segunda-feira, 11 de março de 2019

Ações americanas estão vulneráveis

Ações americanas estão vulneráveis





Opinião - 10/03/2019 - 15:10
Por Gabriel Casonato, Editor da Agora Brasil
Caro leitor,
Como um exército que se distanciou de suas bases de suprimento, o mercado americano de ações está muito à frente do seu apoio logístico.
A capitalização de mercado total das ações dos EUA atualmente varia de 40 trilhões de dólares – ou o dobro do PIB.
Esta relação de 2 para 1 é a mais alta da história, vale mencionar.
Ou seja, nunca antes Wall Street esteve tão à frente da Main Street.
Mas como Napoleão correndo para Moscou após a Batalha de Borondino, um exército desguarnecido é um exército vulnerável.
O Grande Armée entrou na Rússia com cerca de 250.000 homens em junho de 1812.
E em apenas um dia, 70.000 destes homens perderam suas vidas na maior e mais sangrenta batalha das Guerras Napoleônicas.
Acreditamos que o mercado americano de ações está marchando em direção a sua própria Moscou.
Cedo ou tarde, ele voltará quebrado e sangrando.
Nos três últimos meses de 2018, o PIB dos EUA cresceu 2,6 por cento, bem abaixo dos 3,4 por cento do trimestre anterior, na segunda desaceleração trimestral seguida.
E para o primeiro trimestre de 2019, também por culpa do impacto da paralisação parcial do governo, o Goldman Sachs projeta uma alta de apenas 0,9 por cento.
O que alguns já consideram uma previsão otimista, considerando que o Fed de Nova York espera um crescimento de 0,88 por cento e o de Atlanta de apenas 0,3 por cento.
Enquanto isso, o consumo no país parece ter atingido seu ápice e já começa a dar sinais de exaustão.
Em dezembro, a dívida de cartão de crédito dos EUA aumentou 870 bilhões de dólares – o maior valor já registrado.
Da mesma forma, as taxas de juros de empréstimos de automóveis atingiram o maior patamar em oito anos.
E um número recorde de americanos tem pelo menos 90 dias de atraso no pagamento.
No total, os pagamentos agregados de juros das famílias aumentaram para uma taxa de 15 por cento ano a ano.
Como o Zero Hedge nos lembra, a recessão esteve presente em quase todas as ocasiões em que os pagamentos de juros aumentaram com tanta extravagância.
Michael Snyder, do sugestivo blog The Economic Collapse, faz o alerta:
A inadimplência da dívida está em níveis sem precedentes, as falências estão em alta, as lojas de varejo estão fechando em ritmo recorde; esta é a pior economia para os agricultores desde o início dos anos 80, as exportações estão despencando e uma nova crise imobiliária já começou.
Então por que as ações ainda estão tão caras?
O Índice Shiller de Preço sobre Lucro é um barômetro amplamente reconhecido dos preços do mercado de ações.
Ele basicamente leva em consideração o lucro médio das empresas do S&P 500 nos últimos dez anos ajustado pela inflação.
Estendendo-se pela história, sua pontuação média é de 16,9.
Pois mesmo depois do quase bear market que tivemos no final do ano passado, hoje ele encontra-se em 30,3 – ou 80 por cento acima da média.
Conforme o gráfico acima, apenas os obscenos 44 pontos de 1999 superam o atual ciclo.
Mas será que as condições econômicas atuais justificam os lucros tão altos dos últimos anos?
As evidências reunidas gritam que não!
Olhando para um prazo mais longo, vemos que Wall Street está em marcha desde 2009, apenas com reversões ocasionais.
O problema é que a economia atual tem desempenho inferior à pior economia.
Entre 2007 e 2018, o PIB real dos EUA se expandiu a uma taxa acumulada de 18,85 por cento.
Isso é menos da metade do crescimento de 38 por cento acumulado entre 1969 e 1980, década marcada pela crise energética e por severos problemas de inflação.
Mas a última década ainda é melhor, por exemplo, do que os terríveis anos da Grande Depressão.
Não em termos de crescimento do PIB real, o qual cresceu 19,89 por cento entre 1929 e 1940, mas sim no que diz respeito a outros indicadores, como o de desemprego.
O que está agora estabelecido, no entanto, é um fato matemático. Em nenhum dos últimos 11 anos a economia americana cresceu acima de 3 por cento.
Isso em plena década do mais massivo estímulo monetário e fiscal combinado da história dos EUA.
Enquanto isso, o S&P 500 ganhou mais de 300 por cento desde a última grande queda de 10 anos atrás, época da crise financeira.
Algo não está certo.
Vamos comparar o desempenho do mercado de ações atual com a Grande Depressão e os anos 1970?
Ele esteve positivo em grande parte da década de 1930. Mas, em termos nominais, precisou de 25 anos para se recuperar do choque de 29.
Enquanto isso, os principais índices de ações dos EUA precisaram de apenas seis anos para recuperar as máximas de 2007.
E esse fato não pode ser atribuído à economia, que cresceu apenas 1,14 por cento entre 2009 e 2013.
E sobre a década “perdida” dos anos 70?
Lembre-se que o PIB real de 1969 a 1980 cresceu mais que o dobro do que entre 2007 e 2018.
Contudo, o Dow Jones, que havia iniciado 1969 em cerca de 6.500 pontos, abriu 1980 em apenas 2.850.
O S&P 500, por sua vez, mergulhou de 740 para 360 pontos no mesmo intervalo.
Ou seja, para o mercado de ações a década foi verdadeiramente perdida.
Tão perdida que a a Business Week publicou uma matéria de capa em 1979 pronunciando “A Morte das Ações”.
Resumindo:
O PIB real de 1969-1980 cresceu mais do que o dobro do que o PIB real de 2007-2018.
Mas o mercado de ações de 2007-2018 pelo menos triplicou o mercado de ações de 1969-1980.
Talvez esse fato curioso se deva às múltiplas rodadas de flexibilização quantitativa que inflaram muito as ações pós-crise de 2008.
As mesmas múltiplas rodadas de flexibilização quantitativa que geraram um crescimento artificial na economia.
O tempo, contudo, é um grande equalizador. E suspeito que, em algum momento, mercado de ações e economia se encontrarão novamente em um local mais justo.
Isto é, as ações provavelmente cairão para o nível da economia real antes que a economia real suba para o nível das ações.
Mas se os deuses do mercado existem, eles não deixarão que isso aconteça tão cedo.

Fonte:  Agora Brasil


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