terça-feira, 24 de setembro de 2013

O garimpo é uma das atividades mais antigas da cidade mineira de Coromandel

O garimpo é uma das atividades mais antigas da cidade mineira de Coromandel, que não à toa ficou conhecida como a "Terra dos Diamantes". Ao contrário do que ocorre em algumas minas, lá a extração é dominada por garimpeiros nativos, de famílias com longa tradição na profissão.
As jazidas têm um histórico de pedras grandes e raras. Em 1938, deram origem à maior pedra já extraída de solo brasileiro - um diamante de 726,6 quilates, maior que um ovo de galinha, que ficou conhecido como "Getúlio Vargas". Os garimpeiros usam o exemplo dessa gema para ilustrar sua relação com os intermediários. "Ela foi vendida por 2.300 contos de réis pelo garimpeiro, comercializada no Rio por 5 mil contos de réis, e depois comprada por um grupo suíço-alemão por 9 mil contos de réis", diz o garimpeiro Darío Machado Rocha, frisando que os colegas da época ficaram apenas com um quarto do valor. Parte da pedra está hoje incrustada na coroa da rainha da Inglaterra, Elizabeth II.

Canadenses descobrem diamante em Goiás

Canadenses descobrem diamante em Goiás

SÃO PAULO - A empresa canadense Dia Bras Exploration Inc. descobriu diamantes na escavação que vinha fazendo em Contendas, em Goiás.
Em comunicado divulgado em Montreal, a mineradora informa que foi retirado um total de 29,17 quilates, ou 20 diamantes com peso médio de 1,45 quilate. Duas pedras têm mais de 5 quilates. O valor total estimado das vinte pedras é US$ 7,1 mil.
A exploração de diamantes em Contendas, que a empresa chama Projeto Alto Paranaíba, é feita numa área próxima a um garimpo que teria produzido cerca de 5 mil quilates.

Garimpeiros recuperam 180 diamantes

Garimpeiros recuperam 180 diamantes

Arquivo Coopergac / Arquivo CoopergacGarimpeiros trabalham em Coromandel, município mineiro localizado na divisa com o Estado de Goiás
Uma hora da tarde em Israel. Darío Machado Rocha, 51 anos, e três colegas garimpeiros de Coromandel, uma cidade de 27 mil habitantes no interior de Minas Gerais, estão diante do suntuoso prédio de vidro da Bolsa de Diamantes em Tel Aviv. Tomaram um avião pela primeira vez na vida - a não ser Darío - para uma missão inédita: negociar 445 quilates de diamantes diretamente no mercado internacional. Sonham receber US$ 800 mil pelas 180 pedras. Mas não imaginam que as gemas ficarão retidas ali por um ano, num longo e tortuoso processo que, no entanto, está prestes a terminar em final feliz.
A viagem ao exterior foi marcada após a audaciosa decisão da Cooperativa de Garimpeiros da Região de Coromandel (Coopergac) - que reúne 135 trabalhadores do Alto do Paranaíba, na divisa com Goiás - de atuar diretamente no mercado internacional de diamantes, sem a participação de intermediários. Estavam atentos às graúdas possibilidades de um comércio que movimenta US$ 100 bilhões por ano.
A saga para exportar os dois lotes de diamantes a Israel começou há um ano, quando os quatro fizeram as malas e tomaram o voo, com as 180 pedras a bordo. Entre elas, uma gema rara, cor-de-rosa, de 3,89 quilates, do tamanho de um grão de feijão. Apenas Darío se virava no inglês. Nem o duro interrogatório da imigração israelense foi capaz de desanimar os vendedores. Numa sala fechada, mostraram e comprovaram a origem legal de suas mercadorias, por meio do certificado Kimberley - sistema criado no âmbito da Organização das Nações Unidas (ONU) para garantir a origem legal das pedras e evitar o comércio internacional dos "diamantes de sangue" (Leia mais ao lado).
O conflito em Israel lançou holofotes sobre o trabalho da cooperativa. Notícias correm sobre as 180 pedras
O procedimento dos agentes israelenses intimidaria qualquer um, mas valia a pena. Israel é um dos mais importantes centros de comercialização e lapidação de diamantes do mundo, e ali esperavam receber pelas pedras brutas 40% a mais do que conseguiriam no desaquecido mercado nacional. Só não sabiam ao certo qual seria a cifra.
Um acordo prévio havia estabelecido que a avaliação das gemas seria feita na própria corretora israelense, sediada num escritório dentro da Bolsa de Diamantes de Israel - um complexo de quatro suntuosos arranha-céus de vidro, conectados por pontes internas, em Tel Aviv. Ao verem aquelas torres e grandiosas, lembraram do garimpo. "Olha onde nós chegamos, os garimpeiros de Coromandel", pensou emocionado um dos integrantes do grupo, Wanderson Mendes de Souza, 23 anos. Registraram o momento em fotografias e seguiram pela rígida segurança do prédio da bolsa.
Além de receber pelo diamante bruto, os garimpeiros dividiriam com os parceiros israelenses o valor agregado na venda após a lapidação. Tudo indicava que seria um bom negócio. O contato inicial havia sido feito através de conhecidos, na base da confiança, que caracteriza esse tipo de transação. A primeira exportação direta, através da mesma corretora, havia sido um sucesso, embora o valor fosse bem menos expressivo - US$ 14 mil.
Vitória maior haviam alcançado em 2009, quando negociaram na Bolsa de Diamantes da Antuérpia, na Bélgica, a maior do planeta: 44 quilates vendidos por US$ 350 mil. A diferença agora é que, pela primeira vez, eram os garimpeiros os portadores da mercadoria, e não os estrangeiros que vinham buscá-las no Brasil.
No escritório da corretora, eles ficaram otimistas com a avaliação das primeiras cinco pedras. Mas depois de uma ligação em hebraico, eles contam, os preços começaram a despencar. A maior decepção foi o valor oferecido ao diamante rosa de 3,89 quilates. "Queriam pagar US$ 4.850, um preço de banana, enquanto nossa expectativa era de US$ 250 mil", diz Darío, uma das lideranças da Coopergac. "Eu 'nasci os dentes' no garimpo e sei muito bem que aquele preço era de total má-fé", afirma.
Seria óbvio pensar que, naquele momento, os quatro deveriam ter feito as malas e trazido os diamantes de volta ao Brasil. O fato é que ficaram numa saia-justa: se carregassem as pedras, estariam praticando formalmente uma espécie de contrabando. "Tínhamos todos os documentos para exportar os diamantes, mas não para trazê-los de volta ao Brasil", explica Darío. Com isso, tiveram que desapegar-se das gemas, transferidas para a duvidosa custódia da corretora em Tel Aviv.
Foi esse o começo de um sufoco que parecia não ter fim. Nos longos meses de negociação, segundo relatos de pessoas independentes envolvidas no processo, a corretora israelense negava-se a mostrar as pedras a outros interessados, e chegou a ameaçar lapidar as gemas - para total desespero dos 135 garimpeiros, que, em maior ou menor quantia, ganhariam com o empreendimento.
O maior aperto foi quando a corretora anunciou que havia vendido o diamante cor-de-rosa, o maior e mais valioso, a um comprador espanhol, supostamente por US$ 85 mil. Acrescentaram que pagariam apenas US$ 45 mil aos originais vendedores, pois descontariam os custos que tiveram no processo.
Foi esse o alerta final. Os garimpeiros acionaram quem podiam. Com a ajuda de especialistas no Processo Kimberley, chegaram ao presidente da Bolsa de Diamantes de Israel - o experiente empresário Avi Paz, descendente de uma tradicional família de comerciantes dessas pedras preciosas na Rússia e na Bélgica. Paz sugeriu que o caso fosse levado a uma arbitragem internacional e, pela primeira vez, os dois lados entraram em um acordo.
A arbitragem funcionou como uma espécie de conciliação, liderada por dois árbitros - um indicado por Paz e outro pelo presidente da bolsa de diamantes da Antuérpia. As duas partes sentaram-se frente a frente, sem a presença de advogados. A corretora israelense representada por um sócio. A cooperativa brasileira, por Darío e Wanderson - que mais uma vez desembarcaram na moderna Tel Aviv. Uma integrante da embaixada do Brasil em Israel traduzia as negociações em hebraico. A decisão de três parágrafos, com força de sentença, foi publicada em novembro, num desfecho considerado satisfatório.
Há mais de 15 dias os diamantes aguardam o desembaraço no aeroporto de Confins, em Belo Horizonte
O valor da pedra rosa foi o principal assunto em discussão. Os árbitros determinaram que a corretora israelense pagasse US$ 180 mil aos garimpeiros. O empresário e gemólogo holandês Mike Angenent, que se dedica ao comércio justo de pedras preciosas, participou do processo como observador. "Um avaliador convocado pelos árbitros declarou que não havia dúvidas de que a pedra era um rosa intenso, e não um rosa claro, o que significa um incremento de cerca de US$ 100 mil no valor", explica Angenent.
A cooperativa recebeu o total estipulado na sentença. Os custos da arbitragem foram divididos entre as duas partes. A história se completa com o envio das outras pedras ao Brasil. Há cerca de 15 dias elas aguardam apenas o desembaraço no aeroporto de Confins, em Belo Horizonte, para voltar às merecidas mãos dos garimpeiros.
Ao comentar o primeiro conflito em suas transações diretas ao mercado internacional, os integrantes da Coopergac não escondem um certo constrangimento com algumas falhas de percurso. A avaliação das pedras, sobretudo, deveria ter sido feita no Brasil. "Toda aprendizagem tem um custo", contenta-se Darío, que, ao seguir a profissão de sua família, também se preocupou em ir além. Formou-se em comércio exterior, especializou-se em São Paulo, estudou inglês e elegeu-se vereador. "Falar é fácil, fazer é que é difícil", diz.
Tudo isso lhe rendeu conhecimento e trânsito nos diversos níveis empresariais e de governo. A Coopergac se tornou uma das cooperativas mais ativas do mundo na discussão do processo Kimberley. Tanto é que, em novembro de 2007, ao comparecer à plenária do processo em Bruxelas, na Bélgica, Darío e seus amigos mereceram aplausos de representantes de 45 países, por serem os únicos representantes de garimpeiros no encontro, ao lado de colegas de Diamantina, também em Minas Gerais. "Hoje eles são considerados um exemplo mundial", atesta João César de Freitas Pinheiro, diretor de Planejamento e Desenvolvimento da Mineração do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) - órgão responsável por assegurar o cumprimento do Processo Kimberley no Brasil.
Ao avaliar a experiência, Darío diz que o saldo é positivo. "Estivemos pessoalmente com o presidente da Bolsa de Diamantes de Israel, que nos abriu as portas", conta. "E isso não é para qualquer um." Os garimpeiros revelam que seus planos agora incluem insistir no mercado israelense e negociar diamantes já lapidados, ganhando com o valor agregado.
E quanto às gemas que chegaram ao Brasil? O conflito em Israel caiu na boca do mercado e lançou holofotes sobre o trabalho da cooperativa. Notícias correm pra todos os lados sobre as 180 pedras claras, coloridas, de todo tamanho, dos garimpeiros de Coromandel. "Já tem muito comprador interessado", garante Darío.

A tunisiana que colocou holofotes nos pescoço

A tunisiana que colocou holofotes nos pescoço

Divulgação / DivulgaçãoA designer Shourouk Rhaiem escolhe cristais e metais para compor enormes colares que satisfaçam as mulheres com o mesmo glamour de joias volumosas
Se Marilyn Monroe estava certa quando dizia que diamantes são os melhores amigos de uma mulher, eles são sujeitinhos de poucos amigos. Colares, brincos e pulseiras cheios de brilhos fazem parte do inconsciente coletivo, mas que são normalmente associados à joalheria clássica - cara e acessível a poucas milioárias do porte de Lily Safra. Para a designer tunisiana Shourouk Rhaiem, quem não tem cão, caça com gato e mesmo na ausência de pedras valiosas, as mulheres não ficam desemparadas. Ela usa cristais Swarovski, metais e tecidos nobres para criar colares cinematográficos, que exercem sobre as mulheres o mesmo fascínio de uma grande joia, mas a um preço, digamos, um pouco mais amigável.
A moça já criou acessórios para Chloé, Galliano, Cavalli e Gaultier e, agora, é uma das responsáveis por trazer de volta às páginas dos editoriais de moda acessórios volumosos e reluzentes. São peças pesadas, como aquelas que povoam os cofres dos colecionadores, porém feitos para ficar longe dos trincos. Os preços vão de € 100 a € 900.
Michele Obama e Sarah Jessica Parker estão entre as ilustres clientes de Shourouk. Mas há de se convir que um colar com uma pedra enorme no centro envolta por várias fileiras de cristais não costuma estar entre as escolhas do dia a dia de mulher comum - alguém que não seja uma celebridade ou blogueira de moda. "As mulheres costumam relacionar os colares de cristais às joias caras. Dessa perspectiva, uma grande peça pode parecer assustadora, mas costumo dizer às clientes para usar de maneira tranquila, casual. Quando mostro como eu visto as minhas peças, elas instantaneamente perdem a timidez e começam a se divertir", diz Shourouk. Para ela, o "impacto dramático" de um acessório vistoso pode ser quebrado quando usado de forma despretenciosa, com um vestido vintage ou uma camiseta branca acompanhada de jeans.
Das revistas de moda gringas para cair nas graças das blogueiras brasileiras foi um pulo. Elas encorajam suas leitoras a usar camisas fechadas com o colarzão - o "it necklace", nas palavras das moderninhas - sob a gola, arrematando-a como se fosse um broche, com vestidos estampados e até camisetas simples, como a própria designer sugere.
"Acessório é algo que tem valor sentimental, é essencial para o visual de uma mulher porque ele define a assinatura de seu estilo e dá um toque final a cada tipo de look", diz a designer.
Para criar um visual impactante, ela gosta de misturar cristais Swarovski a metais e tecidos nobres como seda e cetim. Outra combinação recorrente em seu trabalho é a mistura de tons pastel e nude com cores fluo. Em sua última coleção, a tunisiana introduziu outro inusitado material, o PVC. O plástico é usado como uma espécie de tela, que fica sobre o colo como um babador, onde são coladas as pedras. É o que as revistas de moda andam chamando de "bib necklaces", a mais nova especialidade de Shourouk.
Tanta ousadia tem encontrado espaço especial no universo das adolescentes. E, segundo a designer, não são só as cores vibrantes de neon que atraem as jovens moças. "Elas gostam de produtos de qualidade com design original por um bom preço, que é a minha meta para todas as coleções.".
A Shourouk é vendida em 20 lojas na França (como Galeries Lafayette, Urban Outfiters e Le Bon Marché) e também em cem pontos de venda em outros países. No Brasil, está na loja da mineira Patrícia Bonaldi e na Lool (de Luiza Setúbal) em São Paulo e na Garimpo Chic de Fortaleza.
Apesar de não conhecer o Brasil, Shourouk imagina o porquê das brasileiras serem atraídas por seu design. "As mulheres do Brasil são fortes e modernas, gostam de se enfeitar e procuram algo deslumbrante e vibrante como elas", diz a designer, que deve vir ao país em breve. "Eu sinto que o Brasil é o tipo de lugar em que você sente que tem que ir pelo menos uma vez na vida."
Criada na França, Shourouk se diz uma "moça tipicamente parisiense", apaixonada pelo aspecto clássico da cidade em contraponto à mistura de culturas que há em cada bairro. Não por acaso seu estúdio fica perto do Centre Pompidou, um dos principais museus de arte contemporânea da cidade.
"Adoro a atmosfera moderna de lá", diz. O bordado tunisiano da região de Nabeul, onde nasceram seus pais, também é fonte de inspiração.
Em paralelo ao trabalho em sua marca própria, Shourouk trabalha constantemente criando linhas de acessórios para outras grifes - como fez para o desfile de alta-costura de Jean-Paul Gaultier em 2009 e para a Swarovski em 2010.
Atualmente, está criando uma linha especial para o e-commerce Net-à-Porter e outra para a rede chinesa Shanghai Tang, ambas do grupo sul-africano Richemont.

Joias com turmalina de Minas agora só se vierem da China

Joias com turmalina de Minas agora só se vierem da China

Marcos de Moura e Souza/Valor / Marcos de Moura e Souza/ValorTrabalhador na Mina do Cruzeiro, no município de São José da Safira
Cinquenta metros abaixo do chão, trabalhadores caminham por túneis estreitos, abertos na rocha e cheios de poças de água, para extrair a pedra que caiu no gosto do mercado de luxo da China. Com pás, picaretas e furadeiras, uma centena deles retira todos os dias quilos e quilos de turmalina na Mina do Cruzeiro, no município de São José da Safira, interior de Minas Gerais. As pedras são exportadas em forma bruta, lapidadas na China e também lá transformadas em anéis, brincos e pingentes usados por chinesas endinheiradas.
O aumento do interesse chinês por turmalinas e outras pedras preciosas e semipreciosas de cor do Brasil é ainda uma novidade, mas já provoca uma pequena revolução no mercado de gemas. Os chineses tornaram-se mais visíveis como compradores depois da crise financeira mundial de 2008, quando os compradores tradicionais - americanos e europeus - se retraíram. A demanda da China literalmente salvou empregos em algumas cidades do interior de Minas Gerais - o Estado mais tradicional na produção e venda de "pedras coradas" do país - que são centros de exploração ou comércio de pedras. Mas o apetite asiático também é motivo de preocupação.
Grandes joalherias brasileiras que usam em suas peças pedras nacionais viram quase de uma hora para outra compradores chineses arrematando grandes lotes de turmalinas, topázios, águas-marinhas e muito quartzo. A disponibilidade de pedras para o mercado nacional diminuiu, ao mesmo tempo em que os preços explodiram. Algumas pedras estão sendo vendidas a preços 400% superiores aos que eram praticados há quatro anos e muitos produtores acabam privilegiando fazer negócios com os chineses porque eles estariam em geral mais dispostos do que os compradores brasileiros a pagar mais pelas pedras, compram lotes maiores e pagam à vista.
Um dos efeitos do aquecimento do mercado pela China se vê nas minas. Segundo o chefe do escritório do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) em Governador Valadares, Marlucio Dias de Souza, há um movimento de reabertura de minas na região.
Marcos de Moura e Souza/Valor / Marcos de Moura e Souza/ValorO resultado do trabalho na Mina do Cruzeiro
Em seu discreto escritório na cidade, Douglas Willian Neves, um dos proprietários da Mina do Cruzeiro, diz que antes da crise de 2008 a China representava 20% de suas vendas. Hoje, representa 80%. Neves está à frente também da Nevestones, empresa de compra e venda de gemas. "A China aqueceu o mercado. Eles compram de tudo, pedras para joias e para bijuterias. Antes de 2008, até o cascalho de turmalina [pedras pouco aproveitadas para lapidação, mas que têm valor para coleções e entalhes], que custava US$ 200 o quilo, hoje custa US$ 3,5 mil."
Outro comerciante de pedras preciosas e semipreciosas de Valadares, José Henrique Fernandes, dono da Pinkstone International e da Mina de Aricanga, diz: "Se não fossem os compradores asiáticos, nós, pedristas, teríamos quebrado. Exportávamos para o mercado dos EUA e da Europa, mas, com a crise, a tendência dos preços era cair".
Não se trata apenas de uma substituição do mercado. Os empresários que produzem pedras dizem que com os chineses - e em menor escala outros novos clientes da Índia e Rússia e de alguns países asiáticos - compram mais do que os americanos e europeus.
Em 2009, a China já era o principal destino das exportações de pedras brutas brasileiras. Naquele ano, Hong Kong sozinha comprou US$ 6,5 milhões e a China continental mais US$ 6,2 milhões. Em 2011, as vendas para cada um estavam na casa dos US$ 11 milhões. Para a Índia, as exportações saltaram de US$ 4,1 milhões para US$ 9,5 milhões. No mesmo período as exportações para os EUA ficaram num nível bem inferior: de US$ 3,8 milhões em 2009 para US$ 4,7 milhões no ano passado. Para a Alemanha, a maior economia da Europa, foram de US$ 1 milhão para apenas US$ 1,5 milhão.
Marcos de Moura e Souza/Valor / Marcos de Moura e Souza/ValorLapidador em Valadares trabalha em turmalina
Quando a China começou a abrir sua economia, o consumo local por pedras preciosas era quase todo limitado ao jade, pedra verde com longa tradição no país e que era usada para joias, estatuetas e talismãs, diz Hécliton Santini Henriques, presidente do Instituto Brasileiro de Gemas e Metais Preciosos (IBGM), cujos escritórios ficam em Brasília e em São Paulo. Com a abertura, outras pedras ganharam espaço. Comerciantes de diamantes foram um dos primeiros a se estabelecer. Depois, veio o forte consumo de platina. "De três anos para cá, os chineses começaram a descobrir a cor, a variedade de pedras de cor. E começaram a comprar turmalina, principalmente a vermelha. Daí essa valorização brutal", diz Henriques. "Eles também compram quartzo rutilado e a demanda por esmeraldas está em um processo de crescimento."
Esse interesse, trouxe à região de Valadares um tipo diferente: o comprador chinês de pedras preciosas. "Os chineses ficam circulando por aqui, nas cidadezinhas menores, como São José da Safira, por exemplo. Estão em todo o lugar. Nos garimpos ilegais, eles dominam", diz Douglas Neves. Em Curvelo e Corinto, municípios da região central de Minas e onde o forte é o quartzo, chineses também passaram a fazer parte da paisagem e da economia locais.
Esses compradores são tipos sui generis, segundo a descrição que se ouve entre empresários: andam de chinelo, mal vestidos, dormem em pensão ou às vezes debaixo de lona no mato e falam um português arrevesado (quando falam). E, apesar da aparência, compram lotes de pedras com dinheiro vivo, à vista - muitas vezes pagam adiantado por uma produção. São eles que passaram a concorrer com vários compradores de pedras brasileiros.
Parte das pedras sai do subsolo de Minas Gerais de modo ilegal e entra também de modo ilegal no mercado. Não há consenso entre empresários e autoridades, qual o peso da extração e do comércio clandestino no comércio total de pedras no Brasil. Mas até o DNPM em Valadares admite que o número de minas sem autorização de funcionamento deve ser muito maior do que as meras dez autorizadas em todo o leste e nordeste do Estado. Quanto ao envio das pedras para o exterior, o caminho alegadamente mais fácil para quem está no mercado clandestino é o de subfaturar lotes de pedras - algo difícil de ser captado pelas autoridades.
Para os produtores e comerciantes de maior porte, como Neves e Fernandes, a porta para o mercado externo costuma ser outra. Como vários exportadores brasileiros, José Henrique Fernandes, participa da feira de joias e gemas de Hong Kong, a Jewellery and Gem Fair. É lá onde faz muito de seus negócios. "Antes participávamos das feiras de Tucson, Nova York e Las Vegas (EUA) e na Basileia (Suíça). Hoje, nos concentramos só nas feiras de Hong Kong, que não atrai só compradores chineses, mas americanos e europeus." Na edição de setembro da feira (são três edições anuais), das 35 empresas no pavilhão do IBGM, 30 são de Minas, segundo Hécliton Henriques.
O Brasil é, segundo o IBGM, o maior produtor de pedras coradas em termos de variedade. Produz mais de cem tipos de gemas, num mercado que só aqui movimenta entre US$ 250 milhões e US$ 300 milhões. Estimativas citadas pela instituição em seu site apontam o Brasil como a fonte de cerca de um terço do volume das gemas do mundo - sem levar em conta diamantes, rubis e safiras. Dois Estados são grandes produtores e polos de negócios: Minas Gerais e Rio Grande do Sul. Minas é o maior produtor em termos de valor.
De uma lavra de turmalina, topázio imperial ou água marinha no interior de Minas, até a vitrine de uma joalheira brasileira num shopping de São Paulo, por exemplo, o caminho costuma ser mais ou menos o mesmo. Começa com o empresário, o dono da lavra; passa pelos representantes das empresas de joias que vão a campo ver e escolher os lotes de pedras; segue para as mãos de lapidários; dos designers e da equipe de montagem da indústria joalheira e pronto, as peças estão à disposição dos clientes. Se o efeito China é ótima notícia para quem investe e trabalha na ponta inicial dessa cadeia, para os demais é um estorvo.
Os lapidários, por exemplo, parecem estar em fase de extinção. "Aqui em Valadares havia há uns 10 ou 15 anos cerca de 2 mil oficinas de lapidação. Hoje são no máximo 50", diz Ronaldo Rodrigues Barbosa, 45, ele mesmo um lapidário. É a velha questão dos custos da mão de obra: enquanto no Brasil o preço do trabalho por quilate oscila de US$ 0,80 a US$ 1,20, na China, fica entre US$ 0,25 e US$ 0,35. Um grama é equivalente a 5 quilates. Barbosa conta que muitos de seus colegas de profissão ficam duas ou três semanas sem trabalho; outros tantos simplesmente abandonaram o ramo porque os clientes que tinham passaram a contratar lapidários na China e na Índia.
Mas quem se queixa mais da concorrência asiática são mesmo as empresas de joias que dependem da oferta das pedras nacionais. "Tivemos de rever o tamanho das pedras de algumas de nossas coleções. Antes, podíamos fazer o que quiséssemos com pedras de quaisquer tamanhos, hoje já não é mais assim", diz Rodrigo Robson, designer da Vivara, empresa paulistana, fundada em 1962, que se apresenta como a maior rede varejista de joalherias do Brasil. Segundo ele, a maioria dos fornecedores de pedras da empresa são de Minas Gerais. Topázio e quartzo são as duas mais usadas nas joias de Vivara. "O que estamos percebendo é uma diminuição na oferta de pedra bruta. As pedras maiores vão para a China."
Daniel Sauer, diretor da Amsterdam Sauer, sediada no Rio, diz: "Se eu quiser comprar, tenho de pagar o preço que eles [chineses] estão pagando ou mais. E tem pedras que eles estão pagando o dobro e ninguém quer pagar mais". "A China não está apenas comprando commodities. Está consumindo muito produto de luxo e a joia está nesse contexto."
A vantagem de sua empresa, diz ele, é estar há 70 anos no mercado, enquanto os chineses ainda não estabeleceram uma base de confiança com muitos fornecedores. Os chineses, no entanto, compram quantidades maiores e pagam valores acima do que as joalherias nacionais estão dispostas a pagar.
Em Belo Horizonte, a grife joalheira mais conhecida da cidade, a Manoel Bernardes, desistiu de depender da pedra preciosa de cor brasileira. "Comprávamos mais de Minas Gerais, mas hoje 80% das pedras brutas de cor que compramos vêm da África, de Moçambique e Nigéria. Às vezes também do Paquistão", diz Marcelo Bernardes, que junto com o irmão, Manoel, dirige a empresa fundada pelo pai. A vantagem, diz ele, é que a oferta africana é maior e mais contínua.
Segundo Bernardes, a oferta brasileira de pedras é pequena e os produtores preferem vender mais para quem paga mais, que são os chineses atualmente. "É difícil para nós pagarmos o preço que eles pagam. Sai mais barato comprar em Moçambique do que aqui".
Nem todos veem assim. Raymundo Vianna, um dos maiores exportadores de joias do Brasil, com vendas para 112 países, é um deles. Dono da Vianna Brasil, ele diz que se fosse depender de pedras importadas para competir mundo afora seria derrubado pela carga tributária do Brasil, que onera pedras preciosas de fora em 40%. "Nossa empresa já está tendo dificuldade de adquirir matéria-prima no Brasil. Se continuar assim, a empresa não terá condições de sobreviver."
Presidente do Sindicato da Indústria de Joalheria, Bijuteria e Lapidação de Gemas de Minas Gerais (Sindijoias-MG), Vianna defende medidas drásticas do governo: estancar a saída de pedra bruta do Brasil e motivar empresas de joias e lapidação a se instalarem aqui. "Algo tem de ser feito, senão acaba a indústria da joia no Brasil."