segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Lojas de ouro anunciavam em "O Garimpeiro"

Lojas de ouro anunciavam em "O Garimpeiro"

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inguém chega ao ouro apenas olhando o Rio Madeira do barranco. Vá de Classimpeiro e ‘bamburre’ numa boa. Todas as semanas ele ‘fofoca’ a melhor dica para você não ‘blefar’. Saiba o que acontece nas currutelas de Rondônia e do Brasil, lendo O Garimpeiro” – dizia o anúncio do jornal. Além dessa seção fixa também saíam anúncios individuais.

A publicidade nas edições desse semanário porto-velhense fazia parte do êxito do efervescente comércio do ouro em 1985, tempos em que o País conhecia o governo da “Nova República”, pós-morte do presidente Tancredo Neves.

Para bamburrar, apoite com segurança na Fortaleza do Povo – de Altamiro Passos.

Garimpeiro comprando na Cibrama não fica blefado – Companhia Industrial Brasileira de Madeira (Lambris, assoalhos, rodapés, pranchas, forros, vigas e tábuas – Estrada da Cascalheira s/nº, telefones 2213365 e 2213275).

Compra de ouro do Tião – Venha tomar um refrigerante e negociar o seu ouro na melhor oferta da cidade: Avenida Sete de Setembro 1.326, ao lado do Pastel Quente. O melhor negócio é com o Camelo – Vá procurá-lo na Rua Henrique Dias 456, Telefones 2219849 e 2219183, em Porto Velho.

Era um jornal artesanal composto em linotipo e impresso a quente (com chumbo derretido), que divulgava informações do setor mineral e defendia a classe extrativista mais nômade da Amazônia, tanto constituída por garimpeiros quanto por balseiros e dragueiros que migravam para todos os quadrantes onde havia notícia de fofoca (ocorrência de ouro). Cutucava sempre as “grandes onças” multinacionais que haviam se instalado em Rondônia nos tempos da cassiterita, e também as novas, que estavam chegando.

Criado pelo geólogo Djalma Lacerda, então presidente da Companhia de Mineração de Rondônia, teve suas edições confiadas a mim e aos colegas Nelson Severino, Carlos Gilberto Alves e Jorcêne Martínez. No começo, seu João Leandro Barbosa, o Perigoso – que a todos chamava de Perigozinho – nos levava de carro toda a semana para Cacoal, a 500 km, onde o jornal era impresso na gráfica da Tribuna Popular, de Adair Perin.

Outros anunciantes daquele período e seus respectivos slogans:

– Rua Campos Sales 984); Zé Lobato (Com a cotação do dia pagamos o melhor preço de Rondônia – Avenida Sete de Setembro 1.180).

Dragas Gondim Indústria e Comércio (Fabricação, montagem e manutenção de barcos, rebocadores, silos, dragas de todos os tamanhos – Com grande profundidade. Peneiração de areia e garimpo, 512053 e 511112).

Antonio Barbudo (Ouro e metais preciosos – Paga o melhor preço da praça – Avenida Sete de Setembro 1.059).

Advogada Lindinalva Laranjeiras (Garimpeiro, o endereço é este: Rua Campos Sales 1.591, Areal) Lindinalva e Nilton Dantas eram advogados do jornal.

L.J.R. Comércio Golden de Ouro (A diferença das outras casas está no preço que pagamos; comprove – Rua Campos Sales 934, telefone 2212590).

Não adianta descer a Sete para tentar o melhor. Você vai voltar e vender para o Manuel. É o que paga melhor.

L.F.P. Barreto Comércio de Ouro – Avenida Sete de Setembro, esquina com Rua Marechal Deodoro 1.264, telefone 2219144).

R.V. Coelho (Compra ouro de garimpo e ouro velho – Avenida Sete de Setembro 1.181).


Já os hotéis esnobavam seus apartamentos com ar condicionado, frigobar, telefone, TV, restaurantes, pratos italianos, frutos do mar etc. Um deles, o Rondon Palace Hotel, “inteiramente familiar”, não arriscava se dizer o melhor. No anúncio colocava: “com prestações de serviço quase perfeitas.”

Outros hotéis que prestigiavam o jornal: Azteca, Boa Viagem, Guaporé Palace, Jordan, Los Andes, Nunes, Planalto, São João, Sebma, Tia Carmem, Vitória, Samaúma, Cuiabano, Iara e Libra. Em Ariquemes: Horla, Hotel Ariquemes, Jocemel, Rio Branco e Rio Madeira.

Em Jaru: Bar e Hotel Paraná. Costa Marques: Hotel Vale do Guaporé. Guajará-Mirim: Fênix Palace Hotel e Hotel Mini Estrela. Ouro Preto do Oeste: Hotel Ouro Preto. Ji-Paraná: Hotel Guanabara, Hotel Itamaraty, Hotel Sol Nascente, Hotel Transcontinental. Rolim de Moura: Hotel e Comercial Dalla Vecchia. Cacoal: Tarcisbel, Hotel Amazonas e Cacoal Palace Hotel.

Pimenta Bueno: Hotel Céus de Rondônia, Hotel Piritiba Palace. Cerejeiras: Hotel Real. Colorado do Oeste: Fenícia Palace Hotel e Hotel Restaurante do Toninho. Vilhena: Aripuanã Hotel, Diplomata Hotel, Hotel Campinense, Hotel Mirage, Hotel Primavera, Hotel e Restaurante Colorado e Vilhena Palace Hotel.

Mais anunciantes:

Casa Cruzeiro do Sul – antigo grupo Zé Arara (Compramos ouro pelo melhor preço: Rua General Osório, ao lado da Magriff); Pescaça Sociedade Comercial Ltda. (Armas, munições e artigos de pesca – Avenida Campos Sales 2247, telefone 2211871).

Sobral Magazine (Aqui, quem manda é o freguês – Ande na moda, passe na Sobral e se atualize – O ponto chic da capital –Edifício Rio Madeira, loja e sobreloja).

Agroindustrial e Mineradora Camelo Ltda. (Motobombas, grupos geradores, motores de pôpa, motores diesel e todo equipamento para garimpo – Rua Henrique Dias 456).

Hectare Empreendimentos Imobiliários Ltda. (Diretores: Ramalho e Barreto – A nova opção de negócios de imóveis no Estado, 2218296).

Motomaq (Possui todo material para equipar dragas e balsas, como também para tratamento de ouro, além de uma linha completa para mergulho – Rua D. Pedro II 1378, com filiais em Mutumparaná e Guajará-Mirim).

Itaituba a Jacareacanga

Itaituba a Jacareacanga

Fim da trilha
A vegetacao muda o tempo todo. Sao muito cenários diferente ao longo da mesma estrada

A foto está de cabeça pra baixo ou não?
A Transamazonica dos meus sonhos
A maior árvore que ja vi na vida.
Cruzar o Brasiil pelas areias Jalapao ao coraçao da floresta Amazonica é preciso ter os dois pés no chao. E de preferecia que sejam dois mittas E09.
Entrada do Parque
Itaituba a Jacareacanga

Itaituba tem seu passado recente ligado ao garimpo.
Nos anos 80 havia em Itaituba 60 mil garimpeiros trabalhando nos garimpos da cidade. As histórias de riqueza são muitas. Os homens que mais enriqueceram com o garimpo foram Zezao do Abacaxi (Dono do garimpo do abacaxi) e o Zé Arara.
O dinheiro era tanto que Zezao fez uma festa de quinze anos para sua filha reunindo 700 pessoas. Tudo do bom e do melhor. Para animar a festa chamou o Grupo Polegar que estava no auge da fama.
Zé Arara tinha um jatinho com pista de pouso particular asfaltada. Às vezes pegava a família e ia almoçar em um bom restaurante de São Paulo, depois voltava.
Vinham mulheres do Brasil todo para trabalhar no km 7 onde ficavam as boates.
Havia 17 boates e mais de 400 mulheres, tudo de primeira linha. Algumas depois eram vistas em capas de revistas ou no carnaval do Rio. Foram as que mais ganharam com o garimpo.

Logo que se sai de Itaituba em direção a Apui há a Reserva Nacional da Amazônia.
Que lugar! O lugar mais espetacular que já vi na vida. Você se sente na casa de Deus.
É como se ele conduzi-se você lentamente. Há uma paz muito grande. Arvores muito alta. Pássaros cantando o tempo todo. Há um cheiro de vegetação.
É como se estivesse acontecendo um grande espetáculo e só você fosse à platéia e o teatro fosse todo seu. Você pode ver a apresentação na velocidade que quiser, pode pedir pra repetir e pode voltar atrás e ver de novo. Sentia-me leve, completo e em paz com Deus. Abençoado por poder estar ali. Fui tocando lentamente sem capacete e sem velocidade. Apenas vendo, ouvindo e sentindo. Extasiado
Obrigado meu Deus por esse dia.

Na década de 1980, Itaituba (a 890 quilômetros de Belém) era uma espécie de Dodge City brasileira

Agnaldo Timóteo
Na década de 1980, Itaituba (a 890 quilômetros de Belém) era uma espécie de Dodge City brasileira - muito ouro e uma lei de artigo único: calibre 38. Calcula-se que, por baixo, havia coisa de 120 mil garimpeiros emburacados floresta adentro. Circulava pelo mapa local cerca de 3,5 toneladas de ouro por mês. A cidade vivia um orgasmo permanente e ganhar dinheiro era tão fácil quanto morrer. O improvisado aeroporto da cidade chegou a contabilizar 382 pousos num único dia - metade do fluxo atual de Congonhas (SP).

Responsáveis por manter toda aquela doideira em movimento, os pilotos eram os que mais lucravam. "Costumava viajar com um saco cheio de dinheiro", lembra o piloto Clinger Borges do Vale, que chegou a transportar, em seu monomotor, artistas do naipe de Agnaldo Timóteo e Raul Seixas nas turnês pelos garimpos. Os donos dos aviões eram sempre garimpeiros para quem a sorte lhes estampara sorriso de ouro. Foi o caso de Zé Arara, um piauiense analfabeto dono de uma quinzena de aviões, entre eles um Lear Jet que usava para ir pessoalmente, manhã cedinho, à sua Parnaíba natal comprar a carne-de-sol que comeria no almoço, na volta a Itaituba. Outro que voou para Zé Arara foi o lendário comandante Rogério Maconha (veja seu depoimento a seguir).
Bem, agora não é boa hora para lembranças. O monomotor pilotado por Luís Feltrin está para fazer sua primeira parada e é preciso atenção. A pista aparece apenas quando já se está em cima dela. Tanto essa como a maioria só têm uma estrada para pouso, o que complica se o vento for de cauda. A descida até que não foi das piores. Parte da carga é rapidamente descarregada e seguirá seu trajeto no "jegue". Jegue, entenda-se, é um veículo tradicional dos garimpos, feito de um motor diesel e alguma carcaça disponível. É bem feio, mas é capaz de rodar três dias com cinco litros desse combustível - e isso, ali, o pessoal acha bem bonito. Primeira remessa entregue, hora de levantar vôo - e mais alguns apuros - até as paradas seguintes.
Cinco corpos
Antes do GPS, a aviação de garimpo era praticamente uma roleta-russa. Sobrevivia-se na sorte. "Um dia, prestes a levantar vôo, assisti à chegada de cinco corpos de pilotos mortos na véspera", relembra, no ar, o sempre inoportuno Feltrin. É verdade que, com tanto dinheiro em circulação, ninguém gostava de perder tempo fazendo manutenção de avião ou de pista. Usavam-se clareiras mínimas, de cerca de 200 metros, até em curvas ou em subidas. Nada disso, no entanto, importava - a coisa era a grana.

"Antes do GPS, a aviação de garimpo era praticamente uma roleta-russa. Sobrevivia-se na sorte"
A situação, hoje, é a que conhecemos. Com a queda da euforia, vários pilotos abandonaram a região. Uns foram parar na aviação comercial ou executiva. Outros, procurando manter o padrão de vida conquistado no auge do garimpo, partiram em busca de um novo Eldorado - o "ouro branco" da Colômbia. Os que ainda insistem em permanecer voando pelo garimpo o fazem por alguma paixão sobrevivente.
"Além de saber quem são seus passageiros, aqui você voa e sente o peso do avião na mão", explica Armando Palla Júnior, que continua resistindo a ofertas de trabalho em companhias de aviação. Graças a ele e outros persistentes pilotos de garimpo, Zé do Rifle receberá seus remédios, a boate terá suas meninas, Raimundo Nonato, sua carta, e o Negão do Curuá será finalmente levado para o hospital que tentará recolocar para dentro seu bucho escancarado, cortesia do terçado de Francisco - que vai embarcar no próximo vôo para explicar ao delegado o motivo da briga. Sorte que os monomotores continuam no ar.

1. Comércio de outro no garimpo de Água Branca (PA).
2. Atenção, preparar para o pouso: clareiras de apenas 200m.
3. às vezes, vai aos trancos mesmo.
4. O piloto Clinger, com a jaqueta que ganhou do "patrão" Raul Seixas numa turnê que o músico fez pela região: "Eu viajava com um saco de dinheiro".

Tempos de ouro

Tempos de ouro


A cidade foi chamada de último faroeste brasileiro, a capital dos garimpos. No auge da febre do ouro, Itaituba recebia hordas de gente vinda de todos os cantos do país. Vinte toneladas de ouro por ano chegaram a ser extraídos dos garimpos do Alto Tapajós no fim dos anos 80. Mesmo com a decadência da mineração no rio do ouro, eles não perderam a esperança. Dos mais de 700 garimpos, só 200 ainda estão em funcionamento. A produção não chega a três ou quatro toneladas por ano.
Zé Arara é o mais lendário garimpeiro do Tapajós. Na década de 60, foi o garimpeiro mais famoso da Amazônia. Ele formou um império, no município de Itaituba, de aviões, mansões, fazendas, muito dinheiro, tudo tirado do ouro. Aí veio a crise e ele teve que recomeçar tudo.
“Antes da crise fui o único brasileiro que vendeu na faixa de 40 toneladas de ouro ao governo brasileiro”, conta ele. Zé Arara perdeu muito, mas nunca foi um garimpeiro de alma livre, capaz de gastar em uma noite, com mulheres e bebida, tudo o que levou meses para ganhar.
Ao contrário, ele construiu um patrimônio. “Além de ter um jato, tinha 15 aviões pequenos e quatro bandeirantes”, ressalta. Um problema com o jato em Itaituba fez com que Zé Arara trasladasse o avião de volta para a fábrica, em Nova York. “O avião explodiu no ar. Morreram dois tripulantes, dois comandantes e dois mecânicos. Para eu desenrolar esse rolo e não ser preso nos Estados Unidos, tive que gastar 200 quilos de ouro”, conta o garimpeiro.
Desde então, ele está sem sair do garimpo. São onze anos pagando dívidas. “Não devo mais, agora estou lutando para reerguer nosso negócio”, conta. Zé Arara se diz dono de 23 mil hectares de terra, toda a área do garimpo de Patrocínio. Mesmo assim, os moradores criaram uma associação e querem transformar a região em uma comunidade.
Zé Arara se sente ameaçado. “Temo até pela minha segurança. Hoje, estou recomeçando aos 70 anos”, ele diz. O garimpo não é mais como antes. Das dez mil pessoas que buscavam ouro em Patrocínio só restam duas mil.

Não dá mais para tirar ouro com a mão, diz coronel

Não dá mais para tirar ouro com a mão, diz coronel

Sebastião Curió chegou ao garimpo em 1980 e coordenou a extração de ouro com mão de ferro. Hoje, acompanha de longe a mecanização

Aos 75 anos, o coronel Sebastião Rodrigues de Moura conhece como poucos as agruras de Serra Pelada. Há exatos 30 anos, Curió, como é conhecido, chegou pela primeira vez na região, como enviado do governo federal para coordenar a corrida pelo ouro. Durante três anos, baixou regras rigorosas para controlar a turba de mais de 100 mil homens que tentavam bamburrar – ou enriquecer, na gíria dos garimpeiros – e viu sair 42 toneladas de ouro da mina. Quando foi deputado federal, aprovou um projeto de lei para estender por mais cinco anos o garimpo e foi prefeito de Curionópolis, município do qual Serra Pelada é um distrito e cujo nome foi dado em sua homenagem.

 
Durante três anos, o coronel Sebastião Curió coordenou com mão de ferro o garimpo em Serra Pelada
Com a experiência de três décadas em Serra Pelada, Curió tem uma certeza: não dá mais para tirar ouro com as mãos como nos velhos tempos. Por isso, é a favor da mecanização da mina, processo que terá início em maio, quando o governo deverá conceder a licença de lavra para a Serra Pelada Companhia de Desenvolvimento Mineral (SPCDM), joint venture entre a mineradora canadense Colossus e a Coomigasp, a Cooperativa de Mineração dos Garimpeiros de Serra Pelada. “Nessa nova fase de Serra Pelada nenhum garimpeiro vai enriquecer”, disse ao iG o coronel Curió. “Mas, como acionistas da empresa, eles têm uma boa perspectiva para melhorar a qualidade de vida”.
De sua casa em Brasília, Curió, que antes de chegar a Serra Pelada havia combatido a guerrilha do Araguaia, falou sobre a mecanização da mina e fala dos tempos em que comandava os garimpeiros. Acompanhe os principais trechos da entrevista:
iG: Como o senhor foi parar em Serra Pelada?
Sebastião Curió: Por causa de uma busca e apreensão que fiz com o Zé Arara, o maior comprador de ouro da região. Trouxe o material apreendido e fiz uma apresentação para o ministro da Fazenda, o presidente da Caixa Econômica, vários generais e representantes do presidente da República, João Figueiredo. Contei o que estava acontecendo em Serra Pelada e, depois dessa palestra, foi determinado que a exclusividade de compra do ouro fosse dada para a Caixa Econômica e que eu fosse o coordenador do garimpo.
iG: Em que condições o senhor encontrou a região?
Curió: Havia uma corrida do ouro e milhares de garimpeiros chegavam diariamente em Serra Pelada. Cheguei no dia 2 de maio de 1980, e o povoado devia ter uma população de 40 mil pessoas. Ao chegar, falei que meu objetivo era evitar desvios, contrabando e coordenar a exploração. Trouxe alguns benefícios. Entre outras coisas, cortei o percentual que eles pagavam ao Genésio, o suposto dono da propriedade, um posseiro que cobrava taxa de 20% da produção dos garimpeiros.

iG: Por que o senhor proibiu a entrada de mulheres em Serra Pelada?
Curió: Muitos dizem que foi discriminação, mas não é verdade. Eram muitos homens e a presença das mulheres causaria muitas mortes por noite. Além das mulheres, proibi jogo de azar, bebida alcoólica e o uso ostensivo de armas. Recebi uma ordem de Brasília para desarmar todo mundo. Mas não dava para desarmar 60 mil homens com apenas 16 policiais. iG: E se alguém não respeitasse as regras?
Curió: Quem não tinha carteirinha da Receita Federal (naquela época ainda não existia a cooperativa) era colocado num avião e mandado embora do garimpo. Eram os chamados furões. Brigões e ladrões também eram expulsos de Serra Pelada.
iG: Como era o relacionamento com os garimpeiros?
Curió: Excelente. Montávamos um telão com lençóis brancos e 40 mil homens assistiam a filmes à noite. Quando decidi que iria hastear a bandeira nacional todas as manhãs, convidei todo mundo para assistir. Cerca de 30 mil homens apareceram. Quando começou a tocar o hino e coloquei a mão no peito, percebi que os garimpeiros fizeram a mesma coisa. Toda dia pela manhã, 40 mil homens hasteavam a bandeira e cantavam o hino nacional. Era um espetáculo de civismo.
iG: O senhor viu muita gente enriquecer em Serra Pelada?
Curió: Muita. Tem um caso engraçado. Estava no meu barraco de lona e vi um tumulto na pista de pouso. Tinha um monte de garimpeiro correndo atrás de um cara. Quando ele se aproximou de mim, pude ver que fumava um charuto de notas de Cr$ 1 mil. Além disso, tinha uma cauda parecida com as usadas em pipas, mas feita de notas de Cr$ 1 mil ao invés de plástico. O garimpeiro parou perto de mim e gritou: ‘bamburrei (enriqueci, na gíria local), meu chefe’. Perguntei o que era aquele rabo e ele falou: ‘sempre andei atrás do dinheiro. Agora o dinheiro anda atrás de mim’. Ao todo, colocamos 42 toneladas de ouro nos cofres do Banco Central.
iG: Mas os garimpeiros não viviam numa situação muito degradante?
Curió: Muita gente me pergunta se os formigas (carregadores de sacos) não viviam num sistema semi-escravo. Eles carregavam sacos com cinco, seis, oito pás de cascalho, mas ganhavam de cinco a seis salários mínimos por mês. Era a mão de obra não especializada mais bem remunerada do País.
iG: Por que o senhor resolveu se candidatar a deputado federal?
Curió: Não tive escolha. Em 1982, recebi ordem da presidência da República para me candidatar a deputado. Um compadre acha que fizeram isso para me tirar do garimpo. Quando saí de lá desligaram as bombas que puxavam a água, a cava encheu e acabou a exploração. Fui estrategicamente retirado de Serra Pelada.
iG: Por que o senhor acha que fizeram isso?
Curió: Para que Serra Pelada não funcionasse. Eleito deputado, recebi a orientação para voltar à Serra Pelada para dizer aos garimpeiros que o garimpo havia terminado. Fiz o oposto. Em 1984, apresentei um projeto de lei para prorrogar o garimpo por cinco anos, criei a cooperativa dos garimpeiros de Serra Pelada. Deixei de ser deputado e os garimpeiros pediram que eu fosse presidente da cooperativa. Aceitei, mas estava numa situação muito difícil porque já não tinha o apoio do governo.
iG: O senhor é a favor da mecanização de Serra Pelada?
Curió: Sou. A lavra manual tornou-se impossível, o ouro pode ser encontrado a 150 metros abaixo do solo. Não dá mais para tirar com a mão.
iG: Se a mecanização é boa, por que ela não aconteceu antes, como na época em que o senhor foi presidente da cooperativa dos garimpeiros?
Curió: Quando era presidente da cooperativa, pedi o alvará de lavra industrial de empresa de mineração. Ou seja, a cooperativa passou a ser cooperativa de mineração dos garimpeiros de serra pelada, deixou de ser só dos garimpeiros. Se não tivesse feito essa mudança, ela não poderia fazer um convênio com uma empresa como a Colossus.
iG: Os garimpeiros que ficaram em Serra Pelada acreditam que saíram perdendo com o acordo fechado com a Colossus. O que o senhor acha disso?
Curió: Muitos têm razão. O problema é que a cooperativa não teria condições de industrializar a mina. Tem de ter uma empresa de porte da Colossus para realizar o trabalho. O que é perigoso é a cooperativa perder os direitos minerais e administrativos. Consta que a diretoria da cooperativa assinou um contrato com uma cláusula passando os direitos para a Colossus. É isso que preocupa uma parcela dos garimpeiros.
iG: Algumas pessoas acreditam que Serra Pelada só produziu miséria. O senhor acha que agora ela vai produzir riqueza?
Curió: Se o acordo funcionar direito, o garimpeiro deixa de ser um sonhador para ser um cotista, um acionista. Ele vai receber um percentual do lucro da mineração de acordo com o número de cotas que ele tem. É uma boa perspectiva.