sábado, 26 de abril de 2014

Adeus aos diamantes




Diamantina ainda tem uma
fortuna no subsolo. Mas
garimpá-la é uma pedreira



 
Divulgação

O casario: bem cultural da humanidade em cima de uma reserva
De acordo com o Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), no subsolo da cidade mineira de Diamantina deve haver 3 milhões de quilates de diamantes. A preços de hoje, esse tesouro em que 90% das pedras têm qualidade para uso em joalheria vale pelo menos meio bilhão de reais – o equivalente a quarenta anos de arrecadação no município. Agora, a má notícia: são cada vez menores as possibilidades de que essa fortuna venha a ser garimpada. Encravado no paupérrimo Vale do Jequitinhonha, o município tem 70% das reservas de diamantes do país, mas acumula dificuldades para a mineração.
Há empecilhos técnicos, como a necessidade de cavucar áreas profundas, com altos custos, mas boa parte dos problemas só existe porque se decidiu preservar a cidade exatamente do modo como a riqueza com a extração dos diamantes a produziu no passado. A área urbana, rica em edificações coloniais, virou patrimônio da humanidade no final de 1999. Embora os garimpos se concentrem na zona rural, especialistas como o geólogo Pedro Ângelo Almeida de Abreu acreditam que parte da reserva diamantífera pode estar sob as vielas e o casario do centro histórico. O tombamento enterra as chances de conferir essa teoria. A história de São João del Rei – que teve os alicerces roídos numa corrida do ouro – confirma a impossibilidade.
A condição de patrimônio cultural também exige a preservação do conjunto paisagístico do entorno. Por isso autoridades estaduais e municipais apertaram o cerco contra os garimpeiros. De 5 000 homens envolvidos na atividade, só uma centena tem os registros necessários. A taxa de legalização é baixa, cerca de 850 reais, mas a maioria cisca tão superficialmente o terreno que nem isso fatura por mês. Os garimpeiros convivem, ainda, com uma lei estadual de 1995 que transformou trechos ao longo do Rio Jequitinhonha em áreas de preservação permanente. Vários desses pontos eram lavras de diamante que estão longe de merecer essa honra.
Tudo isso levou à quase completa paralisação da mineração no município e a uma queda de aproximadamente 40% no comércio local. "Estão matando nossa galinha dos ovos de ouro", afirma o garimpeiro Ademir Werneck, multado em 36 500 reais pelo Conselho de Defesa do Meio Ambiente de Diamantina por manter uma lavra ilegal. Agravando o quadro, a única mineradora de grande porte instalada na cidade, a Rio Novo, do grupo Andrade Gutierrez, deixará de atuar na região dentro de três anos por causa do esgotamento da jazida explorada pela empresa.
Em outros tempos, com o dinheiro da extração de diamantes a família do garimpeiro Cláudio Oliveira adquiriu casa, carros e até um sítio. Ele chegou a morar nos Estados Unidos, onde aprendeu a falar inglês. Desde que voltou para Diamantina, há dois anos, Cláudio ganha a vida lecionando o idioma num curso pré-vestibular. "Só fica no garimpo quem não tem outra opção", ele diz.
Desbravada por bandeirantes paulistas no início do século XVIII, a região teve como primeira atividade econômica a extração de ouro. Diz a lenda que um padre um dia viu habitantes locais brincando com pedrinhas brilhantes e as identificou como diamantes, fugindo com todas as que conseguiu carregar. Folclore à parte, data de 1771 a criação de uma colônia diamantífera oficial da coroa portuguesa naquela área. "A cidade chegou a ser a maior produtora dessa pedra no mundo", afirma o professor Friedrich Renger, da Universidade Federal de Minas Gerais. "Os portugueses levaram pelo menos 2 milhões de quilates e mais 1 milhão foi retirado por garimpeiros." Metade da reserva total, portanto, ainda está no solo.

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