terça-feira, 2 de junho de 2015

Mesmo não utilizando o mercúrio, como é o caso dos garimpos de ouro, a extração de diamantes compromete o meio ambiente

Coromandel, cidade dos diamantes, sofre com a exploração do solo e dos rios

Mesmo não utilizando o mercúrio, como é o caso dos garimpos de ouro, a extração de diamantes compromete o meio ambiente




Jigue - um equipamento para separar produtos de densidades
diferentes, mediante movimento alternado, que faz boiar
o material mais leve e submergir o mais pesado
  - operando próximo ao rio Paranaíba

O diamante e o barro se transformaram em grandes vilões do meio ambiente em Coromandel. Cravado no Alto Paranaíba - região noroeste do estado de Minas Gerais - o município não vem reluzindo o brilho das pedras que são extraídas de suas jazidas e que lhe renderam a fama de "cidade dos diamantes". Da mesma forma, a extração do barro (argila e taguá) também vem estragando a paisagem da região e ameaçando a micro-bacia Buriti, responsável pelo abastecimento de água local. Situada a 480 Km de Belo Horizonte, com 27 mil habitantes (IBGE), Coromandel vive o paradoxo de possuir nos garimpos e mineradoras uma das principais atividades econômicas e de conviver com a degradação ambiental resultante dessa exploração.
Atualmente estima-se que existam 4 mil pessoas (entre garimpeiros e mineradores) trabalhando nas proximidades dos rios Santo Antônio, Santo Inácio, Buriti, Douradinho e Paranaíba, próximos ao município. Esse contingente de trabalhadores é responsável pela extração diária de toneladas de cascalho das proximidades dos rios formando uma sequência de buracos que chegam a uma profundidade de 20 metros, dependendo da capacidade do equipamento de escavação e do nível de investimento do empreendedor, se garimpeiro ou minerador.
Garimpeiros
São visíveis as diferenças entre os garimpeiros e mineradores que trabalham ao longo dos rios. Os garimpeiros, aqueles que utilizam técnicas rudimentares como peneira, pá e picareta, arrancam aproximadamente 20 carrinhos de mão por dia de cascalho das proximidades dos rios. Na mesma categoria estão os garimpeiros, às vezes empresas, que dispõem de caminhão e da tecnologia do "jigue", máquina que depura o cascalho, e da draga, que suga o cascalho do leito do rio. Estes chegam a extrair diariamente 10 caminhões de cascalho.
"A maioria das empresas que operam aqui não possui licenciamento. E as que possuem não são fiscalizadas", argumentou o Promotor de Justiça, Jadir Ciqueira de Souza. O promotor ressalta que já foram ajuizadas várias ações civis públicas, ações penais, execuções de multas contra garimpeiros, mas que o problema está longe de ser resolvido.

Buracos e montes de cascalhos são abandonados
 por garimpeiros e mineradores
Atualmente os "jigues" estão proibidos de operar às margens dos rios. "O que não resolveu o problema pois os buracos não são tapados e o cascalho arrancado das margens dos rios fica acumulado em outras áreas prejudicando o meio ambiente", disse o presidente da Associação dos Amigos do Rio Paranaíba e Afluente (ARPAA), Arnaldo Machado.
Mineradores
No patamar mais elevado da extração de diamantes estão os "mineradores", como gostam de ser chamados. São grandes empresas, muitas delas multinacionais que chegaram nos últimos anos em Coromandel apostando na pesquisa dos "kimberlitos", depósitos de diamantes protegidos por vários séculos por uma espécie de crosta.

Multinacionais remexem o solo,
levam a riqueza e deixam a degradação

A tolerância da população de Coromandel com a atividade mineradora está chegando ao fim

Esquerda, buraco feito pela mineradora SAM. À
acima, os equipamentos sofisticados instalados
pela mineradora à margem do rio Paranaíba
A reportagem da Folha do Meio Ambiente conseguiu ultrapassar a barreira de segurança de uma dessas empresas, a Sul América Mineração (SAM), a subsidiária nacional da Black Swam Resources, que instalou moderníssimos equipamentos na fazenda Marques, nas proximidades do rio Paranaíba, bem na divisa com o estado de Goiás.
De acordo com o engenheiro da mineradora, Wagner, são retirados 30 caminhões de cascalho por dia para a pesquisa. "Não somos garimpeiros, somos mineradores. O garimpeiro retira o cascalho da margem do rio, depredando o meio ambiente. Nós respeitamos a margem dos 100 metros estabelecidos em lei e cumprimos o compromisso de tapar os buracos", compara.
Não é o que pensa o dono da fazenda, Braz Faria de Lima, que assinou um contrato com a mineradora, uma espécie de arrendamento, no qual recebe 2 mil reais mensais para a permanência da empresa em suas terras. "Esse dinheiro não paga o estrago que estão fazendo aqui", explica o fazendeiro. O contrato com a mineradora também prevê para o fazendeiro um percentual de 1,5% sobre cada diamante acima de 10 quilates. "Em seis meses que eles estão aqui nunca me mostraram nada acima de 4,5 quilates", mas a região é muito rica, deve ter milhões de reais em diamantes grandes e puros, questiona o fazendeiro, ele mesmo já viu 2 grandes em 1966, de 20 kilates, deve valer hoje muito dinheiro diz.
Instalada naquela região há seis meses, a SAM planeja pesquisar mais três pontos próximos às margens do Paranaíba, escolher o melhor local para efetivamente traçar o seu objetivo. "Se a empresa aprovar a pesquisa aí sim ela vai investir aqui com equipamentos 100 vezes maiores e mais potentes", disse Wagner.
Visivelmente contrariado com o contrato assinado com a mineradora, Braz Faria de Lima questiona a legislação em vigor. "Eles chegaram aqui com a autorização da prefeitura e dos órgãos dizendo que mesmo se eu não autorizasse eles iam explorar que então era melhor eu negociar um contrato".
Mesmo não rendendo dividendos para o município - a maioria das pedras extraídas é vendida clandestinamente - o garimpo gera recursos para a cidade. De acordo com o secretário de Meio Ambiente municipal, Luiz Rabelo, cerca de 20% da construção civil local tem recursos oriundos do garimpo.
Se por um lado existe uma tolerância da população de Coromandel com a atividade garimpeira, por outro se encontra preocupada com a extração de argila que vem ocorrendo nas proximidade da bacia hidrográfica do córrego Buriti. "Quando chove o barro vermelho escorre para o córrego que fica todo lamado", disse o morador da região Noé Nunes Valadão. "O povo está falando que se continuar assim a gente vai ficar sem água", completa a esposa de Noé, Maria Ilma Nunes.
De acordo com o relatório da perícia, as cerâmicas que exploram a região "por apresentarem um controle ambiental incipiente e inadequado na sua área de extração, vêm gerando processos erosivos nos taludes de sua áreas de disposição de material estéril, que provocam o carreamento de sedimentos para o córrego Catitu, afluente do córrego Buriti.

O homem, no centro da foto, é o princípio
e o fim de tanta devastação. A riqueza é
para poucos e a poluição é para muitos
Extração de argila preocupa população
O relatório ressalta que o carreamento contribui para o assoreamento do manancial e alterações para a qualidade e quantidade de água. Esse assoreamento, segundo o relatório, "pode inviabilizar a médio e longo prazo, o aproveitamento do córrego para o abastecimento".
A perícia, que investigou nove cerâmicas que operam em Coromandel, subsidiou as ações civis públicas propostas pelo MP e que encontra-se em grau de recurso junto ao Superior Tribunal de Justiça (STJ).
A argila e o taguá (barro de cor acinzentada) encontrados em Coromandel são considerados de alta qualidade para a fabricação de tijolos, telhas e ornamentos. No entanto, a maioria das cerâmicas que opera na região é do município de Monte Carmelo, localizada a 55 quilômetros de Coromandel, conhecida nacionalmente como "cidade das telhas". Segundo o promotor de justiça, o retorno financeiro para o município é ínfimo em virtude da degradação do meio ambiente.

Noé Valadão e Maria Ilma: a preocupação
  dos moradores é a mesma dos técnicos, só
que as autoridades não fazem nada
O secretário de Meio Ambiente reconhece que a maioria das cerâmicas está trabalhando de forma ilegal. Segundo ele, as empresas operam sem os licenciamentos do Instituto Estadual de Florestas (IEF), Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam) e do Departamento Nacional de Pesquisa Mineral (DNPM). "O controle hoje está sendo apenas municipal, da Comissão Municipal de Conservação e Defesa do Meio Ambiente de Coromandel (Codema), mas nós pretendemos um sistema com maior participação dos governos estadual e federal", disse o secretário, que assumiu a secretaria há 2 meses.
O secretário disse que vai buscar recursos junto ao Ministério do Meio Ambiente e órgãos governamentais para a recuperação das imensas áreas devastadas tanto pelos garimpos quanto pela extração do barro. Enquanto o dinheiro não vem, a população convive com os buracos e com as consequências que a extração mineral pode trazer a um bem que é de todos: o meio ambiente.

 


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