Garimpando na areia da praia
Quando entra a frente fria, pescadores ficam atentos ao que o mar traz: dependendo da sorte, encontra-se um bom “tesouro”
Na última quarta-feira, parte da areia na praia de Matinhos, no Litoral do Paraná, amanheceu coberta por sujeira. Entre um volume grande de algas, também era possível encontrar uma porção de objetos como óculos, relógios, pulseiras, correntes, bermudas e até uma dentadura. Tudo trazido pelo mar.Enquanto o fenômeno espantava alguns veranistas, para os pescadores aquilo não era novidade. O cisco (como eles chamam os detritos trazidos pelo mar) aparece na praia sempre que entra uma frente fria. “Quando bate o vento sul e o tempo está para mudar, o mar traz tudo o que encontra para a areia da praia”, explica o pescador Gerson Crisanto, 46 anos, que também é pai do surfista Peterson Crisanto, vice-campeão mundial sub-16 e que participa do WQS. Mais conhecido pelo apelido de Gugo, o pescador volta e meia aprecia garimpar o cisco na areia, pois sabe muito bem que no meio daquelas coisas que não valem nada pode haver um tesouro a ser descoberto.
Entre os objetos que Gugo já recolheu do cisco e guarda estão várias moedas antigas, da década de 30 e 40. Uma delas é praticamente uma preciosidade: um patacão de prata de 100 réis do período imperial, de 1883.
“O pessoal diz que eu conseguiria um bom dinheiro vendendo minhas moedas para colecionadores de Curitiba, mas eu não tenho o mínimo interesse”, conta Gugo, que se diz um aficcionado por coisas antigas. Até mesmo objetos aparentemente sem valor – como inúmeros óculos quebrados e já cheios de cracas, todos trazidos pelo mar – ele faz questão de guardar. “Para mim tudo tem o seu valor. Tanto que montei até uma espécie de museu em casa, junto com outras coisas antigas que adquiro e os troféus de surfe do meu filho. Se um dia eu faltar, isso fica de lembrança para minhas crianças.”
Sorte
Quem perguntar na colônia de pescadores de Matinhos quem é o pescador mais sortudo para achar coisas no cisco fica sabendo este sujeito é Orlando Gonçalves da Silva, 42 anos, o Feijão. Além de pegar camarão todos os dias no mar, a renda de Feijão volta e meia é reforçada pelo que encontra na areia da praia. “Ano passado vendi seis relógios e 40 óculos que achei no cisco”, conta.
Mas sorte mesmo Feijão teve há oito anos, quando encontrou R$ 800 na areia. “As notas estavam todas espalhadas pelo cisco”, lembra. Em anos mais recentes, o pescador diz ter encotrado R$170 e R$ 80, valores que deram uma força no sustento da mulher e de três filhos.
Os presentes trazidos pelo mar ajudam, mas não garantem uma renda estável, lembra ele. “Já vi uma reportagem sobre um cara no Rio de Janeiro que vivia de recolher o lixo na praia. Mas aqui não tem disso”, lembra Feijão, que nunca deixa de sair de sol a sol para buscar seus camarões. “Ainda mais agora, que até os veranistas passaram a catar o cisco. Antes sobrava mais para os pescadores.”
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