Na Serra Pelada de hoje, circulam mais histórias do que ouro
Foi em 21 de julho de 1674 que o grupo do bandeirante Fernão Dias Paes Leme saiu de São Paulo em busca de pedras preciosas onde hoje fica Minas Gerais, desenvolvendo a mineração na região. Na segunda-feira, dia 21 de julho, será comemorado pela primeira vez o Dia do Garimpeiro, instituído em junho com a aprovação do Estatuto do Garimpeiro, que finalmente regularizou a pequena exploração mineral. O marco legal ocorre 20 anos após o fim de Serra Pelada, o maior garimpo do mundo, onde centenas de milhares de homens viveram, morreram, enricaram e perderam tudo.
Hoje, Serra Pelada, distrito do município de Curionópolis que fica a 35 quilômetros do centro da cidade, é um local pacato. Foi-se o ouro fácil da superfície e com ele a febre que levou centenas de milhares de garimpeiros para lá no começo dos anos 80. A imagem cristalizada do formigueiro humano desapareceu junto com o fim da mina e da possibilidade de enriquecimento instantâneo.
Seis ou sete mil pessoas vivem em casas de tábua agrupadas em ruas de terra vermelha, desde sempre carentes de estrutura pública. Não existe atividade econômica significativa além de pequenos comércios e do dinheiro das aposentadorias. Todas as famílias são de garimpeiros que, detentores do direito de exploração daquela terra, buscam resolver diferenças internas para explorar em grande escala o solo rico. Até lá não há muito o que se fazer, melhor puxar uma cadeira para acompanhar as histórias de toda uma geração de garimpeiros conversadores.
Rodas de bancos proliferam em frente às casas e nos bares. "Sente aqui meu patrão, sente aqui", diz o filho do Piauí Juvenal Ferreira do Vale, 72 anos, oferecendo sua própria cadeira. A pele queimada de sol e profundamente riscada aponta para uma vida de trabalho braçal. Trabalhou na construção de Brasília. No garimpo cavou muito ouro daquele chão, em 86 tirou a sorte grande e "bamburrou", termo que designa aqueles afortunados que encontraram os veios mais ricos e conseguiram 30, 50, 100, 500 kg de ouro em poucos dias.
O recorde é de Zé Maria, que tirou 2.350 kg em um barranco só. "Foi um tempo curto, bom demais e terrível. Quando bamburrei foi uma madrugada de tiro, atacaram o acampamento, mas seguramos o ouro. Mas isso era pouco, essa ladroagem danada no mundo inventaram de uns tempo para cá. O garimpeiro era respeitador".
Difícil saber se a vila, que faz parte do município de Curionópolis, no sudeste do Pará, é mais rica em histórias ou em ouro. Teve aquele que bamburrou, comprou uma caminhonete e foi dar carreiras por esses meios de mundo. Atolou, voltou para a cidade e comprou outra igualzinha só para desatolar a primeira. Um outro estava no Rio de Janeiro cheio do ouro, lembrou que esqueceu o chapéu e fretou um avião para buscá-lo em Serra Pelada. Vem fácil, vai fácil, poucas histórias remetem a garimpeiros que investiram e multiplicaram a riqueza, a maioria financiou farras homéricas que hoje são nostalgia. Riqueza ou pobreza era condição passageira, regida pelo verbo estar e não pelo ser. A velocidade com que alguns ganhavam dezenas de quilos de ouro só era comparada ao ímpeto com que os gastavam.
"Naquele tempo eu não era gente", avalia saudoso um senhor com dentes de ouro. "Ah, se eu tivesse a tranqüilidade que tenho hoje..", lamenta um velho maranhense. Quando o garimpo terminou, em 88, quem ficou por ali foi quem estava pobre no momento. Ficaram para lutar por um subsolo que conhecem a riqueza. A mina não terminou por falta de ouro e os garimpeiros sabem que têm direito, entendem que produziram riqueza gigantesca e que a nação tem este débito a reparar.
A mesma esperança de ouro que levou aqueles homens para lá nos anos oitenta faz com que permaneçam até hoje lutando por ele. "Está vendo aquela cava cheia dágua bem ali? Deixei uma fazenda de 600 vacas parideiras dentro dela. Já perdi a força para aprender a fazer de outra forma e por isso vou tirar essa fazenda dali. Não perdi dinheiro, investi, vou ter lucro. Se eu não estiver vivo meu filho vai e se ele não estiver meu neto vai, porque ali tem ouro e ele é nosso", vaticina João Pimenta, 53 anos.
- Com casas de madeira, chão de terra e pouca estrutura, Serra Pelada é hoje um local pacato
Seis ou sete mil pessoas vivem em casas de tábua agrupadas em ruas de terra vermelha, desde sempre carentes de estrutura pública. Não existe atividade econômica significativa além de pequenos comércios e do dinheiro das aposentadorias. Todas as famílias são de garimpeiros que, detentores do direito de exploração daquela terra, buscam resolver diferenças internas para explorar em grande escala o solo rico. Até lá não há muito o que se fazer, melhor puxar uma cadeira para acompanhar as histórias de toda uma geração de garimpeiros conversadores.
Rodas de bancos proliferam em frente às casas e nos bares. "Sente aqui meu patrão, sente aqui", diz o filho do Piauí Juvenal Ferreira do Vale, 72 anos, oferecendo sua própria cadeira. A pele queimada de sol e profundamente riscada aponta para uma vida de trabalho braçal. Trabalhou na construção de Brasília. No garimpo cavou muito ouro daquele chão, em 86 tirou a sorte grande e "bamburrou", termo que designa aqueles afortunados que encontraram os veios mais ricos e conseguiram 30, 50, 100, 500 kg de ouro em poucos dias.
- Em Serra Pelada hoje há
mais histórias do que ouro
Difícil saber se a vila, que faz parte do município de Curionópolis, no sudeste do Pará, é mais rica em histórias ou em ouro. Teve aquele que bamburrou, comprou uma caminhonete e foi dar carreiras por esses meios de mundo. Atolou, voltou para a cidade e comprou outra igualzinha só para desatolar a primeira. Um outro estava no Rio de Janeiro cheio do ouro, lembrou que esqueceu o chapéu e fretou um avião para buscá-lo em Serra Pelada. Vem fácil, vai fácil, poucas histórias remetem a garimpeiros que investiram e multiplicaram a riqueza, a maioria financiou farras homéricas que hoje são nostalgia. Riqueza ou pobreza era condição passageira, regida pelo verbo estar e não pelo ser. A velocidade com que alguns ganhavam dezenas de quilos de ouro só era comparada ao ímpeto com que os gastavam.
"Naquele tempo eu não era gente", avalia saudoso um senhor com dentes de ouro. "Ah, se eu tivesse a tranqüilidade que tenho hoje..", lamenta um velho maranhense. Quando o garimpo terminou, em 88, quem ficou por ali foi quem estava pobre no momento. Ficaram para lutar por um subsolo que conhecem a riqueza. A mina não terminou por falta de ouro e os garimpeiros sabem que têm direito, entendem que produziram riqueza gigantesca e que a nação tem este débito a reparar.
A mesma esperança de ouro que levou aqueles homens para lá nos anos oitenta faz com que permaneçam até hoje lutando por ele. "Está vendo aquela cava cheia dágua bem ali? Deixei uma fazenda de 600 vacas parideiras dentro dela. Já perdi a força para aprender a fazer de outra forma e por isso vou tirar essa fazenda dali. Não perdi dinheiro, investi, vou ter lucro. Se eu não estiver vivo meu filho vai e se ele não estiver meu neto vai, porque ali tem ouro e ele é nosso", vaticina João Pimenta, 53 anos.
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