Garimpo no Brasil – impactos sociais e ambientais -
O garimpo, autorizado pela
Constituição Federal, é uma atividade cheia de paradoxos e contradições:
contribuiu para a expansão territorial do país, mas às custas da
destruição de comunidades indígenas. Hoje, ela ajuda no equilíbrio da
balança comercial brasileira, ao mesmo tempo em que danifica o meio
ambiente. Também mantém potencial simultâneo para enriquecer e adoecer
os garimpeiros. A reportagem especial desta semana traça o panorama
atual do garimpo no brasil. Ao longo da semana, você vai conhecer as
ações do Parlamento e do Executivo em prol de garimpos legais e
ambientalmente sustentáveis. A segunda matéria sobre o garimpo no brasil
detalha um pouco mais os impactos sociais e ambientais dessa atividade
polêmica, mas rentável.
TEXTO
O que leva homens a abandonar a família
e a vida urbana para se embrenhar em garimpos à beira de rio ou dentro
de crateras de rocha, quase sempre em condições subumanas? A resposta
está na ponta da língua de qualquer garimpeiro espalhado por esse país
continental.
"O sonho do garimpeiro é bamburrar, ficar rico. Achar um filão com muito ouro, uma pedra muito grandona de ouro".
A atividade garimpeira é cheia de
contradições: contribuiu para a expansão territorial do país na época do
Brasil colônia, mas às custas da destruição de várias comunidades
indígenas; ajuda o equilíbrio da balança comercial brasileira, ao mesmo
tempo em que danifica o meio ambiente; e tem potencial para enriquecer e
adoecer os garimpeiros, só para citar alguns desses paradoxos.
Defensores da atividade costumam afirmar que, apesar de reconhecidos
pela Constituição federal, os garimpeiros são "satanizados
ambientalmente, injustiçados socialmente e penalizados tributariamente".
Presidente de uma cooperativa de garimpeiros do Amapá, Antônio Pinto,
explica o perfil desses homens e lamenta as poucas oportunidades para o
trabalho legal no Brasil.
"A classe dos garimpeiros é uma classe
sofredora. São pessoas que não tiveram a oportunidade de estudar e hoje
vivem em busca do ouro porque é a forma mais fácil que ele acha para
sobreviver. Então, tem que ter oportunidade. Não é preciso que nossos
garimpeiros entrem nos países (vizinhos) adentro atrás de ouro, porque o
nosso país tem muito ouro. Na nossa região de Boa Vista, em Roraima, eu
conheço cento e poucas pistas de avião que foram explodidas pela
Polícia Federal. E é área rica. Por que o nosso governo brasileiro não
abre uma oportunidade para essa classe garimpeira se manter dentro de
seu país e ter a sua liberdade?"
Hoje, Antônio Pinto comanda um grupo de
garimpeiros devidamente legalizados. Mas ele também já desempenhou essa
atividade clandestinamente aqui no Brasil e também nos vizinhos
Suriname e Guianas francesa e inglesa. Antônio conta que não tem nenhuma
saudade daqueles tempos difíceis.
"Eu fiquei cinco dias escondido no
mato, lá no Kourou (Guiana Francesa), querendo tanto ir ao supermercado
para comprar uma merenda. E eu não podia ir porque, se fosse, eu seria
preso. Eu já entrei bem aqui, no Oiapoque, passando pelo garimpo do
Sikini, Sapucaia, Groatá, Mototáxi, Abafadinho e saí lá na fronteira do
Suriname com a Guiana, que é a Tapiqui. E de lá, eu fui para Paramaribo,
Suriname. De lá, fui para um garimpo dentro da Guiana inglesa, me
expulsaram e fui para Boa Vista. Eu conheço essa rota todinha. Mas hoje
eu não quero viver naquela situação, porque é triste. É muito sofrido
para quem está lá dentro".
MÚSICA: "Garimpeiro", de Antônio Ferreira
"Eu só vou garimpar, garimpar, garimpar
Sou garimpeiro
Eu vim da Serra Grande, parei na Serra Pelada
Atravessei o Amazonas, montado em minha jangada.
No caminho de lá pra casa, gastei tudo que ganhei
E a fortuna que lá deixava, nunca mais eu avistei..."
"Eu só vou garimpar, garimpar, garimpar
Sou garimpeiro
Eu vim da Serra Grande, parei na Serra Pelada
Atravessei o Amazonas, montado em minha jangada.
No caminho de lá pra casa, gastei tudo que ganhei
E a fortuna que lá deixava, nunca mais eu avistei..."
Quem vai atrás de esmeraldas, conhecida
como "ouro verde", também vive uma via crucis. Para se chegar, por
exemplo, aos veios de esmeralda dentro das rochas da Serra da Carnaíba,
na Bahia, é preciso cavar buracos de até 300 metros de profundidade e,
lá em baixo, suportar temperaturas escaldantes, manipular dinamite,
respirar fuligem e rezar para que não ocorra nenhum desabamento.
Além do drama humano, as atividades em
torno do garimpo esburacam nossas serras e sangram nossos rios. O
mercúrio, usado para separar o ouro e outros metais presentes na água
fluvial, é extremamente tóxico e está associado a problemas
respiratórios, digestivos e neurológicos nos garimpeiros; e à
contaminação de peixes, água, ar e solo. O problema é tão sério que a
Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/81), aprovada pelo
Congresso em 1981, determinou ao Ibama a responsabilidade de controlar a
importação, a produção, a comercialização e o uso do mercúrio no
Brasil.
Outro impacto ambiental da atividade
garimpeira se dá na extração ilegal de ouro e outros metais preciosos em
parques nacionais e terras indígenas. E se não bastassem tais
problemas, o policial federal Jorielson Nascimento, que tenta combater o
garimpo ilegal na fronteira do Brasil com a Guiana Francesa, lista uma
série de crimes que rondam as comunidades garimpeiras.
"A prática da exploração clandestina do
ouro faz com que flutue em torno dessa prática diversos outros crimes:
tráfico de drogas, tráfico de armas, tráfico de pessoas especificamente
para prostituição. Tráfico de crianças também. Sonegação fiscal, crimes
contra ordem tributária, crimes contra o sistema financeiro, enfim, a
prática do garimpo ilegal na fronteira faz isso".
Ufa, haja problemas! E na hora de
pensar em soluções, o consenso gira em torno da legalização dos
garimpos. Até porque a atividade dificilmente deixará de existir e o
Brasil precisa dos recursos financeiros gerados por suas riquezas
minerais. De acordo com o Ministério de Minas e Energia, o setor de
mineração responde por cerca de 4% do PIB nacional, movimentando em
torno de 70 bilhões de dólares por ano. Ex-secretário do ministério e
autor do livro "Geopolítica das Minas no Brasil", o geólogo Cláudio
Scliar afirma que o país ainda tem muito potencial inexplorado.
"Nós somos um país continental e ainda
há muitas áreas que precisam ser detalhadas do ponto de vista do
mapeamento geológico sobre o conhecimento do seu potencial. Mas o
Brasil, dentro do que já foi descoberto, tem um papel extremamente
importante do ponto de vista mundial, onde somos o primeiro produtor em
vários bens minerais, como bauxita, rochas ornamentais, caulin; e, em
outros, somos importantes: segundo em ferro. Nós temos vários bens
minerais que são muito importantes para a nossa balança comercial".
Quanto ao ouro, o governo estima que as
reservas brasileiras são de 2 mil toneladas. A produção anual, que está
em torno de 60 toneladas, deve dobrar até 2017, consolidando o ouro
como o segundo bem mineral em valor de exportação, atrás apenas do
minério de ferro. E essa estimativa, obviamente, nem leva em conta a
extração informal feita por 300 mil a 500 mil garimpeiros espalhados
pelo país, na avaliação do próprio ministério.
E vem de um simples garimpeiro
legalizado da Amazônia, Manoel Perquival, um apelo para que essa riqueza
possa ser explorada com pleno respeito à vida humana e ao meio
ambiente. Com seus 60 anos de idade, Manoel ainda não perdeu a esperança
de bamburrar, ou seja, de ficar rico trabalhando dignamente nos
garimpos do país.
"Que nos deixem trabalhar, porque as
autoridades, hoje em dia, estão nos reprimindo ao máximo. Estão nos
deixando sem respirar. Há como trabalhar no garimpo sem danos para o
meio ambiente. Não é o terror que eles falam. O nosso maior problema é
proteger as nascentes. Eu, como garimpeiro, reconheço que, se
protegermos as nascentes, nós não teremos problemas com o meio ambiente.
Há como recompor, como reflorestar. Não existe bicho de sete cabeças. O
problema é planejamento".
Música: "Garimpeiro do rio das Garças", de João de Barro (c/ Francisco Alves)
"Garimpeiro, tua vida é sem bonança,
Mas tu vives de esperança, continuas a procurar.
Continua, garimpeiro rude e forte,
Pois um dia vem a sorte e te bem diz
E acharás pedras lindas como estrelas
E nas mãos sorrindo ao vê-las
serás feliz..."
"Garimpeiro, tua vida é sem bonança,
Mas tu vives de esperança, continuas a procurar.
Continua, garimpeiro rude e forte,
Pois um dia vem a sorte e te bem diz
E acharás pedras lindas como estrelas
E nas mãos sorrindo ao vê-las
serás feliz..."
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