sábado, 16 de agosto de 2014

Garimpo

Garimpo
 
 
O garimpo é uma forma de exploração de minérios valiosos através de meios mecânicos ou manuais, que pode ser realizada a céu aberto ou em minas escavadas nas rochas. Entretanto, o garimpo é considerado uma forma predatória ao meio ambiente. Durante o garimpo na Serra Pelada, o ouro era extraído da pepita utilizando o mercúrio na sua forma líquida, que tem a propriedade de capturar os grãos de ouro formando uma amálgama, uma espécie de liga.
 
Existe um aparelho artesanal construído para separar o ouro da lama extraída no garimpo. Apelidado de “cobra fuma”, nele existem placas com mercúrio sobre as quais corre água com barro e que servem para reter o ouro presente na lama. O fluxo de água faz com que o ouro entre em contato com o mercúrio sendo imediatamente aprisionado. O processo é, em geral, muito rudimentar e causa grandes perdas de mercúrio que é transportado pelas águas para os rejeitos onde se infiltra.
 
A parte do amálgama que não foi perdida na garimpagem é, após alguns dias, processada pelo garimpeiro com o intuito de recuperar o ouro e parte do mercúrio metálico, através de uma separação gravimétrica. Este processo torna-se como a maior fonte de contaminação dos garimpeiros, pois o amálgama separado é queimado, geralmente a céu aberto, liberando grandes quantidades de mercúrio para a atmosfera. Durante o processo, quantidades variáveis de mercúrio são perdidas na forma metálica para rios e solos, e rejeitos contaminados são deixados a céu aberto na maioria dos sítios de garimpo. Alguns garimpeiros também faziam o uso do maçarico para vaporizar o mercúrio deixando somente o ouro na sua forma sólida. Neste processo, os vapores de mercúrio, pela inexistência de equipamentos de proteção, máscaras e capelas, eram inalados diretamente pelos garimpeiros. Este contato direto com o mercúrio desencadeou uma série de problemas de saúde na população da Serra Pelada, levando a morte de muitos garimpeiros ou deixando marcas para a vida toda.

A Corrida pelo Ouro na Serra Pelada

Ouro e Serra Pelada
A Corrida pelo Ouro na Serra Pelada
 
 
 
Em dezembro de 1979, no interior do estado do Pará, um vaqueiro de uma fazenda, encontrou a primeira pepita de ouro. Como a cidade era pequena, a notícia logo se espalhou.
 
O impacto dessa descoberta provocou uma verdadeira revolução na região e ocorreu uma nova corrida pelo ouro que gerou no Brasil o que foi considerado de maior garimpo a céu aberto do mundo.
 
Entre fevereiro e março de 1980, mais de 60 mil homens chegaram ao local, conhecido como Serra Pelada, região localizada no estado do Pará, atual município de Curionópolis e deu-se início a corrida pelo ouro, sem qualquer organização e preocupação com os riscos a saúde e ambiente, movidos apenas pela busca da riqueza. Os morros foram transformados em barrancos através da escavação para a retirada da pepita e como estas eram raras, quem conseguisse maior quantidade ganhava mais. Os lucros e os custos do ouro ficavam para os sócios, donos de fazenda. O garimpeiro ganhava muito pouco pela exploração, mesmo trabalhando dia e noite para obter poucas gramas de ouro.
 

Figura 7: Mapa do Brasil mostrando Curionópolis e o estado do PA.
 
Cerca de 10 toneladas foram extraídas em 1981 e as péssimas condições de trabalho no garimpo causaram uma perda de qualidade de vida dos trabalhadores da região e de suas famílias.
 
A extração do ouro na Serra Pelada durou aproximadamente 4 anos. Ao final de 1981, os depósitos de ouro na superfície se esgotaram e então, uma companhia de mineração tentou reaver a posse das terras e continuar a exploração. O apogeu do garimpo ocorreu em 1983, quando aproximadamente 14 toneladas de ouro foram extraídas. Nos dois anos seguintes, a produção teve um decréscimo e ficou em torno de 3 toneladas⁄ano. Nos anos seguintes, a produção continuou caindo: em 1988, aproximadamente 745 kg de ouro foram extraídos e em 1990, menos de 250 kg. Hoje, acredita-se que ainda existam pequenas jazidas de ouro em algumas regiões, mas a exploração já é controlada pela companhia de mineração Vale. Atualmente, a região da Serra Pelada se transformou em uma favela com cerca de 1000 habitantes e surgiu uma imensa cratera com 200 m de profundidade no local do garimpo.

Mercúrio utilizado no garimpo causa contaminação no solo e em pessoas

Mercúrio utilizado no garimpo causa contaminação no solo e em pessoas

Exploração de ouro na Serra Pelada durante a década de 80 ficou marcada pelas graves consequências causadas pela utilização desta substância


Mineradores usam mercúrio no garimpo para separar o ouro (Foto: Thinkstock/Getty Images)Mineradores usam mercúrio no garimpo para identificar o ouro
A técnica de exploração de minérios que se dedica principalmente a extração de pedras preciosas, como ouro e diamantes, é conhecida como garimpo. A garimpagem pode ocorrer de forma mecânica ou manual e na maioria das vezes utiliza o mercúrio para facilitar a exploração mineral. Apesar da vantagem de catalisar o processo de identificação do ouro, por exemplo, essa substância química é responsável por gerar graves danos ao meio ambiente e aos seres humanos que a ela ficam expostos.
Região de garimpo na Serra Pelada (Foto: Divulgação/ Marcello Veiga)Região de garimpo na Serra Pelada
O mercúrio é utilizado no processo de garimpagem em sua forma líquida para atrair o ouro diluído em um determinado solo, formando uma liga entre as substâncias. Giorgio de Tomi, diretor do Núcleo de Pesquisa para a Pequena Mineração Responsável da Universidade de São Paulo, explica que quando esse concentrado é queimado, o mercúrio evapora deixando apenas o ouro em seu estado bruto. A contaminação com a substâcia pode ocorrer de forma direta, por inalação, ou indireta após sua precipitação no solo. " A combinação do mercúrio precipitado com compostos orgânicos do solo forma a substância metilmercúrio, altamente danosa", esclarede de Tomi.
Além de contaminar o solo, o metilmercúrio pode provocar graves complicações à saúde de garimpeiros ou de pessoas que indiretamente são infectadas. “O metilmercúrio se acumula na cadeia alimentar se fixando na natureza. Ele normalmente fica por volta da região em que o material foi processado, mas com chuva pode cair em um curso de água. Nos seres humanos, ele é conhecido por causar enfermidades neurológicas graves”, declara Giorgio.

Na década de 80, o uso do mercúrio durante a intensa corrida pelo ouro na Serra Pelada causou sérias consequencias para a região. Além de chamar atenção por ter sido o local do maior garimpo a céu aberto do mundo, a exploração do ouro nas jazidas do estado do Pará ficou marcada pelas graves contaminações do solo e de trabalhadores. A falta de equipamentos de proteção, como máscaras ou luvas, permitiu que o mercúrio fosse diretamente inalado pelos garimpeiros, que sofreram com sérias complicações de saúde chegando, em certos casos, à óbito.

As atividades garimpeiras na Serra Pelada desaceleraram durante a década de 90 até serem interrompidas. As crateras abertas no período da exploração foram abandonadas sem qualquer tratamento de recuperação do solo. Hoje, Giorgio explica que a região está dividida entre cooperativas de garimpeiros. Algumas delas já fizeram parcerias com grandes empresas e reiniciaram atividades de escavações subterrâneas.
Instalações de recuperação de ouro na Serra Pelada (Foto: Divulgação/ Marcello Veiga)Instalações de recuperação de ouro na
Serra Pelada
A USP foi procurada por uma destas cooperativas para fazer um caminho diferente. Giorgio explica que o trabalho a ser realizado pela universidade é de reconhecimento do espaço antes da exploração. “Fomos procurados para reconhecer, saber como é a reserva. A ideia é fazer um plano de negócio para deixar a relação com um futuro investidor mais transparente”, diz.

Giorgio conta ainda ter realizado uma pesquisa de levantamento com garimpeiros da rSerra pelada sbre a aceitação de novas tecnologias limpas para a exploração de minerais. O resultado foi positovo em particamente 100% dos casos. No entanto, a falta de conhecimento sobre essas novas técnicas dificulta sua implantação pratica. “A saída é ter um programa de conscientização do garimpeiro para mostrar os riscos do mercúrio e a existência de tecnologias limpas. Além disso, autoridades precisam ensinar os garimpeiros a utilizar essas novas técnicas”, diz. O diretor do Núcleo de Pesquisa para a Pequena Mineração Responsável esclarece que ao invés de mercúrio, os garimpeiros poderiam usar o cianeto, substância não poluente e economicamente mais rentável. “Entendo que a solução não é legal ou ambiental, é econômica. Temos que mostrar que usando tecnologias limpas ele poderão tirar mais ouro”, afirma.

A nova corrida do ouro em Serra Pelada


A nova corrida do ouro em Serra Pelada — sem as tensões, o sofrimento e as cenas bíblicas dos anos 80

Operários da mineradora canadense no túnel escavado recentemente em Serra Pelada. A terra rica em partículas de ouro será retirada e levada à superfície por máquinas (Foto: Antônio Milena / Milenar)
Operários da mineradora canadense no túnel escavado recentemente em Serra Pelada. A terra rica em partículas de ouro será retirada e levada à superfície por máquinas..
A NOVA CORRIDA A SERRA PELADA
No local onde existiu o maior garimpo do mundo, ainda há muito ouro. Em 2013, esse tesouro começará a ser explorado de forma organizada e com o uso de tecnologia moderna
Vinte e cinco anos depois do fechamento do maior garimpo do mundo, Serra Pelada voltará a produzir ouro. No lugar dos 100.000 homens de todas as partes do Brasil que se amontoaram nos terraços enlameados de uma cratera cavada no sul do Pará em busca do metal precioso, em condições precárias, haverá máquinas modernas operadas por funcionários com carteira assinada e protegidos por equipamentos de segurança.

Nos anos 80, a terra retirada no garimpo era carregada em sacos no ombro dos garimpeiros e a escavação se fazia com pás e picaretas (Foto: Luis Novaes - 1982 / Folhapress)
Nos anos 80, uma cena bíblica: a terra retirada no garimpo era carregada em sacos no ombro por milhares de garimpeiros, e a escavação se fazia com pás e picaretas (Foto: Luis Novaes – 1982 / Folhapress)
Em vez de garimpeiros agachados em frente a uma fogueirinha fervendo mercúrio em uma panela para separar as partículas de ouro da terra, serão utilizados complexos processos não poluentes de decantação, flotação e fundição para produzir barras de ouro de 25 quilos com 80% de pureza.
Nas próximas semanas, a mineradora canadense Colossus Minerals, que está investindo 700 milhões de reais em Serra Pelada, concluirá a medição da reserva ainda intocada, que escapou às escavações artesanais dos garimpeiros na década de 80.
SEM MERCÚRIO -- No processo industrial, a separação será feita com técnicas não poluentes como a decantação e a fundição -- na foto, em fase experimental (Foto: Antonio Milena / Milenar)
SEM MERCÚRIO — No processo industrial, a separação será feita com técnicas não poluentes, como a decantação e a fundição — na foto, em fase experimental (Foto: Antonio Milena / Milenar)
Em 2010, quando a cooperativa dos garimpeiros ganhou do governo federal o direito de retomar a exploração de seu tesouro, os técnicos do Ministério de Minas e Energia estimaram em 50 toneladas a quantidade de ouro ainda existente no local. Se o cálculo se confirmar, será mais do que se conseguiu extrair nos sete anos em que o garimpo funcionou, entre 1980 e 1987 (40 toneladas).
Os velhos métodos, contudo, não servem mais. O ouro remanescente encontra-se misturado em uma camada de argila, a 200 metros de profundidade, que se estende a sudoeste da cratera aberta nos anos 80.
Os garimpeiros não sabiam disso e, depois de retirar o ouro que estava mais próximo à superfície, continuaram cavando na vertical. Em vão.
Eles já não conseguiam encontrar uma quantidade significativa do minério e acabaram atingindo um lençol freático, que começou a inundar o garimpo. O governo, então, mandou interromper as atividades no local.
COM MERCÚRIO -- Na década de 80, os garimpeiros usavam metal tóxico para isolar o ouro das impurezas (Foto: Claudio Laranjeiras)
COM MERCÚRIO — Na década de 80, os garimpeiros usavam metal tóxico para isolar o ouro das impurezas (Foto: Claudio Laranjeiras)
Para retomar a exploração, a cooperativa teve de criar a Serra Pelada Companhia de Desenvolvimento Mineral, uma joint venture com a empresa canadense. Os 38.000 garimpeiros cooperados não precisarão fazer nada além de dividir entre si 25% dos lucros da operação.
Na Vila de Serra Pelada, situada no município de Curionópolis, há uma gameleira de 15 metros de altura que serve de ponto de encontro de homens que há trinta anos sonham com a reabertura do seu Eldorado.
A árvore ganhou o apelido de “Pau da Mentira”, por causa das histórias improváveis contadas à sua sombra, mas bem que agora poderia ter seu nome mudado para “Pau da Esperança”.

José Mariano dos Santos, de 58 anos, acredita que a nova fase de Serra Pelada poderá garantir a ele e seus colegas uma renda mensal de 20.000 reais. No passado, Santos chegou a acumular 411 quilos de ouro, o equivalente a 47 milhões de reais em valores atuais, o que fez dele o segundo homem mais rico do garimpo.
Esbanjou tudo em festas, em viagens extravagantes e em investimentos desastrados. Hoje ele sobrevive do salário mínimo que recebe como aposentadoria.
Os representantes da mineradora se preocupam com as expectativas dos seus sócios brasileiros. “Não temos dúvida de que esta mina tem potencial para se tornar uma das mais produtivas do mundo, mas infelizmente não será capaz de enriquecer esses 38.000 homens”, diz a canadense Ann Wilkinson, vice-presidente da Colossus.
ALAGADA -- Na cratera escavada nos anos 80, os garimpeiros que eram donos de "barrancos" contratavam outros homens para ajudá-los a retirar a terra com ouro. O lago que se formou no local tem uma área equivalente à de dois estádios do Maracanã (Foto: Antonio Milena / Milenar)
ALAGADA — Na gigantesca, impressionante cratera escavada nos anos 80, os garimpeiros que eram donos de “barrancos” contratavam outros homens para ajudá-los a retirar a terra com ouro. O lago que se formou no local tem uma área equivalente à de dois estádios do Maracanã (Foto: Antonio Milena / Milenar)
Para atender à remuneração sonhada pelos garimpeiros, a mineradora teria de atingir uma média de extração anual dez vezes a das principais minas do mundo. Isso é impossível, mesmo com a alta concentração de ouro que os técnicos estão encontrando em Serra Pelada.
A média confirmada até agora é de 20 gramas de ouro por tonelada de terra. Em comparação, a média na maior mina em operação no Brasil, em Paracatu, em Minas Gerais, é de 0,45 grama por tonelada.
Durante a fase de prospecção, os geólogos descobriram que as imagens de enormes pepitas de ouro, que ajudaram a fomentar a corrida a Serra Pelada nos anos 80, não se repetirão. Essas pedras já eram raras naquele tempo, e, agora, mais ainda.
Cada terraço retangular é um "barranco", medida de propriedade dos garimpeiros na década de 80 (Foto:  Grislaine Morel / Gamma)
Cada terraço retangular é um “barranco”, medida de propriedade dos garimpeiros na década de 80
O ouro em pó que sobrou está diluído no solo argiloso. Para que se chegue aos pontos de maior concentração do metal, foi construído um túnel de 1 600 metros de extensão e 5 metros de largura.
Mesmo que haja alguma pepita em meio às 150 toneladas de terra que serão recolhidas diariamente por pequenas escavadeiras, ela acabará triturada no processo mecânico de separação do metal.
A dificuldade técnica e o alto custo da extração na “nova” Serra Pelada são compensados de duas formas. Primeiro, o ouro não é o único tesouro do local.
Há quantidades significativas de platina e paládio, metais de grande valor industrial e para a confecção de joias. “Só são conhecidas outras duas minas no mundo onde o ouro vem acompanhado desses metais”, diz o presidente da Colossus, o canadense Claudio Mancuso.
NOVA ILUSÃO -- O garimpeiro José Mariano dos Santos, o Índio, achou 411 quilos de ouro, tornando-se um dos homens mais ricos de Serra Pelada (no detalhe, no auge). Perdeu tudo. Ele sonha em receber 20.000 reais mensais com a parcela que lhe cabe na repartição dos lucros da mineradora com a cooperativa dos garimpeiros
NOVA ILUSÃO — O garimpeiro José Mariano dos Santos, o Índio, achou 411 quilos de ouro, tornando-se um dos homens mais ricos de Serra Pelada (no detalhe, no auge). Perdeu tudo. Ele sonha em receber 20.000 reais mensais com a parcela que lhe cabe na repartição dos lucros da mineradora com a cooperativa dos garimpeiros
A segunda compensação é a crescente demanda pelo ouro, motivada pela desvalorização do dólar e pela instabilidade nas bolsas de valores. No ano passado, o metal acumulou uma alta de 16%, enquanto o índice Bovespa caiu na mesma proporção, e os bancos centrais compraram 440 toneladas de ouro, quase seis vezes mais do que em 2010.
O aumento da procura fez o preço da onça troy (equivalente a 31 gramas) saltar de 300 dólares, em 1998, para 1 310 dólares, na semana passada.
Da preferência dos investidores do século XXI à febre que levou milhares de brasileiros a abandonar a família para tentar a sorte em Serra Pelada nos anos 80, o ouro é desejado por uma razão simples. Ele é raro. Todo o ouro já extraído no planeta, 160.000 toneladas, caberia em apenas 64 piscinas olímpicas.

Suriname: Garimpeiros brasileiros destroem florestas a procura de ouro

Suriname: Garimpeiros brasileiros destroem florestas a procura de ouro

Pictures-Oeco-Brownsberg-2Mineiros do Suriname e da Guiana Francesa posam para fotos em frente a sua escavadeira. Fotos: Anke Vellenga
O Parque Nacional Brownsberg, no Suriname, é o único acessível e o mais antigo do país, localizado a 130 km ao sul da capital Paramaribo, na região de Brokopondo. Trata-se de uma área protegida de 12.200 hectares cujo nome vem de John Brown, explorador e minerador de ouro do século 19. O parque recebe por ano cerca de 20.000 turistas que o visitam para conhecer sua fauna e flora, observar pássaros, fazer caminhadas e admirar cachoeiras. No entanto, dentro dele, do platô Mazaroni, uma montanha de 500 metros, pode-se ver mais que a floresta tropical e a represa de Brokopondo. Ao alcance da vista está a destruição causada pelos garimpeiros ilegais: grandes manchas marrons vazias, rodeadas pelo verde da Amazônia. Com frequência, os mineiros responsáveis por esse estrago são brasileiros. Devido à colonização, a língua mais falada no Suriname é o holandês, mas nativos do Brasil são pela palavra que os designa em português: garimpeiros.
Na trilha dos "garimpeiros"
Um sinal confuso e envelhecido marca a entrada do Parque Natural Brownsberg. Neste ponto, a estrada se divide em duas. Um braço sobe o morro, enquanto o outro leva aos locais onde ficam as minerações de ouro. Não há qualquer posto de controle. Para adentrar as estradas de terra abertas por mineiros é preciso um carro 4x4 e habilidade na direção. Ao longo do caminho, podem-se ver várias minerações abandonadas. Elas deixam montes de lama e nenhuma vegetação.
Mais para a frente, estão mineradores da Guiana Francesa e do Suriname, divididos em dois grupos, de 3 e 5 pessoas. Ambos os grupos mineram da forma mais agressiva possível à natureza: usando mangueiras de água com alta pressão e mercúrio. "Tiramos da terra entre 15 e 30 gramas de ouro por dia. Se tivermos sorte, dá até 60 gramas”, conta um deles. Como os colegas, ele dorme em uma rede coberta por uma tenda improvisada, ao lado da mina. Esses mineradores estão aqui há alguns meses. "Sim, nós sabemos que estamos trabalhando em uma área protegida, mas ninguém nos pediu para ir embora e, por isso, vamos ficando", diz o homem com naturalidade.
Desde 1999, há mineração ilegal de ouro em Brownsberg. Em 2007, as estimativas eram de que a mineração em pequena escala já havia infligido uma perda de 5% da cobertura florestal do parque. Quase 13 anos depois, em março de 2012, a Ong WWF (World Wide Fund for Nature) publicou um relatório denunciando a destruição. Quando ele foi divulgado, o parque tinha 54 minerações, sendo uma delas a apenas 50 metros de distância de uma das suas maiores cachoeiras. As fotos das minerações feitas pelo WWF tiveram grande impacto sobre o público do país, as organizações ambientalistas e o governo do Suriname.
Avançando pela estrada, de repente, surge uma escavadeira. A lama molhada torna impossível continuar de carro. A única maneira de descobrir de onde veio a escavadeira é continuar o caminho a pé. Bem perto, há uma mineração onde estão outras duas máquinas. O local é gerido por um grupo de três garimpeiros brasileiros e alguns surinameses, que claramente investiram nesta operação. "Nós chegamos faz apenas duas semanas, mas ainda não encontramos muito ouro”, dizem ao lado de uma cratera escavada por eles mesmos, “algo como de 10 a 30 gramas por semana”. Eles trabalharam duro e já conseguiram construir um acampamento com cozinha e quartos de dormir feitos de lona plástica sobre uma estrutura de madeira.
Domingo é um dos brasileiros. Patrícia, sua esposa, me convida para se juntar a eles e experimentar comida típica de seu país. Ela está lá para cozinhar e fazer o trabalho doméstico. Patrícia e Domingo são de Belém do Pará, capital do estado do Pará, no Brasil. Eles são casados e têm três filhos, que foram deixados para trás com parentes. "Não é fácil obter documentos para eles", explica Domingo. Nos últimos 5 anos, ele só foi ao Brasil uma vez. Eduardo é de Manaus, onde costumava trabalhar como vendedor. "Aqui eu trabalho muito, mas ganho mais do que no Brasil. E a vida é mais tranquila, embora o Brasil seja muito mais bonito do que o Suriname", diz com um sorriso largo no rosto. "Além disso, não é possível garimpar no Brasil como aqui”, acrescenta Domingo. Eles sabem que mineram ilegalmente em uma área protegida, mas dão de ombros: "Temos que ganhar dinheiro de algum jeito”.
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Mangueiras de pressão usadas para minerar O estrago da mineração Condições de vida duras
Área de mineração abandonada. O estrago está feito. Suprimento de gasolina sendo entregue aos mineiros Perda de floresta e mineração abandonada
“Little Belém”
Patricia , Domingo e Eduardo estão longe de ser os únicos garimpeiros brasileiros no Suriname. Entretanto, o número preciso é incerto. O Instituto de Estatísticas do Suriname diz que há 5.027 brasileiros registrados, mas a "Comissie Ordening Goudsector", comissão do governo que regula a mineração de ouro, estima que existam cerca de 8.000 brasileiros. E funcionários do governo dizem informalmente que, em todo o país, os brasileiros podem chegar a 20 ou 30 mil. Antropólogos que estudam a indústria do ouro do Suriname afirmam que 70 ou 80% dos mineiros são brasileiros.
Nem todos os brasileiros estão trabalhando na mineração, uma parte significativa está em atividades de apoio. São cozinheiros, donos de bares e hotéis, ou fornecedores de transporte. As mulheres trabalham principalmente nas lojas, lavam roupas, são cabeleiras, e uma parte está na prostituição.
Quando se pergunta a um surinamês o que pensa sobre os brasileiros, a resposta padrão é que eles estão saqueando o país, e que as mulheres são prostitutas. No entanto, o Suriname precisa dos brasileiros. "Eles conhecem bem a floresta e o processo de mineração de ouro. Os locais podem aprender com eles", diz Diana Pokie, uma política que representa no parlamento a região de Brokopondo, abundante em ouro. "Os brasileiros estão levando as pessoas do vilarejo a aprender português".
Esta presença também é visível na capital Paramaribo, especialmente na zona ao norte do centro da cidade, também conhecida como "Little Belém” (pequena Belém). Nesta área, encontram-se supermercados brasileiros, bares e hotéis, compradores de ouro, e lojas que vendem equipamentos de mineração. O ambiente é diferente do resto da cidade. Parece mais colorido e animado.
Rodrigo da Silva, 51, está hospedado em um hotel bar chamado Castelo. Ele é do estado do Maranhão e ficará no hotel por alguns dias até vender seu ouro. Rodrigues trabalha operando uma escavadeira e, assim como outros brasileiros, sua presença no Suriname é ilegal, pois ele não tem uma autorização para residir no país. "Já faz 21 anos que trabalho aqui sem documento. Durantes todos esses anos usei quatro passaportes com vistos de curta duração", diz. "Quando meu visto expira, é fácil sair e voltar via Guiana. Dessa forma, consigo outro visto para mais 3 meses". Apesar dos problemas, ele também acha que a vida no Suriname é melhor do que em algumas cidades brasileiras. Marieke Heemskerk, antropóloga cultural, confirma: "nas favelas de Belém há mais violência e roubos. No Suriname, os brasileiros podem viver tranquilamente, mesmo ilegais no país”.

A maioria dos brasileiros opta por trabalhar em áreas mais inacessíveis do que Brownsberg, onde o governo surinamês não consegue localizá-los com facilidade. As condições de vida dos garimpeiros de ouro na floresta são difíceis. As pessoas vivem em acampamentos improvisados e lamacentos, próximos aos campos de mineração. A maioria dorme em redes sob um teto improvisado, uma situação frágil durante a estação de chuvas. Nas minerações maiores, há lojas chinesas que oferecem de alimentos e roupas a ferramentas. Para entretenimento, há bares e pequenos bordéis anexos. O custo de vida é alto nestas áreas, onde tudo é pago em ouro, de uma lata de Coca-Cola ao trabalho de uma prostituta.

Mais destruição Mineração abandonada Placa desgastada e confusa na entrada do Parque Nacional de Brownsberg
Acampamento de garimpeiros brasileiros e surinameses. Na esquerda fica a cozinha e à direita a área de dormir. À esquerda, Domingo, e a seu lado, Eduardo, ambos dentro do acampamento, na parte em que fica a cozinha. Os garimpeiros vivem ao lado da área de mineração
Desmatamento no Suriname
Mais de 90 % do Suriname é coberto de floresta, dos quais grande parte é mata primária . O país abriga mais de 1.100 espécies conhecidas de anfíbios, aves, mamíferos e répteis, e cerca de 5 mil espécies de plantas vasculares, de acordo com o World Conservation Monitoring Centre. No entanto, Brownsberg é apenas um exemplo de desmatamento na Amazônia do Suriname.
No Suriname, 12,7% do território é composto de áreas protegidas (nas categorias I-V da IUCN). Mas, em 2012, o país perdeu 19.138 hectares de cobertura florestal amazônica, segundo dados do Terra-I e do InfoAmazonia . Isto é um aumento em torno de 87% em relação a 2011. As medidas de conservação do país parecem não sair do papel; e é débil o combate do governo contra a mineração ilegal de ouro.
Mapa do InfoAmazonia com os dados de desmatamento no entorno da Reserva Brownsberg
Mudanças
Os garimpeiros brasileiros não são os únicos culpados pela perda de floresta amazônica. Em um país em que há pouca regulação, fiscalização e monitoramento, mineiros ilegais operam sem preocupações em um “Velho Oeste” à la Suriname. Porém, há sinais de mudanças chegando. Robby Dragman, Diretor do Stichting Natuurbehoud Suriname (STINASU ), órgão que gerencia o Parque Nacional Brownsberg Nature, explica seus planos para levar o parque de volta aos seus dias de glória: "Queremos formar a nossa própria equipe profissional de segurança”.
Além disso, a Comissie Ordening Goudsector tem planos para ensinar os mineiros a trabalharem de forma mais amigável à natureza. Há alguns meses, garimpeiros passaram a poder se registrar com o governo e obter autorizações para minerar em locais pré-determinados. A STINASU também está trabalhando em um projeto de recuperação do Brownsberg, em cooperação com a Universidade de Paramaribo. São boas notícias, mas a destruição causada pela mineração de ouro no parque levará anos para ser remediada. Mas, assim como tudo o mais no Suriname, as coisas boas vêm lenta e pacificamente.

Mazaroni Plateau, ponto mais alto do parque Brownsberg, de onde é possível avistar as mineraçõesMazaroni Plateau, ponto mais alto do parque Brownsberg, de onde é possível avistar as minerações