Rio de Janeiro - Com 18 mil habitantes, a cidadezinha mineira de
Conceição do Mato Dentro, a 170 quilômetros de Belo Horizonte, está na
origem de um dos maiores projetos de
mineração do mundo.
Foi lá que, no primeiro dia deste mês, o presidente global da mineradora
Anglo American,
Mark Cutifani, testemunhou a última solda do mineroduto de 525
quilômetros, estrutura de porte inédito que vai transportar minério de
ferro por 32 municípios até o litoral do Rio.
Essa foi a última de 288 mil soldas e marca a reta final do projeto
Minas-Rio, que deve entrar em operação até dezembro, com quatro anos de
atraso.
A expectativa da empresa com o projeto é grande. Ele adicionará de US$ 1
bilhão a US$ 1,5 bilhão ao caixa anual da Anglo American, sexta maior
mineradora do mundo, quando atingir, a partir de 2016, a capacidade
plena de produção, de 26,5 milhões de toneladas anuais de minério de
ferro.
O grupo anglo-sul-africano estima levar a commodity até a China e ao
Oriente Médio a um custo de US$ 35 a tonelada, considerado páreo para
enfrentar até mesmo os eficientes rivais australianos.
A mineradora mantém a previsão de iniciar a operação no fim do ano. "O
Minas-Rio será um grande gerador de caixa, porque é um produto de volume
e com um custo baixo", diz o presidente da Unidade de Negócio Minério
de Ferro Brasil da Anglo American, Paulo Castellari.
No País desde 1973, a mineradora mantém em território brasileiro
unidades de produção de níquel, nióbio e fosfatos. Mas o negócio mais
relevante é, sem dúvida, o projeto Minas-Rio.
Ele teve início em 2007, quando a Anglo comprou uma reserva da MMX, empresa de Eike Batista.
O orçamento de US$ 3 bilhões, na época, saltou para US$ 8,8 bilhões.
Somados aos US$ 5,2 bilhões pagos à companhia de Eike, a conta da Anglo
chega a US$ 14 bilhões.
O estouro de orçamento e o atraso da obra - que enfrentou denúncias no
Ministério Público, remoção de centenas de famílias, gastos com
liminares, imprevistos geológicos e arqueológicos, além da demora para
obtenção de licenças ambientais - levaram, em abril do ano passado, ao
afastamento da presidente global Cynthia Carroll.
Em 2012, quando o cronograma foi alterado pela última vez, a empresa registrou uma baixa contábil de US$ 4 bilhões.
A multinacional, no entanto, está otimista quanto ao retorno do
projeto. Recentemente, Mark Cutifani, anunciou o objetivo de atingir um
retorno sobre capital de 20% para a companhia.
A meta é chegar a no mínimo15% até 2016. Ao lado de melhoras
operacionais em minas do Chile e da África do Sul, a entrada em operação
do Minas-Rio é uma das apostas para alcançar o resultado.
"Remunerar nosso capital vai ser muito difícil. Mas com um custo de US$
35 vamos gerar bastante caixa mesmo se houver um cenário catastrófico
de (preço do minério a) US$ 80 por tonelada", diz Castellari.
Estratégia
Toda a produção da Anglo em Conceição do Mato Dentro já foi
comercializada em contratos de mais de dez anos para clientes chineses e
do Oriente Médio.
Por isso, o projeto já entra em operação com a Anglo de olho em ampliar
a capacidade de produção da mina para 30 milhões de toneladas/ano.
Segundo Castellari, a expansão é possível apenas com melhorias operacionais e sem grandes investimentos.
Além de ganhar escala, o excedente de produção deve ajudar a companhia a
carimbar um selo de qualidade no minério extraído do Minas-Rio, que tem
68% de teor de ferro e baixo nível de contaminantes.
"Nossa estratégia é usar esse volume para mostrar ao mercado que esse
produto é diferenciado e conseguir chegar a outros clientes", revelou.
O executivo admite que os contratos de longo prazo herdados pela Anglo
com a compra do ativo da MMX não eram muito "atraentes" e carregavam
descontos por terem sido negociados com o projeto ainda em uma fase
muito inicial.
"A notícia boa é que temos confiança de que vamos conseguir atrair
prêmio (de qualidade para o minério), compensando esses descontos."
O analista de investimento da SLW Corretora, Pedro Galdi, lembra que o
Minas-Rio entrará em operação em um momento delicado para o setor,
quando a economia chinesa desacelera e o preço médio do minério está
abaixo de US$ 100 por tonelada.
Embora avalie que a China continuará sendo uma forte compradora de
minério, ele lembra que o governo chinês está tomando medidas para
conter a poluição que fatalmente afetarão siderúrgicas locais.
"O projeto Minas-Rio ultrapassou as barreiras do racional, se tornou
muito caro e, nesse cenário, pode não ter um retorno tão bom", diz.
Mesmo com a cotação do minério de ferro abaixo dos US$ 100 por tonelada
nas últimas semanas, a commodity continua entre as mais atrativas no
planejamento de longo prazo da Anglo American.
A análise da empresa é que a China continuará investindo em
infraestrutura. Ao mesmo tempo, à medida em que o preço cai, produtores
com custos mais altos tendem a fechar as portas.