O Minério de ouro em Pitangui
Durante pesquisas sobre a exploração de galena na região próxima a Patos de Minas me deparei com um interessante relatório do Engenheiro de Minas Francisco de Paula Oliveira (1857 - 1935). Ele foi aluno da primeira turma de Engenheiros de Minas formada pela escola de Ouro Preto em 1878 e o primeiro engenheiro brasileiro a ser admito pela Morro Velho, empresa que até então só se utilizava de técnicos britânicos. Começou a atuar profissionalmente como preparador de mineralogia e repetidor de química e física. Dois anos depois tentou montar uma forja catalã em Abaeté, posteriormente dirigiu algumas minerações particulares até ser aproveitado pela Comissão Geográfica de São Paulo. De lá passou pelo Museu Nacional, pela Comissão de Construção de Belo Horizonte, pelo serviço público do estado do Rio, pela Comissão White, pela Comissão do Planalto Central e terminou sua carreira como geólogo do Serviço Geológico e Mineralógico do Brasil.
Francisco de Paula Oliveira
Em 1880 ele apresentou o relatório Exploração das Minas de Galena do Ribeirão do Chumbo Afluente do Abaeté e Estudo da zona Percorrida de Ouro Preto Até Esse Lugar. No meio desse caminho estava Pitangui, cidade que ele descreveu de forma bem ampla conforme veremos a seguir.
A cidade de Pitangui foi começada com a mineração de ouro, que era tão rendosa nos seus arredores, que ainda existe hoje o nome de Batatal, dado ao lugar onde mais ouro se encontrou, e com abundância tal que assemelhava-se a sua colheita à das batatas. Atualmente a mineração acha-se de todo abandonada nesta cidade, que, pela sua importância comercial e agrícola e pelo pessoal ilustrado que aí se encontra, é considerada uma das mais importantes do oeste da província.
A cidade foi construída na encosta de uma montanha de pequeno declive. É grande, mas sem arruamento e ordem. As casas são bem edificadas, e algumas há que assemelham-se a palacetes, hoje bastante arruinadas pela falta de conservação. A matriz é grande e bem ornada. A cadeia e a casa de câmara estão situadas em um largo à entrada da cidade em um prédio bem construído e sólido.
Suas principais lavras foram nos córregos e rios, incluindo o Pará que é o mais importante de sua circunvizinhança. Das dos morros a mais notável foi a do Batatal, fronteira e próxima a cidade que dizem ser a primeira que li houve e deu lugar a sua fundação. Os veieiros foram também explorados e alguns deles, de que extraí amostras com grande vantagem. Posto que me fosse impossível, na maior parte deles, chegar ao corpo principal, contudo, o pouco que me foi permitido observar, fez-me crer que a extração do ouro apenas teve começo aí onde os veieiros são tão abundantes e de tão grande potência, que faz-me supor comparáveis aos da Califórnia.
Formado de quartzo escuro com poucas piritas ordinárias, apenas pequenas manchas, grande quantidade de óxido de manganês, de limonito e de litomargia, tem estes veieiros uma potência variável de 1 a 3 metros.
Perto da cidade, no lugar denominado Batatal, os veieiros são em tal número que parecem formar um só. Daí extraímos amostras do denominado Lapa-Grande, por me parecer o melhor e mais abordável. Este veieiro tem uma potência de 2 metros.
O quartzo sem piritas acha-se no meio de talcitos argilosos, onde penetram pequenas veias do mesmo quartzito, formando uma espécie de rede. O ouro não é visível nessas formações.
A sudeste da cidade visitei uma outra mina abandonada no Morro do Fraga de quartzo negro também, acompanhado de pirolusito, limonito e litomargia e sem piritas. É ainda um veieiro camada, situado entre talcitos argilosos inclinados de 60º com o horizonte, levantados para o oeste e dirigidos aproximadamente no eixo norte-sul. O veieiro-camada tem a mesma direção e inclinação que os talcitos e uma potência variável entre dois e três metros.
A leste da cidade, no lugar denominado Caxingó, dela distante légua e meia, existem dois veieiros exploráveis de quartzo negro com pequenas quantidades de piritas. O primeiro tem uma potência de 60cm, perto do córrego, que passa pelo mesmo lugar, é dirigido 10º a noroeste, levantado para o oeste e inclinado de 50º com o horizonte. Os encostos do veieiro são formados de argilas, provindo da decomposição dos talcitos corados pelo óxido de ferro em vermelho que vai se tornando carregado a medida que se afasta do mesmo veieiro.
A meia légua deste está situado o segundo que, conforme uma antiga tradição, é de uma grande riqueza, no lugar denominado Capão do Ouro. Composto, da mesma sorte, de quartzo negro com poucas piritas, grande quantidade de limonito nos interstícios de quartzo, pirolusito e litomargia, é ainda um veieiro-camada inclinado de 85º com o horizonte, dirigido a 20º a noroeste e levantado para o oeste e que tem uma potência igual a um metro.
Existem, mesmo nesse lugar e nos arredores da cidade uma superabundância de veieiros da mesma natureza que, pela escassez de tempo me foi impossível explorar um por um.
Além disso a dificuldade que se encontra sempre em estudar minas abandonadas há muitos anos, os trabalhos preparativos para este estudo, absorver-me-ia muito tempo.
Os veieiros foram explorados a marreta e a alavanca. O quartzo, sendo muito quebradiço, não oferecia muita resistência notável a estes instrumentos e assim podiam facilmente abrir galerias. Em nenhuma delas encontram-se vestígios do emprego da pólvora e de estivamento. Os trabalhos eram prosseguidos até que as dificuldades, que sobreviessem, os fizessem cessar, quer por algum desabamento, como é tradição que aconteceu em uma mina perto da cidade, onde ficaram enterrados um padre e quarenta escravos, que ali trabalhavam, quer pela invasão das águas.
Em resumo, a mineração do ouro em Pitangui nos veieiros é trabalho a começar de grande vantagem para qualquer empresa que aí se estabelecer, pois, não só as veias parecem ricas como também não faltará força motriz, sendo possível, com algum trabalho, conduzir às jazidas as águas do rio do Peixe que passa a quatro léguas a leste da cidade.
Ainda hoje, depois das grandes chuvas encontram-se folhetas de ouro no cascalho corrido pelas águas. O Dr, Martinho Contagem ofereceu para a coleção da Escola de Minas de Ouro Preto, uma que foi encontrada depois das últimas chuvas de março, por um caminhante na rua da Paciência daquela cidade. A folheta pesa 5,68gr.
A exploração de cascalho aurífero não está ainda esgotada. E assim que, em certos pontos, onde a dificuldade de fazer chegar a água não permitiu que ela fosse encetada, como por exemplo, na região denominada Carurú e outras, seria talvez vantajosa a sua exploração.
O terreno em torno da cidade não é tão montanhoso e de serras tão íngremes como nas minas de Ouro Preto. Os seus montes são achatados, aproximando-se já de planícies e isolados.
De Pitangui em diante começa a zona dos xistos argilosos e não se encontram para o oeste mais minerações de ouro, que terminam nesse lugar.
A leste de Pitangui está a serra de Onça. Disseram-me ser muito aurífera esta serra e ser minerada em certos lugares com grande vantagem.
Não tendo eu recebido ainda as amostras dos minérios de ouro de Pitangui para, pela análise, ter um resultado exato da sua riqueza, serão mais tarde feitas essas análises e publicadas como complemente a esse trabalho.
Nenhum comentário:
Postar um comentário