Empresas oferecem trabalhos regulares, mas não uma chance tentadora de riqueza
The Economist, O Estado de S.Paulo
No fundo de uma bacia fluvial lamacenta cercada pelas montanhas verdejantes, Dora Alicia Hernández vasculha o lodo negro e a rocha na esperança de encontrar uma esmeralda valiosa que irá tirá-la da pobreza. “Tudo o que precisamos é uma pedra” afirma, enquanto as nuvens de chuva tomam conta das montanhas acima. “Então poderemos sair daqui”.
Alicia está em busca da sorte nas proximidades de Muzo, cidade montanhosa ao norte de Bogotá, que atrai os guaqueros (garimpeiros) de todo o país desde os tempos pré-coloniais. A região é conhecida pela qualidade e o tamanho das esmeraldas. Das 20 pedras vendidas em leilão por mais de US$ 100.000 o quilate, 19 eram de Muzo, ou de uma região vizinha. Os garimpeiros falam com veneração de Fura, pedra de 11 mil quilates cujo nome é baseado em uma mítica esposa infiel que derramava lágrimas de esmeraldas. Victor Carranza, que trabalhou como garimpeiro e se tornou o czar das esmeraldas na Colômbia, encontrou aquela pedra em 1999. Pelo que se sabe, ela jamais foi vendida.
A probabilidade de um garimpeiro enriquecer como Victor Carranza, que nunca foi grande, agora é ainda mais vaga. Não porque não há mais esmeraldas valendo US$ 100.000 o quilate em alguma parte nas montanhas próximas de Muzo, mas porque a empreitada passou para o controle das empresas multinacionais. Elas oferecem trabalhos regulares, mas não uma chance tentadora de riqueza. E nem todos os garimpeiros aceitam e alguns preferem a emoção da busca a um salário regular.
Antes de as empresas chegarem predominava o caos. Carranza empregava seu próprio Exército para lutar contra seus rivais pelo controle das minas mais produtivas, na chamadas “guerra verde” das décadas de 1960 e 1980. Cerca de seis mil pessoas morreram então. “Perdemos familiares e amigos”, disse William Nándar, sentado na piscina ao ar livre em sua mansão no alto da colina. Ele é diretor da Mina Real, de propriedade local. Os vencedores da guerra conseguiram fazer valer seus direitos. Traficantes de droga tentaram lavar dinheiro por meio da mineração de esmeraldas, disse Nándar, “mas nunca conseguiram transpor os Exércitos privados”.
Os “guaqueros” encontraram oportunidades em meio à agitação, vasculhando os resíduos deixados pelas minas, e buscando pedras no rio Itoco. Os que passaram a trabalhar para os barões da mineração conseguiarm se sustentar, mas a vida não ficou mais segura: em vez de salários, recebiam uma parte do que encontravam.
A situação se acalmou depois que esses barões firmaram um acordo de paz em 1990, afirmou Nándar. Mas veio a continuação. Charles Burgess, americano, foi o primeiro a descer de um helicóptero em 2009. Ele se associou com Carranza e criou uma empresa chamada MTC. Trouxe máquinas para ampliar as minas, tornando-as mais produtivas. Depois que Carranza morreu em 2013, a MTC adquiriu suas minas.
Outras companhias estrangeiras chegaram depois da MTC. Em Coscuez, a 15 quilômetros de Muzo, a Fura Gems, empresa de Dubai, adquiriu recentemente uma mina de um empresário colombiano. E a Mina Real está em busca de investidores estrangeiros.
Os mineiros contratados pelas empresas trabalham em horas regulares e recebem um salário mínimo (US$ 270) por mês. Dina Luz Poveda ganha quase o dobro como inspetora de segurança em uma mina que se estende por mil metros dentro de uma montanha. Diz ela que foi um grande avanço em comparação com seu emprego anterior em que atuava como intermediária entre os guaqueros e os compradores em visita. “Agora posso alimentar minha família. Não me preocupa o fato de todo meu dinheiro ser usado em combustível porque sei o quanto vai entrar”, disse ela.
Para Elin Bohórquez, prefeito de Muzo, a mudança para melhor é indiscutível. “Antigamente, quando os garimpeiros ganhavam dinheiro com uma grande descoberta, eles gastavam tudo em bebida e mulheres”, diz ele. E hoje as empresas fazem a manutenção das estradas em uma região totalmente abandonada pelo Estado, e cuidam da segurança. “Nosso foco é a segurança da nossa mina”, disse Dev Shetty, diretor da Fura Gems.
Mas muitos garimpeiros que ainda vivem em choupanas do lado da montanha com vista para os túneis de entrada das minas, não ficam animados. Em parte porque não há vagas de trabalho suficientes para todos eles. A MTC emprega 800 pessoas e a Fura Gems afirma ter contratado centenas. Mas quase 80% da mão de obra de Muzo, incluindo esses guaqueros, não têm um emprego formal.
Respeitando mais o meio ambiente do que os barões das esmeraldas, as companhias deixam menos resíduos para os garimpeiros separarem com suas peneiras. As minas de galerias que penetram nas montanhas substituíram as minas a céu aberto, proibidas em Muzo. Além disto, em vez de deixar os detritos para os garimpeiros, as empresas também os separam e os levam de volta para as minas. “São mosquitos sugando nosso sangue”, queixa-se Henry Pamplona, um garimpeiro já idoso.
Os guaqueros têm protestado esporadicamente. Em 2013, um grupo de mais de mil começou a fazer escavações em um terreno da MTC; três morreram quando alguns túneis desmoronaram. Um garimpeiro que se autodenomina Cavalo, diz que as companhias mineradoras deveriam pelo menos ser obrigadas a se desfazer de uma parte dos detritos. Ele acha que um protesto organizado pode conseguir isso. “Precisamos de um líder que se expresse da maneira certa”, afirma.
Mas é provável que ele esteja errado. Nas colinas de esmeraldas da Colômbia a época do garimpeiro acabou.
Fonte: DNPM
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