A expressão “a riqueza vem da terra” é válida para Mato Grosso, com uma profundidade bem literal. Aleixo Garcia e Cabeça de Vaca, os primeiros europeus que aqui chegaram, ainda em 1525, vieram justamente atraídos pelas lendas que após o grande “Mar de Xarayé”, o nosso Pantanal, existiram uma cidade de ouro. Eles nunca encontraram o local e desviaram o caminho em direção às minas de prata da Bolívia. Foram os portugueses que encontraram o ouro em Mato Grosso em 1719, o estado até hoje produz cerca de R$ 600 milhões apenas em exploração mineral.
O historiador Luis-Philippe Pereira Leite aponta que a primeira descoberta de ouro em Cuiabá por Miguel Sutil, em 1722, às margens do Córrego da Prainha foi tão surpreendente que foram necessárias três canoas para levar a primeira leva. “Só de impostos, antes duas oitavas e meia por cabeça, no primeiro mês forma arrecadadas 942 oitavas e meia. No ano seguinte, o Rei, recebeu mais de 4 arrobas de ouro”, afirmou Luis-Philippe em Vilas Fronteiras Coloniais.
Segundo o historiador isso era apenas uma amostra, as safras seguintes produziram 60 arrobas de ouro para a Coroa Portuguesa. Os historiadores contam que a magnífica Biblioteca da Universidade de Coimbra, a Sala Joanina, foi erguida e ornamentada com o ouro de Mato Grosso, entregues ao Rei D. João V, avô da rainha Dona Maria I, “a louca”, que fundou Vila Bela da Santíssima Trindade para também explorar os diamantes dali. A cidade é até hoje uma das maiores produtora mundiais.
Apesar de 300 anos de exploração intensa o potencial do Estado ainda é grande. É o que diz que o presidente da Metamat (Companhia Mato-grossense de Mineração), Roberto Vargas. Hoje, Mato Grosso é o segundo maior produtor de diamantes no Brasil e o terceiro na produção de ouro. Em 2016, ano de pico na produção, foram movimentados R$ 600 milhões.
Mas, como em outros estados brasileiros, em Mato Grosso o campo é mal explorado com concentração de trabalhos na mão de grandes empresas, pouca atenção do governo para formatação de regras que impulsionem as atividades. Outro grave problema é o histórico de conflitos em áreas de exploração entre proprietários de terra ou empresas com alvarás e trabalhadores informais.
O mais recente ocorreu em Pontes e Lacerda e envolveu a empresa Mineração Santa Elina e um grupo de garimpeiros informais, no qual se incluía inclusive muitos moradores da cidade. Em novembro de 2015 foi descoberto um grande veio de ouro na região, a “fofoca do ouro” logo correu e chegou atrair até 7 mil pessoas para o local conhecido como “Serra da Borda”, (a 448 km de Cuiabá). Foi necessário uma verdadeira força tarefa de Estado para desocupar o garimpo, que ainda segue sobre forte tensão, como muitas outras áreas em Mato Grosso. A ilegalidade do setor ainda não foi dimensionada pelos órgãos reguladores.
O Eldorado ainda é aqui
Mapas sobre o segmento montado pela Seplan (Secretaria de Planejamento) mostram espalhamento pelo território de Mato Grosso de áreas com potenciais de exploração. Áreas que vão de Colniza (nordeste do estado) a Peixoto de Azevedo, quase no limite oposto, passando por Vila Bela da Santíssima Trindade, na fronteira com a Bolívia, e a Baixada do Vale do Rio Cuiabá, como Chapada dos Guimarães, Jaciara e Nossa Senhora do Livramento.
“Mato Grosso hoje tem potencial de exploração de muitos outros minerais, além do ouro e do diamante, que sempre vêm à mente quando se fala no assunto. Aqui têm reservas de calcário, pedras coloridas, quartzo e também águas termais e a mineral”, diz Vargas.
Ele afirma que o potencial do segmento em Mato Grosso, se explorado adequadamente, equivaleria à pujança do agronegócio, capaz de movimentar a economia local com certa segurança.
Apenas numa região, Vargas diz existir área de 600 mil hectares com indícios de ouro. Na região Norte, a estimativa está na faixa de 90 toneladas do mineral.
O diretor da Coogavepe (Cooperativa dos Garimpeiros de Peixoto), Gilson Camboim, diz que, além dos R$ 600 milhões movimentados pelo segmento em 2016, neste ano, o montante é bem menor, mas está na casa de R$ 360 milhões, de janeiro e novembro. Em 2015, uma quantia foi registrada apenas em Mato Grosso. No ano anterior, devido a mudanças de governo, a produção ficou em torno de R$ 150 milhões.
“O ano de 2016 foi atípico, com pico de R$ 600 milhões. Mas, nos últimos anos, o setor tem movimentado quantias acima de R$ 100 milhões e tem potencial maior, pois o campo está mal explorado em Mato Grosso, e há um fluxo de atividades informais que não dá para calcular quanto é extraído de minerais e o quanto é movimentado”, explica.
A cooperativa, com sede em Peixoto do Azevedo (698 km de Cuiabá), reúne garimpeiros em sociedade econômica para padronizar as atividades do setor e ganhar força política na representação da categoria.
Para o DNPM (Departamento Nacional de Produção Mineral) em Mato Grosso, a produção anual de ouro do estado está hoje em torno de 16 toneladas, que são extraídas de dois grandes distritos em Peixoto de Azevedo e Pontes e Lacerda/Vila Bela da Santíssima Trindade, com participação menor de outros campos nas regiões norte e centro-sul.
“Mas a comparação usada pelos próprios garimpeiros é de que a exploração de garimpo, que não tem estrutura para escavação, fica somente na casca da laranja, ainda não se chegou à laranja propriamente dita”, diz Serafim Carvalho Melo, superintendente do DNPM-MT.
Órgão regulador não da conta da demanda
A fraca estrutura do DNPM é apontada como um dos fatores para os resultados atrofiados da exploração de minerais. O tempo médio somente para definição de exploração in loco dura de quatro a cinco anos no país, em etapas que vão do pedido de autorização para pesquisa à apresentação do estudo e à liberação dada pelo Estado para o início das atividades.
Nesta semana, funcionários do departamento em Brasília fizeram protesto em cobrança de atendimento de pedidos que vêm sendo demandados há anos e que fragilizam as ações do órgão. O déficit de funcionários em Brasília é de 1.200, conforme a assessoria de imprensa do DNPM.
“A falta de apoio ao órgão, a falta de infraestrutura têm prejudicado as atividades e isso acaba gerando atrasos na própria pesquisa, na fiscalização da exploração. Isso gera deficiência no setor”, diz Gilson Camboim.
Conforme o DNPM, somente em Mato Grosso há mais de 6.000 processos ativos em tramitação e os serviços de exploração mineração cobrem menos de 50% dos 903.357 km² do estado com potencial de reserva mineral.
Os processos que ainda dependem de decisão do Estado estão distribuídos em requerimentos de pesquisa (822), requerimentos de lavra (284), requerimentos de lavra garimpeira (1.181) e requerimento de licenciamento (343).
Os processos autorizados são: portarias de lavra (153), permissões de lavra garimpeira (850), alvarás de pesquisa (1.721) e licenciamentos (694).
A superintendência do DNPM-MT lista ao menos oito itens que travam o segmento. Os problemas começam com o baixo nível de gerenciamento, o que reduz a efetividade de fiscalizações e estabilidade da regulação – na prática, isso aumenta a margem de exploração ilegal. E também incluem baixa qualidade técnica e econômica, entrave na ampliação das atividades e falta de autonomia para atividades locais.
Municípios poderão receber impostos das mineradoras
O Senado aprovou nesta terça-feira (28) a medida provisória (MP) 789/2017, que cria a Agência Nacional de Mineração em substituição ao DNPM na regulação e fiscalização do setor de mineração. A agência funcionará vinculada ao Ministério de Minas e Energia e será responsável por fiscalizar a atividade de mineração, vistoriar, notificar, autuar infratores e adotar medidas como interdição e impor sanções.
O relator da proposta, o senador Aécio Neves, defende que as empresas que atuam com a exploração mineral, principalmente de ouro e diamante, paguem impostos aos municípios onde atuam. “Essas companhias geralmente deixam apenas o buraco para a população. Precisamos rever esse passivo e fazer com que algo fique para as cidades”, afirmou o senador em entrevista à Radiobrás.
Segundo o projeto a distribuição do imposto sobre a produção mineral se mantem com a alíquota de 0,2% para cooperativas de garimpeiros e subiu de 1% para 1,5% às empresas detentoras do direito de exploração. A taxa é cobra somente sobre os produtos manufaturados, pois minerais que saem do país em exportação são tratados como commodities, protegidas pela Lei Kandir.
A distribuição da taxação feita em três níveis: 65% para o município de origem, 23% para o Estado e 12% para União. O diretor da Coogavepe, Gilson Camboim afirma que, no entanto, pelo projeto aprovado no Congresso, a aplicação da arrecadação será feitas em áreas sociais para desenvolvimento das cidades com campos de exploração.
“Se manteve o formato de distribuição do que for arrecadado com maior parte para os municípios, o que é mais justo, visto que são neles que ocorrem as explorações. Mas não há um destino já determinado para aplicação do dinheiro, ele pode ir para áreas social, ambiental e de infraestrutura, por exemplo”.
A proposta segue para sanção do presidente Michel Temer.
Mato Grosso arrecada R$ 15 milhões de minerais
Conforme o DNPM, Mato Grosso é um dos maiores arrecadadores via o CFEM (Contribuição Financeira pela Extração Mineral). Em 2016, o montante foi de R$ 15 milhões.
Em Peixoto de Azevedo (698 km de Cuiabá), a arrecadação da produção de ouro representa 8% da economia. O prefeito Maurício Ferreira Souza afirma que em 2016, o montante que entrou no caixa foi de R$ 4,5 milhões, e para este ano a estimativa é de R$ 2,2 milhões.
“Haverá queda de 50% entre 2016 e 2017 na arrecadação do setor em Peixoto, mas somando a cobrança da alíquota de 1% mais o CFEM, o recurso representa cerca de 8% da economia do município”.
O governo federal afirma que a mineração responde por 4% do PIB (Produto Interno Bruto) do país, mas enfrenta hoje um "cenário adverso" em razão da diminuição do fluxo de investimentos.
A agência também terá como atribuição regular, fiscalizar e arrecadar a Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM), espécie de “royalties” do setor.
Pela Constituição, as jazidas e os depósitos minerais são bens da União. A atividade de mineração é autorizada sob o regime de concessão pública. Em contrapartida, as empresas que exploram os minérios têm que pagar uma compensação aos estados e municípios.
Pela proposta, a ANM será dirigida por uma diretoria colegiada, composta por cinco diretores; um deles será o diretor-geral da agência.
Os diretores serão brasileiros indicados pelo Palácio do Planalto e serão nomeados após aprovação pelo Senado. Eles exercerão mandatos de quatro anos, sendo permitida somente uma recondução ao cargo.
  Fonte: Jornal O Liberal