terça-feira, 2 de junho de 2015

Investimentos recentes podem mudar situação do Brasil no setor de diamantes

Investimentos recentes podem mudar situação do Brasil no setor de diamantes

País já foi o maior produtor do mundo e hoje é insignificante no mercado. Especialista diz que Brasil tem imenso potencial ainda inexplorado

Stephane de Sakutin/AFP
 Brasília – Diamantes dão brilho ao roteiro de um filme ou de uma telenovela. E também podem se destacar nos relatos da formação de um país. Quando se descobriram os primeiros exemplares desse mineral na região onde hoje fica Diamantina (Vale do Jequitinhonha), em 1725, só se tinha visto algo semelhante extraído de minas da Índia.

As pedras foram levadas por um padre para a corte portuguesa, que tratou de regulamentar e incentivar as lavras no Brasil. “A história dos diamantes se confunde com a do país”, resume Francisco Valdir Silveira, chefe do departamento de recursos minerais da Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM).

Surgiram garimpos nas Gerais, na Chapada Diamantina, da Bahia, e em tantos outros lugares. O Brasil foi, durante muito tempo, o maior produtor mundial. Até que se descobriu o minério na África. Primeiro, no leito dos rios, como aqui, depois, no início do século passado, em depósitos primários subterrâneos.

Diamante deixou de ser apenas algo que se consegue peneirando cascalho. E o peso do país foi encolhendo. De acordo com os dados mais recentes, respondemos por apenas 0,04% da produção global, apesar de termos a sexta maior indústria de mineração do mundo quando se levam em conta o ferro, a bauxita e outros itens. “Para um geólogo de diamantes, o Brasil é o país mais frustrante do mundo”, relata Mark Van Bockstael, chefe de inteligência de mercado da Antwerp World Diamond Center (AWDC), uma fundação na cidade belga que concentra 50% do mercado de diamantes brutos do mundo e 84% dos lapidados.

Ele se refere ao imenso potencial ainda inexplorado no país. Segundo a CPRM, há 1.325 depósitos de kimberlitos ou minerais associados, onde podem ser descobertos os depósitos primários de diamantes — de onde são levados para os rios pela erosão. “Desses, provavelmente 20 são economicamente viáveis”, afirma Silveira.

A primeira mina do país em um depósito primário, a Braúna, vai começar a operar em Nordestina (BA) no começo de 2016.  Em outubro, ela deverá estar funcionando experimentalmente. É um processo bem diferente da coleta de cascalho dos rios, o garimpo de aluvião, que também pode ser mecanizado. As lavras subterrâneas serão exploradas por explosões.

As rochas trituradas mergulham em ferro-silício, em que partículas mais densas, incluindo diamantes, decantam. Dali, seguem para uma câmara onde recebem laser, que destaca os diamantes. Funcionários que estão fora do compartimento enfiam a mão em luvas semelhantes às de laboratórios de doenças altamente contagiosas, acessando o interior do compartimento blindado para separar os diamantes. Não serão usados produtos químicos e 98% da água será reciclada.

A mina de diamantes baiana, a primeira na América Latina, é resultado de um investimento de R$ 80 milhões de belgas e chineses, comerciantes de gemas que criaram uma mineradora, a Lipari, ao decidir enveredar por esse ramo. O total de recursos empregados no projeto deve chegar a R$ 200 milhões.

BARREIRA
O alto custo é um grande obstáculo para o aumento da exploração, explica Silveira, da CPRM. “Mas, duas ou três pedras grandes, se forem encontradas, pagam tudo isso”, diz. No mercado de diamantes, não há padrões tão rígidos quanto no do ouro. Um quilate (medida de peso padrão nesse setor, equivalente a 0,2 gramas) pode valer US$ 200, no caso de uma pedra pequena. Mas chega a US$ 5 mil, no caso de uma pedra grande e de qualidade — ou muito mais. Cores valorizam: os diamantes rosas estão entre os mais caros do mundo.

Fábio Borges, diretor financeiro da Lipari, está entre os que apostam que a exploração de diamantes subterrâneos no Brasil pode crescer muito. “O Canadá não tinha nenhuma mina no início dos anos 1990. Hoje, tem nove. E lá é muito mais difícil de implantá-las porque as reservas estão em locais remotos, no meio do gelo”, compara. Em sete anos, a Braúna poderá atingir a produção de 360 mil quilates, 7,5 vezes a produção total do país no ano passado.

Para o diretor de fiscalização do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), Walter Arcoverde, o câmbio poderá impulsionar investimentos em novas lavras subterrâneas de diamantes. “A valorização da moeda nacional frente às estrangeiras faz diminuir o garimpo”, analisa.
COMÉRCIO EM EVOLUÇÃO

Além dos investimentos em mineração, a ideia é sofisticar também o comércio e os serviços relacionados a essa indústria. “Queremos ter mais gente nesse mercado, no Brasil e em todo o mundo”, afirma Van Bockstael, da AWDC. No mês que vem, a fundação vai promover o GMB Brasil, no hotel Copacabana Palace, versão nacional de um evento global do setor, que vai envolver especialistas e empresários — haverá até um desfile de modelos usando joias.

Dados da AWDC mostram que há um grande potencial de crescimento das vendas de diamantes. Das famílas chineses, 40% têm alguma joia com diamante, uma proporção muito menor do que as dos países europeus e dos Estados Unidos.

Para o ex-garimpeiro Dario Machado Rosa, hoje funcionário público, a sofisticação do setor é bem-vinda. “Uma das dificuldades que temos no Brasil é o número reduzido de compradores, o que diminui muito o valor que conseguimos”, relata. Ele é presidente de honra de uma cooperativa que reúne 130 garimpeiros em Coromandel (Alto Paranaíba). Filho e neto de garimpeiros, conta que a cidade já teve 3 mil pessoas trabalhando nesse setor, hoje secundário.

A região do município, próxima do Triângulo Mineiro, tem grandes depósitos de diamantes nos rios — o que sugere potencial de uma mina subterrânea, caso se descubra o local do depósito primário. O Getulio Vargas, maior diamante encontrado no Brasil, foi lavrada ali. Com 726 quilates, deu origem a 29 pedras. Hoje, as técnicas de lapidação com laser permitiriam mantê-la em uma só peça, ou então reduzir o número de divisões. “Não valeria menos do que US$ 50 milhões”, estima Rosa.

Uma das dificuldades de negócios está no processo de certificação Kimberley, implantado no Brasil em 2002, que garante que a pedra não tem origem ilícita ou em áreas de conflito. Silveira, da CPRM, levanta a hipótese de que muitos garimpeiros prefiram a informalidade a passar pelo processo, o que pode acabar jogando a produção no contrabando. “Ele está devendo dinheiro na mercearia e acaba entregando a pedra por muito menos do que ela vale.” Isso ajudaria a explicar a queda de produção do país, ao menos de acordo com os números oficiais, nos últimos anos.

Rosa acha que o processo de certificação é benéfico para os garimpeiros. Mas queixa-se da lentidão. “Às vezes demoram até 40 dias. Ninguém compra uma pedra e espera todo esse tempo para receber”, queixa-se. Arcoverde, do DNPM, contesta a informação. “Pode ter sido algum caso por falha processual do interessado. Se ele estiver cumprindo todas as normas, o prazo médio é de 10 dias, podendo ser menor”, afirma.

RARIDADES

Diamantes são formados a 2 mil metros de profundidade, sob alta pressão. E chegam à superfície carregados a velocidade supersônica pelo magma em uma erupção. O processo tem de ser rápido, se não as pedras viram carvão. Mas também é necessário que elas sejam preservadas na subida. Tantas restrições explicam por que são raros. Os diamantes explorados no Brasil foram formados há cerca de 120 milhões de anos.

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