MINERAÇÃO ARTESANAL
A economia brasileira sempre teve uma relação estreita com a
extração mineral. Desde os tempos de colônia, o Brasil transformou a mineração
- também responsável por parte da ocupação territorial - em um dos setores
básicos da economia nacional.
A mineração artesanal é um tipo de operação de
pequena escala de mineração que não está associado a grandes empresas
corporativas. Esse tipo de mineração de subsistência é um tanto comum no mundo
em desenvolvimento, e usa muitas ferramentas manuais e métodos que têm sido
utilizados por garimpeiros ao longo da história. Em alguns casos, trabalhadores
agrícolas sazonais encontram emprego na mineração artesanal quando
não trabalho intenso até a colheita, apesar de que há mineiros artesanais
atuando em tempo integral. Muitos outros fatores econômicos também podem
conduzir os trabalhadores de outras áreas à mineração artesanal como uma forma
alternativa de se conseguir meios de subsistência.
Ao contrário de grandes operações de mineração que
fazem uso de máquinas pesadas, explosivos e tratamentos químicos, os
garimpeiros costumam aproveitar métodos mais primitivos. A maioria dessas
operações de mineração em pequena escala emprega ferramentas manuais
simples. O garimpo de ouro é um exemplo de mineração artesanal que pode ocorrer
com ferramentas simples e pouco ou nenhum treinamento. Em todo o mundo, uma
percentagem significativa da produção anual de ouro vem da mineração
artesanal de menor escala, embora muitos outros materiais também sejam obtidos
através desta técnica.
Minerais como lítio são extraídos da terra com métodos
artesanais, assim como muitos tipos de pedras preciosas. A maioria das
gemas coloridas que estão disponíveis para o mercado mundial é obtida por garimpeiros que
trabalham individualmente, porque há poucas operações de mineração em grande
escala para estes minerais preciosos e semipreciosos. Diamantes
também são obtidos por meio do processo de mineração manual. Um dos
efeitos da mineração artesanal no mercado de pedras preciosas coloridas é que
pode ser difícil ou impossível determinar de onde essas pedras foram extraídas,
devido ao fato de que os mineiros que atuam com a mineração de subsistência
raramente vendem diretamente aos atacadistas.
Algumas operações de mineração manual e artesanal também
fazem uso de minas subterrâneas e plantas de processamento, embora sejam
ainda muitas vezes limitadas aos trabalhos com ferramentas manuais
relativamente simples. Muitos problemas podem surgir neste tipo de mineração
artesanal se forem levadas em conta as condições de trabalho nas minas e
plantas de processamento. Nos países em desenvolvimento, onde estas operações
são comumente encontradas, ainda há a ausência de fiscalização adequada ou
regulamentos que garantam a segurança dos operários e preservem o
meio ambiente. Para ajudar a minimizar esses e outros entraves, algumas
organizações estão trabalhando a fim de aprimorar as condições de trabalho dos
garimpeiros em todo o mundo.
GARIMPAGEM DO OURO
Em 1993, estimou-se que cerca de 6 milhões dos milhões de trabalhadores na
mineração mundial estavam engajados no que se chama mineração artesanal ou
garimpagem como é definido no Brasil. Esses mineiros espalhados em 40 países
extraiam mais de trinta diferentes tipos de minerais. Em 2000, a Organização
Internacional do Trabalho, estimou que o número de mineiros artesanais cresceu,
totalizando cerca de 13 milhões em 55 países o que leva a crer que de 80 a 100
milhões de pessoas dependem desta atividade para sobreviver. O ouro por sua
característica de fácil venda e alto valor tem sido o bem mineral mais extraído
pelos mineiros artesanais em todo o mundo. Em 1995, estimou-se que mais de um
milhão de mineiros atuavam na América Latina com uma produção de 115 a 190
toneladas de ouro com o maior contingente no Brasil (200.000 a 400.000)
produzindo de 30 a 50 toneladas.
Em muitos países, as leis relativas às atividades de
mineração artesanal não se baseiam nas características do tipo de tecnologia
utilizada, mas na escala de produção ou no tipo de minério extraído (ex:
aluvião). No Brasil a lei n° 7.805 de 20-07-89 estabelece que os minérios
aluvionares, coluvionares e eluvionares estariam à disposição de serem
minerados por atividade garimpeira organizada, isto é, associações ou
cooperativas de garimpeiros. A legislação brasileira exclui os garimpeiros da
extração de ouro de depósitos primários, que na realidade foram em grande
maioria descobertos pelos próprios garimpeiros. A história tem mostrado que sem
suporte técnico e investimento, os depósitos primários, normalmente ricos em
sulfetos, são pesadelos para os mineiros artesanais. Assim não parece ter
sentido regulamentar a atividade garimpeira pelo tipo de depósito geológico a
ser trabalhado, uma vez que existe um controle natural da atividade artesanal.
Infelizmente, as maiorias dos governos de países em
desenvolvimento não provêm uma assistência de qualquer tipo aos mineiros
artesanais. Esta seria uma forma pela qual os mineiros poderiam ter acesso à
tecnologia e garantias legais das jazidas que descobriram. Os governos têm um
papel fundamental em estabelecer o arcabouço legal que seja visivelmente
vantajoso ao mineiro artesanal de outra forma ele irá (e tem sido),
inevitavelmente, trabalhar na ilegalidade.
A mineração artesanal representa uma situação embaraçosa
para as elites dos países em desenvolvimento, que procuram mostrar ao mundo
seus avanços tecnológicos e a evolução de seus conceitos de modernidade.
Contudo, a garimpagem representa uma atividade absolutamente coerente com a
falta de planejamento de desenvolvimento rural da maioria dos países ricos. Um
grupo de estudiosos reunidos pela Organização das Nações Unidas para
desenvolvimento industrial em Viena, em 1997, conclui que em todo o mundo a
mineração artesanal é uma atividade importante como fonte de emprego que
contribui para o alivio da pobreza, e se bem organizada e assistida, pode vir a
contribuir para o desenvolvimento sustentável das comunidades rurais.
HISTÓRICO DA
GARIMPAGEM DE OURO NA AMAZÔNIA
É reconhecido que a moderna corrida ao ouro na Amazônia foi
intensificada pela descoberta de Serra Pelada, em janeiro de 1980. O mérito
dessa descoberta é atribuído ao peão de nome Aristeu, a serviço do senhor
Genésio Ferreira da Silva, proprietário da fazenda Três Barras. Constatada a
abundância de ouro, houve uma grande corrida de pessoas para esse local de modo
que em março de 1980, já existiam cerca de cinco mil pessoas garimpando na
'Grota Rica'. Em abriu de 1980 ocorreu o início da garimpagem no 'Morro da
Babilônia'.
A partir de 20 de maio de 1980, já com a presença do DNPM
(Departamento Nacional da Produção Mineral), e da DOCEGEO (empresa de pesquisa
da antiga CVRD, hoje VALE), foi montado um esquema governamental para controlar
e orientar as diferentes atividades que ali se desenvolviam, e para tal se
fizeram presentes diversos órgãos do governo federal e estadual. Em outubro de
1980, houve necessidade de paralisia dos trabalhos de desmonte manual para
serem executados os serviços de terraplenagem. O aprofundamento das catas de
Serra Pelada fez com que se surgissem problemas de desmoronamento, visto que os
garimpeiros acostumados a trabalhar com o ouro secundário, não davam a devida
atenção para a segurança de trabalho. Em julho de 1983 um acidente vitimou 19
garimpeiros. Ao final de 1983 existiam, 3.973 catas de mineração distribuídas
em uma cava de forma elipsoidal com 30.000 m² de área e profundidade de cerca
de 60 m. Os direitos minerários do depósito pertenciam a CVRD, que havia feito
seu requerimento de pesquisa para manganês e ferro e não havia reconhecido a
presença de ouro na área.
Atualmente a cava da Serra Pelada está inundada (pelo lençol
freático) e menos de 800 garimpeiros tentam sobreviver reprocessando rejeitos
ou dragando material do fundo da cava. A VALE (CVRD) anunciou em 1997 ter
encontrado através de sondagens cerca de 150 toneladas de ouro na área de Serra
Pelada. E esse anúncio atraiu novamente garimpeiros e especulou-se o retorno de
milhares de pessoas ao garimpo. Todavia problemas geológicos e estruturais não
ratificaram a previsão e com isso o garimpo continuou latente, sem maiores
fluxos de trabalhadores para a região.
Nas décadas de 70 e 80 muitas das áreas descobertas por
garimpeiros foram requeridas por empresas de mineração. Muitas delas alegaram
depois de terem suas concessões invadidas por garimpeiros. Outras, realmente
foram vítimas de invasões irresponsáveis. Empresários da mineração passam a
conviver não só com o risco, mas, também, com a insegurança, ao verem seus investimentos
sucumbidos e os depósitos minerais dilapidados.
Cerca de 236 mil km² ou 4,34% da área total da região
amazônica brasileira são afetados pela garimpagem de ouro. Somente no estado do
Pará, essas áreas atingem 150 mil km², das quais o Tapajós é maior área
garimpeira do Estado e do mundo – 100 mil km² – e também a mais importante em
termos de produção.
A produção aurífera oficial dos garimpos da região do
Tapajós, no período 1991-2000,representou cerca de 70% da produção paraense que
por sua vez representou 52,5% da produção garimpeira da Amazônia. No ano de
1991 a produção industrial de ouro sob a responsabilidade da CVRD (na época) ,
representava cerca de 7% da produção total do Pará, sendo a grande maioria, 93%
, proveniente dos garimpos ativos do Tapajós (59,3%). Cumaru-redenção-tucumã
(26,2%) e de outras áreas (7,8%). Em 2000 o quadro se inverteu sendo a produção
industrial da mina do Igarapé Bahia (Mineradora VALE) a fonte mais importante
de ouro do Estado do Pará e do Brasil. A produção garimpeira representou apenas
27,6% do total de ouro produzido no Pará.
ASPECTOS AMBIENTAIS
COM RELAÇÃO AOS GARIMPOS
Os impactos ambientais da garimpagem podem ser divididos em
físicos e biológicos.Os aspectos físicos são caracterizados pela destruição da
capa vegetal e dos solos assim como pelo assoreamento de rios. O envolvimento
do solo promove intensa erosão das margens de rio, carreando sólidos em
suspensão e mercúrio associado à matéria orgânica para sistema de drenagem.
Este processo pode ser umas das principais vias de mercúrio natural ou
antropogênico nos sistemas aquáticos amazônicos. Os impactos biológicos iniciam-se
nos impactos a qualidade das águas por intermédio do assoreamento*, pela
descarga de derivados do petróleo, tais como óleo diesel e graxa, pelo uso
exacerbado de detergentes utilizados para dispensar o minério e, o mais grave
pelo uso inadequado do mercúrio.
* Assoreamento é a obstrução, por sedimentos, areia ou detritos quaisquer, de
um estuário, rio, ou canal. Pode ser causador de redução da correnteza. No
Brasil é uma das causas de 'morte' de rios, devido à redução de profundidade.
Os processos erosivos, causados pelas águas, ventos e processos químicos, antrópicos
e físicos, desagregam solos e rochas formando sedimentos que serão
transportados. O depósito destes sedimentos constitui o fenômeno do
assoreamento.
ASPECTOS SOCIAIS EM
RELAÇÃO AOS GARIMPOS
A característica transiente, migratória e muitas vezes
ilegal dos mineiros artesanais modernos na América Latina, em particular no
Brasil, não tem contribuído com benefícios de assentamentos observados durante
o período colonial. O ciclo da atividade de mineração e bem conhecido:
descoberta, imigração, relativa prosperidade econômica, seguida de exaustão do
recurso mineral (material secundário), emigração e decadência econômica. A
mecanização dos garimpos contribuiu mais para a aceleração deste ciclo. Drogas,
prostituição, doenças, jogos, abuso de álcool e degradação de princípios morais
são consequências frequentes da ocupação caótica dos garimpos. É óbvio que os
benefícios econômicos obtidos pelos mineiros não compensam as deploráveis
condições socioeconômicas deixadas nas comunidades formadas pelos garimpos.
Após a exaustão do minério de ouro facilmente extraído, as minas são
abandonadas e quem permanece nos locais tem que conviver com o desenvolvimento
econômico alternativo.
A criação de muitos municípios, cidades ou vilas, originados
de maneira caótica, através da corrida do ouro tem causado sérios problemas aos
gestores municipais. No Pará, os casos mais conhecidos são Curianópolis,
Eldorado dos Carajás, Cachoeira do Piriá, etc. muitas dessas comunidades sofrem
falta de opções econômicas, escassez de visão de futuro e liderança, além de
viverem em extrema pobreza, normalmente buscando e reprocessar rejeito dos
garimpos.
A significativa produção histórica do ouro no Brasil retrata
o enorme potencial aurífero das regiões geológicas do país. Os investimentos
realizados na exploração de ouro, principalmente nos anos 1980, ainda que bem
menor em relação a outros países tradicionais produtores trouxeram excelentes
retornos aos investidores através de importantes e novas descobertas que
alavancaram a produção nacional industrializada a níveis sem precedentes. Este
relato só não foi mais proeminente devido à falta de uma política nacional que
incentivasse a pesquisa mineral como um todo. Apesar do pouco conhecimento acerca
da geologia do território nacional e das reservas de ouro contidas, sabe-se que
o grande potencial aurífero encontra-se associado a rochas de idade arqueana e
paleoproterozóica, que em geral fazem partes da sequencia do tipo greenstone
belt. No entanto, a nova fronteira exploratória no Brasil situa-se na região
Amazônica, de geologia ainda menos conhecida.
Nesta região, além dos greenstone belt já reconhecidos,
ocorrem depósitos ainda pouco definidos, alguns associados a outros metais que
também apresentam interesse econômico. O real potencial dessas regiões deve ser
estudado através da metalogênese, à luz dos conhecimentos gerados de outras
partes do globo, e de desenvolvimento de técnicas exploratórias adaptadas às
condições tropicais que dominam a paisagem nessas regiões.
Entre as questões mais problemáticas da extração de ouro no
mundo, estão a invasão de terras, a devastação ambiental, o desalojamento de
pequenos produtores e a violação dos direitos humanos por parte de empresas
transnacionais, que levam a maior porcentagem de lucros em detrimento das
comunidades locais. Isso ocorre em muitos países da América Latina, onde
grandes empresas aproveitam brechas na legislação e regulamentação para
estabelecer práticas irresponsáveis de extração desse metal precioso.
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