Era o início dos anos 1990,
época de incerteza política e financeira no Brasil. A fiscalização
pegava leve e não era tão difícil entrar em outros países. Isso
facilitava o trânsito de vendedores de pedras preciosas autônomos para o
Leste Europeu, que simplesmente vendiam as pedras para clientes de
hotéis luxuosos.
Meu pai era um deles.
Ele possuía uma lapidação em Governador Valadares, um
negócio quase inexplorado no Brasil, e ainda hoje diz que aquela foi uma
época muito próspera, pois o dinheiro entrava em caixa com facilidade.
As margens de lucro eram absolutamente imensas, por exemplo: 50 quilates
de ametista (ou seja, 10 gramas) comprados em Minas Gerais por U$ 200
tinham margens de lucro de até U$ 2 mil. O resultado desta matemática
foram centenas de histórias homéricas do meu velho pelo mundo,
demonstrando que o mesmo se tornara um dia um bon vivant.
Essa é a história do meu pai. A minha nasceu por conta de um garimpo de esmeraldas.
Pequenos tesouros verdes
Estava concluindo os estudos do ensino médio e,
diferentemente da maioria dos meus amigos que se preparavam para o
vestibular, eu me preparava para ir a um garimpo de esmeraldas.
Localizado em Nova Era (MG), o Garimpo de Capoeirana foi referência em
qualidade de esmeraldas por mais de 20 anos. Dizia-se que, no inicio dos
anos 1990, as pessoas não precisavam ir muito fundo para encontrar
pedras de qualidade, e infelizmente o acesso a muito dinheiro para pessoas com pouco conhecimento trouxe um resultado bastante negativo.
Quando lá cheguei, comecei a ouvir diversas histórias
sobre mortes por conta de roubos de pedras ou desacertos de sócios.
Lembrava-me os bons filmes de Velho Oeste dos anos 1960, só que dessa
vez as histórias eram reais. Nada disso me desanimou, muito pelo
contrário: fui tomado pela curiosidade. Queria saber como funcionava
todo o sistema, como o garimpeiro, apesar do pouco conhecimento teórico,
lidava com o fato de poder se tornar milionário com apenas a detonação
de algumas dinamites.
Compramos um bom shaft (o acesso ao nível
subterrâneo) que funcionara alguns anos antes e que fora impedido
judicialmente por conta de rixa de antigos sócios. Pegamos o serviço
praticamente pronto, era só continuar. Imaginem o que é descer
pela primeira vez em um buraco estreito (perto de 1,5m de largura) e
profundo (por volta de 100m de extensão) pendurado!
Essa é só a primeira etapa.
Lá embaixo, na primeira galeria, havia um antigo troller
(à la Indiana Jones) que foi reativado. Descemos através dele mais
algumas dezenas de metros até chegarmos em um segundo guincho com cabo
de aço e mais um cavalo para descer outros 150m. Foi uma viagem
alucinante visitar aquelas galerias que foram trabalhadas havia dezenas
de anos por homens em busca da gema verde, cheios de sonhos e projetos
megalomaníacos.
O que acontece no subsolo fica no subsolo?
Do garimpo, eu trouxe boas histórias, como essas:
- A luz acabou!
Já estávamos a quase 700m abaixo da terra. Para se
chegar na linha de frente demorávamos cerca de 1 hora e 20 minutos. O
processo de descida era extremamente cansativo, mas chegar naquele
lugar, ver aquele veio de cristal e ter a possibilidade de tirar as
esmeraldas me fazia esquecer um pouco do cansaço. A parte da detonação
não era madeirada, ou seja, sustentada por um conjunto de vigas de
madeira. Isso era preocupante.
De repente, a luz apaga.
Não víamos coisa alguma e estávamos na linha de frente!
Eu comecei a ficar mais preocupado. Ficamos no breu por quase três
horas, até que o eletricista do nosso serviço encontrou o local do corte
da energia e consertou. Voltamos ao trabalho…
Link YouTube | Filmagem feita pelo autor em mina de Nova Era
- “Saiba negociar. Sua vida depende disso”
Em certo dia, tiramos um lote de esmeraldas bom,
avaliado em R$ 50 mil. Pegamos as pedras e fomos negociar com os judeus e
indianos, que geralmente ficam no local comprando as mercadorias. Vocês
pensam que quem pechincha é turco? Fale isso para os judeus e os
indianos! Os caras choram preço o tempo inteiro!
Começaram ofertando R$ 5 mil, acreditem! Isso também se
deve ao fato de que o garimpeiro é um homem humilde, que passa por
muitas dificuldades durante o ano e, quando vê algumas pedras, as vende a
preço de banana. Por isso, era importante manter uma ideologia fixa
sobre valores, afinal eu tinha plena convicção de que os gringos
venderiam as pedras com margens de lucro de, no mínimo, 100%.
Garimpeiro: profissão que exige culhões
Por meio destas aventuras, descobri que a profissão de
garimpeiro é algo nobre. E que é preciso ter bolas para enfrentar os
problemas e os dilemas com os quais esses profissionais lidam todos os
dias. Afinal, não é para qualquer um descer 700m no subsolo e voltar com
uma única pedra.
Mas o risco é altamente compensador. Esta única pedra pode definir o seu futuro financeiro.
Nenhum comentário:
Postar um comentário