O novo boom da exploração
mineral e o Brasil
A exaustão de muitas minas
antigas juntamente com o crescimento da economia mundial e, principalmente, da
China está forçando as mineradoras à um novo ciclo de exploração mineral.
Para podermos entender um boom
exploratório como o que se inicia, evitando a repetição dos erros passados,
é importante revermos os conceitos e a história.
A exploração mineral no
Brasil
Nas últimas décadas o Brasil passou por várias fases exploratórias
distintas. Todas ditadas pelo mercado mundial e pelas suas expectativas. A
evolução foi drástica. Mudaram as commodities , a metodologia, a tecnologia, os
enfoques, a estratégia e a eficiência. Independente dessa imensa evolução ainda
é necessário o mais importante: o ser humano que irá digerir e transformar
todos estes parâmetros em uma descoberta: o exploracionista.
Carajás e o
seu impacto na exploração mineral brasileira
No nosso país, o grande divisor de águas na exploração
mineral foi, sem sombra de dúvidas, a descoberta da Província Mineral de
Carajás.
Até então os principais levantamentos brasileiros
constituíam-se em projetos de mapeamento geológico direcionados a embasar
os trabalhos exploratórios subsequentes. A busca de petróleo na Amazônia, a
descoberta de manganês na Serra do Navio, do estanho de Rondônia e da bauxita do
Trombetas são os fatores determinantes que pavimentaram a descoberta maior que
só ocorreu 1967.
Foi lá, em Carajás, que a história mudou.
Nesta época, década de 60, as multinacionais americanas, como
a Union Carbide e a US Steel, haviam invadido a Amazônia em busca de manganês.
Foi um caso clássico de serendipity que até hoje é discutido nas fogueiras
dos acampamentos.
A US Steel, comandada pelo excepcional
Gene Tolbert, chegou
primeiro ao topo da Serra e a descoberta da maior jazida de ferro de alto teor
do planeta foi feita.
Poucos anos depois, por intermédio de uma empresa, fruto
direto de Carajás, a Terraservice, o Brasil ingressou na fase exploratória
tecnológica e que, pela primeira vez, vimos a aplicação de métodos
exploratórios regionais que combinavam a geologia, a geoquímica de sedimentos de
corrente e a geofísica aérea. Por incrível que pareça as primeiras anomalias
significativas de cobre e ouro em Carajás, efetuadas por essa metodologia
exploratória, são as mesmas que geraram os depósitos de ouro e cobre do Igarapé
Bahia, Salobo, Alemão e Sossego (estes três últimos ainda não entraram em
produção).
Era o acerto da equação mais importante na exploração
mineral: o homem certo no lugar certo usando o método certo.
A Terraservice, que alguns anos mais tarde se transformaria
em Docegeo, foi a primeira grande empresa de exploração mineral do Brasil e,
provavelmente, uma das maiores e melhores do mundo naquela época.
A empresa, criada pelo mesmo Gene Tolbert de Carajás, para
ser o braço exploratório da CVRD nasceu gigante, ambiciosa e vencedora. O
próprio Tolbert pessoalmente entrevistou e contratou a maioria de um dos mais
seletos grupos de consultores e de geólogos de exploração que o Brasil viu. A
idéia era, simplesmente ambiciosa, atacar a Amazônia, o Centro-Oeste, o Centro e
o Nordeste.
Tudo ao mesmo tempo.
Para realizar tal feito foram contratados, a peso de ouro, os consultores
Australianos, Peruanos e Americanos cujo principal papel seria o de implantar o
maior e mais avançado programa exploratório que o país havia visto, transferindo
o know-how para a equipe brasileira que seria, em 3 anos, a base da Docegeo.
Em pouquíssimos anos o País se transformou e a década de 70
viu a melhor fase da exploração mineral brasileira. Assim como no Canadá de
hoje, a exploração mineral simplesmente entrou em ebulição.
De um lado o Governo, por meio do DNPM, da CPRM, Radam e da
Petrobras e do outro a Docegeo, as grandes multinacionais como a Shell, INCO, De
Beers, Anglo American e outras dezenas de empresas mineradoras se digladiavam em
busca de novas anomalias e novas descobertas em todo o território nacional. O
geólogo de exploração era uma commodity rara e muito bem paga.
Foi quando o Brasil teve o seu território coberto por imagens
de Radar e por mapeamentos geológicos regionais enquanto o Governo criava projetos pioneiros de geoquímica-geofísica e
geologia em cooperação com o países como o Canadá. Tempos áureos.
Os booms exploratórios
Era a fase dos metais básicos. O mundo precisava de cobre,
chumbo, zinco e níquel para alimentar as suas indústrias.
Até então já havíamos visto booms similares mas que nunca
haviam atingido de forma tão marcante o Brasil.
O interessante é que a exploração mineral,
na época, era
feita somente pelas major companies. No após guerra a exploração consistia de
levantamentos geológicos seguidos de detalhamentos e sondagens. Era um processo
voltado para a descoberta dos grandes depósitos aflorantes. A medida que o
mercado mundial se tornava mais voraz e exigente e que os corpos aflorantes
escassearam, a exploração mineral começou a
se sofisticar. Afinal já não haviam tantos grandes depósitos a espera do martelo
do geólogo para serem descobertos. Foi quando iniciaram-se os programas de base
os grass roots. Estes programas contavam com a geoquímica de sedimentos de
corrente e com a geofísica aérea como ferramentas para melhor discriminar e
detectar as anomalias tão fundamentais.
Na época as grandes exploradoras
eram empresas como a Kennecott, a Anaconda
e a Western Mining. A Kennecott havia basicamente desenvolvido métodos
geoquímicos exploratórios voltados para a descoberta de porphyry coppers nos
EUA, Canada e na Nova Guiné. Por outro lado novas descobertas estavam sendo
realizadas no Canadá, a partir da geofísica aérea.
Os principais booms exploratórios podem ser sintetizados
conforme abaixo:
-
De 1950-60 a busca do urânio.
-
De 1960-77 busca por metais básicos.
-
De 1977-hoje a busca pelo ouro.
-
De 1990-hoje a busca pelos diamantes.
-
De 2003...retomada da exploração mineral para cobre, níquel, ouro, diamantes, zinco, ferro, alumínio, manganês.
A tecnologia
acima da geologia
Como vimos o Brasil foi catapultado
ao primeiro mundo da
exploração mineral no início da década de 70. A partir deste momento não
existiram avanços tecnológicos ou métodos exploratórios que não tenham sido
usados exaustivamente no nosso País.
Nesta fase muitos começaram a acreditar que era possível
achar depósitos minerais sem a geologia básica. Segundo esta ótica bastava um
computador repleto de dados geoquímicos, geofísicos, gráficos e de imagens de
satélite para gerar todas os alvos e a estratégia do programa. Foi quando o geólogo tinha que encaixar, de
qualquer forma, o seu projeto em um modelo pré-existente.
A situação foi levada a extremos e os absurdos se repetiram
de empresa a empresa. Os trabalhos publicados, quase todos, mostram um geólogo
de exploração preocupado em provar que o seu projeto era do tipo A ou B. Se o
projeto não se enquadrasse em um modelo existente de interesse da empresa o
projeto era, geralmente, bombardeado pelos experts de plantão e descartado.
Esta tendência levou as grandes
empresas a perder centenas de milhões de dólares ao apostar as suas fichas na
tecnologia em descompasso com o homem. Os novos softwares geram literalmente
incontáveis novos alvos que se superpõem formando um oceano de anomalias que
tragam o orçamento, os recursos e, frequentemente, a criatividade dos seus
geólogos de exploração.
O tratamento de dados, hoje, faz
a equipe de exploração ter que lidar com camadas de geologia, geoquímica e de
geofísica superpostas a imagens de satélites tratadas e filtradas. A cada novo
parâmetro adicionado ou modificado nesta equação são várias as "anomalias" que
aparecem ou desaparecem. A situação é tão drástica que geralmente consegue
paralisar a grande maioria dos geólogos de exploração que acabam ficando reféns
dos gráficos e mapas coloridos.
São poucos aqueles que ainda
conseguem focalizar o mais importante: a geologia que está por trás das cores e
números.
Como a major é uma empresa
conservadora por definição é natural que este conservadorismo se reflita também
na chefia dos programas de exploração. O somatório final é, quase que
invariavelmente, o insucesso. Todos fazem exatamente o previsível que, quase
sempre, tem a concordância da maioria.
Ocorre que na exploração mineral
a maioria está quase sempre errada. A descoberta de um novo depósito
mineral está sempre relacionada a uma visão totalmente nova e revolucionária.
Descobrir outros depósitos similares qualquer empresa pode fazer. Afinal, depois
de Colombo, qualquer um pode colocar o "ovo de pé".
A história mostra que são poucas
as pessoas equipadas com essa capacidade de visão e abstração que é fundamental
ao sucesso de um programa exploratório.
Saber identificar os
exploracionistas deveria ser uma das principais funções da chefia.
A exploração mineral, por mais fechada e hermética que possa
ser, nunca consegue manter os seus segredos do mercado. Um bom exemplo é o
da tecnologia de exploração para kimberlitos férteis a partir de minerais
indicadores. Por anos a De Beers escondeu, até dos seus geólogos locais, uma série de
parâmetros exploratórios que acreditavam se constituir em uma das grandes
vantagens competitivas da empresa. Estes gráficos e dados são guardados a sete
chaves e utilizados somente pelos analistas do core. Com o tempo outras
empresas como a Rio Tinto também desenvolveram programas exploratórios e
metodologias próprias que, também, foram consideradas segredos de estado e que
pareciam a solução para qualquer programa exploratório.
As junior companies
A história mostra que essas "vantagens tecnológicas" nem
sempre se refletem em dinheiro para os acionistas. No caso do diamante estes
métodos não impediram que as duas maiores exploradoras de diamantes do mundo a De Beers
e a Rio Tinto de gastassem bilhões de dólares sem absolutamente nenhum
sucesso palpável.
Quem mudou a história recente dos diamantes não dispunha
dessa tecnologia e nem de grandes equipes e sofisticados
computadores. O Chuck Fipke, trabalhando praticamente só, movido pela sua
inteligência, persistência e por um aguçado espírito exploratório descobriu no
Canadá os kimberlitos que hoje fazem a alegria dos investidores. Após a
descoberta de Fipke as majors tiveram que reinventar os seus programas e
"receitas de bolo", comprar
aquilo que poderia ser comprado e começar uma nova fase exploratória.
São homens como Fipke ( Lac de Gras), Lowell ( Pierina) ou
Bob Friedland (Turquoise Hill, Voisey's Bay) que re-escreveram a história da
exploração mineral.
Eles e as junior companies são responsáveis por mais de
30% de todas as descobertas feitas a partir de 1975. O fenômeno junior cresceu
fomentado pelo boom das bolsas canadenses da
década de 90. Somente em 1998 a fraude da BreX (6 bilhões de dólares) conseguiu
por um fim ao explosivo cenário causado pelas junior companies no mundo da
exploração mineral.
Depois da BreX o mercado ficou
mais exigente e os investidores se voltaram para a bolha de tecnologia, as
empresas .com .
As junior companies serviram
para mostrar ao mundo as enormes fraquezas das majors companies na exploração
mineral. A eficiência dos programas exploratórios das grandes empresas é
baixíssima e a história está aí para provar.
As principais histórias de
sucesso datam da década de 70 quando ainda se fazia exploração mineral com o "pé
no chão e a mão no martelo". Foi nesta época que as empresas como a CRA e a
Western Mining descobriram os principais depósitos australianos e que a
Terraservice/Docegeo descobriu a maioria dos depósitos e anomalias de Carajás.
Nas décadas de 80 e 90 o mundo
viu as majors afundarem bilhões de dólares em programas exploratórios quase
sempre infrutíferos. De outro lado começaram a aparecer pequenas empresas com
pequenos orçamentos e grande sucesso. Algo estava errado. Como um Davi pode
bater vários Golias sistematicamente em várias batalhas tão distintas?
O exploracionista
A resposta óbvia está nas
características intrínsecas do gerenciamento de uma grande mineradora e de uma
pequena. A diferença está no homem e não no orçamento. Os programas de
exploração de sucesso sempre tem em comum um tipo de homem que está no timão:
o exploracionista. Ele é um visionário, com grande experiência e coragem,
que navega com muita facilidade nas várias áreas da geologia e que consegue como
ninguém traduzir as evidências, que outros tem dificuldade de ver ou entender,
em uma descoberta.
As grandes empresas se tornaram
grandes após uma fase exploratória de sucesso. Com o sucesso na exploração
vieram as minas e a necessidade de empregar profissionais com perfis muito
diferentes dos perfis de um exploracionista.
Os novos chefes são responsáveis
por grandes orçamentos e estão muito mais preocupados com cash-flows e retornos
sobre os ativos existentes do que na estória impalpável e improvável que um
geólogo de exploração possa estar contando. Estes dirigentes de grandes empresas
são, em sua imensa maioria, burocratas conservadores totalmente incompatíveis
com os riscos e a imponderabilidade da exploração mineral. De uma forma geral
eles entendem muito bem os mecanismos das aquisições, das fusões e joint
ventures e quase nada da exploração mineral. Naturalmente os novos chefes se
cercaram de clones que tentam imitá-los e às suas habilidades e conhecimentos em
detrimento de outras virtudes mais importantes mas agora desprezadas. Nas
grandes empresas os geólogos passaram então a saber tudo sobre cash-flows, rate
of returns, EVA e, cada vez menos sobre spinifex, gossans, ou outros
parâmetros fundamentais da arte exploratória. Os geólogos destas empresas podem
falar sobre Kuroko sem nunca ter estado no Japão, mas a maioria é incapaz de
distinguir um boxwork de pirrotita de um de calcopirita. O resultado dessa
tendência foi o insucesso de quase todos os programas exploratórios
mundiais conduzidos pelas grandes mineradoras. As excessões são poucas e quase
desprezíveis quando considerarmos os investimentos efetuados.
Impulsionados pela mesmice das
grandes empresas os verdadeiros exploracionistas começaram a criar asas e voar
por intermédio de sua própria empresa. Uma junior company.
Os resultados desta nova
estratégia não se fez esperar: a maioria das grandes descobertas da última década foram
feitas por junior companies e não pelas majors.
A competência das juniors e
incompetência das majors na exploração mineral é um assunto polêmico e gerador
de debates acirrados. No entanto o que parecia ser uma simples constatação
estatística passa a ter um suporte inesperado, das próprias major companies. As
grandes mineradoras , a cada dia que passa, começam a reconhecer as suas
limitações e passam a apoiar a exploração feita pelas pequenas empresas. Essa
mudança de estratégia coloca na devida perspectiva as
áreas tão diferentes quanto exploração mineral e mineração.
Desta forma a junior, mais
flexível e dinâmica, passa a ser financiada por uma grande empresa ou pelo
público ou ambos, acumulando tão somente as funções inerentes à exploração
mineral.
A fórmula é altamente
interessante para todos e empresas como a Rio Tinto, por exemplo, já investem
milhões de dólares nesta associação com pequenas exploradoras minerais (mais).
O novo boom
O ano de 2004 inicia com o
prenúncio de um novo boom exploratório. Este parece ser mais sólido que os
anteriores e está sendo causado pelo reaquecimento da economia mundial do pós 11
de setembro de 2001. Somente em 2003 a maior potência do planeta, os EUA,
cresceram mais de 7%. Por outro lado a China, a maior concentração humana do
planeta está, também, crescendo em ritmo alucinante.
Os chineses passaram os
japoneses e americanos e tornaram-se, em poucos meses, os maiores importadores
mundiais de ferro e cobre (mais).
Se o país continuar a crescer neste ritmo, em menos de dez anos, será uma das
maiores, se não a maior, economia do planeta passando os EUA como o mais
importante consumidor global.
Não há melhor motivo para
aquecer as turbinas da exploração mineral. As minas de metais básicos estão no
limite máximo de produção, tentando, sem êxito, suprir a voracidade do mercado.
Como nos últimos 20 anos a prospecção para cobre-chumbo-zinco-níquel e outros
metais básicos foi simplesmente reduzida a zero, substituída pela procura
de ouro e de diamantes, praticamente não existem novos depósitos minerais destas
commodities entrando em produção no futuro próximo.
As honrosas exceções ficam por
conta de Turquoise Hill na Mongólia, Phoenix em Nevada, Rosario no Chile e
Sossego em Carajás. estas minas não terão a capacidade de suprir a demanda
aquecida e a queda da produção das minas em exaustão.
No Brasil a situação é quase
confortável para a CVRD que deverá colocar em produção vários depósitos de cobre
e possivelmente ouro e níquel nos próximos anos.
Por incrível que pareça os
nossos depósitos de níquel laterítico (Onça, Puma) e todos os depósitos que a
CVRD poderá colocar em produção nos próximos anos (Sossego, Salobo, Cristalino,
Alemão, Vermelho, S.J. do Piauí) são descobertas direta ou indiretamente na
década de 70 pela Terraservice/Docegeo ou pela INCO.
Suportado pela China e pelo
crescimento da economia mundial o ano de 2004 se prenuncia como um forte divisor de águas.
Neste ano veremos as majors focarem no desenvolvimento e expansão de projetos
existentes e nas aquisições e fusões. As juniors deverão ter os seus projetos
financiados pelas bolsas canadenses e, cada vez mais, pelas majors.
O grande diferencial de 2004 não
será de caráter qualitativo, mas sim quantitativo. O que vai mudar em relação
aos anos anteriores será a velocidade e o ritmo de instalação de novos projetos
e dos novos negócios.
Vamos limpar os martelos e
arregaçar as mangas, que o novo boom está aí e não espera aos retardatários!
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