quarta-feira, 29 de julho de 2015

Garimpo no Brasil – impactos sociais e ambientais -

Garimpo no Brasil – impactos sociais e ambientais -


O garimpo, autorizado pela Constituição Federal, é uma atividade cheia de paradoxos e contradições: contribuiu para a expansão territorial do país, mas às custas da destruição de comunidades indígenas. Hoje, ela ajuda no equilíbrio da balança comercial brasileira, ao mesmo tempo em que danifica o meio ambiente. Também mantém potencial simultâneo para enriquecer e adoecer os garimpeiros. A reportagem especial desta semana traça o panorama atual do garimpo no brasil. Ao longo da semana, você vai conhecer as ações do Parlamento e do Executivo em prol de garimpos legais e ambientalmente sustentáveis. A segunda matéria sobre o garimpo no brasil detalha um pouco mais os impactos sociais e ambientais dessa atividade polêmica, mas rentável.
TEXTO
O que leva homens a abandonar a família e a vida urbana para se embrenhar em garimpos à beira de rio ou dentro de crateras de rocha, quase sempre em condições subumanas? A resposta está na ponta da língua de qualquer garimpeiro espalhado por esse país continental.

"O sonho do garimpeiro é bamburrar, ficar rico. Achar um filão com muito ouro, uma pedra muito grandona de ouro".
A atividade garimpeira é cheia de contradições: contribuiu para a expansão territorial do país na época do Brasil colônia, mas às custas da destruição de várias comunidades indígenas; ajuda o equilíbrio da balança comercial brasileira, ao mesmo tempo em que danifica o meio ambiente; e tem potencial para enriquecer e adoecer os garimpeiros, só para citar alguns desses paradoxos. Defensores da atividade costumam afirmar que, apesar de reconhecidos pela Constituição federal, os garimpeiros são "satanizados ambientalmente, injustiçados socialmente e penalizados tributariamente". Presidente de uma cooperativa de garimpeiros do Amapá, Antônio Pinto, explica o perfil desses homens e lamenta as poucas oportunidades para o trabalho legal no Brasil.
"A classe dos garimpeiros é uma classe sofredora. São pessoas que não tiveram a oportunidade de estudar e hoje vivem em busca do ouro porque é a forma mais fácil que ele acha para sobreviver. Então, tem que ter oportunidade. Não é preciso que nossos garimpeiros entrem nos países (vizinhos) adentro atrás de ouro, porque o nosso país tem muito ouro. Na nossa região de Boa Vista, em Roraima, eu conheço cento e poucas pistas de avião que foram explodidas pela Polícia Federal. E é área rica. Por que o nosso governo brasileiro não abre uma oportunidade para essa classe garimpeira se manter dentro de seu país e ter a sua liberdade?"
Hoje, Antônio Pinto comanda um grupo de garimpeiros devidamente legalizados. Mas ele também já desempenhou essa atividade clandestinamente aqui no Brasil e também nos vizinhos Suriname e Guianas francesa e inglesa. Antônio conta que não tem nenhuma saudade daqueles tempos difíceis.
"Eu fiquei cinco dias escondido no mato, lá no Kourou (Guiana Francesa), querendo tanto ir ao supermercado para comprar uma merenda. E eu não podia ir porque, se fosse, eu seria preso. Eu já entrei bem aqui, no Oiapoque, passando pelo garimpo do Sikini, Sapucaia, Groatá, Mototáxi, Abafadinho e saí lá na fronteira do Suriname com a Guiana, que é a Tapiqui. E de lá, eu fui para Paramaribo, Suriname. De lá, fui para um garimpo dentro da Guiana inglesa, me expulsaram e fui para Boa Vista. Eu conheço essa rota todinha. Mas hoje eu não quero viver naquela situação, porque é triste. É muito sofrido para quem está lá dentro".
MÚSICA: "Garimpeiro", de Antônio Ferreira
"Eu só vou garimpar, garimpar, garimpar
Sou garimpeiro
Eu vim da Serra Grande, parei na Serra Pelada
Atravessei o Amazonas, montado em minha jangada.
No caminho de lá pra casa, gastei tudo que ganhei
E a fortuna que lá deixava, nunca mais eu avistei..."
Quem vai atrás de esmeraldas, conhecida como "ouro verde", também vive uma via crucis. Para se chegar, por exemplo, aos veios de esmeralda dentro das rochas da Serra da Carnaíba, na Bahia, é preciso cavar buracos de até 300 metros de profundidade e, lá em baixo, suportar temperaturas escaldantes, manipular dinamite, respirar fuligem e rezar para que não ocorra nenhum desabamento.
Além do drama humano, as atividades em torno do garimpo esburacam nossas serras e sangram nossos rios. O mercúrio, usado para separar o ouro e outros metais presentes na água fluvial, é extremamente tóxico e está associado a problemas respiratórios, digestivos e neurológicos nos garimpeiros; e à contaminação de peixes, água, ar e solo. O problema é tão sério que a Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/81), aprovada pelo Congresso em 1981, determinou ao Ibama a responsabilidade de controlar a importação, a produção, a comercialização e o uso do mercúrio no Brasil.
Outro impacto ambiental da atividade garimpeira se dá na extração ilegal de ouro e outros metais preciosos em parques nacionais e terras indígenas. E se não bastassem tais problemas, o policial federal Jorielson Nascimento, que tenta combater o garimpo ilegal na fronteira do Brasil com a Guiana Francesa, lista uma série de crimes que rondam as comunidades garimpeiras.
"A prática da exploração clandestina do ouro faz com que flutue em torno dessa prática diversos outros crimes: tráfico de drogas, tráfico de armas, tráfico de pessoas especificamente para prostituição. Tráfico de crianças também. Sonegação fiscal, crimes contra ordem tributária, crimes contra o sistema financeiro, enfim, a prática do garimpo ilegal na fronteira faz isso".
Ufa, haja problemas! E na hora de pensar em soluções, o consenso gira em torno da legalização dos garimpos. Até porque a atividade dificilmente deixará de existir e o Brasil precisa dos recursos financeiros gerados por suas riquezas minerais. De acordo com o Ministério de Minas e Energia, o setor de mineração responde por cerca de 4% do PIB nacional, movimentando em torno de 70 bilhões de dólares por ano. Ex-secretário do ministério e autor do livro "Geopolítica das Minas no Brasil", o geólogo Cláudio Scliar afirma que o país ainda tem muito potencial inexplorado.
"Nós somos um país continental e ainda há muitas áreas que precisam ser detalhadas do ponto de vista do mapeamento geológico sobre o conhecimento do seu potencial. Mas o Brasil, dentro do que já foi descoberto, tem um papel extremamente importante do ponto de vista mundial, onde somos o primeiro produtor em vários bens minerais, como bauxita, rochas ornamentais, caulin; e, em outros, somos importantes: segundo em ferro. Nós temos vários bens minerais que são muito importantes para a nossa balança comercial".
Quanto ao ouro, o governo estima que as reservas brasileiras são de 2 mil toneladas. A produção anual, que está em torno de 60 toneladas, deve dobrar até 2017, consolidando o ouro como o segundo bem mineral em valor de exportação, atrás apenas do minério de ferro. E essa estimativa, obviamente, nem leva em conta a extração informal feita por 300 mil a 500 mil garimpeiros espalhados pelo país, na avaliação do próprio ministério.
E vem de um simples garimpeiro legalizado da Amazônia, Manoel Perquival, um apelo para que essa riqueza possa ser explorada com pleno respeito à vida humana e ao meio ambiente. Com seus 60 anos de idade, Manoel ainda não perdeu a esperança de bamburrar, ou seja, de ficar rico trabalhando dignamente nos garimpos do país.
"Que nos deixem trabalhar, porque as autoridades, hoje em dia, estão nos reprimindo ao máximo. Estão nos deixando sem respirar. Há como trabalhar no garimpo sem danos para o meio ambiente. Não é o terror que eles falam. O nosso maior problema é proteger as nascentes. Eu, como garimpeiro, reconheço que, se protegermos as nascentes, nós não teremos problemas com o meio ambiente. Há como recompor, como reflorestar. Não existe bicho de sete cabeças. O problema é planejamento".
Música: "Garimpeiro do rio das Garças", de João de Barro (c/ Francisco Alves)
"Garimpeiro, tua vida é sem bonança,
Mas tu vives de esperança, continuas a procurar.
Continua, garimpeiro rude e forte,
Pois um dia vem a sorte e te bem diz
E acharás pedras lindas como estrelas
E nas mãos sorrindo ao vê-las
serás feliz..."

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