Cristais: Beleza pura
Poucas coisas são tão perfeitas no mundo como os cristais - as obras-primas que a natureza leva centenas de milhares de anos para produzir. Suas formas, cores e combinações parecem não ter fim
Bons exemplos são a grafite e o diamante: ambos constituídos de carbono puro, possuem no entanto estruturas cristalinas diferentes. A primeira é um mineral comum encontrado nas rochas que se formam usualmente na parte superior da crosta terrestre; nela, os átomos de carbono se dispõem em planos de anéis de seis faces. Já o diamante, muito raro, forma-se nas profundezas da crosta, em rochas vulcânicas muito especiais, onde a pressão e a temperatura são muito altas. Por isso, seus átomos de carbono constituem uma estrutura muito mais compacta, em forma de pirâmide de quatro faces iguais. Com estruturas tão diferentes, não é de estranhar que as propriedades físicas de grafites e diamantes também sejam diferentes.
Enquanto a grafite é mole, cinzenta, opaca e leve – sua densidade é de apenas 2,1 gramas por centímetro cúbico – o diamante é incolor, duro (é o material mais duro que se conhece), transparente e denso – 3,5 g/cm3 – e provoca intensa dispersão da luz que o atravessa. Quando a estrutura cristalina dos minerais se reflete externamente nas pedras, com faces planas e simetricamente distribuídas, é chamada de cristal. A natureza leva centenas de milhares de anos para fazer um cristal. Mas a tecnologia permite fabricá-lo em laboratórios, ou mesmo em casa, em questão de um mês.
A experiência pode ser feita usando-se o sulfato de cobre, dissolvido e deixado num recipiente com água. Esta começa a evaporar lentamente. A concentração do sulfato aumenta até atingir o limite máximo de saturação à temperatura ambiente. Então, o produto começa a se depositar no fundo do recipiente já em forma sólida. Como a evaporação prossegue, os átomos de cobre, enxofre e oxigênio vão ocupando seus lugares na estrutura cristalina. Ao fim dessa alquimia, surgem no fundo do recipiente inúmeros cristaizinhos de faces externas planas, que só param de crescer quando a água se evapora por completo.
Outro processo permite fabricar um único e grande cristal. Basta pendurar por um fio um pequeno cristal de sulfato de cobre num recipiente e ele servirá como gérmen. À medida que a solução no recipiente chega ao ponto de saturação, tem início a cristalização. Sobre o cristalzinho se depositam átomos de cobre, enxofre e oxigênio e ele começa a crescer. Daí resulta um cristal grande em forma de prisma oblíquo, cuja base é um paralelogramo intensamente azul. Mas não será certamente tão belo quanto os que a natureza se esmera em produzir.
O processo natural é semelhante ao doméstico, mas as condições são muito mais severas. Por um longo período, massas enormes de magma – rochas em estado de fusão que constituem a grande parte da massa da Terra – rompem outras rochas que estão na base da crosta, provocando nelas intensa deformação e fraturas. As frações mais leves do magma – que contêm maiores quantidades de elementos químicos leves, água superaquecida a temperaturas de até 300 graus e gases – se concentram na periferia das rochas magmáticas e penetram nas fraturas das rochas adjacentes, a temperatura é mais fria. É assim que os minerais começam a se formar.
À medida que vão diminuindo, devido ao contato com as paredes mais frias das fraturas das rochas, os sais contidos na água passam a se depositar ordenadamente, formando cristais, como na experiência doméstica. Mas na natureza os recipientes são as fendas de algumas centenas de metros de comprimento que se abrem nas rochas. Com freqüência ocorrem mudanças na composição química das soluções que atravessam as fraturas; isso permite que minerais diferentes se cristalizem sobre outros já formados.
Tais soluções carregam impurezas que se alojam em pequenas quantidades na estrutura cristalina dos minerais. São elas que dão a um mesmo cristal cores diferentes ou as tonalidades tão diversas que encantam os olhos. Onde quer que sejam encontrados, os minerais apresentam a mesma estrutura cristalina. Da mesma forma, os cristais deles derivados têm a mesma simetria. O quartzo, por exemplo, cristaliza-se sempre sob a forma de prismas de base hexagonal – de seis lados – que terminam na combinação de dois cubos deformados (romboedros), assemelhados a uma pirâmide de seis faces. As proporções podem mudar, mas a simetria é invariavelmente a mesma.
Já o topázio se cristaliza sob a forma de prismas de base losangular – de quatro lados – que terminam com faces de pirâmides de diferentes inclinações. A água-marinha e a esmeralda, variedades de berilo, formam prismas hexagonais que terminam normalmente em pequenas faces de pirâmides truncadas por outra face plana perpendicular ao prisma. No caso da turmalina, os prismas que se formam têm base triangular que terminam em pirâmides. As dimensões dos cristais variam muito. Os diamantes, por exemplo, medem normalmente poucos milímetros, enquanto os cristais de quartzo freqüentemente ultrapassam 1 metro de comprimento. Existem cerca de 3 mil espécies conhecidas de minerais, e a variedade de formas, cores e combinações dos cristais deles derivados parece infinita.
De Minas para o mundo
Uma das mais fantásticas e importantes coleções de cristais do mundo pode ser vista no Museu Nacional de História Natural da França, em Paris. São 78 peças gigantes cuja idade varia entre 200 milhões e 1 bilhão de anos e cujo peso oscila entre 200 quilos e 4 toneladas. Têm em comum uma característica: são, todas, pedras de quartzo brasileiro. A coleção começou a ser montada em 1957, quando o comerciante de gemas Ilia Deleff, búlgaro de nascimento, esteve pela primeira vez no Brasil. Na década de 70, Deleff foi viver em Governador Valadares, Minas Gerais, onde Henri-Jean Schubnel, conservador de Mineralogia do museu francês, descobriu a preciosa coleção.
Schubnel não sossegou enquanto não convenceu o governo francês a comprar as pedras guardadas em Minas. Mas oito anos se passaram até que, em 1982, o presidente Fançois Mitterrand liberou os recursos para a transação. Não se sabe quanto a França pagou: os museus do governo jamais revelam o custo de suas aquisições. Deleff, que divide seus dias entre o Brasil e a França, diz que tentou em vão vender sua coleção a instituições brasileiras. Mas, como elas não demonstraram interesse, acabou por negociar com os franceses. Segundo ele, também museus britânicos, japoneses e americanos pretenderam comprar as pedras. O interesse se explica: a boa qualidade da cristalização e a perfeição das formas que caracterizam esses cristais não se encontram em nenhuma outra coleção.
A cura pelas pedras
Uma corrente com um pequeno cristal pendurado no pescoço ou um anel de ametista no dedo podem significar mais que meros enfeites. Os adeptos da New Age – última moda em esoterismo nos Estados Unidos – acreditam que os cristais têm poderes curativos. A papisa dessa seita é a atriz Shirley MacLaine, 53 anos. Eles recorrem às pedras para combater uma variedade de mazelas, de insônia a má digestão. Há quem ache que isso funciona. O técnico em Mineralogia Edson Roberto Endrigo, 21 anos, conta que, ao participar no ano passado de uma exposição de pedras, em Pasadena, Califórnia, teve um acesso de sinusite acompanhada de enxaqueca. Um negociante de cristais que ali estava se ofereceu para curá-lo, passando um quartzo incolor em torno dos ombros e da cabeça de Edson. “Três minutos depois, eu não sentia mais nada”, ele jura.
Os fãs da New Age incluem tanto os apreciadores dos hexagramas do I Ching ou das cartas do tarô quanto os crentes em discos voadores e nos poderes dos cristais. Os iniciados dizem que um quartzo dentro de um aquário torna os peixes mais limpos e brilhantes. Perto de um vaso, faria as plantas crescer mais depressa. Os partidários da cristaloterapia acreditam que tudo isso se explica pela transmissão de energia contida nas pedras. Como toda crendice sempre gera um próspero comércio, existem nos Estados Unidos institutos que prometem literalmente vida nova a seus pacientes por meio de cristais. É o caso de um certo Instituto de Concentração do Cristal, no Estado do Novo México, que cobra a bagatela de 1500 dólares
por uma semana de “tratamento”, numa aprazível praia do Havaí.
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