sábado, 1 de setembro de 2018

A “SQUATTERIZAÇÃO” da Mineração no Tapajós

A “SQUATTERIZAÇÃO” da Mineração no Tapajós

“Squatterização” é uma palavra de origem inglesa que significa ocupante ilegal. Quando ocorreu a primeira corrida ao ouro da Califórnia, São Francisco, hoje capital do Estado mais rico dos U.S.A., tudo começou com um acampamento de garimpeiros atraídos pelas notícias de ouro em uma fazenda local. O fazendeiro suíço que havia descoberto e desbravado as terras no início do século passado teve que ir embora e até hoje os seus descendentes procuram reaver as terras, hoje ocupadas pela linda cidade de São Francisco.
          Neste caso como muitos outros, a sociedade americana, tipicamente baseada no direito, deu razão de causa aos “Squatters”, admitindo o fato ocorrido. O que ocorre no Brasil e em particular na Amazônia não é outra coisa.
        Empresas se apossam de dezenas, centenas e até milhões de hectares de direitos minerais baseados num Código de mineração imperfeito e contornável através de artifícios legais. Na maior parte dos casos não fazem nada porque se requerer é fácil, pesquisar é bem menos e os pequenos mineradores, à procura de locais para trabalhar e instalar os seus equipamentos, depois de tentar requerer inutilmente as suas áreas de atuação, já legalmente ocupadas, decidem arriscar a ocupação ilegal esperando que a empresa que nunca apareceu não saberá de nada ou mesmo sabendo não irá se queixar.
          Entram de mansinho, declarando a quem quiser escutar que seu objetivo é extrair um pouco de ouro para pagar os custos e sair do blefe. E que se a empresa chegar solicitando sua saída esta se processará sem problemas. Não tentam enganar ninguém: no início é sempre difícil, os custos são altos e os pequenos mineradores estão com dúvidas se o investimento é realmente rentável. Constitui a primeira fase da “Squatterização”, a instalação, quando o minerador começa a atrair os amigos e os familiares em função de seu sucesso inicial. Em seguida, estamos na segunda fase da “Squatterização” a ocupação, quando o minerador procura negociar com a empresa titular se ela se manifestar, tentando ganhar tempo enquanto rapidamente os companheiros vão aumentando a ocupação até que o evento se transforme em corrida, onde os ocupantes devem lutar para resguardar os seus direitos de pioneiros.
           Tem lugar a terceira fase: A corrida, quando resguardado pela massa invasora os primeiros ocupantes passam a sentir-se mais fortes em relação à empresa, não aceitando discutir com ela e procurando lutar contra os mais fortes dos novos chegados. A empresa então vai procurar os seus direitos nos órgãos especializados: Justiça Comum, DNPM, Ministério público entre outros, recebendo muitas palavras de conforto e apoio, raramente havendo ações práticas. Cada órgão costuma atribuir responsabilidade ao outro.
          A área já está “Squatterizada” e como a autoridade não pode admitir coisa ilegal o Governo procura legalizar o “Squatt” através de medidas como: fiscalização da compra de minério, podendo inclusive cassar o direito da empresa no que se refere a Alvarás de Pesquisa, o “Squatt” se desenvolve, os pequenos mineradores mais importantes tentam se organizar, mas a classe é particularmente arredia a qualquer estrutura de organização. Após o término do ouro fácil o garimpo tende a se esvaziar; os garimpeiros irão seguir outros rumos e fofocas e suatts. Desdobra-se a quarta fase, a do abandono, na qual os buracos são deixados para traz permanecendo apenas o mito de riqueza fácil. A empresa, a não ser em casos raros, nem se aproveitará da liberação da área. O ouro superficial que já se foi e os investimentos para desenvolver uma mineração subterrânea são elevados demais, talvez com os ganhos do ouro superficial a empresa teria prosseguido com a lavra subterrânea. De qualquer maneira o Brasil ganhou algumas centenas de quilogramas de ouro embora tenha perdido uma jazida de dezenas de toneladas.
          Temos de achar soluções rapidamente para um aproveitamento mineral adequado em função das características intrínsecas das pequenas jazidas correspondentes à maioria das existentes na Amazônia e ao senso de pioneirismo que move a jovem sociedade mineral da região, pioneirismo avesso aos regulamentos burocráticos e agora incrementados por um número de pequenos empresários do sul do País que têm encontrado no ouro uma alternativa para a crise econômica que assola o País. “Squatt” ou pequena mineração são alternativas válidas? é a pergunta que se impõe, necessitando-se definir as regras do jogo ou pelo menos chegar a uma solução intermediária clara. As soluções são obviamente políticas; já falamos dos “Squatt” minerais e vale frisar que também se formam “Squatt” na área fundiária com ocupações de terrenos ociosos para construções, na área habitacional com ocupações de casas abandonadas em conjuntos habitacionáveis, na área comercial com comércios ilícitos, totalmente sonegadores. Progressivamente está se criando uma sociedade paralela, ou alternativa, como é chamada em Berlim ou Amsterdam, uma sociedade que passa a recusar as regras da outra sociedade que se sente forte, e que no caso da Amazônia Brasileira conta para se desenvolver com um rico fermento social, um extenso espaço físico e o substancial apoio de muitos políticos locais e nacionais. Devemos procurar soluções para buscar as causas, analisar os efeitos perversos de medidas políticas ou administrativas precariamente estudadas e aplicadas de forma irrealista criando problemas de ordem social, econômica e política.

          Se de um lado o pioneirismo tem valor incontestável para justificar processos de “Squatterização” em áreas ainda não assumidas, de outro lado uma lei forte e aplicada justamente, deve garantir os direitos legalmente adquiridos à luz da Constituição do País, evitando-se uma escalada de ações ilegais que massacrem o direito da lei em detrimento do exercício da força o que caracterizou no passado as sociedades primitivas. 

Fonte: Jornal Do Ouro

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