Cinco alimentos que podem salvar o mundo
Veja os que os cientistas estão fazendo para criar alimentos capazes de transformar a vida de milhares de pessoas.
Apesar da ajuda estrangeira, das remessas de comida e do comércio justo, uma em cada seis pessoas no mundo ainda passa fome todos os dias. E o crescimento populacional leva a calcular que a demanda de alimentos aumentará uns 40% nos próximos 20 anos. Mas há boas notícias. Há décadas, os cientistas trabalham para criar alimentos que promovam a saúde, vençam o aquecimento global, sobrevivam a secas e, ao mesmo tempo, transformem milhões de vidas. Agora, algumas inovações brilhantes começam a aparecer...
Arroz Mergulhador
Imagina passar meses trabalhando, semeando e cuidando da plantação para alimentar a família de 22 pessoas e ver tudo ir por água abaixo. Foi por essa adversidade que Mostafa Kamal passou. Durante quatro de cada cinco anos, o agricultor do distrito de Rangpur, em Bangladesh, perdeu muitos pés de arroz com as inundações. Dois dos seis hectares de sua fazenda alagavam com tanta frequência que ele deixou de usá-los. E este não é um caso isolado. Quatro milhões de toneladas de arroz – o suficiente para alimentar 30 milhões de pessoas – se perdem todo ano com inundações só em Bangladesh e na Índia.
Mas isso pode se tornar coisa do passado. Os cientistas do Instituto Internacional de Pesquisa do Arroz, nas Filipinas, desenvolveram um arroz “mergulhador” que sobrevive até a duas semanas de imersão completa.
É claro que a plantação de arroz é feita debaixo d’água. Mas as sementes crescem muito rápido, logo lançando brotos para que encontrem a luz do sol. Isso exige muita energia e, se as plantas permanecerem submersas mais do que alguns dias, os pés morrem. O truque do arroz que resiste a inundações é adormecer caso fique tempo demais coberto por água e só voltar a crescer quando for possível chegar rapidamente à superfície.
Os pesquisadores que criaram esse arroz isolando o gene que dá tolerância a inundações, uma variedade muito resistente mas cuja produção é baixa demais para uso comercial. Depois, transferiram o gene para novas “megavariedades” de elevada produção, com grão de boa qualidade e resistência a pragas.
Apos três anos de testes no sul da Ásia, a primeira linhagem de arroz resistente a inundações foi liberada em fevereiro de 2009. Agora os cientistas tentam criar mais variedades adaptadas a outros ambientes.
Essa inovação levou 30 anos para ser elaborada. O Dr. David Mackill, do Instituto Internacional de Pesquisa do Arroz, seu principal desenvolvedor, tentou criar um arroz como esse na década de 1980, mas a ciência ainda não estava suficientemente avançada, e o resultado tinha um sabor horrível. Mas a perseverança rendeu frutos. Mostafa foi um dos fazendeiros que testou as sementes resistentes a inundações, viu a safra aumentar 50% e diz que isso mudou sua vida. “Dois hectares a mais [de produção] é um grande salto.”
Espera-se que até 2021 o arroz esteja à disposição de aproximadamente 18 milhões de famílias de agricultores nos países em desenvolvimento.
Melão-de-São-Caetano
Costumamos associar o diabetes tipo 2 aos ocidentais obesos, mas 80% dos 285 milhões de diabéticos do mundo todo vivem em países de média ou baixa renda.
Nos países que se desenvolvem rapidamente, como a Índia e a China, onde há poucas informações sobre saúde, os moradores estão engordando por comer carne e fast‑food demais sem fazer exercícios suficientes. Enquanto isso, na África subsaariana e na Oceania o consumo de alimentos amiláceos básicos leva à ingestão de calorias demais e de poucos nutrientes. O uso da insulina pode controlar o diabetes, mas, em alguns lugares, o tratamento anual de uma só pessoa pode custar 75% da renda média.
Entra em cena um fruto amargo e verrugoso. O melão‑de‑são‑caetano, usado em molhos e refogados, contém nível elevado de carantina, que aumenta a sensibilidade à insulina, e compostos que ativam a AMPc, que regula a absorção de glicose. Ele também contém uma forma de lectina (proteína que se liga ao açúcar) que baixa a glicose no sangue e reduz o apetite. Em 2007, o Ministério da Saúde filipino verificou que uma porção do fruto tem efeito semelhante a uma dose diária de glibenclamida, um
medicamento antidiabético.
Os cientistas do Centro Mundial de Mortaliças, sediado em Taiwan, estão fazendo experiências com 280 variedades do fruto – que cresce nos trópicos e subtrópicos – para produzir uma supervariedade com máximo efeito antidiabético. O centro espera disponibilizar essa variedade para o mercado daqui a cinco ou oito anos.
Feijão Moiashi
O feijão moyashi (também conhecido como feijão-mungo e feijão-da-índia) tem papel fundamental na alimentação de populações vulneráveis do sul da Ásia.
“Mulheres e crianças correm risco maior porque não costumam ocupar posição muito alta na sociedade, e assim os homens comem primeiro e elas ficam com os restos”, diz a Dra. Jacqueline Hughes, vice-diretora do Centro Mundial de Hortaliças. “Faltam micronutrientes na sua alimentação, e elas adoecem. Em cada 15 crianças do sul da Ásia, uma morre antes dos 5 anos.”
A deficiência de ferro, que provoca anemia e até crescimento retardado, é uma grande preocupação, e o moiashi é riquíssimo nesse mineral. Mas, até recentemente, os agricultores relutavam em plantá-lo porque ele leva até 110 dias para crescer, e a produção é baixa. Suas vagens também são muito frágeis e se quebram com facilidade.
Mas, na década de 1970, o centro viu a possibilidade de melhorar o feijão. Agora, vários cruzamentos criaram, finalmente, plantas de moiashi com processo de maturação de 55 dias, boa produção e vagens mais fortes que crescem no alto da planta para facilitar a colheita. As novas sementes foram distribuídas entre 1,5 milhão de agricultores de toda a Ásia, resultando num aumento de produção de 35%.
“O feijão também é muito gostoso”, diz a Dra. Hughes, que realiza oficinas culinárias em comunidades indianas para demonstrar o potencial do produto. “Minha receita favorita é o dhuli mung dahl.”
Bananas resistentes a pragas
A banana é um alimento fundamental em toda a África subsaariana e também fonte de renda importantíssima para cerca de 50 milhões de pequenos produtores do planalto da África Oriental e da região dos Grandes Lagos.
Mas, em 2001, o surto de uma nova doença, a murcha bacteriana da banana causada pela Xanthomonas (conhecida pela sigla em inglês BXW), deixou em Uganda um rastro de miséria e destruição que se espalhou para o Congo, Quênia, Ruanda e Tanzânia. A doença, que faz a bananeira murchar e torna o fruto não comestível, reduziu a renda de muitos agricultores e lançou na miséria milhares de famílias ugandenses.
E ela continua a atacar, provocando anualmente meio bilhão de dólares de prejuízos na África.
A resposta? Uma superbanana.
Nenhuma banana comum consegue resistir à BXW e não há agente bioquímico para combatê-la. Assim, o Instituto Internacional de Agricultura Tropical, sediado na Nigéria, e a Organização Nacional de Pesquisa Agrícola, de Uganda, inseriram material genético do pimentão – eficaz na manipulação genética de arroz resistente a pragas – numa variedade de banana.
As proteínas do material injetado matam rapidamente as células que entram em contato com a bactéria da doença, impedindo que se dissemine. Agora os cientistas realizam experiências em campo. Se tiverem sucesso, daqui a três anos a nova variedade estará à disposição dos agricultores.
Milho resistente a secas
A mudança climática está se tornando uma realidade assustadora em muitas regiões do mundo. O Programa de Desenvolvimento da ONU prevê que até 2050 as secas reduzirão em 10% a produção de milho da África (que alimenta 300 milhões de seus habitantes mais pobres).
Mas o Grupo Consultivo de Pesquisa Agrícola Internacional, em Montpellier, na França, e o Centro Internacional de Melhoramento de Milho e Trigo, sediado no México, misturaram e cruzaram numerosas amostras de bancos genéticos internacionais para criar diversas variedades de milho que não são afetadas pela falta de chuva.
Philip Ngolania, pequeno produtor de machakos, no Quênia, plantou algumas sementes de alta tecnologia em fevereiro deste ano. O Quênia passa pela pior seca da década, e a safra do milho vem sofrendo quebra total; mas esse cultivo de um terço de hectare produziu 360 kg. “Essa colheita alimentará minha família durante nove meses”, diz ele. “Sem a nova semente, eu não teria nada, como os meus vizinhos.”
O milho resistente a secas deve aumentar em até 30% a produção de cerca de 40 milhões de agricultores.
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