segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016

EUA não vislumbram o fim da era do petróleo

EUA não vislumbram o fim da era do petróleo


Quarenta anos depois do primeiro choque do petróleo — o embargo que provocou o caos na distribuição de gasolina e na economia dos Estados Unidos nos anos 70 –, o país volta a discutir a dependência do combustível e, consequentemente, a relação com os grandes produtores.
Agora sob nova ótica: a possibilidade de autossuficiência graças ao aumento da produção propiciado pelo fraturamento hidráulico, conhecido como fracking, uma tecnologia de consequências no mínimo discutíveis.
Proibida na França, discutida na Grã-Bretanha e no Canadá, motivo de protestos no mundo inteiro, a tecnologia foi adotada rapidamente nos Estados Unidos.
A produção aumentou tanto que o país já ultrapassou a Rússia, este ano, e assumiu a liderança mundial na produção conjunta de petróleo e gás natural.
Segundo dados do governo, a produção doméstica de petróleo pode chegar a 8,4 milhões de barris por dia no ano que vem, quase o mesmo nível da Arábia Saudita.
Quatro décadas separam a possibilidade da autossuficiência dos tempos do embargo.
Nesse período, a política energética e a necessidade de garantir a oferta do combustível comandaram as ações externas do país. E ainda preocupam.
Empresários, representantes das Forças Armadas e ex-funcionários do governo norte-americano se reuniram, na semana passada, para discutir o tema no seminário “Embargo da OPEP + 40: Seminário Nacional sobre Segurança Energética”.
Pela composição das mesas se viu não só a importância do assunto para o país, mas ficou claro que o tema é política de Estado, não de partidos.
Entre os palestrantes estavam os presidentes da GE e do Fedex, os ex-secretários de estado Henry Kissinger e Madeleine Albright, os ex-secretários de defesa Leon Panetta e James Schlesinger, além do general James Conway e do almirante Dennis Blair.
Kissinger era secretário de Estado em 1973, durante o primeiro choque do petróleo, e disse que nos anos seguintes ao embargo “não se podia fazer planos no Oriente Médio sem levar em conta o mercado do petróleo”.
Naquela época, a produção americana estava em queda. Os poços do Texas estavam secando. O país passou a importar o dobro do que comprava do exterior, se tornando ainda mais dependente dos produtores do Oriente Médio.
Quando eles declararam o embargo, o preço do combustível quadruplicou nos Estados Unidos. Racionamento, fila nos postos de gasolina…
Este é o retrato dos anos Carter.
Segundo Henry Kissinger, essa dependência em relação ao Oriente Médio está mudando agora, por causa do aumento da produção de combustíveis nos Estados Unidos.
“A redução da distância entre oferta e demanda na América do Norte tem consequências estratégicas gigantescas”, afirmou.
O almirante Blair acredita que os Estados Unidos poderão se distanciar um pouco dos conflitos no Oriente Médio, mantendo tropas nas redondezas caso sejam necessárias em uma situação de crise.
Um relatório do Citigroup, divulgado no começo do ano, diz até que pode haver um pouco mais de tensão nas relações dos Estados Unidos com países como a Arábia Saudita, por conta de princípios democráticos, agora que o país depende menos do petróleo do Oriente Médio.
O grande sonho dos Estados Unidos é solapar o poder da Organização dos Produtores e Exportadores de Petróleo (OPEP). Mas, ao mesmo tempo, Washington precisa manter boas relações com a organização.
Os políticos norte-americanos tentaram comprar briga com a OPEP no passado. Aprovaram uma lei no Congresso para permitir que a organização fosse processada, nos Estados Unidos, por formação de cartel.
A lei, aprovada na Câmara e no Senado em 2007, dava ao Departamento de Justiça o direito de processar a OPEP, mas o então presidente George Bush avisou que vetaria qualquer medida nessa linha porque incitaria uma retaliação contra negócios norte-americanos no exterior e afetaria as relações dos Estados Unidos com os países produtores de petróleo.
O jogo é complicado e declarar independência política com relação ao Oriente Médio agora, com o aumento da produção interna, parece precipitado.
A dependência do petróleo externo é menor, mas não desapareceu. No longo prazo, o interesse estratégico e a garantia de fornecimento futuro exige a formação de reservas. A perspectiva de autossuficiência não é assim tão simples.
Enquanto o preço do barril de petróleo estiver na casa dos US$ 100, como está agora, compensa explorar óleo e gás de xisto com o fracking, uma técnica cara. Mas se o preço cair, o fracking se tornará economicamente inviável. Basta a Arábia Saudita abrir a torneira para mudar os preços no mercado internacional.
Em 2005, os Estados Unidos importaram 60% do petróleo consumido no país. Hoje, importam 40%.
Uma queda boa, mas falta um bocado para a autossuficiência. Por isso mesmo, o jogo de xadrez com o Oriente Médio vai continuar.
A maioria absoluta dos analistas e economistas norte-americanos descreve o choque do petróleo dos anos 70 como represália ao apoio dos Estados Unidos a Israel durante guerra do Yom Kippur.
O economista político nova-iorquino Rob Urie discorda, como deixou claro no site Counterpunch:
“Os choques do petróleo dos anos 70 foram vendidos como sendo de natureza geopolítica. O primeiro, em 1973, até foi chamado de ‘embargo do petróleo árabe’ apesar de o Irã, até aquele momento um estado cliente dos EUA, e a Venezuela, serem os principais membros da OPEP a favor do embargo e nenhum dos dois ter um grande problema com as relações Israel-EUA. As multinacionais do petróleo baseadas nos Estados Unidos foram os atores principais que mantiveram o petróleo fora do mercado para fazer com que os preços subissem. O que ficou demonstrado com os embargos foi o efeito que o acesso limitado ao óleo tinha nas economias industriais do Ocidente, que foram estruturadas para serem totalmente dependentes de ofertas plenas e de baixo custo”.
Urie diz que o problema, nos Estados Unidos, está na origem, no modelo de desenvolvimento.
“O capitalismo, até onde o termo faz uma descrição precisa, é uma política econômica que construiu este mundo no qual a ‘energia’ desempenha o papel econômico que tem. No começo do século XX um grupo de industriais fez lobby junto a governos locais para destruir o transporte coletivo que existia e assim poderem vender carros, pneus, gasolina e estradas. A última discussão séria a respeito da conservação de energia nos Estados Unidos aconteceu quando Jimmy Carter estava na Casa Branca. Em meio à guerra mais recente dos Estados Unidos no Iraque, a administração George W. Bush aprovou uma subsídio para incentivar as empresas a comprarem os carros que mais bebem gasolina no planeta – os Hummers. O aquecimento global provocado pela queima de combustíveis fósseis ameaça a existência da vida no planeta. Para falar de outra maneira, mais de um milhão de pessoas morreram no Iraque para que ‘nós’ no Ocidente pudéssemos dirigir nossos SUVs. E o Iraque foi apenas uma das guerras travadas pelos Estados Unidos por causa do petróleo”.

Introdução aos territórios produtores de gemas: o caso brasileiro do nordeste de Minas Gerais

Pretendo compartilhar nesta crônica uma parte dos elementos recolhidos durante as recentes viagens aos territórios gemíferos localizados no nordeste do Estado de Minas Gerais. O objetivo é apresentar as atividades e os diferentes atores para permitir melhor entendimento de uma indústria baseada na exploração artesanal de gemas. De maneira geral, é uma indústria ainda pouco conhecida e com poucos trabalhos acadêmicos de foco não-geológico que sejam profundamente interessados nos espaços ligados à exploração das gemas. A aproximação e o tratamento deste tipo de indústria são delicados. A própria natureza das gemas – que concentram grande valor em pequenos volumes facilmente transportáveis (Hugon, 2009) – favoriza a criação de redes comerciais informais, a exploração ilegal e a fragmentação das initiativas(Guillelmet, 2000; Duffy, 2007). A presença e, às vezes, o predomínio da ilegalidade no setor, complica as tentativas de abordagem aos atores particularemente mudos sobre suas atividades (Canavesio, 2010). Por isso, neste contexto, a compreensão e a racionalização de tal setor se apresenta como uma problemática por si só e seu esclarecimento deve ser concluído antes de passar para a outra pergunta central de meu trabalho de tese de doutorado que não será abordada aqui: as riquezas gemíferas se tornam, ou não, um benefício para as áreas onde sejam exploradas?
2A escolha do nordeste mineiro para fundamentar esta análise se justifica por várias razões. Dentre os diversos territórios que exploram jazidas de gemas no Brasil, a região é provavelmente o melhor exemplo do que se aproxima mais de uma cadeia produtiva completa baseada em espaços periféricos, pois o norte de Minas Gerais apresenta índices que refletem uma situação sócio-econômica desfavorável. De fato, além das numerosas e variadas jazidas de gemas de cor que se espalham pela região estarem sendo bastante exploradas há dezenas de anos por alguns milhares de indivíduos, encontra-se ali o que talvez seja a maior concentração de atividades de lapidação de pedras e de comércio do país.Estima-se que haja pelo menos quase quatrocentos centros de lapidação e duzentos comércios apenas na cidade de Teófilo Otoni, sem contar com as várias centenas de corretores (GEA/IEL, 2005). Em Governador Valadares o número de atores seria provavelmente dividido por dois, mas que beneficiariam de renda similar aos colegas de Teófilo Otoni, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio exterior (MDIC, 2012).
Mapa 1. Áreas visitadas durante pesquisas de campo.
Mapa 1. Áreas visitadas durante pesquisas de campo.
Fonte: Castañeda, Addad & Liccardo (2001), Cornejo & Bartorelli (2010) e autor.
3Por causa da grande extensão da região e da dificuldade de acesso, não foi possível visitar todas as localidades. Então, além dos dois principais centros de lapidação e comércio que são Teófilo Otoni e Governador Valadares, algumas áreas foram escolhidas e visitadas em função da possibilidade e da disponibilidade das pessoas encontradas. Tomei cuidado para não ficar limitado em redes pessoais similares, desta forma mantive relações com pessoas de localizações, atividades e posições nas hierarquias locais diversas. Vários deslocamentos foram necessários, tanto para visitar, quanto para revisitar esses lugares, para assim ganhar uma relativa confiança dos atores. Posteriormente eles foram entrevistados através de um questionário que será analisado na tese em si. As informações apresentadas nesta crônica resultam principalmente de abordagens informais. Trechos de depoimentos e fotografias foram integrados para permitir uma melhor representação do contexto e ambiente.

A extração

Foto 1. Turmalina em estado bruto – peça de coleção.
Foto 1. Turmalina em estado bruto – peça de coleção.
Fonte: Aurélien Reys (2012).
4Minas Gerais é conhecida por ser uma das regiões gemíferas mais ricas do mundo (Delaney, 1996). Segundo o Departamento Nacional de Produção Mineral, cerca da metade das minas de pedras preciosas do país se localizariam no nordeste do estado (DNPM, 2013). Além da abundância de quartzos, a região contém importantes quantidades e variedades de pedras de cor, preciosas ou semi-preciosas, como esmeraldas, águas-marinhas, morganitas, turmalinas, topázios, kunzitas, andaluzitas, brasilianitas, alexandritas e crisoberilos, para citar apenas algumas extraídas regularmente. Às vezes, vários tipos de pedras podem ser extraídos de uma única jazida. E se a exploração gemífera pode ser caracterizada pelo tipo de pedra buscada, pode ser igualmente pelo tipo de processo extrativo empregado. Dependendo dos agentes envolvidos no processo extrativista, existem quatro tipos diferentes:
  • CataO solo é escavado em forma retangular e o buraco não passa de alguns metros de profundidade. Tábuas de madeira são encaixadas na vertical para sustentar as paredes. É a forma de extração menos arriscada para os mineiros, no entanto é muito nociva para o meio ambiente, já que necessita de uma superfície de clareira maior que os outros métodos.
Foto 2. Lavrador trabalhando em mina do tipo “cata”.
Foto 2. Lavrador trabalhando em mina do tipo “cata”.
Fonte: Aurélien Reys (2009).
  • Vagão. A mina forma uma grande cavidade a céu aberto colina adentro. Este tipo de extração é facilmente identificável a grandes distâncias, por isso é pouco utilizado por aqueles que trabalham de forma ilegal.
  • O Túnel. Os túneis são a forma de exploração de pedras preciosas mais comum na região. Medindo cerca de dois metros de altura por um metro de largura, os túneis seguem na horizontal e são feitos normalmente na borda de uma colina, pois desta forma conseguem alcançar grandes profundidades a pequenas distâncias. Quanto mais fundo, mais chances de encontrar as pedras mais bonitas. Tábuas e pedaços de madeira também são utilizados, desta vez apenas na entrada da mina ou em certos locais que apresentam risco de desabamento dentro do túnel. Podem chegar até duzentos ou trezentos metros de profundidade e explosivos são usados regularmente.
Foto 3. Trabalhador de mina entrando em túnel, com lanterna em primeiro plano.
Foto 3. Trabalhador de mina entrando em túnel, com lanterna em primeiro plano.
Fonte: Aurélien Reys (2012).
Foto 4. Trabalhador de mina no fim de um túnel, uma hora após à detonação de explosivos.
Foto 4. Trabalhador de mina no fim de um túnel, uma hora após à detonação de explosivos.
Fonte: Aurélien Reys (2012).
  • Caixa americana. Esta é a forma de exploração mais ambiciosa em termos de tecnologia e investimento. Por isso é o método privilegiado das grandes operações, da qual faz parte a extração de esmeraldas. A mina é caracterizada por um buraco profundo que varia entre vinte metros para as mais artesanais até mais de trezentos metros para aquelas mais importantes, necessitando da instalação de um sistema de elevador – normalmente um simples arreio. Pedaços de madeira, muitas vezes do eucalipto cultivado na região, são usados ao longo da descida para sustentar as paredes. No fundo da cavidade existe uma sala, início de um ou vários túneis escavados na horizontal para seguir as “veias” gemíferas.
5Existem diversas formas de exploração física, mas a forma setorial mais comum em termos de atividade e uso de recursos humanos é a garimpagem. Ou seja, é uma forma de exploração mineira ilegal e artesanal. As pessoas que praticam são chamadas de garimpeiros, o que pode ser interpretado pejorativamente por alguns deles, que por sua vez preferem ser chamados de lavradores. Diversas empresas artesanais são fruto de iniciativas independentes ou de pequenos grupos de atores, comumente oriundos do meio rural e que dividem o tempo entre a mineração e atividades agrícolas de subsistência. Eles escavam dentro da propriedade de um parente, vizinho ou amigo e podem se instalar na mina durante a semana e voltar para casa nos finais de semana. Aqueles que moram próximo podem fazer o caminho de ida e volta todos os dias, especialmente depois que ficou mais fácil aceder meios de transporte modernos, como as motocicletas. Os garimpeiros que trabalham em minas de difícil acesso, às vezes preferem trazer toda a família de uma vez para ficar o ano todo. Os “acampamentos” podem ser pequenas habitações, no melhor dos casos cabanas de madeira.
Foto 5. Cama dentro do alojamento de trabalhador de mina.
Foto 5. Cama dentro do alojamento de trabalhador de mina.
Fonte: Aurélien Reys (2012).
6A realidade das grandes minas que pertencem a empresas mineradoras de meio ou grande porte é completamente diferente, já que seu funcionamento se compara mais a uma empresa do que a um modelo artesanal. Os equipamentos são mecanizados e as condições gerais das minas são melhores, mais organizadas e mais modernas. Engenheiros e geólogos também participam continuamente das atividades. Devido ao tamanho, elas acabam tendo uma nova demanda de profissionais como capatazes ou agentes de segurança, funcionários de limpeza e pessoal administrativo. E as tarefas podem ser mais especializadas: as pessoas que escavam o terrenos não são necessariamente as mesmas que irão limpar e separar os resíduos das gemas.
Foto 6. Entrada de um túnel do tipo parecido com “caixa americana” de empresa mineradora.
Foto 6. Entrada de um túnel do tipo parecido com “caixa americana” de empresa mineradora.

Foto 7. Trabalhador de empresa mineradora lavando minerais e seus resíduos extraídos.
Foto 7. Trabalhador de empresa mineradora lavando minerais e seus resíduos extraídos.

7Em sua maioria, as operações gemíferas são financiadas por diversos parceiros – os “sócios” - que normalmente não participam diretamente das atividades de mineração. A participação deles varia de acordo com a necessidade e a disponibilidade de cada um: por exemplo, um sócio leva um equipamento de motor particular, um outro financia os explosivos usados durante as operações de escavação, um outro se encarrega da alimentação e das eventuais contribuições salariais aos empregados das minas. Quando um lote de pedras é extraído, os benefícios da venda são divididos de acordo com o pré-estabelecido e também de acordo com as contribuições de cada um. Geralmente, a divisão segue o padrão: 20% da venda para o proprietário do terreno; entre 40 e 60% para os sócios; entre 20 e 40% para os empregados, dependendo do valor do salário mensal, que varia entre meio e um salário mínimo.
8É muito comum que as pequenas estruturas mineiras, ou seja, aquelas que empregam apenas duas pessoas, encontrem pedras somente uma vez a cada dois ou três anos, resultando em uma venda de algumas dezenas de milhares de reais no melhor dos casos. Aquelas que são um pouco mais ambiciosas ou que são exploradas há anos por serem particularmente férteis e que podem contratar até uma dezena de pessoas certamente conseguem encontrar muito mais pedras. No entanto as despesas são igualmente elevadas, uma soma que representa algo em torno de 5 à 20 mil reais de investimento mensal, variando de acordo com o tamanho da exploração.
9As maiores operações mineiras podem ter um ritmo de escavação de pedras semanal e seus empregados chegam a ganhar até 3 mil reais em um bom mês. Mas elas támbém não estão livres de um período infértil e caso esta situação dure tempo demais, pode causar o fechamento da mina devido aos altos custos de sua manutenção. Estas empresas possuem normalmente escritórios na cidade vizinha à mina, onde a maior parte das pedras é estocada. Muitas delas também guardam minerais encontrados durante as escavações (principalmente feldspato ou mica), mas estes materiais não são considerados o objetivo final nem a parte mais importante dos negócios.

Depoimento de um garimpeiro, 51 anos (Coronel Murta)

“Comecei a trabalhar em um garimpo quando tinha 13 anos, com meu pai. Nós tínhamos uma fazenda modesta entre Araçuaí e Coronel Murta e dividíamos o trabalho entre as atividades agrícolas de subsistência e a garimpagem, o que é muito comum por aqui. Desde então eu nunca deixei de trabalhar na mineração, mas às vezes de maneira inconstante. Nos anos 90, por exemplo, comecei a viajar para o interior de São Paulo para trabalhar nas plantações de cana-de-açúcar a cada estação. Mas mesmo se o salário era correto em comparação ao que a gente ganha aqui, não valia muito a pena. Na verdade eu tinha despesas de transporte, alimentação, às vezes acomodação, e o dinheiro não compensava a distância da minha família. Então parei de vez e desde 2005 dedico a maior parte do meu tempo ao garimpo, a não ser no fim do ano, com a chegada das primeiras chuvas, que eu tomo conta da minha pequena plantação. Quando o ano é razoável conseguimos colher comida suficiente para nos manter quase o ano todo, mas às vezes as chuvas são tão raras que já no mês de março acabou tudo. Por outro lado, desde a criação do Bolsa Família temos a garantia de ter um mínimo todos os meses. Acho que essa ajuda é uma benção que nos assegura um mínimo de sobrevivência para mim, para minha esposa e para minha única filha.
(…) Meu irmão trabalhava na mina de feldspato vizinha que usa material mais pesado, o que não é possível nas minas de turmalina que pedem um trabalho mais delicado. Há mais ou menos dois meses, uma pedra caiu na cabeça dele por causa de um pequeno desmoronamento. O traumatismo foi maior do que a gente pensava e eu tive que levá-lo ao pronto-socorro do hospital de Montes Claros, a cerca de 280km de distância. Ele está melhor, mas não sei se vai poder trabalhar novamente na mina. Mas eu vou bem, felizmente nunca tive nenhum problema com ninguém e nunca sofri nenhuma ameaça. A gente ouve muitas histórias nos garimpos, mas nem todas elas são verdadeiras.
(…) Pra mim, é um trabalho como os outros. Acordo de manhã, vou até o fundo do túnel onde coloco uma dezena de detonadores e, depois da explosão, espero uma hora, uma hora e meia, tempo suficiente para o gás que escapa ter se dissipado. Durante esse tempo eu tomo um café, às vezes com meu colega que trabalha na mina em dias alternados, mais ou menos. A gente recolhe os restos da explosão, depois usa uma bitadeira e em seguida recolocamos mais um lote de detonadores. E mais um no final da tarde. Vou para a mina no domingo à noite e fico até sexta-feira, mesmo se eu moro perto, a meia hora a pé. Gosto de passar minha semana de trabalho nesse ambiente, eu me sinto bem, é uma vida que gosto.
(…) Trabalhei em uns vinte garimpos durante toda minha vida e o mais profundo deles chegava a mais ou menos 200 metros. No início, quando só tem terra, avançamos rapidamente, entre 5 e 6 metros por dia. Quando chegamos na pedra, descemos a uma velocidade de 2 metros por dia, mas tudo depende da terra e da rocha. Há três semanas encontrei algumas turmalinas que vendemos aqui mesmo para um corretor de Coronel Murta em três lotes, por um total de 16 mil reais. Quando é assim eu chamo todos os sócios – no caso, quatro – e meu parceiro para decidir sobre o lote e sobre o valor. Geralmente tudo acontece sem problemas. Antes disso, encontrei há dois anos um outro lote de turmalinas de qualidade um pouco pior. A gente encontra pedras, mas isso nunca me deu oportunidade de refazer minha vida, como foi o caso de alguns poucos. Meu futuro já está todo planejado: continuar a vida que levo esperando a aposentadoria que vai chegar em alguns anos como agricultor, pois estou inscrito na profissão no Sindicato Rural.”

A lapidação

10Outras atividades ligadas à mineração foram se organizando ao longo do tempo, entre elas, a atividade de transformação das gemas. Este trabalho é feito pelos lapidadores, que em sua maioria exercem atividade nas cidades de Teófilo Otoni e Governador Valadares. Geralmente os centros de lapidação contam com no máximo três pessoas. Os maiores podem contratar até cerca de vinte trabalhadores, mas atualmente este tipo de empresa é muito rara. Os centros de lapidação normalmente tomam a forma de pequenos ateliês próximos aos principais centros de comércio ou em cima de lojas, ou ainda no pátio de domicílios nos bairros residenciais – a chamada lapidação de fundo de quintal.
11O objetivo da lapidação de uma pedra é ressaltar a beleza do mineral e prepará-la para incorporar uma joia. Não existe uma única maneira de trabalhar o produto e a escolha depende da pedra bruta inicial, já que a intenção é tirar o menos possível de material e manter a pedra mais volumosa possível. O processo de transformação descrito pelos profissionais acontece em quatro etapas diferentes:
  • Serrar. A pedra é serrada grosseiramente apenas para retirar os excessos.
  • Formar. Em seguida a pedra é colada com cera na ponta de uma varinha e o lapidador lhe dá sua forma final. Esta operação requer às vezes, quando ela faz parte de uma coleção de joias, por exemplo, a calibragem e a padronização das pedras trabalhadas.
  • Façamentar, ou simplesmente lapidar. E a operação que permite trabalhar as faces planas das pedras.
  • Polir. Finalmente a pedra é polida para que possa ser apresentada sob seu melhor brilho. Pós abrasivos, partículas de diamantes ou de coríndon, são utilizados nesta etapa.
Foto 8. Pequeno centro de lapidação informal.
Foto 8. Pequeno centro de lapidação informal.
Fonte: Aurélien Reys (2012).
12Depois de lapidada, uma pedra bruta pode perder entre 30 e 70% de seu corpo inicial, mas esta porcentagem é muito variável e depende enormemente do tipo de gema e da lapidação escolhida, assim como da dificuldade do trabalho. Pedras como kunzitas, que se quebram facilmente, ou alexandritas, extremamente duras, acabam sendo bem mais complicadas de se lapidar. Não é raro que uma pedra se quebre em vários pedaços por causa de um defeito ou de uma escolha equivocada no início do processo de lapidação. Neste caso, a soma da venda dos pequenos pedaços será sempre inferior àquela da pedra inteira.
13De acordo com os atores locais, a indústria lapidária vem sofrendo uma forte baixa. Se em um passado recente o número de lapidadores na região pode ter chegado a dois ou três mil, talvez até mais do que isso, atualmente apenas algumas centenas teriam conseguido manter o emprego de forma regular. A falta de pedras e a concorrência chinesa são geralmente os dois principais argumentos dos atores para explicar a situação. Hoje, muitos deles trabalham apenas por temporadas ou mantêm outros empregos paralelos, geralmente fora do setor das gemas. Alguns decidiram ir para o exterior, incluindo a China nos últimos anos.
14A maior parte das pequenas empresas independentes frequentemente fazem uso de equipamentos antigos, de mais de trinta anos. Todas as máquinas são dotadas de motor e se antigamente elas eram montadas artesanalmente por alguns lapidadores locais, atualmente a concorrência asiática vem ganhando espaço. Os equipamentos importados oferecem um aspecto mais moderno, uma qualidade igual por um preço inferior, o que forçou a maior parte dos antigos fabricantes locais a abandonar sua produção. De qualquer forma, a maioria dos artesãos locais evitam substituir seus materiais por equipamentos mais modernos, pois isso representa um investimento pesado difícil de recuperar. Segundo os próprios, eles não dispõem de oferta de trabalho suficiente para fazer valer à pena tamanho investimento.
Foto 9. Lapidador formando uma citrina.
Foto 9. Lapidador formando uma citrina.
Fonte: Aurélien Reys (2012).
15Anos depois de diversas ações públicas locais feitas por institutos como o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas – SEBRAE, o Instituto Brasileiro de Gemas e Metais Preciosos – IBGM, e a Associação dos Joalheiros, Empresários de Pedras Preciosas e Relógios de Minas Gerais – AJOMIG, com o objetivo de alavancar a indústria de lapidação a um patamar mais avançado da joalheria, o projeto parece não ter dado certo. Os atores ainda não evoluiram como o esperado e na verdade provavelmente nem desejam fazê-lo. Poucas pessoas originárias da região se especializaram em joalheria e os raros indivíduos independentes que se aventuraram se satisfazem com um mercado local e com alguns turistas de passagem. Apenas uma das grandes empresas entre os atores abordados dedica uma parte de suas atividades à joalheria. A explicação está no fato de que além de enfrentar uma concorrência nacional já instalada, o mercado asiático também está presente. As raras joias encontradas em Teófilo Otoni e Governador Valadares provêm, muitas vezes, da China. Os atores de nacionalidade chinesa importam pedras do Brasil, principalmente quartzo, e as transformam em seu país a um custo menos elevado. Produzem, por exemplo, colares, para em seguida reexportá-los ao Brasil.
Foto 10. Colares importados da China fabricados a partir de quartzos brasileiros.
Foto 10. Colares importados da China fabricados a partir de quartzos brasileiros.

Teófilo Otoni

Teófilo Otoni é considerada a Capital Mundial das Pedras Preciosas. São essas pedras preciosas e semi-preciosas que movimentam a economia da cidade, acontecendo feiras anualmente como a Feira Internacional de Pedras Preciosas, em que ocorrem seminários, palestras, apresentações de novidades do setor e festividades musicais, e a Feira Livre de Pedras Preciosas.
O nome da cidade é uma homenagem a seu fundador Teófilo Benedito Ottoni, que foi deputado geral e senador do Império do Brasil de 1864 a 1869, e um dos principais líderes da Revolução de 1842, em Minas Gerais. Teófilo Ottoni também foi fundador da Estrada de Ferro Bahia-Minas, que ligava o norte de Minas ao sul da Bahia. Além do nome da cidade em sua homengem, existe uma estátua em bronze localizada em uma praça do município.
Outros monumentos da cidade são a Praça Tiradentes, que em suas árvores habitam diversas preguiças; a Praça Germânica, em homenagem aos alemães que foram para cidade; e a Catedral de Nossa Senhora Imaculada Conceição, em estilo gótico e construída em 1902.

Diamantina

Igreja Matriz Santo Antônio DiamantinaTerra de Juscelino Kubitschek, foi grande pólo do Ciclo Diamantino, e até hoje as atividades de mineração constituem a base de sua economia. Destacado centro cultural de Minas, a ele se referiu Saint Hilaire com palavras elogiosas. O antigo Arraial do Tijuco nasceu ao tempo das atividades bandeirantes e sertanistas, que vasculharam o território das Gerais à procura de ouro e pedras preciosas. As ricas jazidas de ouro, atrairam os primeiros exploradores para a região. Com a descoberta de diamantes, motivo pelo qual deu o nome à cidade e fez com que um grande impulso para o crescimento urbano ocorresse.
Diamantina é um dos destinos da Estrada Real, uma cidade histórica bastante conhecida e visitada por muitos turistas anualmente. A sua arquitetura colonial de inspiração barroca, está em todas as partes, desde os casarões até as igrejas. Em 1938 o Centro Histórico da cidade foi tombado pelo Patrimônio Histórico e Artístico Nacional e no final da década de 90 recebeu da Unesco o título de Patrimônio Cultural da Humanidade.O seu roteiro é muito rico culturalmente, por ser uma cidade extremamente histórica, sua arquitetura faz com que os seus visitantes realizem uma viagem no tempo. Com belas paisagens naturais, com suas ruas estreitas, ausências de praças e com suas igrejas elegantes a cidade impressiona seus turistas. Hoje em dia, é considerada como um dos lugares que possuem um dos melhores carnavais do Brasil. A hospitalidade de seu povo agrada ainda mais seus visitantes que encontram na cidade um lugar muito rico em história, belezas naturais e cultura.
A mesma é a cidade-natal do ex-presidente da república Juscelino Kubitschek, que foi Prefeito de Belo Horizonte, governador de Minas Gerais e Presidente da República. A casa onde ele viveu a sua infância, foi transformada em um museu que conta a vida e a história do ex-presidente, mostrando toda a sua trajetoria. 
Recebeu esse nome por causa do grande volume de diamantes encontrados na região. Essas pedras eram extraídas em grandes quantidades pela Coroa de Portugal, durante o século XVIII. A partir da segunda metade do século XIX, ocorre o esgotamento dos diamantes nas jazidas, e a cidade entra num período de decadência econômica. Por causa dessa decadência, intensificou-se a agricultura de subsistência e mais tarde a indústira textil surgiu como uma nova opção econômica. 
O Caminho dos Escravos, foi uma antiga via aberta no século XVIII e usada para o escoamento dos diamantes. O caminho recebeu esse nome porque foi construído e calçado pelos escravos. A casa onde viveu a ex-escrava Xica da Silva, possui uma exposição de pinturas. Na casa ainda existem painéis com dados sobre sua vida e sobre a casa. Atualmente a casa é sede do IPHAN.
Diamantina possui ainda outros diversos atrativos históricos como a Casa da Glória, que são duas edificações dos séculos XVIII e XIX ligadas por um passadiço; diversos museus e dezenas de igrejas do tempo do Brasil Colonial. A cidade não possui só prédios em estilo colonial, também conta com alguns belos atrativos naturais. Destaque para a Gruta do Salitre, que possui paredões de pedra com até 80 metros de altura e nas fendas da rocha existem grutas subterrâneas de até 15 metros de profundidade. Outros atrativos naturais são as belíssimas cachoeiras, como a da Toca, a dos Cristais e a da Sentinela.

O garimpo é uma atividade de extração mineral existente já há muito tempo no mundo

O garimpo é uma atividade de extração mineral existente já há muito tempo no mundo. Os primeiros sinais dessa atividade datam do século XV, com os europeus que partiam em busca de novas terras para conquistar suas riquezas minerais. No Brasil, os garimpos começaram a despontar com maior destaque no século XVIII, com as campanhas em busca de ouro e diamantes no estado de Minas Gerais.
Para melhor entendimento, o garimpo é uma forma de extrair riquezas minerais (pedras preciosas e semipreciosas são mais comuns) utilizando-se, na maioria das vezes, de poucos recursos, baixo investimento, equipamentos simples e ferramentas rústicas. Segundo a legislação brasileira vigente sobre mineração, a atividade garimpeira é considerada uma forma legal de extração de riquezas minerais desde que atenda a determinadas regras e obrigações. É facultado a qualquer brasileiro ou cooperativa de garimpeiros que esteja regularizado no Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), órgão no país que controla todas as atividades de mineração.
O garimpo se torna problema justamente porque a maioria deles segue às margens da lei. Infelizmente, no Brasil, muitos garimpos quase sempre estão associados a confrontos, assassinatos, roubos, disputas de terra, prostituição, vícios, insegurança, impunidade, patrocínio de armas e narcotráfico e à degradação ambiental. Isto porque os garimpos ilegais são extremamente difíceis de serem controlados. Situam-se em regiões de difícil acesso, são dispersos pelo país, é migratório e não há regularidade na mão-de-obra e no regime de trabalho. Há muitos riscos para se estudar diretamente essa atividade. Dentro deste cenário se insere o garimpo de topázio imperial no Alto Maracujá, no distrito de Cachoeira do Campo, município de Ouro Preto, Minas Gerais. Este garimpo se enquadra muito bem em parte das descrições expostas anteriormente.
O Alto Maracujá vem sofrendo desde a década de 1970, com a ação de garimpos de topázio imperial. O nome Alto Maracujá se refere à região que abriga as nascentes do rio Maracujá, afluente da margem esquerda do rio das Velhas, este último afluente da margem direita do rio São Francisco.
Revista Gems&Gemologist
Topázio imperial lapidado
O topázio imperial é uma pedra preciosa de beleza impressionante, porém muito rara na natureza. Logo, tem valor de mercado muito elevado, o que aguça a procura pelos garimpeiros.
Desde 1750, o topázio imperial é extraído na região de Ouro Preto. Esse município é considerado, atualmente, como o único local no mundo onde ainda é possível se extrair este mineral em condições econômicas viáveis, visto que a formação geológica permite sua retirada com o mínimo de danos possíveis à sua estrutura. Uma pedra de topázio imperial que sofre danos físicos, apresentando-se trincada ou lascada, tem seu preço desvalorizado no mercado.
O Alto Maracujá tem toda sua área praticamente exposta à ação dos garimpos de topázio imperial. Quase todos os pontos de extração do mineral são clandestinos, o que agrava a situação. São utilizados métodos de lavra agressivos em termos ambientais além da grande quantidade de água gasta na extração e lavagem do topázio.
O rio Maracujá é formado basicamente por quatro córregos: Cipó, Arranchador ou Ranchador, Caxambu ou Olaria e Cascalho. Os garimpos se concentram, em sua maioria, no leito, às margens e nas cabeceiras dos córregos Cipó e Caxambu. O Cipó é considerado o principal córrego formador do rio Maracujá. Logo, todas as atividades que geram degradação ambiental nesse curso d'água afetam de forma negativa grande parte do rio. Os córregos Cascalho e Arranchador são os únicos que se encontram em melhor qualidade ambiental. O Cascalho, porque não há ocorrência de topázio em suas margens e leito, e o Arranchador, devido à ação efetiva da proibição de garimpos pelos proprietários das terras por onde ele passa.
O topázio imperial é geralmente encontrado a profundidades que variam de dois a sete metros na região do Alto Maracujá. É comum a existência de uma camada de solo que encobre os veios de cascalho (quartzo) onde está embutido o topázio. A retirada dessa camada de solo é feita por meio de escavação com picareta, enxadas e enxadões ou trator, quando o garimpo é semimecanizado. Essa operação é uma das principais causadoras da degradação ambiental e dos acidentes de trabalho na região. O solo exposto é carregado pela água da chuva ou dos próprios córregos, quando em períodos de cheias, e os sedimentos se espalham pela bacia, gerando o que se conhece como assoreamento. Este impacto dificulta a sobrevivência de peixes, entope canais e tubulações, muda o curso dos córregos bruscamente, aumenta os riscos de enchentes, além de proporcionar um aspecto visual negativo ao espelho d'água, degradando a paisagem.
Além do assoreamento, o garimpo instalado junto às margens dos córregos promove a retirada de boa parte das matas ciliares e de cabeceira, que são formações vegetais essenciais à proteção não só das águas, mas principalmente das nascentes (áreas de recarga). Na região, não é difícil visualizar árvores derrubadas lançadas no leito dos córregos. Esta prática é crime porque vai contra o Código Florestal que proíbe atividades desse tipo em áreas como as descritas acima.
Margem do córrego Cipó destruída por garimpo
Muitas vezes são construídas pequenas barragens rudimentares para a lavagem do solo e cascalho que contêm o topázio. Essas barragens modificam o curso dos córregos, fazendo com que eles atinjam estradas e pastos de pequenos sítios da região, causando prejuízos consideráveis principalmente no período das chuvas.
Como se não bastasse a degradação ambiental, os garimpeiros e pessoas que trabalham e trafegam pela região estão expostos a uma série de riscos de segurança e saúde ocupacional. Como as escavações para a retirada do topázio são realizadas sem técnica, há riscos de desmoronamento constantes. Já houve vários casos de acidentes fatais. Outros riscos podem ser citados tais como problemas ergonômicos, doenças devido ao trabalho exposto à intensa umidade, alcoolismo, brigas entre garimpeiros, assassinatos, quedas em buracos sem proteção ou cheios de água e lama, etc.
Barragens feitas no leito do Córrego Cipó
Enfim, os problemas são muitos para serem descritos. Tanto a polícia do meio ambiente quanto a prefeitura local vêm tentando resolver o problema, mas o nível de complexidade da situação, somado à falta de aparelhamento dessas entidades, inibe uma solução a curto prazo.
Realmente, soluções definitivas para esse problema estão muito longe de serem alcançadas. Isto porque os garimpos geram impactos não só nos meios físico e biótico, como também no social. A criação de uma cooperativa de garimpeiros seria uma alternativa, porém, não se sabe com precisão quantos são, quem são e onde estão esses trabalhadores. Não existe um censo que demonstre com certeza a massa trabalhadora que se expõe nas frentes de lavra dos garimpos de topázio imperial do Alto Maracujá. Informações extra-oficiais indicam que existem pais de família que dependem desse trabalho para sustento familiar devido ao desemprego, assim como existem pessoas de má índole, aventureiros, aqueles que buscam o garimpo de topázio como fonte de renda extra, aqueles que tem o garimpo como vício e não querem mudar de situação, grandes empresários que agem nos "bastidores" e pessoas com grau de instrução considerável, estes últimos fazem tanto estrago quanto aqueles garimpeiros sem instrução, o que é mais lamentável ainda.
Uma das nascentes do córrego Cipó destruída pelo garimpo
O que é necessário se fazer hoje pela "saúde" da bacia do rio Maracujá, bem como pela segurança dos seres humanos envolvidos direta ou indiretamente no garimpo, é um estudo de grande porte, abrangendo diversas áreas do conhecimento, de forma a identificar todos os problemas detalhadamente nos campos físico, biótico e socioeconômico para que as alternativas de solução possam ser mais bem elaboradas e aplicadas. O certo é que o foco deve ser direcionado para a informação do garimpeiro e a tentativa de persuadi-lo de que suas ações impensadas corresponderão a reações irreversíveis no futuro não só dele mas dos seus descendentes. O que foi percebido nos estudos de campo é que vários garimpeiros sabem que seu trabalho prejudica o meio ambiente. Provavelmente, as medidas a serem tomadas para mudança desse panorama devam começar por esses elementos.
O rio Maracujá está sujeito a problemas de poluição muito parecidos com os de outros rios brasileiros. Logo, a revitalização da bacia tem que passar por políticas públicas de saneamento e investimento em informação. A questão do garimpo é só mais um agravante que influencia a já crítica situação do rio.
Programas de educação ambiental devem ser realizados junto à população, principalmente nas escolas, para que todos tomem consciência de que a água é um bem essencial ao ser humano. Este deve protegê-la com sabedoria , para que um dia ela não se torne artigo de luxo, como já anda acontecendo em muitos lugares do planeta.
Cascata do Dom Bosco formada pelas águas do rio Maracujá
E quanto ao garimpo? Bem, os recursos minerais existem na natureza para serem utilizados. Afinal, muitos deles são essenciais à vida da sociedade moderna. O que se deve levar em consideração é que é possível se fazer garimpo, ou mineração em geral, com responsabilidade social e ambiental. Basta haver investimento, boa vontade, e trabalho dentro das normas técnicas e de desenvolvimento sustentável.