terminar. Como não existe  política federal de defesa dessa riqueza, outras empresas estão chegando, de forma nem sempre isenta de problemas. A empresa Belo Sun Mining que, por estranho acaso, também é canadense, e possui 42 processos de licenciamento no DNPM, entre eles 27 em fase de autorização de pesquisa, obteve, em  processo acelerado, licenciamento da Secretaria de Meio Ambiente do Estado do Pará, para implantar  enorme complexo de exploração de ouro a apenas 20 quilômetros da barragem principal  de Belo Monte, na região de Altamira, na Volta Grande  do Rio Xingu.
Trata-se, segundo a empresa, de  investimento de um bilhão de dólares, e da maior mina de ouro do país  com previsão de 12 anos de extração de 4.684 quilos por ano até que se esgotem as reservas. Não obstante isso  o que mostra a total falta de planejamento e coordenação na política  do ouro no Brasil, o governo federal só tomou conhecimento da dimensão do projeto quando a multinacional organizou audiência pública na cidade de Senador José Porfírio, no Pará, em 13 de setembro deste ano.
Como primeira medida, a Belo Sun fretou todas as embarcações que fazem o percurso desde a cidade de Vitória do Xingu, deixando sem transporte os membros do Ministério Público, obrigados a se deslocar em barco cedido pela Secretaria de Educação da cidade. A participação do defensor público designado pelas comunidades locais para representá-las, Fábio Rangel, foi cerceada pelo representante da multinacional canadense, que também filtrou, pessoalmente, as perguntas que eram encaminhadas pelo público, exclusivamente por escrito, na presença do secretário de Meio Ambiente do Pará, José Alberto da Silva Colares.
Diante da situação, a procuradora do Ministério Público Federal, Thais Santi Cardoso da Silva, tomou a decisão de embargar a reunião,  e o procurador do Ministério Público Estadual, Luciano Augusto, exigiu que se marcasse também  audiência para a cidade de Altamira, que será afetada pelo empreendimento, no qual se prevê a ocupação de 2.700 pessoas.
Os Estados Unidos possuem, em suas arcas, mais de 8.500 toneladas de ouro. A Alemanha, quase 3.500, a França e a Itália, cerca de 2.500, a China, a Rússia e o Japão, cerca de mil toneladas. E o Brasil, quinto maior país do mundo em extensão territorial, e a sexta maior economia, possui menos de 34 toneladas. Não é por acaso que os países mais importantes do mundo são também os maiores estocadores de ouro, e continuam comprando. Tampouco é por acaso que o ouro rendeu cinco vezes mais que a Bolsa de São Paulo nos últimos dez anos.  Ou os que acumulam ouro estão errados, ou somos nós os negligentes.

Amazônia, biodiversidade, a riqueza da amazônia, história da amazônia

Amazônia, biodiversidade, a riqueza da amazônia, história da amazônia,




A Amazônia Legal, suas Terras, a Biodiversidade, a Produção Agropecuária, os Minérios, os Índios e a Regularização Fundiária – Por Tadeu Fernandes



Quando aportaram no Brasil as caravelas portuguesas, seus navegantes encontraram uma imensidão de terras virgens e seres humanos de origens primitivas, sem um mínimo dos conhecimentos culturais que já eram dominados na Europa.

Tudo foi relatado minuciosamente por Pero Vaz de Caminha, nascendo daí a relação do homem chamado “branco” com os silvícolas (homens da selva), denominados índios porque achavam que as caravelas haviam aportado nas Índias Ocidentais onde trariam especiarias.

Com a chegada dos portugueses, cuja Coroa Real era unida à Igreja Católica, estabeleceu-se que deveriam os Índios ser catequizados e tomar conhecimento dos ensinamentos cristãos, com o que se iniciou a vinda de centenas de missões às aldeias, modificando suas tradições religiosas e acirrando ainda mais a conquista da terra com a divisão em Capitanias Hereditárias. A cobiça dos bandeirantes que se embrenharam nas selvas em busca de ouro e pedras preciosas foi fator de redução das aldeias indígenas existentes, sendo que o que pretendiam os padres Jesuítas e os sertanistas era a aculturação dos silvícolas para um estágio civilizado. No sul do Brasil criaram-se as chamadas Sete Missões, primeiramente dando-se a conquista nas florestas litorâneas para depois adentrarem os rincões do centro do País.

Assim, deu-se quase a dizimação das tribos como as Tupi Guarani, Tamoios, Guaicarás. Na região sul e sudeste quase todas foram extintas, pois a preocupação maior da política de Governo constituía-se na abertura de terras e expansão agropecuária, sendo os índios relegados a um segundo plano, certamente copiando o modelo adotado nos Estados Unidos onde os Chavantes, os Chayenes e os Peles Vermelhas tiveram que modernizar seu modo de vida. No México, onde Astecas, Toltecas e Zapotecas também foram vencidos, o pensamento predominante era que estes seres humanos deveriam receber uma cultura no molde europeu e seguir suas religiões, o mesmo acontecendo na Austrália.

Não há uma única cultura indígena. Os índios atualmente possuem cerca de 180 línguas em aproximadamente 200 povos, diz o sertanista Sidney Possuelo, Presidente da Funai.

Com a derrubada das florestas no centro sul e a quase dizimação dos silvícolas, restaram tribos isoladas nos rincões do Mato Grosso e na chamada Amazônia legal. Daí é que começa propriamente o problema indigenista no Brasil com o Governo Federal passando a ter interesse na conquista de novas fronteiras agrícolas. Antes, o Marechal Rondon havia feito os primeiros contatos com silvícolas e efetuado inúmeros relatórios de como deveriam ser tratados. Chegou com o telégrafo até as margens de Santo Antonio ao lado de Porto Velho. Mais tarde houve a participação efetiva dos irmãos Vilas Boas que foram mestres na aproximação e contato com os índios.

Getúlio Vargas assinou a Lei 1.806/53 criando a SPVEA (Superintendência do Plano de Valorização Econômica da Amazônia), com poucos efeitos práticos.

Até então não havia uma legislação específica que tratasse da proteção e da forma de relacionamento com os índios. Havia uma corrente cujo entendimento era de que os índios deveriam se adaptar ao mundo moderno. Outra, oposta, entendia que suas culturas e tradições deveriam ser respeitadas, razão pela qual deveriam permanecer isolados nos seus respectivos estágios.

Somente em 21 de dezembro de 1.973 é que foi editado o Estatuto do Índio. Com a criação do seu próprio Estatuto, as normas envolvendo os silvícolas foram duras e severas numa intenção evidente de que as coisas mudaram em muito, criando grandes áreas de reserva e áreas de ocupação indígena, que são condições totalmente distintas, onde a criação de uma reserva indígena pode ser feita sem a sua existência e manejá-los, ao passo que a terra de ocupação é posse imemorial e obedece a outros critérios.

Na Constituição de 1934 foi estabelecida a competência privativa da União para legislar sobre áreas indígenas, disposição que sofreu pequenas alterações nas de 1937 e 1946. Já da Constituição de 1967 constou que as terras indígenas integravam o patrimônio da União, onde estes tinham o usufruto sobre os recursos naturais. Tratava-se de meios legais para a garantia física das sociedades silvícolas, sendo que a Emenda Constitucional de 1969 criou novas normas jurídicas estabelecendo que terceiros que ocupassem terras de posse imemorial dos índios não teriam direito a indenização.

Finalmente, a Constituição de 1.988 veio ampliar em muito as questões de natureza de terras indígenas, incluindo entre os bens da União, por seu artigo 20, as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios. Entraram as terras sagradas, os cemitérios e as áreas de ambulação. Já o artigo 49 estabeleceu competência exclusiva do Congresso Nacional para autorizar a exploração e o aproveitamento de recursos hídricos, assim como a pesquisa de riquezas minerais em terras indígenas, fixando a Justiça Federal como órgão competente para dirimir conflitos que envolvam estas áreas. Incluiu, ainda, o Ministério Público Federal como órgão com direito das defesas dessas populações. O artigo 215 assegurou o ensino bilíngüe e os artigos 231 e 232 estabelecem todos os demais direitos, ressalvando a intervenção do Ministério Público em todas as ações judiciais em que forem parte as comunidades indígenas e suas organizações, art. 232. Em suas disposições transitórias, artigo 67, a Constituição fixou ainda um prazo de cinco anos para a demarcação das terras indígenas.

A lei 6.001 classifica os índios em isolados, em via de integração e integrados, os últimos com direitos e obrigações da vida civil, sendo que todas suas terras devem ser arrecadadas e registradas em nome da União, existindo ainda uma distinção entre terras tradicionalmente ocupadas, terras reservadas e terras de domínio comum dos índios e das comunidades.

A FUNAI é responsável pela gestão dos bens dos silvícolas, não sendo aceita a pesca, caça, coleta de frutos e atividades extrativistas ou agropecuárias em áreas indígenas. É assegurada a participação dos índios no resultado da exploração dos recursos do subsolo. O corte de madeira está condicionado à existência e aproveitamento de terras na exploração agropecuária, indústria e reflorestamento, conforme a lei 4.77l.

A lei 5.371/67 instituiu a FUNAI, fundação privada, com dever de estabelecer políticas indigenistas, tratar os índios não integrados, administrar seu patrimônio, propiciar assistência médica sanitária e educação de base, com poder de polícia. Com a criação da Funai foi extinto o Serviço de Proteção ao Índio (SPI), criado em 1910 pelo Marechal Rondon, integrando a Funai ao Ministério da Justiça. A lei 1.141, de 1994, estendeu responsabilidades a outros órgãos federais, principalmente em programas de auto-sustentação, sendo que o decreto 26/1991 atribui ao Ministério da Educação a educação escolar indígena.

O decreto 1.775, de 1996, prevê que a demarcação impõe o princípio do contraditório nos processos administrativos, não se podendo ingressar em terras indígenas sem autorização do órgão publico.

Estas considerações elucidam razoavelmente o ordenamento jurídico que trata das terras dos Índios no Brasil, o que deve ser ainda muito aperfeiçoado pelo Congresso Nacional para que sejam fixados com clareza os objetivos definitivos dessas nações pré-históricas. Muito ainda há que se discutir com vistas ao ideal de convivência pacífica entre o homem “branco” e os nossos primeiros habitantes, deixando-se de lado este sectarismo de nações indígenas, pois na realidade o Brasil é um só e de todos, sem distinções, onde suas leis devem ser respeitadas. É imperioso fomentar seu progresso e desenvolvimento, obviamente obedecendo as áreas preservadas, flora e fauna, não esquecendo que existem quase 200 milhões de bocas para alimentar e que é vital sermos competitivos no cenário internacional. Eis a questão: nada se resolverá com arrogância e agressividade. O Brasil necessita de recursos naturais para gerar energia e utilizar corretamente a exploração de seus minérios, devendo ser feita uma reflexão e uma ampla discussão sobre as razões pelas quais a grande maioria das nossas reservas minerais está justamente dentro das reservas indígenas. Nada contra, mas trata-se de questão que necessita ser esclarecida ao povo brasileiro a partir do Congresso Nacional, pois os índios devem merecer toda retaguarda como ente de menor força, porque os quase 30 milhões de pessoas que residem na Amazônia legal, também almejam prosperidade e melhor meio de vida. O mundo passa por uma escassez de alimentos e o Governo Federal deve incentivar a modernização da produção agrícola e mapear todo o território brasileiro de forma a estabelecer regiões apropriadas para determinadas culturas agrícolas e onde se deve expandir a produção pecuária.

Os estados do sul e do sudeste, e também do nordeste, praticamente dizimaram suas florestas. Agora o Brasil e o mundo voltam seus olhares para o que nos resta de florestas. O fato, porém, deve ser encarado com seriedade para que milhões de pessoas que habitam esta região não fiquem fora do desenvolvimento e das conquistas do mundo moderno.

Se for para congelar totalmente a abertura de novas fronteiras agrícolas, nada contra. Mas que se dê direito ao índio que possui centenas de milhares de quilômetros quadrados, que se dê direito que a Amazônia permaneça intacta, que se conserve nossas reservas florestais, se o resultado de tudo é em benefício do próprio homem. Mas que os habitantes da Amazônia não sejam esquecidos, pois foi o próprio Governo Federal que incentivou milhares de brasileiros a virem para estas novas fronteiras aonde enfrentaram os próprios índios, doenças tropicais, animais selvagens, sem escolas e estradas nem assistência médica. Com suas tralhas nas costas e com seus filhos, quase na miséria abriram carreadores contando somente com choupanas para dormir. O incentivo para a vinda de brasileiros de todas as partes do País permaneceu durante décadas, sendo lema do Governo da União “Integrar para não entregar”. Depois de todos estes sacrifícios que eram impostos pelo próprio INCRA em seus contratos, que continham cláusulas resolutivas expressas determinando o desmatamento de no mínimo 50% da área, o que se vê agora é que a Amazônia e seu povo passam a ser é o vilões da história. Tudo isto deve ser repensado de forma a que os serem humanos que habitam esta região também sejam respeitados. Que sejam formalizados termos de ajustamento de condutas, que não se derrube mais nenhuma árvore há não ser através de planos de manejo, mas que ao mesmo tempo não sejam tratados como marginas aqueles que, incentivados pelo próprio Poder Público, vêm ao longo dos anos tirando seu sustento, a duras penas, das terras aqui localizadas. Não podem ser tratados como marginais. Que se defina uma nova ordem sem necessidade do confronto entre aqueles que querem produzir e a preservação ambiental.

Dito isto, retornamos ao enfoque principal que é a questão indígena no Brasil registrando que no Estado de Rondônia, em uma área de 23,8 milhões de hectares apenas 10 milhões e 100 mil hectares estavam disponíveis para atividade econômica. Depois das últimas medidas, especialmente a Medida Provisória 1.511, editada em 1.996 pelo Ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso, restam minguados 2 milhões de hectares para toda a população. Ninguém pode em sã consciência crucificar os produtores rondonienses, principalmente porque as terras do Estado encontram-se registradas em nome da União.

Na nossa região Amazônica restam as principais tribos indígenas: Ashaninha e Karajá no Estado do Acre; os Surui em Rondônia; Matis, Marubo, Maioruna e Ticuna no Amazonas; os Yecuana_Maiongongo em Roraima; Apiacka no norte do Mato Grosso; Apurinã no Acre e no Amazonas; Arawetê no Xingu; Bororos no Mato Grosso; Deni no Amazonas; Gavião no Tocantins; Ikpeng, Jamamadi, Ejuma e Jurunas no Xingu; Karitanas em Rondônia; Kasarari no Acre, Rondônia e Amazonas; Mamaindê em Rondônia; Manduruku no Pará e Amazonas. Ainda os Nadeb, Nambikwara, Palikur, Pancaru, Pareci, Pataxó, Potiguar, Saterê-Mawê, Tabajara e Temiminó no Amazonas e outras etnias, umas ainda desconhecidas, foram citadas algumas para a noção da sua diversidade, algumas praticamente aculturadas, outras sob a gestão direta da FUNAI e a maioria já integrada a vida do homem moderno.

As maiores reservas indígenas são: a Raposa Serra do Sol, em Roraima, com 1,7 milhões de ha; a Apyterewa, no Xingu, com 773 mil ha; Parque do Araguaia, 1,3 milhão de ha; Ianomâmi, no Amazonas, com 9,7 milhões de ha; Roosevelt, em Rondônia, com 230,9 mil ha; Alto Rio Guamá, com 280 mil ha; Caiapó com 3,2 milhões de ha; Truká, em Pernambuco, com 1,6 mil ha; Aqrariboia, no Maranhão, com 413 mil ha.

O enfoque das terras indígenas com relação à lei 6.001, Estatuto do Índio, teve um capítulo que deve ser relatado para que fiquem registradas algumas questões de natureza fundiária que envolvem nossas terras e o cuidado que se deve ter para fixar posse imemorial indígena.

Em 1.975, no governo do Presidente Ernesto Geisel, foi criado em Ariquemes/RO o Projeto de Assentamento Dirigido Burareiro para serem assentadas famílias em lotes de até 250 hectares, o que foi feito corretamente pelo INCRA. A partir daí, tendo à frente o sertanista Apoema Meirelles, técnicos da FUNAI fizeram um levantamento da área e antropologicamente, segundo eles, encontraram algumas ossadas e vestígios de que ali teriam vivido índios, o que poderia caracterizar uma aldeia. Com o relatório completo, convenceram os responsáveis pelo Poder Público no governo do ex-presidente José Sarney que a área deveria ser arrecadada para o patrimônio da União por tratar-se de posse imemorial indígena. O relatório foi aceito e o então Presidente Sarney em 1975 editou um Decreto declarando a área indígena e determinando sua demarcação e arrecadação ao patrimônio da União, o que atingiria 125 famílias em uma área de aproximadamente 31.150 hectares. Sabe-se que pela própria legislação essas famílias teriam que deixar seus lotes sem nenhuma indenização, tendo seus títulos anulados. Por conseqüência, em síntese toda a área seria arrecadada para o patrimônio da União e transformada em área indígena, causando um grande temor e tristeza aos colonos que de uma hora para outra teriam suas áreas individuais e anos de trabalho destruídos.

Fui contratado para encontrar uma saída jurídica para que os pobres colonos e suas famílias não perdessem suas terras, antes licitadas regularmente pelo INCRA.
Após profundo estudo jurídico sobre a questão, cheguei à conclusão de que não se poderia atacar o Decreto presidencial. Porém, era necessário comprovar que o Presidente tinha sido mal informado e induzido a erro. Por meio de uma Ação de Justificação Judicial, proposta na Justiça Federal, na qual foram arroladas dezenas de pessoas, inclusive funcionários do próprio INCRA, ficou demonstrado que não se tratava de área indígena. A Justificação Judicial foi devidamente homologada.

Acontece, porém, que estava em vias de ser registrada no Ofício de Registro de Imóveis de Ariquemes a arrecadação da área para o patrimônio da União, tendo-se que lutar contra o tempo. Ingressei com uma Medida Cautelar de sustação de cancelamento de registro imobiliário em favor dos assentados, cuja liminar foi deferida pelo MM. Juiz federal. Assim, dirigi-me até o Cartório de Ariquemes com um mandado judicial que determinava ao Oficial que se abstivesse de cancelar os títulos e registrar a área em nome da União.

Obviamente que, como se trata de Medida Cautelar, teria que se ingressar com ação principal. Não tendo por objetivo atacar diretamente o Decreto Presidencial, promovi uma Ação judicial Desconstitutiva de Ato Administrativo, pois o então Presidente havia sido levado a erro.

Faço este registro para que se tomem maiores cuidados nestas questões, devendo haver convicção plena e bom senso dos agentes públicos na destinação das terras públicas. Certamente, se não houvesse aquelas medidas os colonos não mais estariam com suas famílias produzindo alimentos e desenvolvendo o estado de Rondônia, que é um ente federado que tem uma história peculiar. Muita coisa poderia ser diferente e já teríamos alcançado maior progresso e bem estar de sua população. É só lembrar fatos passados e alguns presentes para comprovar que muita coisa foi perdida e não reverteu em benefício de nossa população.

Os conflitos ocorrem e devem ser analisados com muito cuidado. Há que se discutir a questão das reservas minerais, quase todas encravadas em terras indígenas. Outros países como os Estados Unidos, o Canadá, a África do Sul e inúmeros outros encontraram modelos para resolver o problema. Trazendo a matéria diretamente para o Estado de Rondônia, onde realmente deve o assunto ser tratado, temos, por exemplo, a reserva de Roosevelt em Espigão do Oeste aonde se encontra uma das maiores reservas de diamante do planeta. Ora, com normatização coerente e disciplinadora produzirá bons frutos e resultados altamente positivos, e isso longe de querer que deixe de se constituir área indígena, cujo nome, aliás, se deve à uma expedição realizada pelo Marechal Rondon, em companhia do ex-Presidente Roosevelt dos Estados Unidos, quando passaram por aquela região, inclusive com a denominação do Rio Roosevelt.

A Reserva Roosevelt está localizada no sul de Rondônia, mais especificamente em Espigão do Oeste e parte de Pimenta Bueno, onde é habitada pelos índios Cinta-Larga. Possui uma área de 2,6 milhões de hectares e há pouco tempo lá foi descoberto um raro quimberlito, que é uma rocha vulcânica de onde é extraído o diamante. Segundo o CPRM, do Ministério das Minas e Energia, o quimberlito é único no Brasil e tem capacidade de produzir mais de um milhão de quilates e, ainda, um quinto de pedras preciosas, o que representaria receitas em bilhares de dólares. A reserva é uma das cinco maiores do mundo, sendo que seus recursos naturais trariam estrondoso incremento para os cofres públicos e para a própria população brasileira, tão carente em infra-estrutura, o que representa muita coisa. A questão deve e tem que ser enfrentada por comissões especiais do Congresso Nacional, órgãos públicos representativos dos índios, Receita Federal, uma força especial de supervisão. Que se faça como em outros países, através de concessões, o que é possível em razão de estar previsto na própria Constituição Federal – cabe ao Congresso (arts. 21 e 38 da lei 7.805) autorização para a extração mineral, enquanto não se tomam iniciativas para que esta fonte grandiosa de recursos econômicos seja transferida para a já carente população brasileira, continuando os conflitos e a extração ilegal dos minerais, e, segundo a imprensa, saem os diamantes clandestinamente para outros países, devendo ser explorado com regras próprias, respeito e preservação ao meio ambiente, destinando parte da extração aos próprios índios, tudo feito regularmente através de concessões a empresas que comprovem capacidade para a extração, dentro de normas regulamentadas e fiscalização Federal.

Retornando à questão indígena, devemos lembrar que a Reserva de Roosevelt se constitui de uma grande floresta de 2.7 milhões de hectares, sabendo-se que a maioria das mineradoras do mundo tem interesse em extração, pois ali se esconde quem sabe a maior jazida de minérios do mundo. Empresas estrangeiras já têm todo mapeamento da área, a riqueza que se esconde é incalculável, detectores magnéticos e técnicos do ramo já dizem que ali existem vinte quimberlitos, que trata-se de formações rochosas. Segundo foi noticiado, um só quimberlito pode resultar em produção equivalente a 2 bilhões de dólares.

O que se pretende levar à tona é que toda essa riqueza pode ser aproveitada obedecendo-se a padrões corretos e dentro da lei, sendo certo que somente o Congresso Nacional pode dar essa autorização para que sejam criadas comissões. Que se realizem estudos aprofundados para serem dadas concessões ou não, obviamente assegurando-se porcentagem aos próprios índios. E fiscalização severa. O Governo Federal tem que saber o imenso tesouro que ali se esconde e tomar medidas para reverter tal riqueza em benefício da população brasileira. Sabe-se que além dos quimberlitos já encontrados, existem ainda outros. Utilizando tecnologia de ponta, poderão ser encontradas novas rochas. O que não se pode é dar as costas para esta realidade e deixar que a extração se faça clandestinamente.

A Reserva Roosevelt foi demarcada em 1.973. O que deveria ter sido feito é um programa de assistência ao índio e o DNPM fazer um levantamento geológico da área.

Podemos copiar outros países como a África do Sul e especialmente o Canadá que promove extração desde 1.991, quando se iniciou a atividade com a descoberta de três minas em áreas que também estavam em terras indígenas. Que se forme uma comissão no Congresso Nacional que se desloque até lá, com técnicos, visando conhecer como se dá legalmente a extração e a venda de seu produto, tendo em mente que se deverá impor aos concessionários uma rígida legislação sobre preservação ambiental. |Sabe-se que o Canadá é atualmente um dos maiores produtores de diamante do mundo. Não pode o Governo Federal deixar de auferir receita com esta riqueza, ao mesmo tempo não permitindo novos conflitos e a devastação ambiental.

A extração legal das riquezas em terras indígenas já demarcadas reverterá em benefício dos próprios índios, que terão sua cultura preservada, além de passarem a ser beneficiados com melhores condições de vida e de apoio às suas famílias, haja vista não dispor a FUNAI de todos os recursos que os milhares de índios necessitam.

O que se sabe é que o Deputado Federal por Rondônia Moreira Mendes sugere que uma comissão vá até Cacoal para discutir a Reserva Roosevelt com a população e os índios. Este é o papel constitucional do Congresso e tem-se que ir a fundo nesta questão, respeitados, repetimos, os direitos dos índios e o meio ambiente. O que se tem conhecimento é que o projeto de lei 1610-96, do Senado Federal, abre uma porta para a exploração e o aproveitamento em terras indígenas. Que amplie o debate para não deixar de lado este verdadeiro filão de nossas riquezas naturais. O próprio Governo, através de José Alberto Cunha Couto, Secretário de Acompanhamento e Estudos Institucionais da Presidência da República, é favorável, o mesmo se dando com o Coronel Marinho Pereira Rezende Filho, que defende a mineração em terras indígenas dizendo ainda que pode facilitar o controle das fronteiras e segurança do País. Segundo ele, 90% das reservas minerais estão nas regiões de fronteira. Asdrúbal Bente avalia que o projeto vem em boa hora, mesmo pensamento de outros vários deputados.

A Constituição não proíbe a exploração nesta área, devendo ser criado um regime específico e bem detalhado. Estrategicamente é de bom alvitre a exploração correta dos minerais destas áreas, podendo ser acompanhado por toda a sociedade, inclusive as organizações não governamentais.

O que se pretende é contribuir para que se faça uma análise mais profunda sobre os direitos dos índios e os recursos naturais incrustados em suas áreas e que poderão ser explorados racionalmente, com resultado positivo para todos. Trata-se apenas de uma reflexão acadêmica sem nenhum outro propósito, como rondoniense que ama sua terra e quer ver respeitado o ordenamento jurídico vigente no País, porém com aproveitamento de nossas riquezas para que as populações mais carentes possam contar com melhores condições de vida. Só com o desenvolvimento econômico racional é que conseguiremos compatibilizar estas vertentes, produção agrícola, ampliação da matriz energética, utilização dos recursos minerais, respeito aos nossos primeiros habitantes e proteção ao meio ambiente. Isto será alcançado com muito esforço e dedicação, com o Governo Federal adotando o gerenciamento de políticas públicas voltadas para este setor, devendo o Congresso Nacional agilizar concessões para as retiradas destes minérios que estão enterrados no nosso subsolo.

Podemos citar como exemplo o projeto diamantífero de Catoca que explora o quarto maior quimberlito do mundo na província angolana da Luanda Sul, que prevê uma produção de 5,5 milhões de quilates por ano. A sociedade mineira de Catoca é uma parceria entre a empresa nacional de diamantes de Angola, a russa Almazzi, a israeleita Daymont e a brasileira Odebrecht, podendo a exploração ser feita nos próximos 40 anos, pois a estimativa é que atinja a produção anual de 19 milhões de quilates nos próximos anos, o que fará de Angola um dos principais produtores mundiais destas pedras preciosas. Imaginem a quantidade enorme de quimberlitos que existem em Roosevelt e o quanto renderia para a economia nacional.

A Amazônia legal contém 424 áreas de florestas protegidas, faltando implementá-las de fato com a implantação de um plano de manejo como explicita Leandro Ferreira. Caso contrário, não irão segurar o desflorestamento por muito tempo. Impõe-se, pois, instituir normas para a utilização da terra e de seus recursos, devendo considerar-se que a Amazônia legal perdeu aproximadamente 700 mil quilômetros de sua cobertura arbórea, o que corresponde a 20% de sua área, segundo dados do IMPE.

Devemos fazer reflexão sem sectarismo e direcionar o desenvolvimento sustentável de Rondônia equacionando os interesses da população, o seu progresso com respeito às leis ambientais. Mas, não podemos, de uma hora para outra, sacrificar e demonizar aqueles que vieram para cá com espírito de brasilidade e que com muito trabalho e resistência contribuíram para a formação de um Estado federado, incentivados que foram pelo próprio Governo Federal. Se as regras mudaram, vamos adaptá-las, não com medidas drásticas e punitivas, mas com ensinamentos pedagógicos, termos de ajustamento, dando prazo para recompor as florestas, não mais desmatando. Que se conceda títulos de terras a quem merecer de acordo com a Constituição Federal, o Estatuto da Terra, leis ordinárias, hoje especialmente a MP 422. Que sejam rigorosos na aprovação de planos de manejo, pois as árvores têm vida útil e se não fizermos o desbaste certamente estas cairão e trarão enormes prejuízos a economia brasileira.

Somos uma unidade da Federação que muito contribui para o crescimento econômico do Brasil. Deve–se ter muito cuidado com o trato de uma população ainda muito carente, constituída de quase dois milhões de almas que sonham progredir, almejando novos horizontes. Atualmente, dispomos de somente 2 milhões de hectares de terras agricultáveis para as produção de alimentos. Somos bastante participativos em produtos agropecuários, temos uma das maiores bacias leiteiras do Brasil, produzimos feijão, café, soja, milho, além de inúmeros produtos animais e vegetais. Temos reservas minerais imensas e seremos uma das maiores fontes de produção de energia elétrica a ser instalada no Rio Madeira com as usinas de Jirau e Santo Antônio.

Conforme atesta a professora Klondi Lucia de Oliveira Agra, a primeira penetração do homem europeu é relatada pelo dominicano Gaspár Carvajal: “… região que representa a maior reserva biogenética do planeta, o que desperta o interesse e a cobiça do mundo”. Nosso desenvolvimento deu-se de maneira atípica, diferente do estado do Paraná que atualmente não dispõe de 1% de suas reservas florestais, sendo que um grupo inglês coordenado por Willian Davis adquiriu praticamente todas as terras do norte do Paraná e ali criou a Cia. de Melhoramentos Norte do Paraná, assim surgindo os municípios de Londrina, Maringá, etc., onde os colonos compravam suas terras e eram imediatamente registrados no registro de imóveis. Havia a preocupação de cortar em lotes com todos iniciando na altura dos espigões e no fundo havia aguadas, através de riachos e rios, sendo que em pouco mais de quinze anos jogaram a floresta no chão, acabaram com a fauna e a flora. Os estados do sul e do sudeste devem ter muito cuidado para nos analisar e condenar sumariamente, pois Rondônia tem ainda 70% de suas florestas intactas. O Rio de Janeiro ainda não despoluiu a Baía da Guanabara e o canal de Marapendi, que são uma fonte de esgoto. Acabaram com a mata atlântica e não vemos projetos para reflorestamento.

Em 1.975 o INCRA já havia distribuído 4,3 milhões de hectares. De 1996 a 1997 foram criados 17 projetos de assentamentos, com 200 mil ha. Naquela época não havia necessidade de licenciamento ambiental, o próprio IBAMA aceitava planos de manejo com a simples comprovação de posse.

Infelizmente não estão sendo levados em conta os interesses e as necessidades da população de Rondônia, que vive numa região ainda marcada por muitos problemas a serem resolvidos, com um clima escaldante, doenças tropicais e nada de saneamento básico, sobrevivendo graças aos rondonienses e aos pioneiros que com muita garra e trabalho acreditaram que aqui será edificado um Estado pujante e progressista. Que venham os órgãos federais dar novo alinhamento à conduta e à prática na questão agrária, mas que não condenem e punam sem conhecer melhor a nossa história e as causas que nos levaram a abrir novas frentes de trabalho que resultaram em grande produção agrícola, base de sustentação da população brasileira e de exportação para vários outros países.

É bom registrar que apenas 26% das terras de Rondônia são regularizadas, faltando reconhecimento de 74% das propriedades, de acordo com dados do Deputado Tiziu, trazendo prejuízos e intranqüilidade aos agricultores, entraves para o reconhecimento e a consolidação econômica do Estado, sendo que no município de São Miguel, por exemplo, somente 5% das propriedades têm título e em Costa Marques somente 2%.

A crise mundial, principalmente nos EUA, o preço do commodities altíssimo, os minerais em alta, sendo que 350 aviões já pararam de voar nos EUA pela alta do petróleo e quase cem aeroportos deixaram de receber aeronaves, é o momento certo de o Brasil, que conseguiu uma economia mais sólida, desenvolver seus produtos agropecuários com tecnologia que coloca o bio-combustível na vanguarda da nova alternativa bioenergética, escolhendo nossos rumos e tomando medidas competentes para que nosso processo de desenvolvimento não sofra com as adversidades que são visíveis na economia mundial.

Não devemos nos esquecer que apenas 4% das terras da região Amazônica são privadas, com títulos válidos; outros 43% correspondem a unidades de conservação e de terras indígenas. Do restante, 1 milhão de quilômetros quadrados (21% do total), são áreas supostamente públicas, devendo ser discriminadas e arrecadadas ao patrimônio da União. Obviamente o Brasil deve fazer uma profunda reflexão sobre o que pretende quanto à sua produção agrícola, à bioenergia, à flora e à fauna, devendo fazer um planejamento adequado e de execução rigorosa. Estamos diante de uma oportunidade para criarmos empregos e muitos investimentos, impondo barreiras para a compra de terras agrícolas no Brasil por parte de estrangeiros, sendo que já foram vendidas 33.219 propriedades rurais em uma área total de 3,8 milhões de hectares.

Cresce o interesse pela aquisição de terras no Brasil por parte de estrangeiros em razão do alto valor dos alimentos. A lei 5.709, de 1.971, limitava a compra de terras por estrangeiros, mas a emenda nº 6, de 1.995, aboliu a distinção entre empresas brasileiras de capital nacional e capital estrangeiro, sendo que a lei 6.634, de 1.979, fixa uma faixa de 150 km a partir da fronteira indisponível para compra por estrangeiros. Alguns países da América do Sul já restringem a compra de terras por estrangeiros como é o caso da Venezuela, do Equador e da Guatemala, sendo que a Argentina, o Chile, a Colômbia e o Uruguai não têm restrições. Este é um assunto que deve ser tratado com muita seriedade como já faz a União Européia que pretende também fixar limites para compra de terras por estrangeiros. O próprio Governo do Uruguai apresentou Projeto de Lei para limitar a venda de terras para estrangeiros. Rondônia tem 37.343,8 hectares em um total de 162 propriedades que são pertencentes a estrangeiros, sendo que o Estado que tem maior número de estrangeiros que possuem terras no Brasil é o Mato Grosso, em que 1.377 propriedades rurais pertencem a estrangeiros numa extensão de 754,7 mil hectares. As propriedades em que há plantações de soja, cana de açúcar e eucalipto são as que mais atraem os estrangeiros. Assim, o que se observa é que poderá acontecer nas terras brasileiras destinadas ao plantio agrícola o que já acontece com as praias do nordeste, em que uma extensão de quilômetros e quilômetros já pertence a estrangeiros. É hora de o Governo Federal e o Congresso Nacional adotarem medidas mais rígidas na transferência dominial de propriedades brasileiras a estrangeiros.

A parte difícil parece ser transformar o discurso em ação, do conforto do planalto ou de Ipanema, cujas temperaturas são amenas, para as tépidas temperaturas tropicais e aflitivas condições sociais em que um povo depende do seu próprio esforço para garantir a sua sobrevivência, dependendo do Governo e do Congresso definirem com propriedade o que fazer da Amazônia e coordenar novos rumos sem esquecer do homem amazônida, como zerar o desmatamento e dar condições para as milhares de pessoas que aqui vivem garantindo a produção e o sustento de suas famílias.

O Estado do Amazonas tem 98% de suas florestas preservadas graças à Zona Franca de Manaus, que garantiu ao seu povo a manutenção de suas florestas. Outros modelos poderão ser encontrados para a preservação do restante da Amazônia legal.

Temos plena consciência da importância da preservação das florestas, mas devem-se também ter regras claras para a utilização desta biodiversidade por esta geração e não daqui a cem anos, necessitando que sejam criadas condições de trabalho e subsistência, linhas de crédito para que haja novas frentes de trabalho, utilizando racionalmente a floresta. Logicamente que a atual cultura deve mudar, mas não esquecendo das famílias e de todos aqueles que pretendem permanecer na Amazônia, criando uma política sustentável de renda com condições dignas, devendo a bancada política encontrar novos rumos, pois atualmente somos vistos como destruidores da natureza e a realidade é bem diferente. Se houve erros, houve também omissão na fiscalização imediata. Tem-se que estabelecer um grande fórum de discussão para que cada um se responsabilize em recompor o que foi devastado, com abertura de linhas de crédito e prazo para que se possa recompor as áreas degradadas, criando-se grandes viveiros de mudas das espécies tropicais para que se restabeleça a flora e a fauna.


A seguir, enumeramos as perdas que frearam o desenvolvimento do Estado de Rondônia:

1) A estrada de ferro Madeira-Mamoré foi construída a partir de 1907 e fazia seu trajeto normal até Guajará-Mirim, transporte barato e que trazia as riquezas e produção do interior, além do transporte de pessoas, dando saída para os bolivianos, conforme ficou convencionado no tratado de Petrópolis, no qual o Brasil recebeu as terras do Acre, tendo sido desativada inexplicavelmente em 1972, de uma hora para outra, pararam os trens, as litorinas, os vagões. Tudo virou sucata e enterraram parte de uma grande história do Brasil, sendo que esta estrada poderia estar funcionando até hoje com reparos, mas só nos resta o cemitério da maior obra da Amazônia.

2) A extração da borracha não trouxe benefícios para a região, apenas para os seringalistas. Ajudamos em muito na Segunda Guerra Mundial com os chamados soldados da borracha, saindo toneladas de látex, e não houve retorno para a região.

3) A Cassiterita foi arrancada dos solos rondonienses e levada para os fornos de Volta Redonda e outros locais, deixando para nós a destruição e degradação do meio ambiente.

4) O ouro do rio Madeira foi outra página histórica, sem nenhum acompanhamento ou fiscalização do Governo Federal e dos órgãos ambientais. De Porto Velho, milhares de balsas e dragas tiraram nossas riquezas, deixando a poluição do rio Madeira com a utilização do mercúrio, causando enormes prejuízos aos peixes e à saúde da população de um modo geral. Ao Estado não houve retorno em receitas públicas, mas suas cadeias e penitenciárias tiveram sua população carcerária significativamente elevada, sem falar no comprometimento ainda maior da saúde pública naquele período.

5) O caso do BERON ainda não foi resolvido e se sabe que a dívida contraída poderia ser quitada com o patrimônio da instituição bancária estadual. Tínhamos algumas alternativas, como a sua liquidação, a venda ou transferir-se a gestão temporariamente ao Banco Central para o seu saneamento. O Governo da época acreditou no Banco Central, convenceu-se que aquela instituição com mais preparo poderia fazer o seu saneamento e retornar com melhor saúde econômica para o Estado. Porém, o que se verificou passados mais de dois anos é que o Banco Central, através de seus interventores, não administrou corretamente aumentando seu passivo em muito. Quando se deu conta, o déficit e a dívida havia aumento dezenas de vezes e, o que era para ser saneado, acabou se constituindo transferência de uma dívida enorme para os cofres públicos, sendo que o Tesouro Estadual é obrigado a pagar milhões por mês por um débito que não é seu. A União tem de reconhecer e rever esta situação conforme já foi votado pelo Senado Federal, sendo esta é luta de todos nós.

6) A questão do gás de Urucu está em que o gasoduto vai para Manaus e não para Porto Velho, sendo que existe gás suficiente para atender estas duas demandas. Milhares de reais são gastos diariamente na usina termoelétrica em Porto Velho, quando os tubos já deveriam estar sendo assentados até a Capital, com enorme economia no consumo industrial, comercial e residencial, como na utilização veicular. A distância entre Urucu-Coari-Porto Velho é de 523 km, menor distância que conduz para Manaus, produzindo atualmente 9.700.000m3 de gás por dia, suficiente para atender os dois Estados. Será que somos discriminados? O consumo do Estado do Amazonas é estimado em 5,5 milhões/dia. Rondônia 2.2 milhões/dia, segundo nos foi informado nos meios de comunicação.

7) Já na própria criação do Território de Rondônia sua área foi diminuída. O decreto lei 5.836, de 21 de setembro de 1943, que criou o território do Guaporé fixou sua área em 349.178 Km2. Por pressões políticas dos amazonenses foi feita nova revisão e mais uma vez perdemos grande parte do nosso território, sendo que com a edição do decreto-lei 7.470, de 1º de abril de 1945, fomos reduzidos aos atuais 238.512 Km2. Só não perdemos a Ponta do Abunã, mais tarde, graças às ações do Governo Jerônimo Santana, quanto estávamos à frente da Secretaria de Justiça representando o Estado nas questões envolvendo a invasão, pelo estado do Acre, daquela região. Com muito sacrifício conseguimos conservar os 500 mil ha que já estavam prestes a serem tomados de Rondônia. Essa epopéia está narrada no livro que escrevi, denominado Ponta do Abunã, o Braço Ocidental de Rondônia.

8) Em combustível, a Termonorte gasta um bilhão de reais por ano para abastecer a usina termoelétrica em Porto Velho, sendo que a obra do gasoduto Urucu-Porto Velho é estimada em dois bilhões de reais, ou seja, em dois anos a obra é paga. A Petrobras sabe que o custo do gás é seis vezes menor do que o do óleo diesel, sendo que o óleo é trazido em barcaças, o que poderá resultar em um desastre ecológico caso o uso deste meio de navegação venha a afundar nos rios que trazem o combustível até Porto Velho. O que precisa mais para convencer os órgãos públicos para que a obra seja executada? Eis a questão.

9) A Lei Complementar nº 41 que criou nossa unidade da Federação previu que União daria sustentabilidade para a consolidação do Estado e até hoje não foi definitivamente resolvida a questão da transposição dos antigos funcionários da União. A folha de pagamento que com a qual o Estado arca mensalmente, deveria ser responsabilidade da União Federal.

10) E a construção das pontes do Rio Madeira, da estrada para Manaus, do Porto de Cargas e do Terminal Fluvial de Passageiros? Agora com a construção das usinas do Madeira será levada energia para todo o Brasil e alguns a países da América do Sul. As usinas de Jirau e Santo Antonio, a serem construías no Rio Madeira, produzirão energia limpa e renovável que será distribuída de forma integrada pelo sistema nacional. Há que se aguardar em que será beneficiado o Estado de Rondônia em contrapartida pelo uso de seu território na implantação das usinas. É relevante que de plano se questione a pretensão de que venha a ser instalado apenas o “linhão” ligando ao centro sul, passando suas torres sobre Rondônia, porém sem as subestações indispensáveis para que os habitantes do Estado possam também ser beneficiados com o consumo interno da energia a ser produzida.

11) A saída para o Pacífico, empreendimento cuja execução vem sendo postergada ao longo dos anos, vai enfim se tornar realidade? Assim nossa produção agropecuária e industrial poderá ser exportada via Oceano Pacífico, chegando de forma competitiva aos mercados da Costa Oeste dos Estados Unidos e da Ásia. Aqui estamos impedidos de produzir soja, plantar cana, produzir etanol e, agora, parte de nosso rebanho bovino é chamado de pirata.

12) Quando da criação do Estado, através da Lei Complementar nº 41, as terras da União deveriam ter sido transferidas para a nova unidade da Federação. Como absurdamente não o foram, somos um Estado sem terra na medida em que as terras continuam pertencendo à União.

Temos um Estado pujante, com tantas riquezas naturais e minerais, com um povo que trabalha e tem uma formação histórica digna que deve merecer mais compreensão e respeito. Somos brasileiros que lutamos para fazermos jus à terra onde vivemos, a qual, acreditamos, terá ainda maior e melhor destaque entre os demais Estados.

Que se faça um realinhamento nos rumos do Estado, mas que para isso sejam criados todos os mecanismos para uma profunda e abrangente discussão. Já demos muito pelo País e o que queremos é que nos seja dado o direito de sonharmos com um futuro promissor. Com a palavra nossos governantes, nossa bancada legislativa, destacando-se que temos um Poder Judiciário organizado de forma a ser esteio e amparo para o cumprimento das leis sempre em respeito ao estado democrático de direito.

Há que se permitir uma efetiva e justa exploração de nosso potencial de produzir riquezas, sempre respeitando o ordenamento jurídico. É imperioso que os rondonienses natos e por adoção que ocupam legitimamente as terras públicas tenham reconhecido seus direitos fundiário com a outorga dos respectivos títulos de propriedade. Não se pode desconsiderar o trabalho exaustivo dessas famílias na terra durante anos e anos, tornando-a produtiva e gerando divisas para o Estado, impondo sua retirada para favorecer quem não teve qualquer vínculo com a terra até o momento atual.

É com respeito a todos os cidadãos brasileiros que vieram para a Amazônia, portanto não somente aos índios, que se alcançará a almejada justiça social, permitindo que nos orgulhemos de forma efetiva de ser rondonienses.




Lá vem o progresso

Lá vem o progresso

No oeste do Pará, a cidade de Itaituba concentra obras estratégicas para o governo federal, mas, diante da infraestrutura precária, seus moradores temem ficar fora da bonança do desenvolvimento
Uma rua de terra divide as comunidades Vila Nova e Vila Caçula, sustentadas em cima de palafitas à beira do rio Tapajós, que banha a orla do município de Itaituba, no oeste do Pará. A reportagem da Pública se aproxima de duas casas para entrevistar seus moradores. Do alto das escadarias de madeira, eles negam. “A gente dá entrevista e nossa situação aqui não muda. Não vou falar”, diz um senhor de pele morena, cabelos brancos e óculos acompanhado da esposa, que também responde com um sonoro “não”.
O bairro de estrutura precária não tem água encanada e o esgoto, despejado no rio, corre por baixo das casas. Mas a situação não é exclusiva de Vila Nova e Vila Caçula. Não existe rede de tratamento de esgoto na cidade. Nas ruas do centro, as calçadas desreguladas fazem com que seja mais fácil caminhar pela rua. Ali, são raras as vezes em que se consegue completar uma ligação de celular. Em busca do prédio da prefeitura, a equipe de reportagem passou por quatro edifícios até descobrir que o órgão não possui uma sede.
Itaituba é a maior cidade da região do médio Tapajós, que deve receber nos próximos anos um conjunto de obras estratégicas para a economia nacional. Com a construção de estações de transbordo (que recebem os grãos de soja e milho para enviá-los aos portos em balsas), uma hidrovia e o asfaltamento de rodovias federais, o oeste do Pará se tornou um importante foco de atenção da indústria agropecuária. Ali se forma um dos corredores estratégicos para escoamento de grãos produzidos no Mato Grosso.
Itaituba é o principal pólo urbano do médio Tapajós, região que concentra projetos estratégicos para o agronegócio. Foto: Marcio Isensee e Sá
Itaituba é o principal pólo urbano do médio Tapajós, região que concentra projetos estratégicos para o agronegócio. Foto: Marcio Isensee e Sá
A essas obras soma-se o projeto de um complexo de sete hidrelétricas na região. Três no rio Tapajós, duas delas ligadas diretamente a Itaituba, e quatro no seu afluente Jamanxim. A mais avançada delas é São Luiz do Tapajós, com capacidade de 8.040 megawatts, prevista para ser construída a 65 km de Itaituba. Se os estudos de impacto da hidrelétrica forem aprovados pelo Ibama, órgão licenciador do projeto, o leilão da usina deve ocorrer ainda este ano. A previsão é que São Luiz custe R$ 30 bilhões. A segunda usina prevista para o Tapajós, a de Jatobá, também está em processo de licenciamento ambiental.
Mas enquanto os projetos avançam, o receio é que os benefícios do desenvolvimento passem à margem da cidade. Se construída, a hidrelétrica de São Luiz será a terceira maior do Brasil em potência. E, com pouca infraestrutura, Itaituba corre o risco de passar pela mesma situação que Altamira, onde está sendo construída a usina hidrelétrica de Belo Monte. Lá, a cidade vive o impacto das obras com o crescimento desordenado que provoca especulação imobiliária, problemas no atendimento à saúde e crescente violência.
“É uma situação que pra nós não sabemos se vai ser benéfica. Pro sul do Brasil vai. Pro centro-oeste vai. Mas e pra nós que aqui estamos?”, questiona Davi Menezes, 44 anos, presidente do Fórum de Entidades de Itaituba, órgão que reúne 22 instituições, como OAB, Associação Comercial, o Rotary Club e a Maçonaria. O Fórum surgiu com o objetivo de representar a classe empresarial de Itaituba frente à implantação dos projetos. Até agora a realidade não alcançou as expectativas. “Tem um empresário aqui que comprou quase 200 mil EPIs [Equipamentos de Proteção Individual]. Sabe o que ele vendeu? Nenhuma luva”, se indigna Menezes. “Ele preparou-se, com estoque, para vender para construção dos portos e não vendeu nada. Trouxeram tudo de fora”. Para ele, os interesses das grandes empresas que chegam à cidade se sobrepõem aos dos empresários locais

Belo Monte mora ao lado

A preocupação que ronda a cidade não é infundada. Altamira, distante 500 km, é um exemplo recorrente na fala dos moradores do Tapajós. Para Eva Bonfim, maranhense radicada no Pará, a cidade “se acabou”: “Tenho quatro irmãos em Altamira e fui lá visitar. O inchaço populacional é um absurdo, muita morte, acidente, assalto”. Para ela, Itaituba não será exceção com a construção da hidrelétrica de São Luiz do Tapajós.
É uma situação que pra nós não sabemos se vai ser benéfica. Pro sul do Brasil vai. Pro centro-oeste vai. Mas e pra nós que aqui estamos?
A chegada do projeto da usina de Belo Monte somada a uma estrutura precária de políticas públicas contribui para o agravamento de situações de violência em Altamira. A cidade vive uma onda de crescimento de exploração sexual de mulheres, crianças, adolescentes e indígenas desde o início da construção da usina de Belo Monte. A alta nos preços dos alugueis e venda de imóveis chega a afetar instituições que trabalham no combate à exploração sexual na cidade, já que não há recursos disponíveis para arcar com a alta dos custos. As informações foram reveladas por uma pesquisa da Universidade Federal do Pará (UFPA), feita durante os anos de 2013 e 2014.
Além dos impactos, a aplicação das compensações por parte da concessionária de Belo Monte, a Norte Energia, não tem sido feita de maneira adequada. Famílias atingidas pelas obras em Altamira enfrentam atrasos na entrega das casas e indenizações insuficientes. De acordo com a agência Amazônia Real, o caderno de preços das indenizações às perdas das casas desconsidera o aumento no custo de vida em Altamira, reflexo do próprio projeto.
Em março de 2013, a previsão de trabalhadores no canteiro de obras chegou a 28 mil pessoas – 10 mil a mais do que o número autorizado pelo Ibama, órgão licenciador da usina. Mesmo assim, as ações para reduzir os impactos na região de Altamira e dos outros quatro municípios atingidos não foram readequadas.
Sob os olhos do bispo Dom Erwin Kräutler, que está há 50 anos na região do rio Xingu e é presidente do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), a cidade se tornou irreconhecível. “Era uma cidade do interior que o pessoal na boca da noite sentava na calçada e trocava umas prosas. Hoje você não pode sentar mais em canto nenhum. Todo mundo está criando trincheira. Barreiras. Se você entra em Altamira agora tem muro em tudo quanto é canto, a gente não enxerga mais as casas”.
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Eva Bonfim, diretora do maior colégio particular de Itaituba, teme pelos impactos do projeto hidrelétrico de São Luiz do Tapajós. Foto: Marcio Isensee e Sá
De acordo com o estudo de impacto ambiental da usina de São Luiz, além dos 13 mil trabalhadores, cerca de 12.500 pessoas devem chegar à região do médio Tapajós em busca de emprego e negócios. Mas a exemplo do que ocorreu em Belo Monte, os números podem ser maiores.
Em Itaituba, Eva Bonfim é diretora do maior colégio privado da cidade e é uma das pessoas que pode lucrar com a chegada de novas famílias. Ainda assim, ela mantém um olhar crítico sobre o projeto. Por meio de aulas e palestras, tenta alertar seus alunos sobre os impactos que a barragem de São Luiz do Tapajós pode causar. “Acho que falta esclarecimento para a população, do que vai trazer de bom e de ruim. Deveria ser bem explicado”, acredita. “Hoje nossos filhos brincam na frente de casa, saem, vão no mercado. Logo vão perder essa liberdade pelo inchaço populacional que vai chegar no município. O pessoal diz ‘mas não é bom o desenvolvimento?’ Será que é bom? Eu não acho que vai ser bom”.

Abrindo caminho

Na rasteira dos empreendimentos que chegam ao médio Tapajós, o governo federal e as prefeituras traçam planos para buscar orientar o crescimento da região.
Em setembro de 2014, o Ministério do Planejamento divulgou o Plano Plurianual Territorial Participativo da região do Tapajós. O plano foi elaborado junto ao consórcio de municípios que, além de Itaituba, inclui as cidades de Novo Progresso, Jacareacanga, Rurópolis, Trairão e Aveiro. São previstos investimentos de R$ 1,9 bilhão até 2017 na região, em setores que vão da infraestrutura, cultura e turismo, à saúde e educação.
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Enquanto o plano ainda está no papel, na orla oposta a Itaituba, no distrito de Miritituba, a estação de transbordo da multinacional Bunge opera desde abril do ano passado para escoar a produção de soja vinda do Mato Grosso até o porto de Vila do Conde, em Barcarena (PA). Além dessa, outras três estações das empresas Cargill, Cianport e Hidrovias do Brasil já estão em processo de licenciamento ambiental. A rota é estratégica para o setor agropecuário porque hoje representa uma redução de 34% no custo do transporte dos grãos para a safra de 2015/2016, em relação à safra de 2013/2014, então destinada aos portos de Santos (SP) e Paranaguá (PR).
As obras se somam ao projeto da usina de São Luiz do Tapajós, o mais sensível no momento. Sua construção conflita com a demarcação da Terra Indígena Sawré Muybu, que poderá ser alagada assim como comunidades ribeirinhas da região, como a vila de Pimental. O alagamento de terras indígenas para construção de barragens não é permitido por lei. Até agora, a usina já acumula oito ações movidas pelo Ministério Público Federal, que tenta garantir o cumprimento dos direitos das populações locais.
Na tentativa de reduzir os impactos do projeto de São Luiz à região, a Secretaria-Geral da Presidência engatinha na discussão do Plano de Desenvolvimento Regional Sustentável (PDRS) para o Tapajós. Essa mesma política está sendo aplicada na região do Xingu, “para prover uma região historicamente caracterizada pela presença frágil do Estado de políticas públicas necessárias para seu desenvolvimento”, segundo o texto do site do PDRS Xingu.
Com os estudos de impacto entregues, o projeto da usina agora precisa da aprovação do Ibama para se tornar realidade. Enquanto aguarda o resultado, a prefeitura de Itaituba montou uma equipe técnica multidisciplinar para analisar o estudo de impacto ambiental da hidrelétrica e exigir do Ibama as condicionantes necessárias à cidade. É por meio dessa análise que a administração pretende estudar maneiras de mitigar os impactos da usina.
De agosto a novembro, os técnicos observaram uma série de lacunas na elaboração do estudo de impacto ambiental, em um parecer preliminar que ainda não foi finalizado. Um dos problemas apontados por Hilário Rocha, engenheiro ambiental e secretário do Meio Ambiente de Itaituba, é o número da população considerada, que se baseia em dados incorretos do IBGE, segundo ele. De acordo com os dados do IBGE, a população da cidade passou de 118 mil, em 2007, para 97,4 mil pessoas, no censo de 2010. Isso aconteceu porque, segundo a prefeitura da cidade, a pesquisa não visitou toda a extensão do município, que possui distritos com 30 km de distância e localidades da zona rural e garimpeira onde só se chega de avião.
O fato motivou uma ação judicial da representação de Itaituba contra a União e o IBGE, para pedir a recontagem da população. A prefeitura conseguiu que o repasse do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) fosse restituído para os valores correspondentes a uma cidade com mais de 100 mil habitantes. Mas a recontagem estatística pelo IBGE não foi feita. De acordo com o município, a população de Itaituba chega a 120 mil habitantes.
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Na orla de Itaituba, moradores vivem em palafitas para evitar a inundação de enchentes; sem asfalto, água encanada ou tratamento de esgoto, a situação das famílias é de alta vulnerabilidade. Foto: Marcio Isensee e Sá
O caso se reflete em impasse porque com o número de habitantes considerado pelo estudo de impacto ambiental, Itaituba é sinônimo de um município modelo. De acordo com o estudo, existem leitos hospitalares de sobra na cidade (4,48 leitos por mil habitantes, enquanto a recomendação do Ministério da Saúde é de 2,5 a 3 leitos por mil habitantes) e 100% das crianças entre 7 e 14 anos atendidas pelo ensino fundamental. São dados diferentes da realidade, contesta a administração municipal. Baseado neles, as condicionantes a serem sugeridas para mitigar os impactos da construção da hidrelétrica podem não ser suficientes.
De acordo com os números fornecidos pela prefeitura, Itaituba conta com 145 leitos entre o Hospital Municipal (45 leitos) e hospitais particulares que tem convênio com o município (100 leitos). Mesmo com o dado considerado no estudo de impacto ambiental, de aproximadamente 97 mil habitantes, a porcentagem de leitos fica bem abaixo do recomendado pelo Ministério da Saúde: 1,4 leito por mil pessoas. “Todo o estudo do EIA-Rima [Estudo de Impacto Ambiental] da hidrelétrica foi feito em cima de um dado que não existe”, contesta Rocha.
De acordo com o estudo de impacto ambiental, existem leitos hospitalares de sobra na cidade e 100% das crianças entre 7 e 14 anos atendidas pelo ensino fundamental. São dados diferentes da realidade, contesta a administração municipal
Em outubro de 2014, a CNEC WorleyParsons, empresa responsável pela elaboração do estudo de impacto ambiental, apresentou o trabalho e ouviu as considerações dos representantes municipais. “Eles apenas entenderam que nossa participação é de fundamental importância para que o processo seja feito da maneira correta, mas não deram pra nós nenhum posicionamento”, conta Rocha. O ideal, segundo o secretário de Meio Ambiente, é que os estudos fossem refeitos para readequar as projeções de impactos sociais. Assim, o projeto da hidrelétrica poderia propor ações de compensação mais afinadas com a realidade do município.
Se os impactos já preocupam a administração da cidade e seus moradores, do ponto de vista econômico a chegada dos projetos à região ainda não movimenta a incipiente indústria da cidade. “Indústria forte, de produção, de manufatura, de pegar um produto bruto e transformar, praticamente Itaituba não tem ainda”, revela Eugenio Viana, secretário de Desenvolvimento Econômico.
As perspectivas são de que os empreendimentos das hidrelétricas, por conta da produção de energia, e das estações de transbordo aqueçam a indústria de derivados da soja na cidade, como a produção de ração para animais. Mas não existe nada concreto sobre os setores industriais que podem se desenvolver. “É difícil você falar que vai ser nesse ou naquele segmento”, diz Viana. “Provavelmente vão abrir os leques, a gente tem expectativa nisso”.
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Cidade pepita

O ouro continua sendo a principal fonte econômica que movimenta Itaituba. De acordo com Viana, secretário do Desenvolvimento Econômico, 60% da economia gira em torno da exploração mineral. Serviços públicos representam em torno de 20% a 25%. O restante, de 15% a 20%, é representado pelo comércio. O Produto Interno Bruto da cidade é de R$ 650,3 mil.
Nessa cadeia de produção, o ouro que sai de Itaituba é majoritariamente ilegal. “Para cada quilo legal, 10 saem ilegais”, explica o secretário Viana. Assim como o diamante. Ainda sem certificado internacional (o chamado selo Kimberley, criado para evitar que diamantes ilegais possam financiar conflitos como os ocorridos na África), o diamante é explorado em garimpo ilegal, com 300 trabalhadores inseridos em terra indígena.
Para Jubal Cabral Filho, geólogo e vice-diretor da Associação de Mineradores de Ouro do Tapajós (Amot), o alto índice de ilegalidade é reflexo da má gestão do governo federal sobre a região. Ele defende que o pequeno garimpeiro deveria receber assistência para se legalizar. “Se o governo tivesse vindo aqui, como faz no sul do país a ensinar o garimpeiro a cuidar da terra, todos nós teríamos um benefício muito maior. Mas ao invés de vir primeiro orientar, ele vem primeiro punir e punição nem sempre é efetiva”, acredita.
Entre os reflexos da ilegalidade está o sério risco à conservação ambiental da região. A mudança na coloração de cursos do Tapajós nos últimos anos motivou uma petição pública que pede a realização de uma pesquisa para investigar a qualidade da água do rio. A suspeita é que as dragas que revolvem o leito do Tapajós em busca de ouro também estejam despejando mercúrio e cianeto em suas águas, comprometendo a saúde de moradores.
Além dos garimpeiros manuais, maioria na região, o ouro de Itaituba atrai mineradoras de médio porte de capital estrangeiro. Entre as que requisitaram autorização de pesquisa junto ao Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) estão a inglesa Serabi Gold, as canadenses Eldorado Corp, Magellan Minerals e Mineração Regent, e a americana Brazilian Resources. A Eldorado Corp é responsável pelo empreendimento de exploração aurífera Tocantinzinho, a 200 km de Itaituba, que já teve licença prévia emitida em 2012 e aguarda revisão de estudos econômicos. Até agora, ainda não foi solicitada a Licença de Instalação. O projeto consiste em uma mina de ouro a céu aberto, com reservas estimadas em 60 toneladas de ouro e vida útil de 11 anos. Os investimentos alcançam US$ 12 milhões.
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A principal atividade econômica que movimenta a cidade de Itaituba é a mineração do ouro. Foto: Marcio Isensee e Sá
Diferente dos pequenos mineradores, que muitas vezes exploram a superfície e beiras de rio, as empresas visam a implantação de minas de ouro. “O projeto de implantação de uma mina é bem bolado, ela [a empresa] vai pesquisar. É diferente do garimpo, onde a prospecção é feita pelo próprio garimpeiro, que vai cavando e vê se tem ouro”, informa o chefe do gabinete do DNPM em Itaituba, Marcos Antônio Cordeiro, entusiasta da mudança de perfil da mineração. “A empresa de pesquisa faz uma inspeção no local, faz um trabalho geofísico e geoquímico, uma estimativa do bem mineral e vai quantificar para ver se vale a pena [explorar o ouro]”. Nessa conta, a infraestrutura é de suma importância. Sem estradas boas para transporte ou disponibilidade de energia elétrica para manter a mina funcionando, não existe grande investimento que se sustente. Com a rede de obras previstas na região, esse panorama vai mudar.
O problema é que junto à mineração de larga escala, que escava minas em profundidade, estão os impactos ligados à cadeia produtiva da extração de minérios. Além do desmatamento e geração de pilhas de dejetos, a mineração de ouro acarreta um grande consumo de água e energia; os produtos químicos usados podem contaminar os lençóis freáticos do território explorado e as bacias de rios, dependendo da localização da mina. O projeto Tocantinzinho, por exemplo, prevê o uso de explosivos e de reagentes químicos, como cianeto, soda cáustica e ácido clorídrico e fica localizado a 1,5 km do rio que dá nome ao empreendimento.
A demanda por pesquisa e lavra na região do Tapajós por parte de empresas consolidadas só cresceu nos últimos anos. Apenas no município de Itaituba, foram 255 pedidos em 2014 e 560 em 2013 feitos ao Departamento Nacional de Produção Mineral. De 2010 a 2014, foram 1445 pedidos no município, mais de cinco vezes o total dos requerimentos feitos entre 2005 e 2009. De acordo com a Associação de Mineradores de Ouro do Tapajós (Amot) e com a secretaria de Desenvolvimento Econômico, o crescimento da exploração do ouro na cidade tem mais relação com a aquisição de maquinários do que com a chegada dos grandes projetos de infraestrutura ali. As PCs, espécie de retroescavadeiras usadas na mineração, podem encurtar o processo de um mês para dez dias na retirada do ouro.
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Em Itaituba, o número de requerimentos ultrapassa, com folga, o de municípios vizinhos que também são cortados pelo Tapajós. Enquanto a cidade pepita teve 1717 pedidos nos últimos 10 anos – 90% dos requerimentos foram para extração de ouro –, Jacareacanga teve 353 requerimentos registrados no DNPM. Já Trairão teve 262.

Lá fora, a floresta

Com extensão territorial de aproximadamente 62 mil km² (duas vezes o tamanho da Bélgica), o município de Itaituba é formado em grande parte por um conjunto de áreas de proteção ambiental. Na periferia da cidade, duas terras indígenas onde vivem os Munduruku, a Praia do Índio e a Praia do Mangue, estão esmagadas em meio aos bairros residenciais. Para além do núcleo urbano, diversas áreas de preservação entram em conflito com os interesses econômicos na região.
Em 2012, a presidenta Dilma Rousseff alterou as áreas de sete unidades por meio de uma medida provisória, convertida em lei. Todas as alterações estão relacionadas a aproveitamentos hidrelétricos.
De acordo com nota lançada à época pelo Instituto Chico Mendes (ICMBio), o Parque Nacional da Amazônia foi reduzido em 6,7%. Destes, 2,5% do território protegido foi subtraído por se sobrepor ao lago da usina de São Luiz do Tapajós. As Florestas Nacionais de Itaituba I (2,5% de área excluída) e II (7,9%), a Floresta Nacional do Crepori (0,2%) e a Área de Proteção Ambiental do Tapajós (1,3%), também tiveram seus territórios reduzidos por conta das usinas de São Luiz do Tapajós e Jatobá. Somadas, as áreas reduzidas por sobreposição a empreendimentos hidrelétricos totalizam pouco mais que o território da cidade de Salvador.
Em meio à política de proteção ambiental, Itaituba também faz parte do programa Municípios Verdes, cujo objetivo é combater o desmatamento no Pará. “Como controlar o desmatamento ilegal na região se essa região está sendo visada internacionalmente?”, pergunta Hilário Rocha, secretário de Meio Ambiente de Itaituba, ao se referir aos projetos hidrelétricos e de infraestrutura que chegam à cidade. “É muito difícil cobrar do município metas, dados, sendo que o próprio governo federal tem interesse na região”, ressalta.
A equação dessa soma de interesses não tem solução fácil. Enquanto a cidade corre contra o relógio para lidar com as mudanças que se aproximam, os moradores continuam se alimentando das promessas de progresso.

O ouro em alta por aqui

O ouro em alta por aqui


O brilho do ouro tem oscilado muito nos últimos tempos. As cotações no mercado internacional subiram 60,2% entre a crise de 2008 e o fim de 2011, turbinadas pelo aumento da liquidez e pela aversão ao risco que tomou conta dos investidores. Desde então, porém, o preço do metal vem recuando,a onça-troy (31,1 gramas) negociada em Nova York fechou a US$ 1.203, uma queda acumulada de 35,6% em relação ao pico pós-crise. Só neste ano, a baixa é de 7%. No entanto, esse mau humor não chegou ao Brasil. No ano, a alta do dólar ante o real e a perspectiva de fortalecimento da moeda americana comparada às de outros países fizeram o grama do ouro, negociado na BM&FBovespa, avançar 10,5%.
Ainda dá para especular, apostando em novas altas do metal?Para quem conhece o mercado, a resposta é positiva. A ideia é de que vale a pena arriscar um pouco nesse mercado volátil e sujeito a flutuações abruptas, pois o ouro deverá continuar acompanhando, com folga, a variação do dólar. Lá fora, as perspectivas são de novas quedas. Um levantamento divulgado no fim de março pelo World Gold Council, entidade internacional que representa o setor, mostra a correlação estreita entre o metal e as taxas de câmbio americanas. Baseados em dados colhidos entre janeiro de 1973 e dezembro de 2014, os pesquisadores concluíram que o ouro subiu 14,9%, em média, nos anos em que a moeda americana recuou.
Nos anos em que o dólar se fortaleceu, como parece ser o caso de 2015, a queda média das cotações do metal foi de 6,5%. Outro fator que deverá pressionar os preços internacionais para baixo são os juros americanos. A pesquisa demonstrou a forte influência da política monetária: nos anos de juros reais negativos, a commodity teve rentabilidade de 17%, ao passo que, em períodos de taxas moderadas (de até 4% ao ano), o retorno foi de 6,3%. Suki Cooper, diretor de pesquisa de metais preciosos do banco inglês Barclays, um dos grandes participantes desse mercado, avalia que ainda há espaço para novas baixas.
Para o especialista, o preço deve chegar a US$ 1.180 a onça no fim de 2015, uma queda de 3,7%, ante os US$ 1.225 de dezembro de 2014. Entre os motivos para o pessimismo, está a recuperação econômica dos Estados Unidos e o fato de os países da Ásia ainda não terem retomado a demanda pelo metal. “A cotação só deve se recuperar quando países como Índia, China e Rússia, que são compradores finais de ouro, sinalizarem um aumento na demanda”, avalia Cooper. Larry Fink, presidente da BlackRock, gestora que administra US$ 4,6 trilhões no mundo, também diz que o ouro deve perder atratividade junto aos investidores.
“Historicamente, o metal foi um grande instrumento para preservar a riqueza no longo prazo, mas está perdendo espaço para a arte contemporânea e os imóveis”, afirmou ele à agência americana Bloomberg. Se, no exterior, o momento não é bom para o investimento no metal, no Brasil, a história é outra. Desde o ano passado, a valorização do dólar vem puxando a cotação do ouro, e esse movimento ainda não se encerrou, avalia Edson Magalhães, analista da Reserva Metais. Até a terça-feira 28, a moeda americana apreciou-se 9% em relação ao real, quando fechou a R$ 2,98, abaixo da máxima de R$ 3,26, registrada em 30 de março. E o câmbio não deve parar por aí.
Segundo a edição mais recente do boletim Focus, a expectativa do mercado é que a moeda americana encerre 2015 a R$ 3,20. Tudo isso aumenta o brilho do ouro. “Em março, tivemos um crescimento de 300% na demanda, em função das perspectivas da alta do dólar e, mesmo com uma queda momentânea da moeda, até o fim do ano o cenário é muito positivo”, diz Magalhães. O aumento da procura pelo metal também é alimentado pela percepção de que a situação econômica do País pode piorar, acredita Pedro Paulo Silveira, economista-chefe da corretora TOV. “Quando existe um cenário de incerteza, as pessoas ainda costumam correr para o ouro”, diz.
Silveira também recomenda a compra do metal como forma de proteção, mas em pequenas quantidades e considerando o uso de outros ativos para hedge. Há outros canais para investir, além da BM&FBovespa. É possível negociar contratos ligados ao metal no mercado de balcão e investir em fundos que possuem o ativo em carteira. É o caso do XP Capital Protegido IX, da XP Gestão. Criado em janeiro, o fundo pretende garantir uma rentabilidade equivalente a 118% da alta do principal fundo de ouro do mundo, o SPDR Gold Shares. “Esse fundo é uma forma de proporcionar segurança a um investidor com pouca cultura de investir em ativos internacionais e também em ouro”, diz Bernardo Ferreira, da XP.
Sempre é bom lembrar que o ouro é um investimento de altíssimo risco. É um mercado pequeno: nos últimos dez anos, a média mensal negociada na BM&FBovespa foi de apenas US$ 10,9 milhões, o que torna as cotações sujeitas a fortes solavancos de um dia para o outro ou mesmo ao longo de um só pregão. Outra dificuldade é que, com uma liquidez tão baixa, o investidor terá dificuldade para se desfazer de uma posição grande se tiver de fazê-lo em pouco tempo. Tudo isso é bem conhecido para o contador paranaense Juarez de Oliveira. Sua relação com o metal precioso vem da década de 1980, quando viajou 2.140 quilômetros de sua cidade natal, Uraí, até Alta Floresta, no Mato Grosso.
A região vivia a era do garimpo, e ele chegou a fazer muitos negócios com um jovem empreendedor, um certo Eike Batista. “Vivíamos no garimpo e vendíamos o que era coletado para as grandes empresas”, afirma Oliveira. Percebendo o potencial do negócio, o empresário decidiu se tornar concorrente de Batista e fundou, em 1983, a Ourominas Comércio de Ouro. Sete anos mais tarde, desembarcou em São Paulo, adquiriu a empresa Faria Fraga e passou a negociar ouro como ativo financeiro. Hoje, à frente do Grupo Ourominas, Oliveira não só continua no ramo, como mantém parte considerável de seu patrimônio – não revelado – investida em contratos negociados na BM&FBovespa. “É um investimento que deve ser visto como um bem e não como um ativo de especulação.”