Após algumas boas baforadas e lembranças ao leu, o velho voltar a falar, sua conversa pausada, consistente de quem queria colocar para fora de seu intimo, algo que a muito o torturava... iniciou lembrando de bons amigos, Dago, Nílson, Maria e Marcão.... disse-me: nos meados de 88, estava rodado Ia pelas bandas do Palmeiral, tinha acabado de fazer algumas diárias como ajudante de carpinteiro na construção de uma draga escariante... um ajudante ali, naquelas paradas valia um bom dinheiro. Era uma mão de obra escassa e quando aparecia alguém o preço era bom...assim fiquei por uns quinze dias trabalhando naquela barranca de rio. Dormíamos em redes, dependuradas na própria draga, fazíamos nossas refeições ali. A alimentação era farta...recebíamos regiamente a cada final de semana. O Palmeiral era um lugarejo muito movimentado naqueles tempos..era um corre corre de caminhões e caminhonetes com matérias para construções de dragas e alimentação para o garimpo. Hoje imagino que corria muito dinheiro ali. A currutela pulsava viva e abundante. A noite era uma só festa, com seus vários bares abertos a noite toda e a música correndo solta. Era o inicio da época da lambada e isso era tocado direto nos tocas discos dos bares. Mulheres vindas de vários lugares ali atendendo tanto como garçonete e quando as coisas davam certo, sempre pintava um romance ou outro. Sempre aconteciam algumas brigas, mais poucas, bem menos que as pessoas que não conheciam o garimpo imaginava. E assim a currutela do Palmeral ia vivendo seu dia a dia. Dia de glória e esplendor, que nunca mais foi o será visto. A era romântica do garimpo se foi....
O dinheiro corria tão fácil por ali que certas coisas, que em outros lugares causariam o maior tumulto, ali era relevado... certo dia involuntariamente derrubei uma moto serra no rio. Aguardava a cobrança, o xingamento e a fúria do mestre de obras,.pois era isso que aconteceria em qualquer outro lugar. Mais ali não.,apenas olhou a mesma indo rio a dentro., e disse: vou passar um rádio para vir outra da cidade....aquilo me surpreendeu e foi naquele exato momento que fiquei sabendo como era a alma e a essência do garimpo. Porem não tinham vindo dos pagos do Rio Grande, para trabalhar de ajudante de carpinteiro, queira mais...queria ser um garimpeiro.,queria sentir em minhas mãos o brilhar e a força de um pedaço de ouro azogado....e assim subi em uma voadeira e comecei a subir o rio Madeira rumo ao garimpo do Dois Irmãos. Após alguns minutos rio acima a fofoca do garimpo apareceu. Fiquei a principio boquiaberto pelo numero grande de dragas, postos de abastecimentos, bares e mercados colocado em cima de flutuante.,mais o que mais me chamou a atenção foi um flutuante em que uma enorme águia branca feita de madeira, batia suas asas quando do movimento das águas do rio. Era o brega da Deusa., e segundo se dizia, o melhor lugar para se divertir de todo o garimpo...ali estava aquela águia, imponente, linda e chamativa...o garimpo me chamava...a vida me chamava. Outra coisa que a principio me impressionou foi o grande barulho de motores.,pois as dragas estavam em pleno funcionamento,somando-se a isso os geradores de energia dos flutuantes e as voadeiras, na sua maioria de motor 45, subindo e descendo o rio. A voadeira que me dera a carona encostou em u posto de abastecimento flutuante;.que vendia combustível e junto um pequeno armazém em que se tinha de tudo. Logo soube que pertencia aos sócios Dago e Nílson... o Nílson, um descendente de alemão de quase dois metros de alturas com uma baita tatuagem ao longo de seu braço., e o Dago um acreano que com o passar dos tempos aprendi a respeitar como um ser humano impar. Ali ninguém ficava com fome ou sem um lugar para pernoitar. Corajosamente cheguei-me ao Nílson e perguntei se ele não teria um serviço ali para mim. Falou secamente que não, que já tinha gente o suficiente para tocar suas empresas ali. Fiquei cabisbaixo e triste e fui sentar-me a beira do flutuante aguardando uma carona para procurar uma colocação em outra balsa ou flutuante. Passado uns quinze minutos o Nílson me chama e olha bem para mim e diz: olha, alemãozinho, fui com sua cara...coloca suas coisas Ia no flutuantes e pode começar a trabalhar. O Marcão te mostra o serviço. Com isso virou as costa, entrou em seu escritório e fechou a porta. Ali não se falava de salário ou de ganho.,tudo viria á seu tempo certo. O Marcão era o gerente de tudo ali..era o gerente, o atendente da lanchonete, o caixa, o contador e tudo o mais. Mais acima de tudo era um cara com uma alma de menino., me recebeu como se fosse um familiar., e disse-me que meu trabalho ali seria colocar combustível nos tambores trazido pelas inúmeras voadeiras.,pois o posto do Dago e do Nilson era bem movimentado.,chegavam voadeiras com carotes de vinte litros, geralmente olho diesel para as dragas.,calculo que ali deveriam ter mais de 200 dragas do tipo escariantes, que era o que mais de moderno tinha naquela época,para aquele tipo de garimpagem. Quando a tarde noite chegou,após o tradicional banho com uma lata de dez litros amarradas a uma corda tirada do próprio rio, amarrei minha draga perto do motor gerador de energia...o barulho era grande, mais com o cheiro forte de óleo diesel, os carrapanas não me importunada, e isso era bom. E assim os dias foram passando e finalmente estava fazendo parte da vida de um garimpo. Já a Maria, era um morena, natural da Paraíba, que também co-gerenciava tudo ali, junto com o Marcão, mais, porém cuidava mais da parte operacional. Era quem dirigia as voadeira levando um rebocador,quando íamos buscar o combustível que chegava em caminhões na barranca do rio, para encher os tanques do posto. Era rude quando necessário, mais, tenra e amável quando tudo estava calmo. Às vezes era quem cozinhava para nós, e até hoje nunca saboreei um baião de dois iguais a que ela fazia. E assim fui fuçando, conhecendo os segredos daquele garimpo e a vontade de trabalhar em uma draga aumentava dia a dia;porém, era difícil a draga que permite um brabo(aquele que não sabe trabalhar) a fazer parte de sua equipe. Porem, certo dia a oportunidade apareceu. O Nílson, tinha duas dragas escariantes e quando chegou o mês de dezembro ele achou por bem(como faziam a maior parte dos dragueiros), encostar ela no barranco e só voltar para a fofoca após as águas. E perguntou se eu queria ficar cuidando dela na barranca do rio. E era essa a oportunidade que precisava, pois, sabia que quando voltasse a época da garimpagem, seria efetivado. Fui, alegre e feliz. Foram sessenta dias naquele barranco. Nesse meio tempo tive a primeira das mais de vinte malárias que tive. A febre começou leve e foi ficando mais forte e os sintomas eram visíveis. Fui ate o flutuante e pedi para o Nílson um dinheiro para ir ate Porto Velho fazer o tratamento. Ele meteu a mão no bolso e tirou um tufo de dinheiro e disse., vai se trata e volta..e era assim o velho e bom Nilson.,preocupação mínima com as coisas matérias. Para ele o garimpo além de uma forma de ganhar a vida, era uma grande família,e como chefe desta família, nada poderia faltar para seus filhos. Após recuperar me desta malária, voltei para a draga e quando a estação de garimpo voltou, em fim de abril, inicio de maio, o Nílson me deu a grane chance que precisava. Seria um dos brabos da draga escariante dele., e assim comecei a aprender a mexer com cascalho, terra, azougue e ouro. Aprendizado de suma importância.,pois no garimpo ou você aprende e vira um garimpeiro.,ou volta para a cidade e ficará ouvindo as prosas e as lendas, sempre em dúvidas se era verdade ou não. Fiquei uma temporada toda com o Nílson, na sua draga, mais existe um porém, quando você entra como brabo em uma draga, por mais que trabalhe,por mais que saiba executar suas tarefas, você sempre será um brabo., e o único caminho e sair e procurar serviço em outra draga, ai já como manso. Muito aprendi com você Nílson, Dago, Marcão e Maria e que a vida tenha sido boa para vocês. Saudades.
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