sábado, 12 de abril de 2014

O chumbo que mata: Plumbum é condenada por passivo ambiental na Bahia

O chumbo que mata: Plumbum é condenada por passivo ambiental na Bahia
Após 53 anos de um histórico de poluição a francesa Plumbum foi condenada na 3ª Vara da Justiça Federal, a promover a recuperação de danos causados por sua planta metalúrgica em Santo Amaro na Bahia.
É mais um capítulo de uma longa e horripilante história que contaminou e adoeceu milhares destruindo vidas e futuros. História de poluição que até hoje contamina a população local.
Em 1960, Santo Amaro da Purificação, cidade de 58.000 habitantes viu  a francesa Penarroya construir uma   planta metalúrgica para tratar o minério de suas minas. Nascia a COBRAC, a Companhia Brasileira de Chumbo que tornou Santo Amaro em uma das cidades mais poluídas pelo chumbo no mundo. Uma história que ainda não acabou.
No início os empregos e o dinheiro novo alimentou a região que sofria com a queda da cana de açúcar. A COBRAC foi muito bem recebida. Para entender o problema veja, abaixo, um resumo do que o chumbo causou e causa aos desassistidos habitantes de Santo Amaro:

• Diminuição da performance em testes de QI).
• Aumento da Pressão
• Diminuição da fertilidade, aumento da ocorrência de aborto e de morte , alterações no desenvolvimento como baixo peso, prematuridade
• Desequilíbrio postural e retardo na taxa de crescimento
• Anemia
• Alterações neurológicas em adultos
• Alterações renais em crianças
• Diminuição da hemoglobina
• Sinais de intoxicação incluem: irritabilidade, dificuldades motoras, distúrbios na aprendizagem e de comportamento, distúrbios no crescimento e, até encefalopatias
• Distúrbios de humor e neuropatias
• Perda de apetite, mal-estar, letargia, dores de cabeça, fadiga, tontura e esquecimento
• Dor abdominal, constipação, cólicas, náuseas, vômitos, anorexia e perda de peso
• Sintomas de toxicidade crônica: cansaço, sonolência, irritabilidade, tonteiras, dores nas articulações e problemas gastrintestinais
• Efeitos neurotóxicos
• Neuropatia periférica e diminuição da velocidade de condução
• Encefalopatia
• Óbito

Em 1976 foi identificada a poluição dos pescadores de Santo Amaro. A partir desta época vários estudos mostram a contaminação de trabalhadores, crianças e populares por chumbo e cádmio. Já na década de 70, parte da fábrica tinha sido fechada graças a contaminação de chumbo que causava defeitos e mortes, principalmente entre as crianças. Mas, assim como hoje, o problema foi  “empurrado com a barriga” causando as doenças e mortes que ocorreram desde então. Só que agora, com o conhecimento e consentimento tácito das autoridades. Esses muito falaram, mas nunca colocaram um ponto final no problema vindo a se tornar, no nosso entender, cúmplices da Penarroya.
A Plumbum fechou as portas em dezembro de 1993, após ter produzido em torno de 20.000 toneladas de chumbo por ano, durante 33 anos. O minério vinha, predominantemente, de sua mina Boquira e, também, do Peru.
O chumbo era obtido pelo processo de pirometalurgia, que originou grande quantidade de escória e de gases, ricos em chumbo, cádmio e arsênio.
Além de lançar na atmosfera chumbo e cádmio em materiais particulados que contaminaram tudo em um raio de  mais de 2.000m da chaminé (veja o mapa de chumbo nos solos),  a empresa despejava no Rio Subaé mais de 1.152 toneladas (informação da própria COBRAC) de efluentes líquidos com SO2.  O pior ainda estava por vir.  Em 1989 a escória foi classificada como resíduo tóxico classe 1, perigoso, mas mesmo assim ela foi “doada” à população de Santo Amaro e usada na pavimentação de ruas e na construção civil disseminando a poluição e envenenando milhares causando mortes e doenças até os dias de hoje. 
A contaminação atingiu a maioria dos funcionários que trabalhavam nas fundições. E ainda existem 1.200 causas trabalhistas contra a COBRAC, na Justiça do Trabalho aguardando decisão judicial.
Análises da escória mostram teores de chumbo entre 3 a 5%, zinco de 11 a 15% que indicam a falta de qualidade na metalurgia da Plumbum que rejeitava uma escória que hoje ainda pode ser considerada minério. Mais de 500.000 toneladas desta escória com elevado teor de chumbo e cádmio ainda estão poluindo a cidade, os solos, o lençol freático, as águas do Rio Subaé e o povo de Santo Amaro da Purificação.

escória
A foto acima mostra milhares de toneladas de escória venenosa no pátio da COBRAC. Essa escória seria distribuída à população.
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A poluição e suas causas são conhecidas das autoridades por mais de 30 anos. Essas autoridades pouco ou nada fizeram para evitar que o envenenamento se alastrasse e atingisse os níveis que atingiu.
Vários estudos e teses foram feitos sobre o assunto, mas , apesar disso, pouco saiu do papel.
Mesmo após o fechamento da fábrica, em 1998, estudos feitos em crianças indicavam que 31,9% delas estavam com contaminação de chumbo no sangue duas vezes acima do nível aceitável. Esses mesmos estudos mostraram que 88% das crianças tinham mais de 10ìg/dL. Cabe enfatizar que essas crianças tinham nascido após o fechamento da fábrica e estavam sendo contaminadas pela escória e pela água e solo da região onde moram.
O chumbo tem uma meia vida de poucos dias no sangue, mas de quase 30 anos nos ossos. Portanto, a ausência de chumbo em níveis anormais no sangue não implica que a pessoa não esteja contaminada. Indica apenas que não esteve em contato com agentes contaminantes  recentemente.
Pois somente agora é que a Penarroya foi condenada a recuperar parte do desastre ambiental que causou. A metalúrgica terá que cercar a área, colocar placas de advertência e pagar uma multa equivalente a 10% de seu faturamento bruto.
Um pequeno preço pelas mortes e doenças que causaram e que ainda vão causar.
Eles deveriam também pagar a remoção e relocação de todos os habitantes localizados sobre as áreas poluídas bem como os salários a todos os que não conseguem trabalho em decorrência do envenenamento pelo chumbo, cádmio e outros elementos.
O Governo local e as autoridades de saúde e meio ambiente que foram coadjuvantes no caso de Santo Amaro devem, também, pagar, pois sem a “ajuda” deles isso nunca teria acontecido.

Imagens da Tese de Thaynara Santana Rabelo,  Estudo da Contaminação Remanescentes de cChumbo e Cádmio no Município de Santo Amaro – BA, 2010

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