O estranho conceito de ancestralidade e de nação para a atividade garimpeira
Certo dia de 2013, numa vistoria do DNPM solicitada pelo Ministério Público numa área de empresa de mineração invadida por garimpeiros no Tapajós, na reunião na vila vizinha do garimpo, um dos garimpeiros ocupantes da área da empresa declara apaixonadamente ao técnico do DNPM: “Estamo-nos aqui há 50 anos, e vem uma empresa há somente 5 anos e quer ficar dona da área!”.
Um sorriso no lábio, o técnico não deixou de notar que o garimpeiro mal tinha 25 anos de idade.
O jovem garimpeiro não estava consciente da impossibilidade de ele estar trabalhando na área 25 anos antes dele nascer. Não estava falando nem dos pais ou tios, pois raros são os filhos de garimpeiros que continuam na profissão dos pais. Não estava tampouco querendo enganar o oficial do DNPM. Ele estava falando dos garimpeiros em geral, do mesmo jeito que os jovens colonos judeus americanos falam da terra sagrada de Israel.
Neste caso, o que os garimpeiros representavam para ele, para ter em forma de grupo o direito de propriedade, de herança do local ou do ouro contido nele?: como profissão, não teria nenhum sentido, ele falava da mesma maneira que um povo fala da sua história, dos seus antepassados, da sua cultura como uma entidade, uma tribo, uma raça, uma religião ou uma nação.
Esse mesmo termo de nação garimpeira foi amplamente divulgado no caso dos garimpeiros de serra pelada e a união dos antigos trabalhadores da Serra passou a ter direitos diferenciados, e até uma tônica religiosa pode ser observada nos autores defendendo essa nação:
“Essa é a fé que vivemos e que nos movem na AFIDGASP desde 2009. É a certeza de que o milagre do Deus Poderoso opera no exato momento em que achamos que tudo já está perdido. O primeiro livro da bíblia nos ensina: “Existe alguma coisa impossível para o SENHOR?” (Gen. 18:14). Os textos sagrados nos mostram que a fé transforma o impossível de hoje no milagre de amanhã. Um milagre poderá devolver os direitos minerários à Coomigasp, pois a Colossus violou todos os princípios éticos, morais e da justiça de Deus.”
Podemos verificar o paralelismo dos termos místicos utilizados pelo autor com os termos proferidos pelos membros das duas comunidades étnica religiosa a respeito de Jerusalém
Mas como os garimpeiros do Tapajós, divididos em centenas e milhares de frentes de serviços, marcados por um nomadismo que leva esses homens e mulheres a atravessar limites de estados e fronteiras da América do sul como Suriname e Venezuela, a maioria sem religião definida podem sentir se parte de uma entidade ou nação com uma linguagem própria, regras de vida e se auto declarando herdeiros coletivos de antecessores que mostram tão somente o mesmo estilo de viver e trabalhar?
De onde vem esse sentimento de fazer parte de uma nação? Do ouro, do sofrimento, da incompreensão generalizada?
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