Quando terminei de escrever sobre Jules Sauer, me dei conta de que precisava falar também sobre outro ícone da joalheria brasileira, Hans Stern. Ele foi o fundador da H. Stern, uma rede de 280 joalherias espalhadas por 32 países e que emprega quase 3.000 pessoas.
A vida de Hans Stern assemelhou-se em muitos aspectos à vida de Jules Sauer. Ambos vieram da Europa para o Brasil muito jovens (Hans com 17 anos, Sauer com 18), no início da II Guerra Mundial. Eram de origem judia, ambos começaram a vida profissional aqui em atividade não ligada diretamente às pedras preciosas (Sauer deu aulas de francês e Stern começou trabalhando como datilógrafo) e, o mais importante de tudo, os dois deram enorme impulso ao conhecimento e consumo de pedras preciosas brasileiras, numa época em que elas eram consideradas gemas de segunda categoria.
O primeiro emprego de Hans Stern foi numa empresa que lapidava e importava predras preciosas (chamada Cristab). Ele logo se encantou com a beleza daquela mercadoria e começou a viajar por todo o país, inclusive a cavalo, conhecendo garimpeiros e comprando gemas diversas.
Em 1945, fundou no Rio de Janeiro, uma pequena loja: era o início da H. Stern, que desde o início teve este nome.
Brincos Harmony, criados para a H. Sten pela estilista
Diane von Furstenberg, com rubi, rubelita, berilo, citrino,
quartzo rosa e diamante.
Hans não se conformava com o fato de classificarem nossas gemas como pedras semipreciosas, e ficou famosa uma frase sua: Não existe pedra semipreciosa, como não existe mulher semigrávida. De fato, embora a denominação pedra preciosa seja correta, o mesmo não se dá com pedra semipreciosa, por várias razões. A principal é que nunca houve consenso sobre quais pedras seriam consideradas preciosas. Normalmente, eram assim classificados o rubi, a safira, a esmeralda e o diamante. Alguns autores, porém, incluíam também a opala preciosa e o crisoberilo, por exemplo. E outros, a pérola. Além disso, a distinção era inútil e, para o Brasil, muito prejudicial.
Vários autores e gemólogos de renome têm a mesma opinião: Robert Webster, Walter Schumann, Joel Arem, Erich Merget e, é claro, nosso tão estimado Jules Sauer.
O preço não é critério válido para a separação: esmeralda, rubi, safira e diamante são usualmente gemas caras, mas a turmalina Paraíba tem preço médio maior que o do rubi e o da safira e a alexandrita e a opala-negra têm preço médio igual ao da esmeralda, por exemplo.
Coerente com esses posicionamentos, a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) recomenda evitar sempre o uso da palavra semipreciosa, substituindo-a por preciosa, salvo exigência comercial ou legal (NBR 10.630).
Assim como devemos a Jules Sauer o reconhecimento internacional da esmeralda brasileira, devemos a Hans Stern essa atitude importante na valorização das nossas gemas.
Assim como devemos a Jules Sauer o reconhecimento internacional da esmeralda brasileira, devemos a Hans Stern essa atitude importante na valorização das nossas gemas.
Anel Sunrise, em ouro, ametista e um
pequeno diamante na lateral da peça.
Considerar pedra preciosa gemas como água-marinha, turmalinas e topázio imperial não foi difícil. Mas, considerar assim gemas relativamente baratas como ametista, citrino e ágata foi resultado do empenho de gemólogos como os citados. Hans Stern, entretanto, foi bem além.
Eu achava – e acredito que outros gemólogos experientes também - que incluir o quartzo incolor (cristal de rocha) entre as pedras preciosas era o que hoje se chama de forçar a barra. Afinal o
quartzo é a espécie mineral mais comum do planeta, e o cristal de rocha é a mais comum de suas muitas variedades. Então, lapidar e colocar cristal de rocha em uma joia era algo difícil de conceber. Pois a H. Stern fez não uma joia, mas toda uma coleção com cristal de rocha! Com uma inteligente campanha de marketing, apresentaram a coleção como joias leves, adequadas à estação (era verão). Para mim então ficou consagrado definitivamente que qualquer mineral com beleza suficiente para justificar sua lapidação podia ser chamado de pedra preciosa. E assim deve ser: há gemas caras e baratas, como há calçados, roupas, bebidas, etc. de preços bem variados.
Gargantilha Nature, com turmalina verde e diamante.
Por fim outro reconhecimento que devemos e Jules Sauer e a Hans Stern. Ambos souberam transmitir aos filhos o amor pelas empresas que criaram, e são eles que hoje dão continuidade às notáveis obras de seus pais. Nos anos 90, Hans convidou dois de seus filhos a participar da direção da empresa, mas continuou indo lá, todas as manhãs, dirigindo ele mesmo seu Fusca e sem seguranças.
Raramente dava entrevistas e não gostava de posar para fotografias. Ele nasceu quase cego e só começou a enxergar com o olho direito aos dois anos de idade. Gostava de ler, ouvir música clássica e tocar órgão.
Hans Stern colecionava selos e, é claro, pedras preciosas, e deixou uma grande coleção de turmalinas, sua pedra preferida.
A exemplo de Jules Sauer – as coincidências parecem não ter fim... – criou um museu na sede de sua empresa, em Ipanema, no Rio, onde são exibidas mais de mil turmalinas lapidadas.
Stern nasceu em Essen, na Alemanha, e faleceu no Rio de janeiro, em 2007, no mês em que completou 85 anos.
PARA MAIS INFORMAÇÕES:
http://www.nytimes.com/2007/10/29/world/americas/29stern.html
http://hstern.com.br/institucional/sobre-hstern
https://pt.wikipedia.org/wiki/Hans_Stern
https://en.wikipedia.org/wiki/H.Stern
Fotos: Pedro Rubens, revista Veja.
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