Serra da Borborema, região do cariri paraibano. A imensa
cordilheira que corta a caatinga tem muito mais do que beleza.
Na região foi descoberta a mais especial e rara das pedras
preciosas: a turmalina paraíba. De um azul único, brilho
incomparável, alcançou valores nunca imaginados. Um recorde: a
turmalina brasileira superou a cotação dos diamantes.
Um caminho de terra e poeira é a ligação da cidade
do tesouro com o resto do mundo. Em São José da Batalha, o berço
das turmalinas, nada mudou com a descoberta das pedras tão
valiosas. O povoado segue a rotina sem pressa e sem novidades.
Os moradores
apenas assistiram a riqueza ser
levada para bem longe do local. As turmalinas permanecem nas
histórias que alimentam muitos sonhos na região.
"Muita gente teve pedras valiosas na
mão", conta o ex-garimpeiro Antônio Carlos Costa.
"Uma pedrinha dessas custa de R$ 8 a R$ 10
mil. Não me desfaço dela. Fica como lembrança, para as pessoas
verem o que eu faço na vida. Pelo menos fica para os netos,
bisnetos, tataranetos. E a história continua", diz o
ex-garimpeiro Gerlado Oliveira.
Os moradores guardam mágoa de um passado em que a
riqueza esteve bem perto, ao alcance das mãos deles. Mas naquele
tempo a turmalina paraíba não tinha o valor que tem hoje.
"Ninguém sabia o valor, entoa, trocava por
moto, carro. E assim mandaram tudo para fora", conta
Geraldo Oliveira.
E é atrás da história de persistência e obstinação
que se vai ao encontro do garimpeiro José de Souza, conhecido
por Deda. Dá para imaginar que o homem que ocupa uma casa tão
modesta já morou na melhor casa da cidade? Ele já foi dono de
caminhões, de um bom carro, de minas de garimpo. Tudo comprado
com o dinheiro das turmalinas que achou. Mas hoje a cobiçada
pedra azul não passa de um retrato na parede.
"Não tenho ideia de quanto a pedra valeria
hoje, mas eu não entregaria a ninguém por menos de R$ 2 milhões.
Tenho esperança de que vou conseguir outra", diz Deda, que
vai em busca da pedra da fortuna. A caminhada é longa. São seis
quilômetros até a mina. Basta seguir por um túnel.
O garimpeiro não teve dinheiro para pagar a
energia e tem que trabalhar no escuro, à luz de velas. A mina
tem 150 metros de extensão.
"Na realidade, dá para ver o mínimo. Mas não
tem outro jeito", conta o garimpeiro, que não tem medo de
perder a turmalina no meio da escuridão. "Trabalhamos de
olho nela".
Não importa se é dia ou noite, o caçador solitário
de turmalinas cava sem parar. A maratona continua empurrando o
carrinho.
De carregamento em carregamento, todo o material é
retirado de dentro da mina. São toneladas de cascalho. O rejeito
da mina cobriu toda a encosta do morro. Deda conta que são oito
anos de suor no local. "Meu pensamento fica em Deus",
diz.
Caulim é uma argila branca, onde os garimpeiros
encontram as turmalinas. Na primeira mina de turmalina da
região, uma galeria gigantesca está desativada. Exploração
agora, só com máquinas.
"É impossível calcular, mas, pela experiência
que temos, ainda não foram explorados 10% dessa mina",
conta o minerador Sérgio Barbosa.
As galerias têm passagens para todos os lados e
chegam a 60 metros de altura.
E pensar que a mais rara das pedras preciosas foi
encontrada em uma região marcada pela aridez, em uma terra
considerada pobre, que não serve para plantar. A primeira
turmalina paraíba foi descoberta a sete metros de profundidade,
20 anos atrás, graças à obstinação de um homem: Heitor Barbosa,
que o Globo Repórter foi conhecer em Belo Horizonte, Minas
Gerais.
Heitor Dimas Barbosa é o dono da mina de São José
da Batalha. Todas as pedras que ele guarda vieram de lá. Com
orgulho, mostra revistas estrangeiras onde é citado como o homem
que descobriu a raríssima turmalina paraíba, em 1982. Era tão
bonita e diferente que até comerciantes de joias achavam que não
era verdadeira.
"Falavam que era sintética", lembra
Heitor Barbosa, que não desistiu. Enviou amostras do mineral ao
Gemological Institut of America, nos Estados Unidos, que
comprovou: era uma turmalina com cobre e manganês na composição,
o que dá o azul especial. Heitor Barbosa diz que não ficou rico
porque vendeu as pedras por valor muito baixo e aplicou todo o
dinheiro na mina de São José da Batalha, mas garante que ainda
vai enriquecer. "Eu tenho uma convicção muito forte de que
ainda vou encontrar uma pedra acima de três quilos", diz.
A mina do tesouro, em São José da Batalha, fica em
uma região onde não existem empregos. Homens arriscam a vida
diariamente nas profundezas da terra.
O local de trabalho do garimpeiro José Tadeu
Taveira fica a 60 metros de profundidade. O jeito é colocar o
capacete e encarar uma escada. "Não tem perigo",
garante Tadeu, que enfrenta esse expediente todo dia.
Os garimpeiros trabalham sempre em dupla: um
retira o caulim com a picareta e o outro recolhe com a pá. É
também uma medida de segurança. Em caso de desmoronamento, um
pode socorrer o outro.
"O perigo está sempre por perto", diz
José Tadeu.
Mais perto do que se imagina. Durante a
entrevista, uma barreira desabou.
"Na época da chuva é perigoso porque dá
infiltração e começa a desabar", explica José Tadeu.
O desmoronamento foi em uma parede. Por precaução,
as escavações estão suspensas nas galerias mais profundas.
O professor José Adelino Freire, do Departamento
de Minas da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG),
alerta: o garimpo de São José da Batalha é uma atividade
arriscadíssima. "Quem trabalha lá corre risco de morte.
Acho que a universidade deve atuar nessas áreas e orientar os
garimpeiros para que eles façam uma exploração mais
racional", diz o professor.
O garimpeiro Geone de Sousa escapou de morrer
graças ao colega que estava com ele e foi buscar socorro.
"Caiu uma barreira quando eu estava embaixo, suspendendo a
bomba. Quando escutei o barulho, não deu tempo de correr. Caiu
por cima de mim. Eu quebrei o fêmur em dois lugares", conta
Geone, que retornou ao trabalho com oito pinos na perna e
contando com a proteção divina.