Cinqüenta anos de garimpagem de ouro no Tapajós
Dono de uma memória privilegiada, José Carneiro da Silva, conhecido como José Come Vivo abre a serie especial que o Jornal do Comércio publica a partir desta edição, a qual se estenderá até a última edição deste ano do cinqüentenário da garimpagem de ouro no Tapajós. Encerrando a série, na última edição de 2008, será publicada uma edição especial do JC, com a compilação das matérias publicadas ao longo dos próximos meses. Através deste projeto, resgata-se e preserva-se um importante pedaço da história de Itaituba e de toda esta região do Tapajós, da qual muita coisa já se perdeu.
José Carneiro da Silva é um dos principais personagens do início da garimpagem de ouro na região do vale do Tapajós. Ele chegou a esta região em novembro de 1958, quando Nilçon Pinheiro já se encontrava explorando alguns grotões e produzindo muito, mas muito ouro.
Nascido no interior do município de Breves, José Come Vivo cresceu trabalhando em seringais, seguindo os passos do pai. Mas, desde cedo ficou fascinado com as notícias do dinheiro fácil que podia ser ganho em garimpos. Seu primeiro contato com a garimpagem aconteceu quando ele foi para Macapá para trabalhar na Icomi, conhecida mineradora americana que explorava uma mina de manganês no Amapá.
Dono de uma memória privilegiada, José Carneiro da Silva, conhecido como José Come Vivo abre a serie especial que o Jornal do Comércio publica a partir desta edição, a qual se estenderá até a última edição deste ano do cinqüentenário da garimpagem de ouro no Tapajós. Encerrando a série, na última edição de 2008, será publicada uma edição especial do JC, com a compilação das matérias publicadas ao longo dos próximos meses. Através deste projeto, resgata-se e preserva-se um importante pedaço da história de Itaituba e de toda esta região do Tapajós, da qual muita coisa já se perdeu.
José Carneiro da Silva é um dos principais personagens do início da garimpagem de ouro na região do vale do Tapajós. Ele chegou a esta região em novembro de 1958, quando Nilçon Pinheiro já se encontrava explorando alguns grotões e produzindo muito, mas muito ouro.
Nascido no interior do município de Breves, José Come Vivo cresceu trabalhando em seringais, seguindo os passos do pai. Mas, desde cedo ficou fascinado com as notícias do dinheiro fácil que podia ser ganho em garimpos. Seu primeiro contato com a garimpagem aconteceu quando ele foi para Macapá para trabalhar na Icomi, conhecida mineradora americana que explorava uma mina de manganês no Amapá.
Na referida empresa ficou apenas alguns dias, pois muitos trabalhadores foram demitidos, dentre os quais ele. Estabeleceu contato com alguns homens que estavam indo para um garimpo na região do Rio Araguari, sendo esse o começo de sua longa história de ligação com a exploração mineral. Ficou empolgado quando os ouviu dizer que, no garimpo, quem não faturasse 500 cruzeiros por dia não estava fazendo nada. Nessa época um trabalhador recebia dezessete cruzeiros por uma diária na cidade. Essa tentativa deu um resultado razoável; ele ganhou um bom dinheiro, tendo decidido voltar para Belém. É partir daí que José Carneiro começa seu relato, no qual conta toda sua trajetória pelo vale do Tapajós.
“Ao voltar para Belém ouvi notícias sobre a descoberta de garimpos de ouro no Tapajós. Só se falava em Jacareacanga naquela época. No mês de novembro de 1958 eu embarquei no navio Tavares Bastos, determinado a chegar ao garimpo e a encontrar ouro. Fiquei alguns dias em Santarém, de onde segui no mesmo navio para Itaituba, pois como era período de verão ele não chegava a São Luiz do Tapajós, o que só acontecia quando o rio estava cheio. Cheguei por volta do dia 20 de novembro, tendo permanecido aqui por vinte dias.
Os padres tinham um barco de nome “Cor Jesu”, no qual fomos para São Luiz do Tapajós, onde ficamos mais uma temporada, tendo passado Natal e Ano Novo lá. Nessa época o Nilçon Pinheiro, que foi o desbravador dessa região de garimpo, já estava tirando ouro. Ficamos parados em São Luiz por um bom tempo porque não havia transporte para a gente subir. Chegamos dia 5 de dezembro, permanecendo lá até o dia 2 de janeiro de 1959, quando finalmente subimos. Mais de cem homens querendo ir, mas só existiam duas lanchas pequenas que subiam o Tapajós. Uma era a Ida e a outra eu não lembro o nome. Quem ajudou a gente a conseguir embarcar foi o seu Vivaldo Gaspar, com o qual fizemos amizade. Era difícil falar com o velho Roque Pinto e o Zé Bonitinho, que comandavam o movimento comercial na época, os quais poderiam resolver logo o nosso problema.
Eu e mais três companheiros formávamos uma equipe. Pedro Paraíba, Pacheco e seu Manuel eram os outros três. Subimos com destino a São Martins, na Boca das Tropas. Nisso soubemos do início da fofoca no Cuiu-Cuiu e nós resolvemos ficar num lugar chamado Marrafo, em frente à boca do Crepuri. O Nilçon estava começando o trabalho no Cuiu-Cuiu e nós decidimos ir até lá; ele tinha encontrado as primeiras grotas. A gente quis ficar trabalhando com o Nilçon, mas ele disse que não nos queria por lá porque éramos garimpeiros mansos e todo garimpeiro manso era ladrão.
Pegamos um barco de nome Arruda Pinto e fomos para o lugar chamado São Martins, primeiro destino de nossa viagem. Lá encontramos um velho, conhecido por Portuguesinho, que era muito prestativo. Fomos sondar uma grota que havia lá, mas, que já tinha sido explorada pelo Nilçon Pinheiro. Essa foi a primeira exploração na qual ele acertou em cheio; foi onde tudo começou de fato a tirar ouro. Naquele lugar ele tirou ouro, muito ouro, ainda em 1958. De lá, em 1959 ele foi para o Cuiu.
No São Martins eu conversei com um seringueiro, que foi quem encontrou a primeira mina de ouro no Tapajós, o qual me contou como tudo tinha começado e quem começou a exploração do ouro. Segundo ele me contou, o Nilçon começou explorando na cabeceira do Rio Muiuçu, na região do Abacaxi, perto da fronteira do Pará com o Amazonas, conseguindo tirar um pouco de ouro. Mas, era um ourinho pouco, vinte gramas, trinta gramas. Nessa região havia muitos seringueiros, que eram pessoas que andavam muito. Foi através desses seringueiros que o Nilçon fez contato com Jacareacanga, onde passou a buscar seu rancho. A distância para a cidade era de mais ou menos um dia de viagem, de canoa.
Na primeira viagem que fez a Jacareacanga Nilçon conheceu Raimundo Ferreira um seringueiro que trabalhava num seringal, na Boca do Rio das Tropas. Esse seringueiro resolveu acompanha-lo até o garimpo, onde permaneceu por dez dias, observando como tudo acontecia. Ele conseguiu uma cuia e uma bateia e se mandou de volta para o seringal. No caminho ele passava, todos os dias, por dentro de uma grota, que ele cavou, botou a terra dentro da bateia, tendo encontrado pedaços de ouro de vários tamanhos. Aí, ele fez uma caixinha igual a que o Nilçon usava, chamada de lontona e começou a puxar terra e lavar, encontrando ouro com facilidade, que ele colocou dentro de latas de leite ninho. Encheu três latas e meia, somente de pedaços de ouro. Mas, ele não sabia como descarregar a lontona. Então ele foi lá com o Nilçon para que ele o ajudasse.
Quando o Nilçon viu o que o Raimundo Ferreira tinha conseguido, botou para comprar o garimpo. Na ocasião ele deu cem mil cruzeiros, que eu não faço a menor idéia de quanto seria hoje em dia, um motor penta 4,5 e um rádio Philco Transglobe. No Negócio, o Nilçon ficou com todo o ouro que o Raimundo Ferreira tinha conseguido. O Raimundo não fazia a menor idéia do valor do ouro. Achou que tinha feito um bom negócio.
Depois de comprar o garimpo Nilçon foi para Manaus para fazer compras, tendo voltado da capital do Amazonas num barco grande, comprado com o dinheiro apurado com a venda do ouro que tinha entrado no negócio com o Raimundo Ferreira. Como onde estava o ouro nesse garimpo que ele havia terminado de comprar não havia água para lavar a terra, Nilçon colocou mais de cem homens para carregar o material para a beira do Rio das Tropas em latas de querosene, de vinte litros. O ouro começou a aparecer em grandes quantidades. Eu mesmo não cheguei a ver, mas, ouvi muitos garimpeiros dizerem que nesse tempo o Nilçon conseguiu encher de ouro latas e latas de vinte litros.
A partir do momento em que começou a escassear o ouro das Tropas, o Nilçon mandou pesquisar a região do Cuiu-Cuiu. Não demorou para que fosse encontrado o minério no local. Pouco tempo depois que o Nilçon começou a trabalhar lá, eu cheguei, mas não fiquei, como já disse.
Por ocasião de nossa estada na Boca das Tropas eu conheci um seringueiro que trabalhava na região do Pacu. Por meio das informações desse seringueiro a gente seguiu com ele para o são José. Nossa equipe tinha cinco pessoas, à qual se juntaram mais um genro e um filho dele. Começamos a trabalhar e com oito dias já tínhamos mais de 800 gramas de ouro.
Havia muito ouro. A dificuldade era encontrar mercadoria para comprar. Por isso, poucos meses depois que começamos a trabalho pedimos para um dos companheiros, o Araújo, ir a Santarém para fazer uma grande compra, que permitiria que a gente pudesse trabalhar por um bom tempo. Escolhemos o Araújo por ter maior conhecimento de Santarém. Ele levou oito quilos de ouro.
Ao chegar Santarém ele se empolgou. Depois de beber algumas pingas, terminou se envolvendo numa briga, na qual ele atirou na perna de um cara. O Araújo foi preso e para sair gastou quase todo o ouro que tinha levado. Voltou sem quase nada. Isso gerou um atrito muito forte com outro companheiro de trabalho, o Pedro Paraíba. Os dois estiveram perto de se matar. A gente conversou e concordou que a melhor coisa a fazer era dividir a equipe. Assim foi feito. Dividimos a terra, que dava para todos trabalharem.
Depois da divisão, não demorou muito tempo para a gente fazer um bom ouro. Minha turma conseguiu uns dez quilos de ouro em nossa área. A essa altura eu resolvi que era hora de dar um pulo em Belém para visitar a família, que eu não via há mais de um ano. A minha parte nos dez quilos foi de um pouco mais de três quilos de ouro. Deixei um quilo de ouro guardado com o velho Roque, em São Luiz do Tapajós, deixei um quilo com a Dona Ditosa, esposa do seu Duarte, em Santarém e levei um quilo e 50 gramas para Belém, onde vendi o grama por 92 cruzeiros. Era o segundo semestre de 1960”.
Na próxima edição o leitor saberá o que se podia comprar com um grama de ouro nessa época da qual discorre José Carneiro, saberá da expansão das suas frentes de trabalho, de como começou o garimpo do Marupá, começo do trabalho com maquinário etc.
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