domingo, 29 de outubro de 2017

Lítio: Uma corrida louca que vai do Congo à Cornualha

Lítio: Uma corrida louca que vai do Congo à Cornualha

Com o equilíbrio do mercado ainda longe de ser atingido e as grandes potências a posicionarem-se perante a procura deste metal no futuro, várias mineiras procuram oportunidades em vários continentes.
Lítio: Uma corrida louca que vai do Congo à Cornualha

Bloomberg 28 de outubro de 2017 
Para se ter uma ideia da procura a que está a ser sujeito o lítio, elemento utilizado no fabrico de baterias, basta olhar para a australiana AVZ Minerals Ltd. Uma empresa com acções "penny stock" há apenas alguns meses, a promissora mineira valorizou em bolsa cerca de 1.300% este ano. A sua proposta: voltar a explorar uma mina de estanho remota e centenária na República Democrática do Congo para fornecer o lítio necessário para dar energia aos carros eléctricos.

Embora a subida tenha sido dramática, a AVZ não está sozinha na corrida por um lugar na "explosão" das baterias recarregáveis. No Reino Unido, a empresa fundada por um antigo banqueiro de investimento, Jeremy Wrathall, planeia aproveitar nascentes termais na Cornualha, uma região que é mais famosa pelas suas enseadas. Outras empresas estão à procura de depósitos - desde a Alemanha até ao Mali - e até o Afeganistão está a planear leiloar licenças de exploração.

"Há uma grande disputa por depósitos e uma procura que parece impressionante, a questão está sempre do lado da oferta," afirma Paul Gait, um analista na Sanford C. Bernstein Ltd. em Londres. Na pressa de corresponder à procura, há o risco de que venham a ser desenvolvidas muitas minas e de que seja fornecido demasiado metal, considera Gait. "Quando a maré recuar, aqueles que não tiverem uma boa geologia não estarão à altura."

O preço do lítio, que é dominado por três grandes produtores, tem aumentado à medida que cresce a procura por baterias de iões de lítio usadas em veículos eléctricos e em sistemas de armazenamento de electricidade. A Bloomberg New Energy Finance estima que os veículos eléctricos representarão mais de metade das novas vendas de automóveis a nível global até 2040. E a incerteza em torno do crescimento da produção global significa que os fabricantes de carros estão a procurar garantir a oferta futura de metal.

Ainda que a produção possa ter dificuldades iniciais em acompanhar o crescimento da procura, o lítio não é verdadeiramente raro quando comparado com outros metais para baterias, como o cobalto e a grafite, de acordo com o analista da Bloomberg Intelligence, Eily Ong. E a história da mineração está cheia de exemplos prudentes de "explosões" que terminaram em fracassos, quando a corrida para impulsionar a produção superou o crescimento da procura.

O minério de ferro é um exemplo recente, com o "boom" na produção de aço na China a impulsionar a construção de novas minas. Acabou mal para muitos dos recém-chegados ao sector que, quando preparavam projectos no terreno ou começaram a produzir depararam com a queda dos preços daquela matéria-prima.

Mais tarde ou mais cedo, haverá excesso de produção

A produção mundial de lítio aumentou cerca de 12% no ano passado, com as baterias a representar cerca de 39% do consumo, de acordo com o U.S. Geological Survey. Apesar de a Austrália ser o maior produtor em 2016, os seus recursos identificados são pequenos quando comparados com a Argentina e Bolívia, cada um com cerca de 9 milhões de toneladas, e o Chile, com mais de 7,5 milhões.

"Este não é um metal que vá estar isento das leis normais da economia das commodities," afirma Gait. "Mais tarde ou mais cedo, teremos sobreprodução.

Há cerca de uma dezena de projectos a serem construídos ou ampliados a nível mundial, de acordo com a Liberum Capital Ltd. Estes, a que se junta uma mão cheia de outros cujo avanço é visto como provável, poderão ajudar a quase triplicar a oferta de lítio até 2025, que ainda assim ficará aquém da procura prevista.

Além disso, há mais oito projectos que ainda não asseguraram financiamento mas que podem conduzir o mercado a um excedente de produção até 2025, refere um relatório da Liberum.

Negócio do lítio é uma "mina"

Os preços do carbonato de lítio mais do que duplicaram nos últimos dois anos, segundo dados da Benchmark Mineral Intelligence. "Com os preços actuais, não há mina potencial de lítio no mundo que não venha a fazer uma extraordinária quantidade de dinheiro," afirma Richard Knights, analista na Liberum. "Há todo o incentivo para estimular a oferta."

As actuais necessidades podem reduzir-se até 2019-2020, com base na resposta forte do lado da oferta, diz o analista Joel Jackson, da BMO Capital Markets, numa nota de 24 de Outubro. No entanto, a incerteza sobre premissas como a penetração dos veículos eléctricos, a tecnologia de baterias e o crescimento do fornecimento de lítio torna difícil de prever quando é que o mercado atingirá o equilíbrio, acrescenta.

No Congo, a AVZ ainda tem de provar que a extracção de lítio é economicamente viável. É também necessário reabilitar uma velha central eléctrica e construir mais de 600 quilómetros de estradas para ligar a mina à capital regional de Lubumbashi para garantir as exportações. Ainda assim o projecto está a atrair investidores, como a chinesa Zhejiang Huayou Cobalt Co., uma das maiores refinadoras de cobalto do mundo.

"As maiores empresas da China estão a fazer fila," disse o chairman da AVZ, Klaus Eckhof, a partir do Dubai. "Todos eles querem participar porque não têm uma cadeia de fornecimento, o meu telefone não pára de tocar."


Portugal também nos radares internacionais

O interesse desperto pelo lítio também está a ter efeito em Portugal, que historicamente extrai o mineral para aplicação na indústria cerâmica. No ano passado entraram na Direcção Geral de Energia e Geologia 30 pedidos de direitos de prospecção e pesquisa de lítio, que têm subjacentes cerca de 3,8 milhões de euros de propostas de investimento nos primeiros dois a três anos, numa área total de 2.500 quilómetros quadrados.

O mineral extraído no país tem sido usado pela indústria para reduzir o ponto de fusão para produção de pastas cerâmicas – baixando o consumo energético –, mas segundo o relatório do grupo de trabalho "lítio" encomendado pelo Governo e concluído em Março passado, as ocorrências de lítio detectadas em Portugal têm potencialidade para uso também na indústria de compostos de lítio para obter concentrados de minerais de lítio de alto teor, como os que são usados na construção de baterias para os automóveis eléctricos.

Segundo o grupo de trabalho, e de acordo com relatórios técnicos de cinco empresas, com direitos atribuídos de prospecção e pesquisa e de exploração, é possível estimar um total de 29,74 milhões de toneladas em recursos mineralizados de lítio no país.

Exemplos de empresas que anunciaram a entrada no país são a Novo Lítio (anteriormente Dakota Minerals, que tem operado em Sepeda, Montalegre – onde pondera uma instalação de produção de concentrado de lítio - e está em litígio com a Lusorecursos, a detentora da licença de prospecção) e a Savannah, sediada em Londres, que em Maio anunciou a compra de parte dos direitos de exploração de quartzo, feldspato e lítio na Mina do Barroso, concelho de Boticas, Trás-os-Montes.

Portugal tem segundo aquele relatório nove regiões com ocorrência de mineralizações de lítio caracterizado por intrusões pegmatíticas, concentradas no Centro e Norte do país: Serra de Arga, Barroso-Alvão, Seixoso-Vieiros, Almendra, Barca de Alva-Escalhão, Massueime, Guarda, Argemela e Segura.

O grupo de trabalho refere ainda que a DGEG definiu 11 "campos" correspondentes às zonas de potencial interesse das empresas (onde : Arga, Sepeda-Barroso-Alvão, Covas do Barroso-Barroso-Alvão, Murça, Almendra, Penedono, Amarante Seixoso-Vieiros, Massueime, Gonçalo Guarda-Mangualde, Segura e Portalegre.

Nas suas conclusões, o grupo defende a criação de um programa de fomento mineiro para avaliar os recursos minerais de lítio existentes no país e a implementação de duas unidades experimentais – minero-metalúrgica e de demonstração, em consórcio com empresas exploradoras - para aferir da viabilidade económica da cadeia de valor.
Fonte: Bloomberg                    

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