Sonho dourado traz destruição para a natureza
O sonho de se "bamburrar", ficar com o ouro na mão e enriquecer de um dia para o outro. É a história comum na vida dos homens que abandonam suas famílias, para buscarem na floresta Amazônica, o mais cobiçado dos metais: o ouro. Mas, muitos acabam nunca saindo dos garimpos, nem enriquecendo. E padecem na própria floresta, abatidos pela malária, violência e dificuldades de se viver sem a mínima infra-estrutura. Como em outro velho mito que cerca a atividade, expresso na frase de um dos desbravadores do norte de Mato Grosso, Ariosto da Riva: "Garimpo é coisa maldita. O ouro traz junto o diabo e suas conseqüências".
Ao contrário de outros Estados do país, como Pará e Minas Gerais nos quais a maior parte da produção é mecanizada e controlada por companhias mineradoras, como a Vale do rio Doce, responsável por Carajás. No norte de Mato Grosso ainda prevalecem os garimpos artesanais, comandados por pequenos empresários que compram a produção dos garimpeiros.
O resultado deste componente são histórias de abandono, violência, massacres resultantes de conflitos com os índios, o aumento dos surtos de malária e a crescente contaminação por mercúrio. Embora os grandes veios de ouro de aluvião (que ficam na superfície) tenham sido exauridos e o antigo Garimpo do Juruena não produza mais como há dez anos atrás. Muitos homens ainda se arriscam nas matas e rios do município de Apiacás, em busca das cobiçadas pepitas e da perspectiva de mudar sua sorte na vida. As grandes clareiras na floresta são vistas com certa freqüência. E quando sobrevoadas de avião dão a impressão de serem verdadeiras feridas abertas entre a sombra das árvores.
Mercúrio nos rios
Outra forma de extração muito comum na região são as balsas, que dragam os fundos dos rios com o auxílio de mergulhadores. E tanto no rio Teles Pires (ou São Manoel), quanto no Juruena, a grande maioria dessas dragas estão em situação ilegal. O que aumenta as chances de contaminação por mercúrio, ou Azougue como é chamado o metal líquido pelos garimpeiros.
Uma pesquisa de 1995 da extinta Fundação Estadual de Meio Ambiente de Mato Grosso (atual Secretaria Estadual de Meio Ambiente), mostra que 95% da população do Pontal do Apiacás possuí níveis de contaminação por mercúrio acima do limite estabelecido pela Organização Mundial de Saúde (OMS). E o rio Teles Pires, que depois do encontro com o Juruena na região do pontal forma o rio Tapajós, leva a fama (sem comprovação científica) de ser um dos rios mais poluídos por mercúrio metálico no mundo.
Outro problema relacionado às balsas é a precariedade das condições de trabalho. Os mergulhos são feitos com equipamentos praticamente artesanais e sem qualquer tipo de segurança. O trabalho arriscado desses homens é feito em profundidades que podem chegar à 25 metros, em meio a correnteza e quase sem visibilidade. O oxigênio chega por mangueiras e o tempo de permanência no fundo dos rios é de até cinco horas. Durante o processo de extração é o mergulhador quem conduz o duto da draga, que remove os sedimentos do fundo do rio (e o ouro) levando todo o material aspirado à superfície.
No auge do período do ouro, muitos desses mergulhadores eram assassinados nas disputas pelos pontos de extração. A mangueira de respiração era cortada e a pessoa morria no fundo do rio.
Dinheiro Maldito
Mas apesar de todo ouro extraído, a riqueza não parece ficar nas mãos dos que arriscam a vida nas dragas. Muitos afirmam que isso se dá, porque dinheiro de garimpo é "maldito", e nunca permite o garimpeiro deixar o local, pois faz com que este depois de gastar tudo que ganhou, sempre retorne movido pela expectativa de encontrar mais ouro.
Embora o mito seja forte entre os garimpeiros, a forma de comercialização também explicar muito dessa perversa matemática. Em alguns povoados de Apiacás a moeda corrente ainda é a grama do ouro, que é comercializada na forma de troca direta. O ouro do fundo dos rios rapidamente se transforma em roupas, remédios, produtos de higiene e comida. Fator que ajuda a diminuir drasticamente a renda dos garimpeiros, que permanecem em eterna 'dívida" com os proprietários das balsas e comerciantes locais.
A descoberta do ouro no rio Teles Pires aconteceu em 1978, com a decadência dos garimpos de Peixoto de Azevedo. A febre do ouro fez com que durante o auge da extração em 1989, o município de Apiacás chegasse a ter 55 mil garimpeiros. Com a fim do grande ciclo de mineração no final da década de 90, muitos tentaram ocupar terras na região, começando um período marcado por muitos conflitos fundiários e mortes.
Além de abrir frentes de desmatamento, causar a poluição por mercúrio e a degradação dos rios, os garimpos são considerados pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi), como potenciais ameaças aos índios. Dados do Cimi apontam para a possibilidade de existência de grupos "isolados" nas matas do Pontal do Apiacás, que vivem sem saber da ameaça de serem contatados pelos garimpeiros, sob o risco de sofrerem massacres similares aos dos índios Panará. Etnia que quase desapareceu devido aos conflitos e doenças trazidas por garimpeiros durante a abertura da BR 163, a estrada Cuiabá - Santarém.
O recente Parque Nacional criado na região pode, além de aumentar as chances de conservação da riqueza natural da região, fazer com que surjam outras alternativas de renda para a população local, como o ecoturismo.
O recente Parque Nacional criado na região pode, além de aumentar as chances de conservação da riqueza natural da região, fazer com que surjam outras alternativas de renda para a população local, como o ecoturismo.
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