Pegmatito Gentil (Mendes Pimentel, MG) e suas paragêneses mineralógicas de fosfatos raros
Gentil Pegmatite (Mendes Pimentel, MG) and their rare phosphate mineral assemblages
RESUMO
Centenas
de corpos pegmatíticos na região nordeste de Minas Gerais produzem
minerais gemológicos e de coleção, muitos desses corpos possuindo
afinidades com determinada espécie, grupo ou classe mineral. O Pegmatito
Gentil em Mendes Pimentel, ora descrito, notabiliza-se por sua
assembléia de minerais fosfáticos, a maior parte dos quais raros ou
raríssimos na natureza. A associação mineral identificada inclui
microclínio, quartzo, muscovita, almandina-espessartita, berilo e
trifilita como fosfato primário, que foi alterado formando uma
extensa paragênese de espécies secundárias. Entre essas, destacam-se
brazilianita, frondelita, gormanita, huréaulita, lazulita,
litiofilita, purpurita, reddingita, woodhouseíta, zanaziíta e,
recentemente descrita nesse corpo, a matioliíta.
Palavras-chave: Pegmatitos, minerais fosfáticos, Província Pegmatítica Oriental do Brasil.
ABSTRACT
Hundreds
of pegmatitic bodies occur in the northern region of the State of
Minas Gerais, several of these bodies producing gemologic and
collection minerals. Such pegmatites are known by the mineral
affinity with certain minerals species, groups or classes. The Gentil
Pegmatite (Mendes Pimentel county) is characterized by the phosphatic
mineral assemblage, and some of these minerals are rare or very rare
in nature. Primary species are microcline, quartz, muscovite,
almandine-espessartine, beryl, and triphylite as the main phosphate
that was altered to an extensive paragenesis of secondary phosphates.
In this list are noted brazilianite, frondelite, gormanite,
hureaulite, lazulite, lithiophilite, purpurite, reddingite,
woodhouseite, zanaziite, and matioliite, a species recently described
in the Gentil Pegmatite.
Keywords: Pegmatites, phosphate minerals, Eastern Brazil Pegmatitic Province.
1. Introdução
A
região nordeste de Minas Gerais, onde se insere a "Província
Pegmatítica Oriental do Brasil", é mundialmente famosa devido à
ocorrência de minerais excepcionais pela raridade e/ou por seus
aspectos visuais, permitindo com que sejam comercializados no
atrativo mercado de minerais para coleção. No contexto dessa
província mineral, a região compreendida entre Galiléia, ao sul,
passando por Divino das Laranjeiras e se estendendo até Mendes
Pimentel, ao norte, destaca-se pela ocorrência de minerais fosfáticos
raros ou raríssimos na natureza, diversos deles descritos
originalmente na própria região. Nesse caso, incluem-se barbosalita,
coutinhoíta, faheyíta, frondelita, lindbergita, moraesita e tavorita
em Galiléia; e brazilianita, scorzalita e souzalita em Divino das
Laranjeiras (detalhes sobre descrições e depósitos desses minerais
encontram-se em Pough & Henderson, 1945, Cassedanne, 1983, Atencio,
2000, Chaves et al., 2006), bem como, de recente descrição, a
matioliíta em Mendes Pimentel (Atencio et al., 2006). Esse último
mineral foi encontrado no Pegmatito Gentil, cuja geologia e
mineralogia detalhada constituem o objetivo central do estudo ora
apresentado.
Fanton
et al. (1978) e Cassedanne e Cassedanne (1982) realizaram os
primeiros estudos de detalhe, enfocando a geologia e mineralogia
geral, respectivamente, dos pegmatitos da área. Esses minerais foram
também estudados pelos autores e equipe em outras ocasiões (p. ex.,
Karfunkel et al., 1997, Chaves et al., 2001, 2003, 2005, Scholz,
2002, 2006, Scholz et al., 2003). No Pegmatito Gentil, R. Scholz
coletou, em 2003, um mineral de coloração azul-piscina, como
agregados de pequenos prismas (2-5 mm), que logo foi presumido como uma
espécie raríssima ou, então, nova para a ciência. Estudos
preliminares apontaram que tratar-se-ia, em princípio, de uma
burangaíta (Bermanec et al., 2004a, 2004b), embora os resultados
químicos não tivessem sido inteiramente satisfatórios. Estudos
paralelos e mais completos efetuados por pesquisadores da USP
determinaram esse mineral como uma nova espécie, designada matioliíta
(Atencio et al., 2006). Como as amostras coletadas pelos presentes
autores são de maior tamanho e fazem parte de uma pesquisa integrada
envolvendo as paragêneses fosfáticas do depósito, acredita-se que a
apresentação dos atuais resultados complementem o citado estudo, bem
como ajudem a difundir a imagem do mineral através de fotografia e
imagens com MEV de espécimens excepcionais obtidos nos trabalhos de
campo.
2. Localização e contexto geológico regional
O
Pegmatito Gentil (18°41'21"S/41°27'02"W) localiza-se no município de
Mendes Pimentel, o qual dista cerca de 80 km a leste de Governador
Valadares, nordeste de Minas Gerais (Figura 1
- destaque). A partir de Mendes Pimentel, seu acesso pode ser
realizado pela rodovia asfaltada MG-417 (que liga a cidade à BR-381),
de onde, após 5 km, toma-se uma estrada de terra mal conservada à
esquerda em direção à área do Córrego Indaiá. Essa estrada alcança a
Lavra do Indaiá, ora explorada para feldspato e, a 2 km para leste,
em caminho carroçável, alcança-se a Lavra do Gentil (Figura 1).
Ressalte-se, ainda, que, no mapa geológico da região efetuado pelo
convênio COMIG/CPRM (Vieira, 2000), essas duas importantes lavras não
se encontram cadastradas.

Na
região de Mendes Pimentel - Divino das Laranjeiras, afloram rochas
metassedimentares gnáissicas e/ou xistosas, intrudidas por várias
gerações de rochas plutônicas ácidas (Figura 1),
todas essas seqüências sendo datadas no Neoproterozóico (Netto et
al., 1998). Pegmatitos, associados a tal granitogênese, fazem parte do
Campo Pegmatítico Galiléia-Mendes Pimentel, do Distrito Pegmatítico
de Conselheiro Pena.
As
rochas gnáissicas e xistosas compreendem as Formações Tumiritinga e
São Tomé, de natureza metassedimentar, que integram o Grupo Rio Doce.
O relacionamento estratigráfico entre ambas ainda não se encontra
exatamente definido. A primeira ocorre a nordeste e sudeste da
região, constituída na maior parte por
biotita-sillimanita-granada-(cordierita) gnaisses, localmente
grafitosos. A Formação São Tomé, aflorante sobre a faixa central
topograficamente mais arrasada da área, destaca-se por incluir a
maioria dos corpos pegmatíticos. A unidade é composta de
quartzo-biotita-granada xistos, localmente com estaurolita e
sillimanita, além de muscovita e schorlita como produtos de
metassomatismo. Intercalações de quartzitos impuros e rochas
calcissilicáticas são freqüentes. A foliação principal possui
direções variáveis com ângulos de mergulhos geralmente elevados.
Intrusivos
nesses metassedimentos ocorrem duas fases de magmatismo ácido
sintectônico, designadas de Tonalito São Vítor e Tonalito Galiléia,
bem como corpos tardi- a pós-tectônicos, estes últimos não
representados no mapa da Figura 1
(Féboli, 2000, Vieira, 2000). A Suíte Galiléia constitui a maior
parte da região, formando corpos de dimensões batolíticas de rochas
leucocráticas a mesocráticas, estrutura gnáissica e textura média a
grossa, localmente porfiroblásticas. Essa suíte possui composição
metaluminosa a pouco peraluminosa de afinidade cálcio-alcalina e
litotipos granitóides do "tipo-I", representados por tonalitos,
tonali-granodioritos, granodioritos e granitos. A Suíte São Vítor, de
composição similar, aflora em pequena porção, a oeste de Linópolis,
e parece corresponder a uma variedade faciológica do Tonalito
Galiléia com estrutura fracamente orientada (Féboli, 2000).
3. Corpos pegmatíticos da área e o Pegmatito Gentil
Na
região entre Divino das Laranjeiras e Mendes Pimentel, são
conhecidos mais de 30 corpos pegmatíticos de porte maior que 2 m, em
um quadrilátero de, aproximadamente, 100 km² (os 20 mais importantes
são representados na Figura 1).
Esses corpos encontram-se encaixados nos biotita-quartzo xistos da
Formação São Tomé, geralmente de forma concordante com a xistosidade
principal, ou, ainda, condicionados em direções destacadas de
fraturamento.
Associados
à fase tardia da última granitogênese, os pegmatitos se caracterizam
pela presença de uma grande variedade de minerais fosfáticos raros
(Chaves et al., 2005), onde se inserem espécies como brazilianita,
scorzalita e souzalita, descritas no Pegmatito Córrego Frio (Pough
& Henderson, 1945, Cassedanne, 1983). A maior parte desses
pegmatitos possui mineralogia característica de corpos diferenciados,
enriquecida em minerais de lítio como ambligonita-montebrasita,
trifilita-litiofilita e, mais raramente, lepidolita e espodumênio. Os
corpos, geralmente, não apresentam zoneamento textural pronunciado,
entretanto possuem porções internas em menor escala com grande
variação textural e composicional; nessas porções, aparecem os
minerais raros. As dimensões desses corpos variam, em geral, entre
2-30 m de espessura, 10-120 m de comprimento e, para a totalidade dos
casos, faltam estudos sobre a profundidade dos corpos.
O
Pegmatito Gentil aflora encaixado de forma concordante no
biotita-quartzo xisto da Formação São Tomé, no local com direção
NNE-SSW mergulhando fortemente para SSE (Figura 2).
Esse corpo pegmatítico, diferentemente da maioria dos demais da
região, possui zoneamento característico. Nas bordas, a rocha
encaixante é metassomatizada (zona marginal), rica em cristais
isolados de schorlita. Uma zona mais interna é constituída de
pegmatito gráfico, onde já aparecem alguns corpos de substituição (pockets).
Estes, porém, são mais abundantes na zona feldspática, rica em
grandes cristais de microclínio, com menor volume de quartzo,
muscovita, almandina-espessartita, berilo e trifilita como outros
minerais primários. O núcleo é de quartzo quase maciço.

Além
da trifilita, aparece, em quantidade muito menor, a montebrasita.
Nos corpos de substituição, a mineralogia secundária é representada
por albita, muscovita rica em lítio, elbaíta, além de uma
diversificada paragênese de minerais fosfáticos formados a partir da
alteração hidrotermal e/ou supergênica da trifilita, que estão
descritos no próximo item. A trifilita aparece em cristais euédricos a
subédricos, com dimensões variáveis entre 0,5 cm e 5 cm incluídos em
microclínio e/ou quartzo, bem como constituindo grandes massas
agregadas complexas, em conjunto aos mesmos minerais. Em geral, a
trifilita encontra-se parcial ou inteiramente substituída, resultando
em paragêneses secundárias que incluem espécies fosfáticas raras.
4. Paragêneses minerais fosfáticas
Os
processos de diferenciação magmática nos pegmatitos da região
permitiram o desenvolvimento de associações minerais variadas, a
maioria das quais envolve fases fosfáticas (Tabela 1).
A evolução geral da mineralogia dos fosfatos em pegmatitos constitui
três etapas distintas (primária, metassomática e hidrotermal),
responsáveis pela formação de assembléias e paragêneses específicas,
que ocorrem em função da composição química e temperatura do meio
(Moore, 1973). Assim, o processo evolutivo vai depender, tanto de
fatores internos, como composição química e mineralogia do ambiente
primário, quanto de fatores externos, como a possível entrada de água
meteórica, de modo que fosfatos primários podem ser submetidos a
estágios de alteração com intensidades variáveis. Os processos mais
intensos são capazes de substituir, completamente, a mineralogia
inicial, mascarando a paragênese primária do corpo, enquanto os de
menor intensidade substituem somente parte dela.
Os
pegmatitos inseridos no Distrito Pegmatítico de Conselheiro Pena
foram, anteriormente, relacionados a seis grupos distintos por Scholz
(2002) e Scholz et al. (2003), em função de seus minerais fosfáticos
(ou ausência dos mesmos): (I) pegmatitos sem fosfatos primários;
(II) pegmatitos pobres em lítio, com triplita; (III) pegmatitos ricos
em lítio, com trifilita predominante; (IV) pegmatitos ricos em
lítio, com montebrasita predominante; (V) pegmatitos com apatita e
(VI) pegmatitos com monazita. Tendo por base tal classificação,
descrevem-se paragêneses presentes em pegmatitos do "tipo III", onde
se insere o Pegmatito Gentil, bem como diversos outros corpos nos
arredores de Galiléia, ao sul, a exemplo das lavras Boca Rica,
Cigana, Sapucaia e Boa Vista-1 (Chaves et al., 2005). Em todos esses
corpos, a trifilita ocorre fazendo parte da mineralogia primária
junto com microclínio, quartzo e berilo, formando associações com
numerosos minerais de alteração, alguns destes de origem supergênica.
No
Pegmatito Gentil, as paragêneses mais comuns verificadas foram
(fórmulas químicas segundo o IMA (Mandarino & Back, 2004):
Trifilita [LiFe2+PO4] + fosfossiderita [Fe3+PO4.3H2O] + purpurita [Mn3+PO4].
Essa associação corresponde a agregados de cristais de trifilita de
cor verde-escura, inseridos no microclínio e com as bordas
parcialmente alteradas para fosfosiderita e/ou purpurita (Figura 3).
(Trifilita) + reddingita [Mn2+Mn2+2(PO4)2(H2O)] + huréaulita [Mn2+5(PO4)2PO3(OH)2.4H2O]
+ fosfossiderita. Tal paragênese constitui produto de alteração
da trifilita e está presente em cavidades de substituição/alteração
tardias (Figura 4A),
ou em substituição total a cristais de trifilita. No primeiro caso,
cristais de litiofilita apresentam reddingita e huréaulita na
superfície ou em cavidades.
(Triflilita) + frondelita [Mn2+Fe3+4(PO4)3(OH)5] + litiofilita [LiMn2+PO4] + lazulita [MgAl2(PO4)2(OH)2]
+ huréaulita. A frondelita aparece recobrindo corpos de substituição
tardios e, sobre esse mineral, ocorrem litiofilita, huréaulita e/ou
lazulita. Estão também relacionados à substituição total da
trifilita.
(Trifilita) + frondelita + ferrissicklerita [Li(Fe3+,Mn2+)PO4]
+ purpurita. Essa paragênese ocorre como produto de alteração da
trifilita, formando blocos maciços. A purpurita é formada a partir da
seguinte seqüência de alterações: trifilita-litiofilita ®
sicklerita-ferrissicklerita ® purpurita-heterosita.
(Trifilita) + fluorapatita [Ca5(PO4)3F] + brazilianita [NaAl3(PO4)2(OH)4] + woodhouseíta {CaAl3[(P,S)O4]2(OH,H2O)6} + matioliíta [(Na,Mg)Al5(PO4)4(OH)6.2H2O].
Nessa paragênese, a trifilita encontra-se inteiramente substituída,
verificando-se uma interessante e singular associação de fluorapatita
(secundária), brazilianita mal cristalizada, woodhouseíta em
pseudocubos (única ocorrência brasileira do mineral conhecida) e da
recentemente descrita matioliíta, com cristais azuis milimétricos em
prismas longos (Figura 4B).
5. Química mineral dos fosfatos em geral e da matioliíta do corpo
Análises químicas com microssonda eletrônica foram efetuadas em amostras representativas de matioliíta (Figura 5A), brazilianita, frondelita, lazulita e trifilita (Tabela 2),
após suas identificações com difração de raios X. As análises com
microssonda foram obtidas no Laboratório de Microanálises,
Defis-ICEX/UFMG. Na coluna 1 dessa tabela, apresentam-se os dados de
amostra coletada em 2003, então considerada como burangaíta -
[(Na,Ca)(Fe2+,Mg)Al5(PO4)4(OH,O)6.2H2O]
(Bermanec et al., 2004a, 2004b), posteriormente reconhecida por
Atencio et al. (2006) como nova espécie (matioliíta) compondo uma
série isomórfica com a primeira. Imagens de microscopia eletrônica de
varredura detalham os prismas alongados extraídos da mesma amostra (Figura 5B-C).
Nas colunas 2 e 3, são fornecidas, comparativamente, as análises
pertinentes desses últimos autores em relação ao novo mineral e a uma
outra fase de composição intermediária na referida série e, na
coluna 4, valores da burangaíta da localidade-tipo, o Pegmatito
Buranga, em Ruanda (Knorring et al., 1977). Os dados apresentados
indicam que a matioliíta ora analisada é empobrecida em Na2O e relativamente mais rica em P2O5 e Al2O3.

Na coluna 5 (Tabela 2), constam os dados da brazilianita que se associa à matioliíta, apresentados na Figura 5A.
A brazilianita, embora descrita desde longa data (Pough &
Henderson, 1945), é, ainda, um mineral pouco estudado. Análises
desses autores obtidas a partir de amostras da localidade-tipo,
Pegmatito Córrego Frio (situado no mesmo município - mineralogia
geral mostrada na Tabela 1),
possuem valores de Na2O da ordem de 8,4%, entretanto o espécime
analisado também é empobrecido nesse óxido, com ±3,4%. Tais dados,
juntamente com os apresentados para frondelita e lazulita do mesmo
corpo (Tabela 2,
colunas 6-7), demonstram a complexidade química dos fosfatos
secundários encontrados, que, muitas vezes, se comportam como
misturas de distintas fases e/ou ainda exibem diversos graus de
hidratação. Assim, a frondelita da coluna 6 dessa tabela, com ±42,1%
de FeO contra ±49,3% requeridos para valores ideais, pode indicar
maior hidratação do material analisado. Os outros valores são muito
semelhantes aos valores ideais. Os baixos fechamentos nas análises
desses dois minerais devem-se à presença da hidroxila, não
quantificável na microssonda.
Quanto
às fases primárias do Pegmatito Gentil, ocorre trifilita e, de modo
raro, ocorre a montebrasita. A lazulita também é um fosfato primário
característico (Moore, 1973), entretanto esse autor lista, ainda, tal
espécie como uma possível fase secundária, o que, provavelmente,
representa a amostra analisada (Tabela 2,
coluna 7). A mesma possui grande semelhança química com lazulitas da
região de Diamantina, embora estas últimas ocorram em veios de
quartzo (Chaves et al., 2003). A trifilita, que foi analisada a partir
de amostras de três diferentes corpos de substituição (Tabela 2,
colunas 8, 9 e 10), também apresentou anomalia quanto ao FeO, com
30,8-32,9% contra 45,5% requeridos para valores ideais; entretanto o MnO
(não presente na fórmula química teórica) alcançou até ±9,5% nas
análises, indicando um importante processo substitucional do Fe2+,
pelo Mn2+, e resultando numa provável fase intermediária entre esse
mineral e a litiofilita.
6. Considerações finais
O
estudo regional da geologia e da mineralogia fosfática primária e
secundária encontrada nos pegmatitos do Distrito de Conselheiro Pena
tem permitido a identificação de diversos tipos de pegmatitos com
base em suas constituições minerais, além de possibilitar a
caracterização de modo integrado das assembléias e paragêneses
minerais com espécies raras envolvidas. A descrição de onze novos
minerais em pegmatitos dessa região (barbosalita, brazilianita,
coutinhoíta, faheyíta, frondelita, lindbergita, matioliíta,
moraesita, scorzalita, souzalita e tavorita), bem como a diversidade
demonstrada, abre um campo largamente potencial para a descoberta de
outros novos minerais na mesma. O Pegmatito Gentil, embora com
atividades de lavra paralisadas desde 2004, possui, ainda, pilhas de
rejeito interessantes de serem exploradas, tendo em vista o encontro
de novas associações minerais.
O
estudo desenvolvido nesse pegmatito integra-se com os de outros
corpos da região de Mendes Pimentel, o que deve constituir objeto de
futuro trabalho. A caracterização química de distintas paragêneses
minerais com espécies fosfáticas envolveu análises químicas com
microssonda eletrônica na principal fase primária (trifilita) e sobre
algumas fases secundárias presentes (brazilianita, frondelita,
lazulita e matioliíta), ressaltando-se importantes processos de
substituição. Deve-se, ainda, frisar que a matioliíta, recentemente
descrita nesse corpo, assim como as fases estudadas quimicamente e
que apresentaram diferenças consideráveis em relação às composições
químicas ideais, constitui um campo de pesquisas que pode contribuir
para um melhor entendimento da evolução da mineralogia fosfática em
pegmatitos.
Inclusões fluidas em topázio do Complexo Granítico Estanífero de Massangana (RO)
RESUMO
O
complexo granítico de Massangana, localizado na região central de
Rondônia, sudoeste do Cráton Amazônico, Brasil, é um importante
exemplo da Província Estanífera de Rondônia. Esse complexo possui
dimensões batolíticas, marcantes estruturas anelares relacionadas às
sucessivas fases magmáticas e hospeda mineralizações de Sn, W, Nb,
Ta, topázio e berilo associadas a pegmatitos. Esse trabalho apresenta
a composição química e as condições mínimas de aprisionamento dos
fluidos nos cristais de topázio encontrados no complexo granítico
estanífero de Massangana. O topázio, de cor azul, apresenta qualidade
gemológica e possui cinco grupos de inclusões fluidas de natureza H2O-NaCl, cuja salinidade equivalente varia de 3,4 a 11,7% em peso de NaCl, densidade em torno de 0,75g/cm3
e temperatura de homogeneização total (Th) entre 320 e 350ºC.
Devido à íntima associação do topázio com cassiterita, wolframita e
columbita-tantalita nos corpos pegmatíticos, admite-se que esse
intervalo de Th também corresponda ao intervalo mínimo de
cristalização desses outros minerais metálicos. Considerando que os
pegmatitos no complexo granítico de Massangana estão associados às
últimas fases magmáticas, é provável que a profundidade de
posicionamento desses corpos pegmatíticos seja inferior a 3 km e a
uma pressão estimada entre 1 e 1,5 kbar.
Palavras-chave: complexo granítico de Massangana, topázio gemológico, inclusões fluidas, Roraima.
ABSTRACT
The
Massangana granitic complex, located in the central region of the
State of Rondônia, State, southwestern of the Amazon craton, Brazil,
is an important example of the Rondônia Tin Province. The complex
represents a batholitic body with conspiscuous ring structures
related to successive intrusion events hosting Sn, W, Nb, Ta, topaz
and beryl mineralizations associated to pegmatite. In this paper we
determine the chemical composition and the minimal conditions of capture
of the fluids in topaz from the Massangana granitic complex. The
blue topaz has gemological quality and presents five groups of H2O-NaCl fluid inclusions, with salinity between 3,4 to 11,7% weight % NaCl equivalent, density about 0,75g/cm3
and homogenization temperature between 320 to 350ºC. The close
association of topaz with cassiterite, wolframite and
columbite-tantalite in pegmatites suggests the same minimal
homogenization temperature for the crystallization of the mentroned
metalic minerals. The pegmatitic bodies in the Massangana Complex are
associated with the last magmatic phases and their probable emplacement
depth is less than 3 km corresponding to an estimated pressure
between 1 to 1,5 kbar.
Keywords: Massangana granitic complex, gemological topaz, fluid inclusions, Roraima.
1. Introdução
O
complexo granítico estanífero de Massangana está localizado na
região central de Rondônia, distante cerca de 220km ao sul da capital
Porto Velho (Figura 1).
Essa região abriga os principais depósitos de estanho da Província
Estanífera de Rondônia e foi alvo de intensa atividade de mineração
por cerca de 40 anos (Dall'Igna, 1996). Atualmente, devido ao baixo
preço do estanho no mercado internacional, apenas poucos garimperiros
atuam na área do complexo granítico de Massangana, extraindo
principalmente topázio e um pouco de cassiterita ao longo de pequenos
aluviões. O topázio é comercializado como gema e seu jazimento
primário está associado a corpos pegmatíticos, os quais foram, em
grande parte, erodidos e transportados para os aluviões.
Esse
trabalho objetiva caracterizar a composição química e as condições
mínimas de aprisionamento dos fluidos nos cristais de topázio
encontrados no complexo granítico estanífero de Massangana. A
metodologia de trabalho envolveu estudos petrográfico e
microtermométrico em quatro seções polidas em ambas as faces. No
estudo microtermométrico utilizou-se a platina Chaixmeca modelo 871
do Laboratório de Inclusões Fluidas do Instituto de Geociências da
Universidade de Brasília (IG-UnB). O equipamento foi calibrado
utilizando-se inclusões fluidas sintéticas, com precisão variando de
±1ºC para resfriamento até -100ºC e de ±5ºC para aquecimento até
350ºC, com velocidade de aquecimento de cerca de 1ºC por minuto. Duas
inclusões fluidas foram ainda submetidas à análise por
espectroscopia micro-Raman no Instituto de Física da Universidade
Federal de Minas Gerais.
2. Contexto geológico
O
complexo granítico de Massangana é um dos principais representantes
dos chamados Granitos Jovens de Rondônia (Kloosterman, 1967 e 1968).
Possui dimensões batolíticas e se destaca nas imagens de satélite e
fotografias aéreas pelo seu formato elíptico e alongado na direção
ESE-WNW, contendo estruturas anelares relacionadas às sucessivas fases
magmáticas que constituem a história evolutiva desse batólito
(Kloosterman, 1967 e 1968; Warghorn, 1974; Isotta et al., 1978).
Romanini (1982) caracterizou quatro fases magmáticas, denominando-as
de Massangana, Bom Jardim, São Domingos e Taboca (Figura 1).
A fase Massangana é a principal e mais antiga, com idade U-Pb em
zircão de 991±14Ma (Bettencourt et al., 1999), sendo constituída por
um biotita granito cálcio-alcalino a alcalino, de cor rosa-claro, com
textura porfirítica média a grossa e contendo megacristais de
feldspato potássico. As fases Bom Jardim e São Domingos são
intrusivas na fase Massangana, apresentam idade Rb-Sr em rocha total da
ordem de 956±9Ma, com razão inicial 87Sr/86Sr de 0,7104±0,0056
(Priem et al., 1989), sendo representadas por dois stocks de biotita
granito de composição alcalina, exibindo cor rosa-claro, textura
inequigranular fina a média e contendo xenólitos de diferentes tipos
de rochas. A fase Taboca é considerada mais jovem, pois é intrusiva
na fase Bom Jardim e é representada por apófises sieníticos a
quartzo-sieníticas, com textura inequigranular fina a média, também
contendo xenólitas das rochas encaixantes.
Os
depósitos de estanho no complexo granítico Massangana estão
relacionados às fases Bom Jardim e São Domingos, com a cassiterita
associada a veios de quartzo, greisens e corpos pegmatíticos,
normalmente contendo wolframita, berilo, topázio e
columbita-tantalita (Romanini, 1982; Bettencourt & Dall'Agnol,
1995; Bettencourt et al., 1997). Os cristais de topázio
comercializados como gemas ocorrem nas zonas intermediária e central
dos corpos pegmatíticos heterogêneos, normalmente associados a
berilo, cassiterita, wolframita e columbita-tantalita. Esses cristais de
topázio são euédricos, de hábito prismático com terminações
piramidais, com tamanho entre 3 e 12cm, são pouco fraturados,
transparentes a translúcidos e apresentam cor variando de azul,
amarelo a incolor.
3. Inclusões fluidas
O
estudo de inclusões fluidas foi realizado em cristais de topázio
azul, devido ao seu maior interesse comercial como uso gemológico (Figura 2A) e por apresentar um número mais representativo de grupos de inclusões fluidas (Figura 2B a 2F).
A
observação petrográfica à temperatura ambiente (±25ºC), com base
na morfologia, número e volume de fases envolvidas no sistema fluido,
permitiu identificar cinco grupos de inclusões fluidas de natureza
aquosa, sendo quatro grupos com características de inclusões fluidas
primárias e um grupo com característica de inclusões fluidas
pseudo-secundárias. Os grupos de inclusões fluidas primárias (L1, L2, S1 e S2)
ocorrem, normalmente, nas partes mais centrais dos cristais de
topázio, distribuídos em grupos e/ou alinhados ao longo de planos de
crescimento do cristal, enquanto que as inclusões fluidas
pseudo-secundárias (L3) tendem a ocorrer nas bordas dos cristais, distribuídas de modo aleatório.
O grupo L1
é do tipo bifásico, pois apresenta uma fase líquida e uma fase
gasosa, exibe formato em bastonete com tamanho entre 20 e 40µm, é
transparente a levemente rosada, com contornos finos e o volume da fase
gasosa (Vg) em relação à fase líquida variando de 40 a 50% (Figura 2B).
Ocasionalmente, contém uma fase sólida de cor preta, hábito granular
e tamanho inferior a 1µm, a qual é interpretada como provável
agregado mineral capturado durante a formação da cápsula hospedeira
de fluidos e gases.
O grupo L2
é do tipo bifásico e é o mais freqüente. Apresenta formato
elíptico a levemente prismático, ocasionalmente como cristal
negativo, seu tamanho varia de 2 a 8µm, é transparente a translúcido,
com contornos mais grossos e bem definidos, e Vg variando de 40 a 50% (Figura 2C).
O grupo S1 é raro, apresenta a mesma morfologia e Vg das inclusões fluidas do grupo L1,
porém é constituído de inclusões fluidas trifásicas, pois apresentam
uma terceira fase representada por um sólido de saturação incolor,
de hábito cúbico e isótropo, interpretado como um sal do tipo halita,
o qual ocupa um volume (Vs) em torno de 3% da inclusão fluida (Figura 2D).
O grupo S2
é do tipo trifásico e é o mais raro, apresenta formato elíptico a
levemente prismático, tamanho entre 4 e 8µm, um Vg entre 50 e 60% e
uma fase sólida de saturação com Vs inferior a 3% (Figura 2E).
O grupo L3
é constituído por inclusões fluidas bifásicas e é pouco
freqüente. São consideradas como inclusões fluidas pseudo-secundárias
por exibir formato irregular e tamanho variando de 40 a 90µm. Essas
inclusões fluidas são transparentes, com contornos finos e Vg entre
20 e 30% (Figura 2F).
A observação microtermométrica permitiu caracterizar esse sistema fluido como do tipo H2O-NaCl, o que foi comprovado por meio da espectroscopia micro-Raman (Figuras 3A e 3B).
Durante o resfriamento das inclusões fluidas (até -120ºC), o sistema
fluido apresenta um intervalo de congelamento total entre -70 e
-80ºC. Já durante o processo de aquecimento (até +360ºC), esse
sistema fluido apresenta a primeira mudança de fase entre -24,2º e
-18,6ºC, correspondente à temperatura do eutético (Te), a qual é uma
medida pouco precisa e muitas vezes de difícil observação. Segundo
Shepherd et al. (1985), o intervalo de temperatura do eutético para o
sistema fluido H2O-NaCl varia de -21,2º a -20,8ºC. A
segunda mudança de fase, correspondente à temperatura de fusão do
gelo (Tfg), ocorre no intervalo de -8º a -2ºC (Figura 3C), sendo que para as inclusões fluidas L3 a Tfg = -3,8º a -2ºC, para L1 a Tfg = -6,8 a -3,6ºC e para L2 a Tfg = -8 a -5,3ºC . A temperatura de homogeneização total (Th) nas inclusões fluidas L1, L2 e L3 ocorre para a fase líquida no intervalo de 320 a 350ºC, porém com maior freqüência entre 330 e 340º C (Figura 3D). Nos casos das inclusões fluidas contendo sólidos de saturação (S1 e S2),
a fase sólida apresenta temperatura de dissolução (Tds) logo após a
temperatura de homogeneização das fases líquida-gasosa (L+G=L), ou
seja, no intervalo entre 345 a 350ºC (Figura 3D).
A salinidade do sistema H2O-NaCl, para as inclusões fluidas bifásicas (L1, L2 e L3),
foi calculada com base na temperatura de fusão do gelo (Tfg),
aplicando-se a equação proposta por Bodnar (1993), onde se obteve um
intervalo de salinidade equivalente de 3,4 a 11,7% em peso de NaCl,
distribuído no seguinte modo: inclusões fluidas L3 entre 3,4 e 6,1%, L1 entre 6 a 10,2% e L2 entre 8,3 e 11,7% em peso de NaCl equivalente. Para as raras inclusões fluidas trifásicas (S1 e S2),
a salinidade foi calculada com base na temperatura de dissolução da
fase sólida (Tds), aplicando-se a equação proposta por Sterner et al.
(1988), onde se obteve uma salinidade equivalente entre 42 e 42,5%
em peso de NaCl. A densidade das inclusões fluidas mais comuns (L1 e L2),
estimada com base no diagrama que relaciona salinidade por
temperatura de homogeneização total (Shepherd et al. 1985), apresenta
um valor entre 0,65 e 0,75 g/cm3.
4. Considerações finais
Em
geral, nos corpos graníticos portadores de pegmatitos com
mineralizações de Sn, W, Nb, e Ta e gemas, os sistemas fluidos são
aquosos a aquo-carbônicos, apresentam baixa a moderada salinidade,
baixa densidade e temperatura mínima de aprisionamento entre 350 e
500ºC (Campbell & Panter, 1990; Linnen & Williams-Jones,
1994; Lu & Lottermoser, 1997). Estudos de inclusões fluidas em
quartzo, topázio, fluorita e cassiterita nos sistemas de veios e
greisens de outros depósitos de Sn e W na região central de Rondônia
demonstram que a temperatura mínima de aprisionamento desses fluidos
varia de 270 a 420ºC (Souza & Botelho, 2002; Leite Júnior, 2002).
No
complexo granítico estanífero de Massangana, o sistema fluido no
topázio, com características gemológicas, é de natureza
essencialmente aquosa (H2O-NaCl). Entretanto esse sistema
apresenta salinidade variando de baixa a alta, ou seja, nas inclusões
fluidas bifásicas (L1, L2 e L3) a salinidade equivalente varia de 3,4 a 11,7% em peso de NaCl, enquanto que nas raras inclusões fluidas trifásicas (S1 e S2)
a salinidade equivalente varia de 42 a 42,5% em peso de NaCl. Essa
variação no valor da salinidade é indicativa da provável mistura de
fluidos de diferentes naturezas (por exemplo, magmático e meteórico)
durante a ascensão do sistema fluido associado às fases Bom Jardim e
São Domingos, modificando desse modo a salinidade dos fluidos mais
primordiais, provavelmente representados pelas inclusões fluidas S1 e S2.
Entretanto o modo de distribuição dos grupos de inclusões fluidas no
interior dos cristais de topázio sugere uma variação nos valores de
salinidade, de temperatura de homogeneização (Th) e de cronologia das
inclusões fluidas, reflexo dos estágios progressivos de crescimento
dos cristais. Nesse sentido, os primeiros grupos de inclusões fluidas
formados apresentam os maiores valores de salinidade e Th (L1, L2, S1 e S2) e ocupam as partes mais centrais dos cristais, ao contrário do grupo de inclusões fluidas pseudo-secundário (L3)
consideradas mais jovens e apresentando valores mais baixos de
salinidade e Th. Todavia, o contraste entre os valores de Th para os
grupos de inclusões fluidas primárias e pseudo-secundárias não é tão
marcante, o que sugere que a temperatura no interior dos corpos
pegmatíticos permaneceu elevada por um considerável período de tempo.
Com
base nos critérios propostos por Van den Kerkhof e Hein (2001), esse
sistema fluido apresenta característica de aprisionamento homogêneo,
pois seu volume Vg varia muito pouco, tanto nas inclusões fluidas
primárias, como nas pseudo-secundárias, o que demonstra também baixa
variação na densidade desse fluido. Logo, a temperatura de
homogeneização total aqui apresentada (Tht = 320 e 350ºC) pode ser
considerada como a temperatura mínima de aprisionamento desse fluido.
Devido à íntima associação nos corpos pegmatíticos do topázio com
cassiterita, wolframita e columbita-tantalita, admite-se que o
intervalo de temperatura entre 320 e 350ºC também corresponderia ao
intervalo mínimo de cristalização desses outros minerais metálicos.
Assim, é provável que o principal intervalo mínimo de temperatura de
precipitação da cassiterita nos depósitos de estanho de Rondônia
oscile na faixa de 300 a 400ºC.
Os
complexos graníticos com estruturas anelares são, normalmente,
alojados em níveis crustais rasos e ao longo de falhamentos
transcrustais (Johson et al., 2002). Segundo Okida (2001), os
Granitos Jovens de Rondônia foram alojados em estruturas de alívio ao
longo de linhas de fraquezas crustais, através da atuação de
movimentos progressivos transpressivos-transtensivos. Considerando
que os corpos pegmatíticos portadores de minerais de Sn, W, Nb, e Ta e
gemas no complexo granítico estanífero de Massangana estão
associados às últimas fases magmáticas (Bom Jardim e São Domingos), é
provável que a profundidade de posicionamento desses corpos seja
inferior a 3 km e a uma pressão estimada na ordem de 1 a 1,5kbar.
Piroeletricidade e emissão de infravermelho distante da turmalina
RESUMO
Um
modelo tridimensional de computador de esferas rígidas da estrutura
cristalina da turmalina revela que oscilações anarmônicas são
impostas ao sítio W, o que, teoricamente, pode explicar a sua
piroeletricidade e a emissão de infravermelho distante. Entretanto
esses efeitos devem ser pequenos. Medidas das suas grandezas são
necessárias para explicação do uso industrial do pó de turmalina.
Palavras-chave: turmalina, estrutura cristalina, piroeletricidade, emissão de infravermelho distante.
ABSTRACT
A
three dimensional rigid ball computer model of the tourmaline
crystal structure shows that anharmonic oscillations are imposed to
the W site. This can theoretically explain both the pyroelectricity and
the far infrared emission of tourmaline. Nevertheless, these effects
should be small. Measurements of their magnitudes are necessary to
explain the industrial use of tourmaline powder.
Keywords: tourmaline, crystal structure, pyroelectricity, far infrared emission.
1. Introdução
Nos
últimos anos, tem crescido o interesse industrial pelo pó de
turmalina preta (série schorlita-dravita). Produtos para tratamento
de água, purificação de ar, cosméticos, argamassas, agricultura,
tintas e roupas têm sido lançados no mercado. Observa-se um crescente
número de pedidos de patente para usos industriais da turmalina.
Porém há pouca literatura científica para fundamentar esses usos. Em
geral, a piroeletricidade ou a emissão de infravermelho distante da
turmalina tem sido utilizada para justificar o seu uso nos diversos
produtos, através de textos com objetivos de divulgação comercial e
dirigido para o público leigo.
A
piroeletricidade da turmalina é uma propriedade conhecida e
relativamente bem documentada na literatura científica, embora
existam poucas referências sobre as suas causas. (Donnay, 1977)
atribuiu a piroeletricidade da turmalina a vibrações anarmônicas do
oxigênio no sítio W (descrito na próxima seção), ao observar que a
sua posição média se move 0,005 Å entre 193 e 293 K, sendo o único
átomo com deslocamento acima da incerteza experimental. Não se
encontram, na literatura científica internacional, trabalhos sobre as
causas da emissão de infravermelho distante ou mesmo se ela, de
fato, existe na turmalina.
Nesse
trabalho, a estrutura cristalina da turmalina está apresentada em
detalhes, através do modelo de esferas rígidas, e correlacionada com a
piroeletricidade e emissão de infravermelho distante, tanto do ponto
de vista da mecânica clássica, quanto quântica. Espera-se dar uma
contribuição para a elucidação dos fundamentos científicos para o uso
industrial do pó de turmalina.
2. A estrutura cristalina da turmalina
A fórmula estrutural da turmalina é XY3Z6(T6O18)(BO3)3V3W.
A sua estrutura cristalina é trigonal, do grupo espacial R3m. É
caracterizada por anéis de seis tetraedros (sítios T), cujos oxigênios
do ápice apontam para a direção do eixo c. Os sítios tetraédricos T
são ocupados por silício. Ocasionalmente o silício pode ser
substituído por alumínio ou boro [Hawthorne, MacDonald, Burns,1993 e
Tagg, Cho, Dyar et alii.,1999 ]. Grupos triangulares de BO3,
paralelos ao plano (0001), se alternam acima e abaixo dos
tetraedros. A maioria dos estudos cristalográficos indica que há
quantidades estequiométricas de boro nesse sítio [Hawthorne,1996 e
Bloodaxe, Hughes, Dyar, et alii., 1999]. Os anéis planares de tetraedros
são ligados por dois tipos de octaedros, Z e Y, que dividem lados
entre si. O octaedro Z é distorcido e ocupado por cátions
trivalentes, como Al3+, Cr3+ e V3+, mas pode conter quantidades significativas de cátions bivalentes, como Mg2+ ou Fe2+.
Os cátions do sítio Z servem como ligação entre os elementos
estruturais com simetria de 120º em relação ao eixo c. O sítio Y é um
octaedro relativamente regular, ocupado por vários cátions
multivalentes, como Li1+, Mg2+, Fe2+, Mn2+, Al3+, Cr3+, V3+, Fe3+ e Ti4+.
Estudos mais refinados mostram que todos ou quase todos os sítios Y
estão ocupados [Hawthorne, MacDonald, Burns,1993, MacDonald,
Hawthorne, Grice, 1993 e Taylor, Cooper, Hawthorne, 1995]. O sítio X é
um antiprisma trigonal de coordenação nove, localizado ao longo do
eixo c. É comumente ocupado por sódio, cálcio ou potássio em menores
quantidades ou, ainda, pode estar desocupado. Há 31 ânions na
fórmula, localizados em 8 sítios distintos, O(1) até O(8) [Donnay,
Buerger, 1950]. Os sítios O(2) e O(4) a O(8) são ocupados,
exclusivamente, por O2-. O sítio O(1), denominado de sítio
W, na fórmula estrutural, está localizado ao longo do eixo c,
central ao pseudo-anel hexagonal de tetraedros e pode conter OH1-, O2- ou F1-. Se O2-
for dominante nesse sítio, é necessário existir uma ordenação de
curto alcance nos sítios Y e Z, tal que eles são, respectivamente,
ocupados por alumínio e magnésio [Hawthorne, Henry, 1999]. Os três
sítios O(3), denominados de sítio V, geralmente contêm OH1-, mas, também, podem conter quantidades significativas de O2-. O sítio W é único porque F1- só ocupa esse sítio e O2- também tende a ocupá-lo em relação a OH1- [Grice, Ercit, 1993, MacDonald, Hawthorne, 1995].
Para
apresentação das características mais detalhadas da estrutura
cristalina das turmalinas, tomou-se, por base, a shorlita, cuja
fórmula química é NaFe3Al6(Si6O18)(BO3)3(OH)3 OH. A Figura 1
apresenta essa estrutura no modelo de esferas rígidas, construído
com os dados para as distâncias atômicas da WWW-MINCRYST -
Crystallographic Database for Minerals (Card N. 4131) [Annon], com
auxílio do programa Carrara Studio 3.0. Os raios iônicos e
cristalinos foram tomados de (Shannon,1976).

Os silicatos, SiO4-,
que formam hexágonos, são tetraedros quase regulares. As distâncias
do silício para os oxigênios são: Si-O4 = 1,63 Å; Si-O5 = 1,64 Å;
Si-O6 = 1,60 Å e Si-O7 = 1,61 Å. O4, O5 têm multiplicidade 3 e O6 e
O7 têm multiplicidade 6. O6 é o oxigênio do ápice de cada tetraedro.
Os O7 estão fortemente ligados aos seus pares dos hexágonos
adjacentes, com distância de ligação O7-O7 de 1,38 Å. Esse fato se
reflete no espectro de absorção do infravermelho, que apresenta três
picos distintos para as ligações Si-O, de 900 a 1200 cm-1 (vide Figura 2).

Os BO3
são triângulos bem regulares, perpendiculares ao eixo c, formados
por O2, O8 e O8, todos dentro da mesma célula unitária, com o boro no
centro. As distâncias entre os oxigênios e o boro são: B-O2 = 1,37
Å, B-O8 = 1,38 Å, B-O8 = 1,38 Å. O2 é o oxigênio mais próximo do
eixo c. Esses triângulos têm simetria de 120º em relação ao eixo c.
Eles se encontram em um plano diferente dos tetraedros do silicato,
distanciados 3,26 Å destes ao longo do eixo c. O boro exerce um papel
importante na ligação entre as camadas de átomos ao longo do eixo c e
na ligação com o alumínio da célula unitária adjacente. As ligações
B-O são responsáveis pelo pico de absorção em torno de 1.250 cm-1 no espectro do infravermelho da turmalina.
O
alumínio está ligado a 4 átomos da célula unitária à qual pertence
(O6, O7, O8 e OH3) e a 2 átomos da célula unitária adjacente (O7 e
O8). As distâncias entre o alumínio e seus vizinhos são as seguintes:
dentro da mesma célula unitária, Al-O6 = 1,88 Å, Al-O7 = 3,41 Å,
Al-O8 = 1,93 Å e Al-OH3 = 1,98 Å; dentro da célula unitária
adjacente, Al-O7 = 3,59 Å e Al-O8 = 1,91 Å. Trata-se de um octaedro
bastante distorcido. Devido à distância das ligações com os
oxigênios, vê-se que as ligações com os anéis hexagonais de silicatos
(Si-O7) têm caráter iônico e devem ser fracas. Entretanto a ligação
com os O8, tanto da célula à qual pertence, quanto da célula
adjacente, tem quase a mesma distância. Vê-se que o alumínio exerce o
seu papel na ligação entre células adjacentes no plano perpendicular
ao eixo c através da ligação Si-O8. As absorções em torno de 700 cm-1 no espectro do infravermelho são atribuídas à ligação Al-O.
O
ferro também ocupa um octaedro. Porém ele se liga somente a átomos
da célula unitária à qual pertence. Esses átomos e as respectivas
distâncias do ferro são: Fe-O2 = 2,01 Å, Fe-O2 = 2,01 Å, Fe-O6 = 2,05
Å, Fe-O6 = 2,16 Å, Fe-OH1 = 2,07 Å, Fe-OH3 = 2,17 Å. Trata-se de
um octaedro quase regular. O ferro é importante para a ligação entre
as camadas de átomos ao longo do eixo c.
O
sódio e o OH1 se alternam ao longo do eixo c. A distância entre eles
é 4,03 Å dentro de uma célula unitária. Porém a distância do OH1
para o sódio, na célula unitária adjacente, é 3,16 Å. Essa
distribuição não uniforme de cargas positivas e negativas ao longo do
eixo c traz conseqüências para as propriedades elétricas da
turmalina. A Figura 3
apresenta a distribuição de sódio e OH1 ao longo do eixo c. Os
átomos de ferro também estão mostrados. Vê-se que eles impõem uma
restrição aos movimentos do OH1 ao longo do eixo c, que tem mais
liberdade para se aproximar do sódio da célula unitária vizinha. Com o
aumento das vibrações térmicas, espera-se que a distância entre
sódio e OH1, dentro de uma célula unitária, tenda a aumentar,
enquanto que a distância entre o sódio e o OH1 de células unitárias
adjacentes ao longo do eixo c tenda a diminuir.

Há
quatro hidroxilas na fórmula da turmalina. Uma delas, denominada
OH1, ocupa o sítio W e se encontra no eixo c, como visto
anteriormente. As outras três hidroxilas, denominadas OH3, ocupam o
sítio V e formam um triângulo em torno do eixo c. Elas fazem parte,
simultaneamente, dos octaedros do ferro e do alumínio. Na Figura 2, os picos entre 3500 e 3600 cm-1 são atribuídos às OH3 e os picos entre 3620 e 3700 cm-1 às OH1.
3. A piroeletricidade na turmalina
Em
um meio dielétrico anisotrópico (monocristal), a relação linear
entre a indução (D) e a intensidade do campo elétrico (E) é [Landau e
Lifshitz,1971]:
onde
é um vetor constante. O conjunto das grandezas eik
forma um tensor de segunda ordem - tensor de permeabilidade
dielétrica (ou tensor dielétrico). A maioria dos tipos de simetria
cristalina não admite a presença de um vetor constante. A presença
desse termo significa que o dielétrico está espontaneamente
polarizado, mesmo na ausência de um campo elétrico exterior. Esses
corpos são chamados piroelétricos. Entretanto a grandeza dessa
polarização é sempre muito pequena em relação aos campos moleculares.
Se ela fosse grande, levaria ao aparecimento de intensos campos
dentro do cristal, o que não é favorável do ponto de vista energético
e, assim, não corresponderia ao equilíbrio termodinâmico.
O
efeito piroelétrico só é possível para algumas simetrias de
cristais. Como para qualquer transformação de simetria as
propriedades do cristal não devem se modificar, é evidente que
somente cristais com uma direção invariável sob todas as
transformações de simetria podem ser piroelétricos. É nessa direção
que estará apontando o vetor constante
.
Apenas os grupos de simetria com um só eixo e dois planos de
simetria que passam por esse eixo satisfazem essa condição, que é o
caso do grupo espacial da turmalina, R3m.
Em
condições ordinárias, os cristais piroelétricos não possuem momento
dipolar elétrico total, embora a polarização dentro desses cristais
não seja nula. Isso se dá porque, em um dielétrico polarizado
espontaneamente, o campo
é diferente de zero. Como a condutividade elétrica da amostra, mesmo
pequena, não é nula, a presença desse campo produz uma corrente
elétrica que pode existir até que a aparição de cargas livres na
superfície do corpo conduz ao desaparecimento do campo dentro da
amostra. Os íons do ar se depositam sobre a superfície da amostra,
favorecendo esse efeito. Podem-se observar as propriedades piroelétricas
através de aquecimento dos corpos, quando o valor da sua polarização
espontânea se altera e se observa essa variação.
No caso da turmalina, o vetor
só pode apontar na direção do eixo c, onde se encontram as hidroxilas OH1 e o sódio (vide Figura 2),
respectivamente, posições X e W. As vibrações anarmônicas impostas
ao sítio W pelos cátions nos sítiosY fazem com que o campo elétrico
espontâneo, em torno de uma partícula de turmalina, tenda a crescer
com a temperatura. Provavelmente seja essa a explicação para a
piroeletricidade da turmalina. Note que, com as vibrações anarmônicas
provocada pelo aumento da temperatura, a distância entre os sítios X
e W tende a crescer dentro de uma célula unitária e a diminuir entre
células unitárias adjacentes. Um cálculo de campo eletrostático
demonstra que, quanto maior a diferença entre as distâncias dos
sítios X e W, ao longo do eixo c, maior será o campo elétrico
espontâneo da turmalina. Como já visto, Donnay G [1] observou
vibrações anarmônicas no sítio W.
4. A emissão de infravermelho distante na turmalina
A teoria clássica para oscilações dos sistemas com vários graus de
liberdade [Landau e Lishitz, 1971], no caso das vibrações
anarmônicas, prevê que, às freqüências das oscilações normais
próprias do sistema, de freqüência wa ..., wb, se superpõem oscilações suplementares, de freqüência wa ± wb
(entre elas as freqüências duplicadas e a freqüência nula, esta
última correspondente a uma elongação constante). Ora, o espectro do
infravermelho da turmalina revela oscilações da hidroxila OH1, no
sítio W, entre 3628 e 3700 cm-1. Isso nos dá uma estimativa para wa - wb de aproximadamente 2.1012 s-1,
com comprimento de onda de cerca de 0,1 mm, na faixa limite entre o
infravermelho distante e as microondas, ou seja, pela mecânica
clássica, espera-se de fato uma emissão pelos cristais de turmalina
de ondas eletromagnéticas de freqüência da ordem de 2.103
GHz. Entretanto esse é um fenômeno de segunda ordem e deve ser de
pequena intensidade. São necessárias medidas experimentais para se
estimar a sua grandeza, de tal forma a justificar o seu emprego
industrial.
Pela
mecânica quântica, a solução da equação de Schrödinger para um
oscilador anarmônico deve ser feita com auxílio da teoria das
perturbações. Nesse caso, os níveis de energia para esse oscilador
são [Landau e Lifshitz,1971]:
Para um oscilador harmônico, as diferenças entre os níveis de energia será sempre um múltiplo inteiro de hw. Porém, para um oscilador anarmônico, essa expressão mostra que, na medida em que n cresce, as transições entre os níveis energéticos se tornam menores, desde que b < 2a2/(3mw2), ou seja, um oscilador anarmônico terá transições de energia do tipo fn,n-1.hw, onde 0 < fn,n-1 < 1 e é decrescente com o aumento de n.
Ele deve apresentar um espectro de freqüências que incluirá, desde a
freqüência nula até freqüências próximas das suas oscilações
normais. Esperam-se, portanto, emissões de infravermelho distante na
turmalina, devido às oscilações anarmônicas no sítio W. Porém a
intensidade dessas emissões deve ser pequena, porque as emissões
estão distribuídas por todo o espectro eletromagnético com
freqüências menores que as oscilações normais e os valores de a e b, devem ser pequenos. Da mesma forma, medidas experimentais são necessárias para estimativa da grandeza dessas emissões.
5. Conclusão
A
construção de um detalhado modelo de esferas rígidas para a
estrutura cristalina da turmalina revela que os sítios X e W estão,
ao longo do eixo c, mais próximos entre si, quando estão em células
unitárias adjacentes do que quando estão dentro da mesma célula
unitária. Os cátions nas posições Y impõem oscilações anarmônicas
ao sítio W, o que faz com que essa diferença entre os espaçamentos se
torne ainda mais pronunciada com o aumento da temperatura. Isso
explica, teoricamente, a piroeletricidade da turmalina e a emissão de
infravermelho distante. Porém, esses são fenômenos de segunda ordem.
Medidas são necessárias para verificar se as grandezas desses
fenômenos podem explicar os usos industrias do pó de turmalina.
Rubi e safiras de Minas Gerais, Brasil
RESUMO
Rubis
e safiras de quatro depósitos em Minas Gerais, denominados Sapucaia,
Indaiá e Palmeiras, na região de Caratinga-Manhuaçu, e Malacacheta,
mais ao norte, foram caracterizados em termos geológicos,
gemológicos, químicos e espectroscópicos, com o objetivo de
interpretar causas de cor, gênese, bem como analisar o potencial
econômico dos depósitos. Resultados de análises químicas e
espectroscopia UV-visível mostram que a provável causa da cor azul é
transferência de cargas entre Fe2+ e Ti4+, enquanto Cr3+
causa tonalidades violeta e púrpura, efeito alexandrita e
fluorescência. A ausência de Ce e La e o teor relativamente mais alto
de Ga distinguem as amostras de Malacacheta das demais. Além de
sugerir particularidades genéticas, a diferença em termos de
elementos-traços, pode ser utilizada como indicador de proveniência
das gemas. Inclusões de um polimorfo de Al2SiO5
e indícios de campo sugerem que o coríndon deve ter sido gerado por
processos metamórficos regionais, o que expande as possibilidades
para a descoberta de novas ocorrências de rubi e safiras nos terrenos
de alto grau metamórfico do leste de Minas Gerais.
Palavras-chave: Coríndon, rubi, safira, Minas Gerais, elementos traços, gemologia.
ABSTRACT
Rubies
and sapphires from four deposits in Minas Gerais named Sapucaia,
Indaiá and Palmeiras, in the region of Caratinga-Manhuaçu, and
Malacacheta, farther north, were characterized in terms of geology,
gemology, chemistry and spectroscopy in order to interpret causes of
color and genesis. The economical potential of the deposits was also
analyzed. Chemical analyses and UV-visible spectroscopy reveal that
the probable cause of the blue color is a charge transfer between Fe2+ e Ti4+, while Cr3+
causes violet and purplish tints, alexandrite effect and
fluorescence. Absence of Ce and La and relatively higher Ga-contents
distinguish the Malacacheta samples from the others. Besides
suggesting genetic particularities, the difference in terms of trace
elements might be used as a provenience indicator for the gems.
Inclusions of an Al2SiO5 polimorph and field
evidences suggest that the origin of corundum might be due to
regional metamorphic processes, thus expanding the possibilities for the
discovery of new occurrences of ruby and sapphires in the high grade
metamorphic terrain in eastern Minas Gerais.
Keywords: Corundum, ruby, sapphire, Minas Gerais, trace-elements, gemology.
1. Introdução
Nos
últimos anos, novas ocorrências de coríndon surgiram em Minas
Gerais, conhecido produtor de gemas coradas e diamante. Os depósitos
de Palmeiras, Indaiá, Sapucaia e Malacacheta produzem safiras azuis,
com tons violeta ou púrpura e rubi de tamanhos pequenos, mas com boa
intensidade de cor e transparência. Indaiá é um depósito já conhecido
(Epstein et al. 1994; Liccardo, 1999) e que teve sua produção
interrompida em 1996, mas que, esporadicamente, apresenta alguma
produção por garimpeiros. Do mesmo modo que em Indaiá, Palmeiras e
Sapucaia, descobertas recentes na mesma região, apresentam um bom
potencial gemológico, com gemas de tonalidades variando do azul ao
púrpura, às vezes com efeito alexandrita, eventualmente com presença
de rubi (Liccardo e Jordt-Evangelista, 2001). O depósito de
Malacacheta, conhecido há várias décadas como produtor de
alexandrita, sempre produziu safiras azuis como subproduto nas
minerações. Atualmente tais safiras estão sendo comercializadas como
material lapidável e sendo tratadas termicamente em Bangkok. Esse
artigo reporta características desses depósitos e suas gemas, assim
como mais informações sobre as já conhecidas safiras de Indaiá.
2. Histórico
A
presença de coríndon no Brasil tem sido mencionada há muito tempo em
literatura (Hussak, 1916; Guimarães, 1934), sem que existisse, no
entanto, uma produção de material com qualidade-gema. A primeira
menção de safiras azuis com qualidade para lapidação foi em Coxim,
Mato Grosso do Sul (Eppler, 1964). Nesses depósitos, a safira é
encontrada como mineral satélite em cascalhos produtores de diamante e
nunca houve produção constante, sendo que algumas pedras são
esporadicamente comercializadas.
Em
Malacacheta, pequenos cristais de safira azul e incolor/leitosa
foram retirados juntamente com crisoberilo e alexandrita durante
anos, desde a década de 80, contudo com pouca produção comercial.
A
descoberta dos depósitos de Indaiá no início da década de 90 foi a
mais promissora até então, tendo sido descrita por Themelis (1994)
como a primeira ocorrência comercial de coríndon no Brasil. Em 1999,
iniciou-se uma pequena produção em Sapucaia, cerca de 25km ao sul de
Indaiá, com gemas muito semelhantes, inclusive com moderado efeito
alexandrita (Liccardo & Jordt-Evangelista, 2000). Em 2000, surgiram
notícias sobre o depósito de Palmeiras, cerca de 60km a sudeste de
Sapucaia, com gemas semelhantes aos depósitos anteriores, mas com
tons predominantemente mais avermelhados. A falta de tradição na
exploração de rubi e safira, em meio a tantas outras gemas no Estado
de Minas Gerais, faz com que os garimpeiros que atuam nos pegmatitos
da região concentrem-se na extração de outras gemas, principalmente
água-marinha e, em Malacacheta, alexandrita e crisoberilo.
3. Localização e acessos
Três dessas ocorrências situam-se no eixo Manhuaçu-Caratinga, cerca de 250km a leste de Belo Horizonte (Figura 1).
A ocorrência de Indaiá pertence ao município de Vargem Alegre,
aproximadamente a 20km a noroeste de Caratinga, a montante do Córrego
São Gabriel.No município de Sapucaia, cerca de 25km a sudoeste de
Caratinga, nas cabeceiras do córrego Ferrugem, encontra-se a segunda
ocorrência. O depósito de Palmeiras situa-se no município de
Manhuaçu, no distrito de mesmo nome, 12km a noroeste da cidade.
Nessas ocorrências, o acesso, em parte, é feito por estradas de
terra, que, na estação das chuvas (setembro a janeiro), tornam-se
dificilmente transitáveis.
Os
depósitos de Malacacheta situam-se às margens do córrego do Fogo e
ribeirão Soturno, a aproxidamente 12km a norte da cidade de
Malacacheta. O acesso a essa região é um pouco melhor que os das
anteriores, mesmo na estação de chuvas. Malacacheta está cerca de
270km da região de Indaiá, Palmeiras e Sapucaia.
4. Contexto geológico regional
O
coríndon da região de Manhuaçu-Caratinga se encontra em depósitos
secundários sobre terrenos gnáissicos-migmatíticos, com presença
eventual de litotipos granulíticos e charnoquíticos, além de inúmeros
corpos pegmatíticos que entrecortam todas as rochas (Figura 2). Os terrenos fazem parte do núcleo do Orógeno Neoproterozóico Araçuaí (Pedrosa-Soares & Wiedemann-Leonardos, 2000).
Em
Malacacheta, os depósitos também são colúvio-aluvionares encaixados
em rochas metamórficas pré-cambrianas. Regionalmente, o contexto
geológico mostra a existência de um batólito granítico intrudido em
xistos peraluminosos das Formações Salinas e Capelinha e rochas
metaultramáficas que cortam os xistos da Formação Capelinha (Figura 2).
O corpo granítico, sem indícios de metamorfismo, foi datado em 537±8
Ma (Basílio, 1999) e as rochas encaixantes são de idade
proterozóica.
5. Características dos depósitos
Na
faixa que compreende os depósitos de coríndon, ocorrem litologias
pertencentes a terrenos metamórficos de médio até alto grau, como
xistos, gnaisses, granulitos e charnoquitos. Esses terrenos são
cortados por corpos pegmatíticos pouco diferenciados, por vezes
mineralizados em água-marinha. O coríndon é sempre encontrado em
depósitos sedimentares recentes, sem indícios da possível rocha que o
originou.
Os
depósitos podem abranger cinco tipos gerais: aluviões recentes,
paleoaluviões de terraço suspenso, paleoaluviões de fundo de vale,
colúvios e elúvios. A grande maioria dos depósitos de coríndon está
associada a paleoaluviões plio-pleistocênicos, formados sob condições
de fluxos torrenciais e retrabalhamento (Addad, 2001). Os depósitos
ocupam atualmente as partes mais profundas dos preenchimentos
sedimentares de vales, onde armadilhas de relevo condicionaram sua
deposição, ou terraços aluvionares suspensos, relacionados ao
desenvolvimento de paleosuperfícies. A alta densidade do coríndon faz
com que esteja associado a pesados blocos de quartzo e fragmentos de
encaixantes, nas porções mais inferiores.
Nesse
contexto secundário, o retrabalhamento sedimentar fragmenta e
"seleciona" os clastos e os concentra em níveis e pláceres. Do ponto
de vista do seu aproveitamento gemológico, essa seleção fornece
fragmentos com menor quantidade de defeitos de cristalização, de
fraturas e inclusões, que correspondem a partes com maior resistência
mecânica a impactos e abrasão. Isto significa que, a partir de uma
população original de fragmentos, existe uma tendência segundo a
qual, após o transporte por uma determinada distância dentro de um
fluxo sedimentar, os clastos recuperados apresentam uma maior
porcentagem de qualidade gema, pela eliminação de fragmentos
mecanicamente mais frágeis.
6. Métodos de extração
Os
depósitos de coríndon, usualmente inconsolidados, mostram uma
relativa facilidade mecânica de explotação. Camadas de sedimentos
cobrem os níveis mineralizados, geralmente cascalheiras aluvionares
ou porções grosseiras de colúvios. O descapeamento não oferece
maiores dificuldades técnicas, salvo quando se trata de aluviões
recentes ou paleoaluviões posicionados sob leitos ativos de cursos de
água, quando é necessário o bombeamento da água infiltrada ou o
isolamento da porção a ser trabalhada. As gemas podem, então, ser
separadas por processos que envolvem classificação granulométrica,
lavagem e concentração-catação.
Em Indaiá, após o rush
da extração, em meados de 90 (Epstein et al. 1994), os garimpos
paralisaram os trabalhos e hoje a extração é realizada
individualmente nos leitos dos rios. O mesmo acontece em Sapucaia,
que ao final da década era trabalhada com tratores e calhas para a
concentração do material. Na área de Palmeiras, somente garimpos em
aluvião estão produzindo, apesar de tentativas de mecanização. A
extração organizada tem esbarrado em problemas ambientais e, por
isso, está paralisada.
Em
Malacacheta, as áreas de extração (cerca de 4x4m) são escoradas
com madeira para contenção de terra e a água é bombeada continuamente
com motores movidos a diesel ou gás. Equipes de até cinco pessoas
trabalham em cada área, retirando o material mineralizado e buscando,
principalmente, a alexandrita, que ocorre associada.
7. Amostras e análises
Amostras
de coríndon, juntamente com seus minerais satélites, foram coletadas
com lavagem de cascalho e peneiramento. A quantidade de material em
bruto permitiu análises destrutivas e algumas amostras coletadas
puderam inclusive ser lapidadas. Em Palmeiras, foram obtidas 16 gemas
facetadas e 18 cabochões; em Sapucaia, 6 facetadas e 4 cabochões; em
Malacacheta, 4 facetadas e, em Indaiá, 5 facetadas.
As
amostras das quatro ocorrências foram submetidas a análises
gemológicas tradicionais e, ainda, cinco exemplares de cada depósito
foram moídos para análises químicas por INAA (Análise por Ativação
Neutrônica Instrumental) e uma por ICP-OES (Plasma Indutivamente
Acoplado com Espectrometria de Emissão Óptica), para complementação
de alguns elementos. Além disso, foram realizadas análises em
espectroscopia UV-Visível, ATD/ATG (Análises Termodiferencial e
Termogravimétrica) e MEV/EDS (Microscopia Eletrônica de Varredura com
Espectrometria de Energia Dispersa). As amostras submetidas à
espectroscopia foram preparadas em secções cortadas
perpendicularmente ao eixo c dos cristais. Os testes
termodiferencial e termogravimétrico realizados em um mineral anidro
(coríndon) resultam na identificação de fases hidratadas associadas a
esse mineral, como a bohemita e o diásporo.
8. Características e resultados
8.1 Malacacheta
A
safira de Malacacheta ocorre em cristais euédricos transparentes, no
formato típico de barrilete e tamanho normalmente pequeno (<1cm).
A maior parte apresenta um marcante zonamento de cor, sendo incolor
com um núcleo ou mancha de coloração azul intenso, boa transparência,
tendendo a translúcida, principalmente na parte incolor. O
pleocroísmo nas amostras azuis costuma ser moderado, de azul-escuro a
azul-claro. Fotografias representativas de amostras de Malacacheta
encontram-se nas Figuras 3 e 4.
Análises gemológicas convencionais resultaram num índice de refração
variando de 1,759 a 1,764 para o raio extraordinário e 1,767 a 1,770
para o raio ordinário. A birrefringência média é de 0,009 (Tabela 1).
Sob luz UV essas safiras mostram resposta moderada a fraca, de tons
avermelhados para todas as amostras azuis, tanto em SW como em LW. Uma
amostra incolor a levemente rosada apresentou reação muito forte ao
UV de ondas longas (LW).
As
inclusões sólidas identificadas em microscópio óptico e microscópio
eletrônico de varredura foram ilmenita, ilmenita magnesiana e um
polimorfo de Al2SiO5. O comportamento, na
análise termogravimétrica, indica ausência de diásporo ou boehmita,
comumente presentes em coríndon e causadores de perda de
transparência.
As
análises químicas resultaram, para as amostras de Malacacheta, na
seguinte composição em elementos menores e traços: Cr 20 a 58ppm, Fe
3582 a 4415ppm; Ga 180 a 192ppm; Ti 392ppm; Na 69-90ppm; Mn 13ppm; La
0 a 3ppm e V 18ppm (Tabela 2
- para o Ti, Mn e V somente uma análise). A presença desses
elementos indica que, muito provavelmente, a coloração azul das
safiras de Malacacheta tenha como causa uma transferência de cargas
eletrônicas entre os íons Fe+2 e o Ti+4.
Considerando-se esses teores de Fe e Ti e as características ópticas
da safira, é possível que um tratamento térmico sob condições
adequadas possa redistribuir a coloração azul ou mesmo transformar a
cor branca leitosa em azul profundo na maior parte do material produzido
em Malacacheta. Os espectros UV-Visível mostraram picos intensos nas
regiões de 485 e 585nm, possivelmente associados à presença de Fe3+ (Figura 6).
8.2 Indaiá
Safiras de colorações que variam de azul profundo ao violeta, quase púrpura (Figuras 3 e 4),
são encontradas em depósitos coluvionares e aluvionares de Indaiá.
Os cristais apresentam-se anédricos, geralmente de tamanho pequeno
(<1cm) e alguns mostram um moderado efeito alexandrita de azul
para azul-púrpura e de púrpura para púrpura-violeta.
As
análises gemológicas mostraram um pleocroísmo forte de azul para
azulvioleta e de azul-claro para púrpura. Os índices de refração
variam de 1,760 a 1762 para o raio extraordinário e 1,770 para o raio
ordinário, com birrefringência variando de 0,008 a 0,010. Sob luz UV
de ondas longas (LW), as amostras apresentam fluorescência variável
de moderada a forte com coloração avermelhada (Tabela 1).
As inclusões são constituídas de rutilo, ilmenita, zircão, moscovita, monazita (Figura 5), espinélio, biotita (Figura 5) e um dos polimorfos de Al2SiO5.
Análises
químicas e espectroscópicas mostraram a presença de Fe, Ti e Cr
como prováveis elementos causadores de cor nessas safiras. O efeito
de mudança de cor (efeito alexandrita) e a forte fluorescência são
associados à presença do íon Cr3+. Os elementos menores e
traços quantificados foram: Cr 191 a 390ppm, Fe 2626 a 3615ppm; Ga 60
a 93ppm; Ti 185ppm; Na 57-78ppm; Mn 13 ppm; La 19 a 81ppm; Ce 66 a
159ppm e V 44ppm (Tabela 2 - para o Ti, Mn e V somente uma análise).
Em
termos de cor e transparência, as safiras mostram um bom potencial
para aproveitamento gemológico, o qual pode ser sensivelmente
aumentado com tratamento térmico adequado. Themelis (1994) sugere que
80% do material produzido nessa localidade se prestaria ao
tratamento por aquecimento, com base em testes que realizou em
atmosfera oxidante e temperatura em torno de 1750ºC.
Os
espectros referentes às amostras de Indaiá são muito semelhantes aos
obtidos em Palmeiras e Sapucaia, mostrando uma banda de absorção
entre 370 e 420nm, que, em safiras azuis do Sri Lanka, Mianmar,
Vietnam e outras (Smith et al., 1995), é associada à presença de Fe3+. A faixa entre 500 e 600nm, região indicativa do mecanismo Fe2+ - Ti4+ e da presença de Cr3+, apresenta-se na forma de bandas largas e suaves (Figura 6).
8.3 Sapucaia
A
safira de Sapucaia ocorre em cristais euédricos, subédricos e
fragmentos irregulares, nas cores azul, púrpura, violeta e preta (Figuras 3 e 4).
Apresenta-se em prismas hexagonais alongados e, muitas vezes,
terminados em bipirâmide, sendo a superfície externa dos cristais
normalmente lisa e freqüentemente recoberta por muscovita
microcristalina. A maior parte dos cristais mostra dimensões em torno
de 1cm, variando desde alguns milímetros até 8cm de comprimento (o
maior exemplar encontrado).
Os
cristais exibem pronunciada partição basal e romboédrica nos planos
de geminação polissintética. Em termos de diafaneidade, são opacos
até transparentes e parte pode ser aproveitada como gema, apesar das
abundantes fraturas. Nos exemplares translúcidos e transparentes,
foi verificada uma distribuição irregular da cor, além de inclusões
opacas. Como efeitos ópticos especiais, foram observados o efeito
alexandrita (safiras azuis em luz natural tornam-se violetas sob
iluminação incandescente), o efeito seda (brilho prateado sedoso) e,
nas safiras pretas, ocorre, ainda, o asterismo com a formação de
estrela de seis pontas.
As
análises gemológicas mostraram pleocroísmo moderado a acentuado nas
amostras azuis, púrpura e violeta. Os índices de refração variam
de 1,759-1,762, para o raio extraordinário, e 1,768-1,770, para o
raio ordinário, com birrefringência média de 0,009 (Tabela 1).
Sob iluminação ultravioleta de ondas curtas (SW), as safiras
mostraram uma reação fraca a moderada (violeta); em ondas longas, as
amostras, nas cores violeta e púrpura, apresentaram reação de
fluorescência muito forte (vermelha) e, nas outras cores, reação
moderada (violeta).
As principais inclusões identificadas foram mica castanha (Figura 5), rutilo, ilmenita e um polimorfo de Al2SiO5,
além da constatação de diásporo nos planos de geminação
polissintética, muito semelhante ao material de Indaiá. As análises
químicas mostraram os seguintes teores dos elementos menores e
traços: Cr 54 a 1092ppm, Fe 4603 a 9312ppm; Ga 94 a 293ppm; Ti
361ppm; Na 58 a 169ppm; Mn 18 ppm; La 3 a 206ppm; Ce 21 a 300ppm e V
62ppm (Tabela 2 - para o Ti, Mn e V somente uma análise).
Os
estudos dessas safiras apontam boas possibilidades de aproveitamento
gemológico, à semelhança da safira de Indaiá, principalmente em
relação às de cor azul e violeta e com efeitos ópticos especiais.
Possivelmente, esse aproveitamento poderá ser aumentado se essas
safiras forem tratadas termicamente. Os espectros UV-Visível são
semelhantes aos de Indaiá, com banda de absorção mais abrupta em
torno de 370nm e uma banda suave entre 520 e 580nm, provavelmente
relacionadas ao mecanismo de cor Fe2+ - Ti4+ (Figura 6).
8.4 Palmeiras
Os
cristais encontrados em Palmeiras são euédricos, de coloração
predominantemente avermelhada (rubi ou safira rosa), em menor escala
também violeta ou púrpura e, raramente, azul, com hábito prismático
alongado e em "barrilete", com tamanho variando de 0,5 a 4cm (Figuras 3 e 4).
Alguns exemplares pequenos também mostraram o efeito alexandrita,
semelhante a Indaiá e Sapucaia, mas o efeito óptico especial, que
predomina nessas amostras, é o efeito seda e, esporadicamente, alguns
rubis apresentam discreto asterismo. Uma parte dos cristais
apresenta-se transparente, porém a maioria varia de opaca a
translúcida.
Amostras
de coloração vermelha e rosa apresentam pleocroísmo moderado para
tons mais escuros e os cristais azuis e violeta possuem pleocroísmo
fraco. Os índices de refração variam de 1,761 a 1,763, para o raio
extraordinário, e 1,769 a 1,771. para o raio ordinário. A variação da
birrefringência é de 0,008 a 0,010. Sob luz ultravioleta de ondas
curtas (SW), a reação foi muito fraca e, em ondas longas (LW), as
amostras de cores vermelha e rosa mostraram fluorescência muito forte
(Tabela 1).
Como inclusões sólidas ocorrem zircão, rutilo (arredondado e acicular), apatita, ilmenita, hematita, monazita e mica (Figura 5). Também, nessas amostras, o diásporo encontra-se nos planos de geminação polissintética.
Os
teores dos elementos menores e traços são: Cr 596 a 1293ppm, Fe 2022
a 3733ppm; Ga 71 a 114ppm; Ti 172ppm; Na 63 a 73ppm; Mn 9 ppm; La 16
a 150ppm; Ce 98 a 368ppm e V 57ppm (Tabela 2).
A espectroscopia UV-Visível mostrou resultados muito semelhantes a
Indaiá e Sapucaia, com banda de absorção de 370nm a 420nm e uma banda
suave entre 520 e 580nm, provavelmente relacionadas à presença de Fe2+ - Ti4+ nas amostras azuladas e Cr+3 nas amostras rosadas ou avermelhadas (Figura 6).
9. Discussão
A
descoberta de diversas ocorrências de coríndon com qualidade
gemológica em áreas relativamente próximas é um forte indicativo do
potencial para a existência de outros depósitos e de aumento da
produção de rubi e safiras no Brasil.
As análises químicas apontam as causas de cor azul como sendo o mecanismo de transferência de cargas entre Fe2+ e Ti4+ e a presença de Cr3+,
possivelmente, influencia nas tonalidades violeta e púrpura, assim
como pode estar associada ao efeito alexandrita e à forte
fluorescência de algumas amostras, principalmente em Palmeiras e
Indaiá. Nas amostras de coloração vermelha e com tonalidades rosa, os
teores de Cr são sensivelmente mais altos, podendo ser vinculados
como causa dessas cores. Os espectros em UV-Visível são coerentes com
essas possibilidades.
A
ausência de Ce e La e o teor relativamente mais alto de Ga
distinguem o coríndon de Malacacheta do coríndon da região de
Manhuaçu-Caratinga, o que pode sugerir diferenças genéticas e esse
fato pode ser utilizado como indicador de proveniência.
Indícios
de campo, como as rochas predominantes nas regiões, sugerem que a
gênese do coríndon pode ser associada a processos metamórficos
regionais, o que expande as possibilidades de existirem novas
ocorrências em todo o leste de Minas Gerais, cujo contexto geológico é
muito semelhante.
Os
resultados analíticos e as características físicas descritas indicam
que a aplicação de tratamento térmico adequado no coríndon estudado
pode vir a melhorar significativamente a qualidade das gemas
produzidas e viabilizar uma produção sistemática. Malacacheta, por
apresentar produção constante, e Indaiá, pela qualidade de suas
safiras, são as ocorrências com melhores possibilidades para a
sistematização da extração.