terça-feira, 11 de agosto de 2015

Diamantes do médio rio Jequitinhonha, Minas Gerais: qualificação gemológica e análise granulométrica

Diamantes do médio rio Jequitinhonha, Minas Gerais: qualificação gemológica e análise granulométrica




RESUMO
Os depósitos aluvionares da bacia do Rio Jequitinhonha, em Minas Gerais, constituíram a fonte da maior parte dos diamantes produzidos no Brasil desde 1714 até meados da década de 1980. Essa importância histórica e econômica motivou a apresentação dos dados quanto à granulometria e qualificação gemológica dos diamantes nas áreas de concessão das mineradoras Tejucana e Rio Novo. Em adição, a amostragem adquirida em 14 pontos ao longo do rio é instrumental para a composição de um banco de dados, tendo em vista a identificação da origem de populações de diamantes. No mega-lote estudado, constituído por 186.052 pedras (17.689 ct), merece ser destacada a grande proporção (82,2%) de diamantes gemológicos.
Palavras-chave: Rio Jequitinhonha, diamante, distribuição granulométrica, qualidade gemológica.

ABSTRACT
The Jequitinhonha River basin alluvial deposits, in Minas Gerais, were the source of most of the Brazilian diamond production since 1714 until the last middle eighties. This historical and economical importance is in itself a reason to publish grain-size and gemological quality data concerning the diamonds of the Tejucana and Rio Novo mining companies concession areas. In addition, extensive sampling (186,052 stones or 17,689 ct) on 14 locations along the river can contribute to create an important database to identify the origin of different diamond populations. Among other observations, the high proportion (82,2%) of gem diamonds should be stressed.
Keywords: Jequitinhonha River, diamond, grain-size distribution, gemological quality.



1. Introdução
Diamantes foram descobertos no Brasil nas proximidades de Diamantina, centro-norte de Minas Gerais, ao início do século XVIII. Nesse contexto, a bacia hidrográfica do rio Jequitinhonha se destaca por sua importância, não só histórica, como também comercial, uma vez que a maior parte dos diamantes daquele distrito foram produzidos sobre tal bacia, nas suas porções superior e média. No médio curso do rio Jequitinhonha, os aluviões são mais largos, permitindo a operação de grandes dragas de alcatruzes, como as das mineradoras Tejucana e Rio Novo, ao contrário do que ocorre no seu alto curso. O objetivo do presente trabalho é apresentar os dados quanto a granulometria e qualidade comercial referentes à produção de diamantes do Médio Jequitinhonha. Além disso, busca-se compor um banco de dados que apóie o desenvolvimento de um modelo para a identificação da origem de diferentes populações de diamantes.

2. Depósitos diamantíferos do rio Jequitinhonha
Na porção superior do rio Jequitinhonha, os vales são apertados, freqüentemente formando canyons entalhados sobre as rochas quartzíticas da serra do Espinhaço. Nessa área, como a largura dos aluviões raramente excede os 20 m, somente atividades garimpeiras são viáveis. A partir da localidade de Mendanha , o rio ganha o seu médio curso, desenvolvendo aluviões mais largos, muitas vezes com o flat alcançando 1.000 m de largura, onde as companhias Tejucana (atualmente com os serviços interrompidos) e Rio Novo operam diversas dragas de alcatruzes, acompanhadas, respectivamente, de dragas de sucção. No processo minerador, a draga de sucção segue à frente retirando o capeamento arenoso, estéril, enquanto a draga de alcatruzes, em seguida, escava, recolhe e trata o cascalho basal do depósito, rico em diamantes (ouro também é recuperado como subproduto).






A lavra de diamantes aluvionares do rio Jequitinhonha abrange exclusivamente sua calha atual, de idade recente a sub-recente. A fonte desses diamantes está concentrada nos conglomerados proterozóicos intercalados na Formação Sopa-Brumadinho, aflorantes em porções altas da serra do Espinhaço nas cabeceiras do rio e sua margem oeste, constituindo, assim, um novo ciclo geológico de erosão-deposição. A forte queda no gradiente do rio, com altitudes entre 1.200-1.500 m no espigão serrano para 700-600 m na área da jazida, fez com que os diamantes fossem reconcentrados nesse trecho aluvionar estudado . Na área de concessão da Mineração Rio Novo, mais ou menos na parte central do depósito (em termos longitudinais), a espessura média do cascalho mineralizado é de 4 m, para uma cobertura estéril que, em geral, alcança porte similar



 
3. Identificação da fonte de lotes de diamantes
Desde quando foi percebido que a produção diamantífera de certos países africanos, como Angola, Serra Leoa e Congo, estava atrelada ao financiamento de grupos engajados em guerras civis locais (os chamados conflict diamonds, também conhecidos em português como "diamantes-de-sangue"), uma campanha internacional patrocinada pela ONU tem procurado impor sanções à importação de material desses países. Além disso, a comunidade consumidora, sentindo-se moralmente abalada por tais acontecimentos, estimulou a pesquisa de propostas científicas visando a conhecer a real procedência dos lotes de diamantes, para evitar que essa produção chegasse aos grandes centros lapidadores. Entretanto, logo ficou claro que inexistiam metodologias científicas seguras capazes de identificar tal procedência (Janse, 2000; Shigley, 2002).
Desde longa data se tem percebido que diferentes depósitos diamantíferos, desde os primários, mostram particularidades específicas (Lewis, 1887). Nesse sentido, as médias de tamanho, valor ou qualidade gemológica, a freqüência relativa de formas cristalográficas, a presença de certas variedades, bem como outras propriedades químicas afins, poderiam ser relacionados com certos depósitos ou áreas diamantíferas. Estudos nesse sentido foram inicialmente propostos para alguns kimberlitos sul-africanos (Harris et al., 1975, 1979), norte-americanos (Otter et al., 1994) e para os pláceres costeiros da Namíbia (Sutherland, 1982). No Brasil, estudos semelhantes incluíram os diamantes da mina de Romaria - Triângulo Mineiro (Svisero & Haralyi, 1985), do rio Tibagi - Paraná (Chieregatti, 1989) e da serra do Espinhaço - norte de Minas Gerais (Chaves, 1997; Chaves et al., 1998).
Diversos autores (Chambel, 2000a,b; Chaves et al., 1998; Janse, 2000; Shigley, 2002) procuraram enfatizar que os diamantes de determinado depósito têm uma história geológica comum e, assim, devem possuir características que são "únicas" para cada depósito. Documentando tais características, elas poderiam conduzir à identificação do local de origem do lote de diamantes. Para isso, entretanto, precisa-se envolver análises estatísticas sobre populações de diamantes com grande número de indivíduos e os resultados precisam de ser compilados dentro de um programa de dados para cada área produtora de diamantes do mundo. Tal assinatura mineralógica, ainda que bastante fácil de se obter nas jazidas em fontes primárias, torna-se mais complicada em relação aos depósitos secundários, muitas vezes dispersos sobre grandes regiões. A apresentação dos dados referentes aos aluviões do rio Jequitinhonha pretende ser uma contribuição a tal proposta.

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