Por Hudson Bessa*
Poupar não costuma ser uma decisão fácil para a maioria das pessoas. Como qualquer decisão que mereça despender uma parte de nosso tempo para analisar cenários, possibilidades, consequências e, então, partir para um julgamento, ela impõe algum nível de tensão.
Daniel M. Hausman, em seu livro Preference, Value, Choice and Welfare, estabelece um paralelo entre preferência e desejo. Podemos desejar várias coisas, inclusive ao mesmo tempo, desde um vinho, passando por modelos sofisticados de automóveis até atingir um estágio de elevada paz espiritual. Já as preferências, estas são comparativas, implicam em escolher um em detrimento do outro. Significa ter de escolher e, portanto, também, renunciar. Como próprio das decisões que envolvem alternativas com diferentes benefícios, elas causam certa angústia. Em situações em que se tem de escolher um entre dois ou mais objetos, sempre estará presente a possibilidade do arrependimento e do sofrimento que o acompanha.
De acordo com Hausman a preferência se forma a partir da comparação entre as diferentes características e benefícios considerados relevantes para quem está analisando os prós e contras de seu almejado objeto de desejo. Além deste querer, o contexto e os valores contribuem para construir uma atitude positiva e criam um motivo que serve como justificativa para a escolha e, então, conduz a decisão. Portanto, o caminho entre gostar, preferir e decidir não é linear e muito menos simples.
Decisão, contudo, não é ação. Elas podem ocorrer em momentos distintos, por vezes distantes. Nestes casos, diante da necessidade de sacrificar nossos desejos, é comum que a emoção entre em cena, assuma protagonismo, solape a razão e nos leve a uma decisão menos consciente.
A decisão e os hábitos de poupança, não fogem à regra. A pesquisa RaioX do Investidor Brasileiro, promovida pela Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), em parceria com o Datafolha, apresenta um ótimo retrato das intenções de investimento tanto em relação às aplicações financeiras quanto também à aposentadoria. Em especial, busca identificar os motivos que levam as pessoas a fazerem ou não uma reserva financeira. O levantamento tem abrangência nacional e contou com 3.374 entrevistados, das classes A, B e C, distribuídos entre 159 municípios.
Perguntados sobre seus hábitos de poupança, as pessoas responderam da seguinte forma:
PerguntaResposta
Eu não consigo fazer sobrar, porque todo o dinheiro que entra é para pagar as contas do mês40%
Poupo sempre que sobra, mesmo que pequenas quantidades25%
Acredito no meu futuro e procuro investir tudo que posso no meu projeto pessoal15%
Guardar dinheiro é um compromisso para mim, já reservo uma parte assim que entra na conta10%
Não me preocupo tanto em poupar, prefiro viver o presente10%
A despeito das questões relativas à baixa renda dos brasileiros, que, com certeza, impactam a capacidade de poupança das famílias, a pesquisa traz um traço atitudinal interessante.
Para 65% dos entrevistados, poupar é quase uma fatalidade. Entre estes, 40% atribuem às suas necessidades de consumo a culpa pela incapacidade de poupar. Já outros 25% dizem poupar sempre que sobra, ou seja, fazer reservas também não é uma decisão prévia. Em ambos os casos, só existirá alguma possibilidade de se guardar dinheiro após satisfazer todos os desejos, que costumam surgir com grande facilidade.
Para 10% dos respondentes, não parece haver qualquer dilema, talvez sejam mais felizes, pelo menos no presente, pois de partida já admitem que o importante é o agora. Para estes não existe “trade off”, angústia ou sofrimento, é consumir e aproveitar a vida.
Aqueles que procuram investir tudo o que podem em seu projeto pessoal, 15% da amostra, parecem estar preocupados com a construção de patrimônio. Contudo, vale ressaltar que a expressão “tudo o que posso” pode encerrar uma armadilha, qual seja: existe a preocupação legítima mas sempre é possível que necessidades urgentes surjam pelo caminho. Algo similar a vitimização.
Por fim, 10% têm uma decisão prévia de guardar parte sua renda. Para estes, poupar é uma decisão, e não o resíduo do consumo. Estes estão dispostos a comparar benefícios e consequências de curto e longo prazos, fazer sacrifícios e controlar suas emoções em favor da razão. Para este grupo, a decisão é prévia e existe uma disciplina que torna a ação uma decorrência natural.
Poupar não é fácil. É preciso abrir mão dos desejos, fazer sacrifícios, criar uma atitude prévia e ter disciplina.

Fonte: ADVFN