Vale, barata, pode ser a bola da vez
No mundo capitalista de hoje só existem dois tipos de animais: as presas e os predadores.
Para sobreviver neste mar turbulento, infestado de gigantes vorazes, é
necessário ser criativo e ter uma forte blindagem. Nesta guerra
incessante o objetivo é ser grande o suficiente para não ser comido
pelos concorrentes e digerir a todos que o ameaçam ou que podem
contribuir para a sua sobrevivência futura.
Empresas apetitosas, com ativos sólidos e com baixo custo operacional
são olhadas pelos grandes predadores, com cobiça, como o próximo “prato”
a ser consumido.
É assim que ocorrem as grandes aquisições e fusões que resultam em
empresas cada vez maiores e mais vorazes. Foi neste cenário que a Vale
engoliu a Caemi e depois a Inco, em um dos grandes negócios da mineração
mundial que envolveu a soma de US$19 bilhões.
Essa é a essência da guerra pelo controle mundial da commodity mais
importante da atualidade: o minério de ferro. A mineradora que controlar
o minério de ferro será, quase que irreversivelmente, a maior
mineradora do planeta.
É em busca desse título que as três gigantes, a BHP, a Rio e a Vale
estão engajadas em uma luta de vida ou morte. Elas estão aumentando
dramaticamente a produção e inundando o mercado com um produto de alta
qualidade e baixo custo.
Esta estratégia está enfraquecendo e asfixiando os competidores até a morte.
Hoje o número de mineradoras que fecharam as portas é assustador. É na
China onde ocorrem as maiores baixas. A cada semana uma nova mineradora
de minério de ferro fecha as portas. Esse era um resultado previsível,
já que os chineses desenvolveram minas obsoletas com custos operacionais
acima dos US$100/t acreditando que os preços iriam se manter na casa
dos US$120/t.
Neste cenário de guerra até gigantes como a australiana Fortescue
balançam e podem vir a fechar ou reduzir drasticamente no próximo ano.
É o dia do juízo final, quando só as grandes corporações, com ativos de
baixo custo operacional e alta qualidade serão as eleitas.
O que não foi previsto é que essa guerra estaria causando uma série de
efeitos colaterais que enfraquecem a todos, inclusive as três principais
competidoras.
Todos acreditavam que o desgaste mataria só as menores e menos eficientes.
Mas o que se vê é bem diferente...
As grandes mineradoras, membros do triunvirato que controla o minério de
ferro, estão sendo afetadas, também, pela queda dos seus valores de
mercado e suas rentabilidades.
Os gráficos ao lado, mostram que as três megamineradoras estão em queda livre nos últimos quatro meses.
Nesta situação quem são os maiores perdedores? Os acionistas é claro!
São esses acionistas, que amargam um sério prejuízo, que irão definir os
rumos do conflito. Apesar de ainda serem lucrativas, as grandes
mineradoras estão afugentando uma grande parte dos seus investidores,
que preferem sair da mineração e receber retornos e dividendos maiores
em outros segmentos não afetados por essa guerra absurda.
O que se vê hoje é a fuga dos investidores e a consequente queda das
ações. Com esse enfraquecimento significativo, sem data para terminar,
algumas mineradoras vão passar de caçador à caça.
Foi esse fenômeno que levou à fusão da Xstrata com a Glencore criando um
grupo maior e muito mais agressivo, tão voraz que tentou, poucos dias
atrás, abocanhar a segunda maior mineradora do mundo a Rio Tinto. Uma
estratégia surpreendente que mostra uma tendência. A última vez que a
Rio Tinto sofreu um assédio desses foi quando a chinesa Chinalco tentou
controla-la, em 2009
Ser engolido é um dos efeitos colaterais das guerras pela supremacia mundial na mineração.
A tentativa atual da Glencore de engolir a Rio assustou a australiana
que tenta se proteger desta aquisição hostil que deverá ocorrer após
abril de 2015. Para se blindar contra a Glencore a Rio Tinto deve tentar
vender as suas ações aos próprios acionistas em uma estratégia chamada
buyback. Essa estratégia, estará sendo decidida no dia 28 de novembro,
quando o CEO da Rio, Sam Walsh, vai explicar aos acionistas os detalhes
da linha defensiva a ser adotada.
A Rio Tinto, que já foi menor do que a Vale poucos anos atrás, vale hoje
US$103,4 bilhões e está sendo ameaçada por uma empresa que vale 43,3
bilhões de libras.
O que dizer da nossa Vale?
Hoje a Vale tem um valor de mercado de apenas 49 bilhões de dólares. No
dia 11 de janeiro de 2011 o valor de mercado da Vale era de US$199
bilhões e o da Rio Tinto de US$137 bilhões.
Nestes últimos quatro anos a Vale caiu significativamente em relação a
Rio Tinto chegando ao estado lastimável onde se encontra hoje. O mau
desempenho da Vale, obviamente, tem várias explicações, mas uma é o mau
gerenciamento.
A empresa está montada em ativos de imensa qualidade, mas mesmo assim
não conseguiu sequer se manter na posição em que estava em 2011.
Ao invés de investir em metalurgia tornando o seu minério de US$70 por
tonelada em um produto de milhares de dólares a tonelada a Vale reluta
em adicionar valor ao seu principal produto.
A mineradora age com um complexo de inferioridade terceiro mundista, e
prefere permanecer uma simples produtora de matéria prima sem valor
agregado, deixando todo o lucro da cadeia produtiva para os
importadores.
Essa estratégia usada pela Vale, dilapida as reservas de minério de alta
qualidade do Brasil que são vendidas a preços baixíssimos deixando
muito pouco no nosso país. No pior momento da história ela se prepara
para enviar 420 milhões de toneladas de minério por ano sem nenhum valor
agregado.
Este é um assunto de grande relevância, que nos atinge como um todo, e que deveria ser melhor discutido.
O que se pode esperar de uma empresa que não consegue adicionar valor,
maximizar e verticalizar os seus ativos e cuja única estratégia é
reduzir custos e aumentar a produção?
A Vale teve a sua oportunidade e falhou fragorosamente.
Ela perdeu o momento histórico: entre 2009 a 2014, quando os preços do
minério de ferro ultrapassaram a barreira dos US$100/t, atingindo o pico
de US$187/t, mesmo tendo uma margem obscena, a Vale não conseguiu
crescer e manter a sua lucratividade.
Pelo contrário: a empresa encolheu e foi reduzida aos US$49 bilhões de hoje.
A megamineradora, orgulho do Brasil, de caçadora passou a caça, tornando-se, tristemente, em um alvo para aquisição.
A Vale é, possivelmente, a melhor aquisição que existe hoje no mercado. Barata e com excelentes ativos...
Talvez ela não seja tão diversificada quanto a Rio Tinto ou talvez os
seus ativos de carvão não valham tanto quanto ela queira, mas a Vale tem
os minérios de altíssima qualidade e baixo custo de S11D e Carajás, o
passaporte para o futuro.
Não devemos nos surpreender se amanhã lermos nas manchetes mundiais que a
nossa querida Vale está sendo engolida por uma mineradora estrangeira.
Será o fim de uma era.
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