terça-feira, 2 de junho de 2015

Amazônia Doc.3 traz um olhar sobre a floresta

Amazônia Doc.3 traz um olhar sobre a floresta

Após voltar o olhar do mundo para as probelmáticas da região, o cineasta faleceu em Londres.
Foram 50 anos dedicados à maior floresta tropical úmida do mundo. Mérito que deu ao jornalista Adrian Cowell o merecido título de maior documentarista da Amazônia. Traduzidos em imagens, estão lá a trajetória do líder seringueiro Chico Mendes, o drama vivenciado pelos garimpeiros da Serra de Carajás, o avanço brutal da sociedade sobre os territórios indígenas.

Após voltar o olhar do mundo para as problemáticas da região, o cineasta chinês faleceu em Londres no último dia 10 de outubro, enquanto dormia. A informação anunciada dias antes do início da terceira edição do Festival Pan-Amazônico de Cinema – Amazônia Doc. 3, que, no seu ano de estreia exibiu pela primeira vez em Belém os filmes do cineasta, causou pesar, mas também estimulou uma mostra especial em homenagem à sua vida e obra.

Para a diretora geral do Amazônia Doc., Zienhe Castro, o tributo a Cowell é uma forma de homenagear um cineasta que, durante longos anos de sua existência, se empenhou em evidenciar a importância de embrenhar-se floresta adentro, num mergulho profundo na essência humana, na realidade quase ficcional do homem simples amazônida.

“Adrian Cowell era um desbravador, um bandeirante, um realizador na plenitude da palavra, um documentarista raro na história da cinematografia mundial e, sobretudo, na cinematografia amazônida”, acredita. “Adrian Cowell foi um grande porta voz dos povos da floresta, um defensor e propagador das causas ‘amazônidas’”.

A contribuição do cineasta para a produção audiovisual na Amazônia foi dividida com os participantes do Amazônia Doc em 2009. Além de presenciar a experiência do cineasta através da exibição de seus filmes, o público, que lotou as sessões, pôde ouvir do próprio Cowell sua reflexão sobre a floresta na mostra “Amazônia – O Olhar de Adrian Cowell”, que contou com a ilustre presença do cineasta.

Até então, a sensibilidade da obra do chinês radicado em Londres sobre os desafios enfrentados na região só haviam sido apresentados no Brasil em duas ocasiões, em circuitos culturais organizados pelo Banco do Brasil e pela Caixa Econômica Federal. A maioria de suas produções eram direcionadas a emissoras de televisão internacionais.

Cowell percorreu países como Inglaterra e Austrália, mas foram os estados da região amazônica que obtiveram o maior foco de suas produções. Sua primeira vinda ao Brasil foi resultado de um projeto da Oxford e Cambridge Expedition que previa a produção de quatro programas de 26 minutos para a série “Adventure” da emissora de televisão BBC. Quando a expedição seguiu viagem para o resto da América do Sul, Cowell ficou no Xingu.

A experiência rendeu a convivência com os irmãos Villas Bôas em expedições pelo interior de Mato Grosso. Por sete meses, o cineasta viu de perto o cotidiano dos índios, temática tão presente em sua obra. Como resultado, “A tribo que se esconde do homem”, realizado na década de 60, mostrava a saga de índios de diferentes etnias que, aliados aos irmãos Villas Boas, tentavam fazer contato com os índios conhecidos como Kreen–Akrore, isolados no Paraná. Contextualizado no período de construção de uma estrada, a luta dos índios para ‘salvar’ os Kreen–Akrore dos avanços da civilização foi eternizado pelas lentes de Cowell.
Eu quero viver

O documentário é apenas um dos que consagram o acervo de sete toneladas de filmes de 16 mm do cineasta, hoje sob a posse da Pontifícia Universidade Católica de Goiás. Dentre as obras produzidas nos anos de 1980, período intenso de suas documentações, Cowell deu destaque à liderança de Chico Mendes para a organização de seringueiros em defesa da floresta amazônica.

Além de documentar o nascimento da Aliança dos Povos da Floresta, fundada para reunir os principais movimentos sociais da Amazônia, e a luta pela demarcação das primeiras reservas extrativistas da região, o filme ainda aponta a trama armada para o assassinato do líder seringalista. A referência ao fato que comoveu o deu nome ao documentário A frase que teria sido pronunciada por Chico Mendes momentos antes de sua morte deu nome ao documentário “Chico Mendes – Eu quero viver”.

Em continuidade às suas filmagens, já aos 77 anos, Cowell se preparava para voltar ao Brasil, onde finalizaria a versão brasileira do filme Killing For Land (Matando pela terra) focado no atual clima de violência que toma a região do sul do Pará. O projeto, assim como o incansável trabalho de suas filmagens, foi interrompido no momento em que Cowell não pode mais respirar. Ainda assim, é retrato da existência do homem que dedicou grande parte da vida à revelação de uma região por tantas vezes esquecida.
Mostra Retrospectiva Adrian Cowell

A mostra que homenageia o cineasta chinês Adrian Cowell será exibida de 7 a 11 de novembro, no Cine Líbero Luxardo. Confira os filmes que serão exibidos:

“Batida na Floresta” - (Adrian Cowell – Brasil – 2005 - 59min)

“Na Trilha dos Uru Eu Wau Wau” - (Adrian Cowell – Brasil – 1990 - 52 min)

“Montanhas de Ouro” - (Adrian Cowell – Brasil – 1990 - 52 min)

“Nas Cinzas da Floresta” – (Adrian Cowell – Brasil – 1990 - 52 min)

“Chico Mendes - eu quero viver” – (Adrian Cowell – Brasil – 1989 – 40 min)

“O Destino dos Uru Eu Wau Wau” - (Adrian Cowell – Brasil – 1999 – 52 min)

“A Tribo que se esconde do homem” - (Adrian Cowell – Brasil – 1970 – 01 h 06 min)

“Uma Dádiva para a Floresta” - (Adrian Cowell – Brasil – 2001 - 25 min)

“O Sonho do Chico” - (Adrian Cowell – Brasil – 2003 - 25min)

“Barrados e Condenados” (Adrian Cowel – Brasil – 2000 – 25min)

“As Queimadas da Amazônia”. (Adrian Cowell – Brasil – 2002 – 45min)

Serra Pelada ainda vale R$ 2,31 bilhões em ouro

Serra Pelada ainda vale R$ 2,31 bilhões em ouro


No antigo grande "formigueiro" há 33 toneladas de ouro
Cerca de 45 mil garimpeiros adentram 2010 com a expectativa de que ainda no primeiro semestre seja implantado o Projeto Serra Pelada, uma parceria entre a Cooperativa de Mineração dos Garimpeiros de Serra Pelada (Coomigasp) e a Colossus Geologia e Participações Ltda, subsidiária da Colossus Minerals Inc., empresa canadense especializada em exploração de ouro. A principal alavanca para que o projeto saia do papel depois de anos de espera foi a aprovação do Estudo e do Relatório de Impacto Ambiental (EIA-RIMA), feito pela empresa Geoma e aprovado pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente (SEMA). Com o EIA-RIMA em mãos, os garimpeiros já aguardam a possibilidade de que em, no máximo um ano, o garimpo mecanizado comece a extrair as cerca de 33 toneladas de ouro que constam no projeto como ainda passíveis de serem retiradas dos 100 hectares que pertencem à Coomigasp.

Em valores atuais, as 33 toneladas de ouro que a cooperativa e a empresa esperam extrair superam 2,31 bilhões de reais. Como a previsão de investimentos da Colossus deve girar em torno de R$ 100 milhões, o lucro pode ser gigantesco. Além do ouro, há a perspectiva de que sejam extraídos também 6,8 toneladas de platina e 10, 6 toneladas de paládio - um metal branco parecido com a platina e que tem diversas utilidades na indústria química, farmacêutica e petrolífera, além de muito usado na medicina dentária.

O projeto que liga a principal cooperativa de garimpeiros e a gigante canadense tem vida útil prevista para oito anos. A expectativa da Coomigasp é que até o final de janeiro, o ministro das Minas e Energias, Edison Lobão, conceda o alvará de lavra. “Com o alvará na mão a Serra vai ser definitivamente do garimpeiro”, comemora José Sobrinho da Silva, vice-presidente da Coomigasp.

Desde julho de 2007, a Coomigasp tem um contrato de parceria para desenvolver o empreendimento no garimpo com a Colossus. A união dos dois empreendedores gerou a empresa Serra Pelada - Companhia de Desenvolvimento Mineral, detentora dos direitos minerários. “Até abril esperamos que o projeto comece a ser implantado”, diz Sobrinho. “Até julho queremos desenvolver o ‘projeto ouro’”. A parceria entre os dois grupos prevê que 75% de toda a produção fique com a empresa canadense. Os 25% restantes ficam com os garimpeiros. Além disso, espera-se que haja empregos diretos para os garimpeiros, já que toda a extração será mecanizada. “Mais de dois mil garimpeiros serão empregados. O município vai evoluir. Vai mudar tudo por aqui”, diz.

A euforia que toma conta da diretoria da Coomigasp não encontra eco em outras associações ligadas ao garimpo. “A Coomigasp tem o nome sujo na praça. Não pode receber dinheiro, nada. Por isso, criaram uma empresa, a SPE, que vai receber e usar os recursos. Cinco pessoas são donas dessa empresa. Três são da Coomigasp e dois da Colossus. Eu não posso confiar nisso”, diz um diretor da Coomisp, a Cooperativa de Mineradores de Serra Pelada, que tem pouco mais de 4 mil associados. Sem querer revelar o nome, esse diretor diz que os números apresentados pela Coomigasp são falsos. “São pelo menos 600 toneladas de ouro ali”, diz. “Vivemos 24 anos de mentiras. Essa é mais uma delas”, rebate Sobrinho.

No escritório da Colossus em Parauapebas, a informação era de que toda a diretoria estava em recesso e fora do estado, com retorno previsto para o próximo dia 10 de janeiro.

Na vila que abriga os ex-garimpeiros de Serra Pelada, sete mil moradores tocam a vida em compasso de espera. Num local onde o Relatório de Impacto Ambiental mostrou que a água é completamente imprópria para consumo e o peixe não deve ser consumido porque pode estar contaminado com mercúrio acima do nível considerado suportável para o ser humano, os garimpeiros que perambulam de um lado a outro adotam outras atividades, mas no fundo esperam pelo dia em que poderão sentir de novo o que chamam de ‘febre de garimpeiro’. “Eu ainda tenho esperança de que vamos acabar com esses 30 anos de sofrimento”, resume o garimpeiro Raimundo Nonato de Oliveira.

Serra Pelada tem 50 toneladas de ouro

Serra Pelada tem 50 toneladas de ouro

O presidente da Cooperativa de Mineração dos Garimpeiros de Serra Pelada (Coomigasp), Jesse Simão, está otimista na concessão do alvará que vai permitir a exploração mecanizada do garimpo no começo de 2010. Há mais de 50 toneladas de ouro para ser exploradas quando o trabalho começar.

Também há outras 23 toneladas de minérios, incluindo ouro, na montoeira- onde está o rejeito de tudo o que foi produzido no garimpo quando a atividade ainda era manual. Para a exploração mecanizada no fundo da cava de 150 metros de profundidade, que será feita pela mineradora canadense Colossus, falta apenas o documento expedido pelo Departamento Nacional da Produção Mineral (DNPM).

“Fizemos tudo o que o DNPM pediu e apresentamos, juntamente com a Colossus, as pesquisas e os estudos, inclusive de impacto ambiental”, disse Simão ao DIÁRIO. O documento de que tanto dependem os garimpeiros para começar a exploração em Serra Pelada poderá ser liberado antes de outubro, segundo informou o DNPM. O líder dos garimpeiros fez questão de declarar que, em Serra Pelada, as disputas internas e as brigas são coisas do passado. “A Serra está em paz e mobilizada à espera da exploração pelas máquinas da Colossus”, resume o presidente.

Para chegar a esta situação, não foi fácil. Havia uma luta em que interesses pessoais se sobrepunham aos interesses da maioria dos 43 mil garimpeiros. O surgimento da Associação Nacional dos Garimpeiros de Serra Pelada (Agasp) no cenário do garimpo veio em boa hora. A entidade firmou parceria com a Coomigasp em torno da eleição de Simão, atraindo setores simpáticos à causa da mudança.

De acordo com o presidente da Agasp Brasil, Toni Duarte, o maior garimpo a céu aberto do mundo vive hoje novos dias. “Além de mobilizar os garimpeiros em torno da luta pela retomada da produção de ouro, passamos a atender suas famílias, realizando atendimentos médico e social no povoado de Serra Pelada”, conta Duarte. Ele ressalta que os opositores que criavam intrigas e

divisões, impedindo avanços na luta da categoria, foram derrotados e saíram de cena.

Mineradora descobre reservas de ouro e platina

Mineradora descobre reservas de ouro e platina

A empresa canadense Colossus Minerals Inc., que começou a operar na região há pouco mais de um mês, anunciou ontem a descoberta de novas reservas de ouro, platina e paládio em Serra Pelada, no município paraense de Curionópolis. De acordo com o site Globo Amazônia, que deu a notícia em primeira mão, a mineradora descobriu dois depósitos nos arredores do foco central de garimpo da mina. Na década de 1980, Serra Pelada ganhou notoriedade internacional como o maior garimpo a céu aberto do mundo.

Consultado sobre o assunto, o geólogo Alberto Rogério, que por muitos anos pertenceu aos quadros do Departamento Nacional da Produção Mineral (DNPM) no Pará e que hoje atua como consultor técnico do Instituto Brasileiro de Mineração, o Ibram, adotou uma postura cautelosa. Ele disse ter tomado conhecimento do assunto pela internet, mas ressaltou que, até onde se sabe, os depósitos minerais existentes em Serra Pelada são aqueles já anunciados anteriormente: 33 toneladas de ouro, 4 de platina e 6 de paládio, um metal muito utilizado em ligas finas e trabalhos de joalheria.

De acordo com Alberto Rogério, o paládio tem hoje a cotação em bolsa de 450 dólares a onça (o equivalente a 31,1 gramas), contra US$ 1.200 para o ouro e US$ 1.500 para a platina. Com a notícia das descobertas, conforme revelou ontem a própria Colossus, as ações da mineradora canadense subiram 8,8% na Bolsa de Valores de Toronto.

O informe da mineradora, transmitido ontem à tarde para a imprensa de Marabá, confirmou a descoberta de dois depósitos com alta concentração de ouro e platina, o que aumenta ainda mais as expectativas de que existam mais reservas minerais ainda não descobertas na região. Os depósitos foram encontrados a 150 metros ao norte e 50 metros a oeste da zona central de Serra Pelada. A empresa pretende escavar mais profundamente a região onde os depósitos foram encontrados para expandir a exploração.

Segundo o Ministério de Minas e Energia, a retomada de Serra Pelada, cujo garimpo havia sido desativado em 1992, vinha sendo negociada desde 2003, mobilizando mais de vinte entidades de garimpeiros – entre associações, sindicatos e cooperativas. A entrada em cena da mineradora canadense Colossus Minerals Inc., porém, só começou a ser costurada há cerca de três anos.

RAMPA

A Colossus deve começar em outubro deste ano a construção de uma rampa subterrânea com extensão de 1,6 mil metros para investigar a área onde os novos depósitos foram encontrados.

CONCENTRAÇÃO

Segundo o vice-presidente de exploração da empresa, Vic Wall, as descobertas indicam que toda a região apresenta índices elevados de concentração de ouro.

>> Parceria da Colossus com Cooperativa já rende frutos

Em julho de 2007, a Colossus fez uma parceria com a Cooperativa de Mineração dos Garimpeiros de Serra Pelada (Coomigasp), para a exploração de ouro numa área de cem hectares do antigo garimpo, exatamente onde foram descobertos agora os novos depósitos.

A área de exploração, porém, já havia sido aumentada em março deste ano, quando a mineradora adquiriu mais de 770 hectares de novos terrenos. Essas áreas, no entorno do antigo garimpo, permanecem ainda inexploradas.

A febre do ouro em Serra Pelada

A febre do ouro em Serra Pelada

Guto da Costa tinha pouco dinheiro no bolso e muita esperança em 1983. Havia completado 18 anos, e “de maior”, sonhava em ficar rico. Andava de namorico com a filha de um homem “bem de vida”, que não via com bons olhos aquele romance ameaçando entrar sem pedir licença na própria casa. Com os brios feridos, o coração em chamas, o corpo afogueado, Guto olhou para a imensidão à frente, observou atônito, o vai e vem de homens embrutecidos e de poucas palavras, respirou fundo e disse a si mesmo. “É aqui que vou ‘enricar’ e voltar pra casar com ela”. Vinte e nove anos depois, Guto é dono de uma pequena venda em uma vila pobre e empoeirada. Ri dos arroubos da juventude. Nunca mais voltou para casa. Nem saiu do garimpo de Serra Pelada. A história poderia ser um enredo ficcional para uma novela ou filme. Mas é real. Como reais são as histórias de milhares de ex-garimpeiros de Serra Pelada. O mergulho em apenas uma delas é mais rico do que qualquer roteiro cinematográfico, mas o cinema insiste em tentar capturar a quase inatingível essência do mais famoso garimpo de ouro do Brasil.
A empreitada mais recente será a que unirá Wagner Moura, um dos mais talentosos atores de sua geração, ao diretor Heitor Dhalia. O filme terá como pano de fundo a região de Serra Pelada. A história se passa em 1978, quando dois amigos saem do Rio de Janeiro em direção ao Pará, com a intenção de encontrar ouro em Serra Pelada, mas a cobiça pelo poder e pela riqueza vai abalar a relação da dupla. Ao divulgar o projeto, Dhalia disse que há muito a ser explorado nessa história, que marcou uma época no Brasil e ainda não foi contada nos cinemas.
Os garimpeiros não tinham noção dessa grandiosidade épica quando fincaram pés e mãos no barro da serra em busca de ouro. Não pensavam em ser protagonistas ou coadjuvantes de nada. Sonhavam apenas com o metal que mudaria as próprias vidas. Cinema, por exemplo, só os do telão meio encardido que exibia uns filmes de faroeste. “Aqui tinha o telão do cinema todo dia, e sempre tinha um artista por aqui fazendo show. Aparecia uns circos de vez em quando. Os filmes que passava no cinema, os que os garimpeiros mais aplaudia, depois passava de novo”, lembra Almir Ferreira, 71 anos num português atropelado.
Quando Serra Pelada chamou a atenção do mundo, o cinema veio atrás. “Era nosso divertimento”, diz Ferreira. “Quando Os Trapalhões vieram aqui, se melaram tudo de melechete (lama proveniente da lavagem da terra). Aí enchia o saco de folhas, saía subindo as escadas na pedra preta que nem os garimpeiros. Mas o nosso era cheio de terra. Eu achei aquilo muito bom, pra você vê como nós era importante”.
“Os Trapalhões na Serra Pelada” é um filme de 1982, dirigido por J.B. Tanko. A história é simples. Os amigos Curió, Boroca, Mexelete e Bateia aventuram-se em busca de ouro no garimpo de Serra Pelada. A mina é controlada pelo estrangeiro Von Bermann, cujas ordens são executadas pelo capanga Bira. Sedento por poder, o gringo contrabandeia o ouro e deseja apoderar-se das terras do brasileiro Ribamar, que se recusa a fazer negócio antes da chegada do filho Chicão. Mesmo sendo uma típica comédia ao estilo de Renato Aragão e companhia, a sinopse do filme apresenta as possibilidades de discussão a respeito da forma colonizadora que caracteriza a região. O capital estrangeiro dominando o local onde homens simples tentam construir sonhos a partir de uma realidade difícil.
“Sabe qual é a história mais bonita, seu moço? É quando era só nós, os garimpeiros. O cara saía por dentro da mata, com saco de ouro nas costas, com um 38 do lado e mais uns quatro companheiros. Um respeitava o outro, mas não tinha muita conversa”, lembra Luiz Fonseca Oliveira, 65 anos, enquanto senta num banco rústico fugindo do sol. “Quando tirei a carteira de garimpeiro fiquei orgulhoso. Me senti gente importante, cidadão mesmo”, ri, olhando para o boné amassando nas próprias mãos.
Novos Colonizadores
Saber que Serra Pelada e outros pontos da Amazônia voltaram a interessar ao cinema nacional desperta reações diferentes. Como os próprios garimpeiros, a Amazônia será apenas cenário ou protagonista nessa relação?
“A região nunca saiu de foco, o que acontece é que os interesses dos ‘colonizadores’ de nossa sociedade moderna mudam de acordo com o que os convém em dado momento de espaço e tempo”, analisa o professor e videomaker Guto Nunes. “Do ponto de vista profissional pode ser uma boa resposta, desde que eles utilizem em suas produções, produtoras independentes e mão-de-obra profissional e a força braçal e intelectual do nosso povo”, diz.
Diretora do documentário “Serra Pelada: Esperança não é sonho”, Priscila Brasil não gosta quando falam em “redescoberta amazônica”. “A expressão é cheia de uma submissão da qual eu não gosto. Vários já se inspiraram nesse universo, cada um de um jeito, cada um na sua lógica. Uns enxergam a selva de uma maneira mais brutal, outros de uma maneira mais contemplativa, outros veem quase um zoológico gigante, tipo Simba Safari, que só falta rolar ar condicionado”, critica.
A supremacia do olhar estrangeiro
“É preciso mais que um dia para entender a história dos garimpeiros”, diz, com ar de quem viu muito, Pedro Bacabal, 53 anos. Homem de riso fácil que zomba do próprio destino, Bacabal chegou ao garimpo com 23 anos. Ganhou e perdeu dinheiro. Batendo com o cabo de uma enxada no chão, como a pontuar as palavras, enfatiza que em Serra Pelada os homens todos deixaram escorrer a juventude. “Como é que vou explicar isso ao senhor?”, questiona-se. “Eu acho que mesmo na melhor das produções ainda existe um olhar estrangeiro, os protagonistas são de fora, uma lacuna que só vamos talvez superar com nossas produções locais. O que me preocupa é se reforçarem o olhar do exótico, do coitadinho. Isso sempre me irrita”, diz Segtowick.
“Tem quem ache que a Amazônia tem vocação para cenário de filme - mas o cenário exuberante é um coadjuvante mal pago, infelizmente”, diz a jornalista, produtora e fotógrafa Maria Christina. “Embora eu deva concordar que a história ainda por ser contada deve ser efetivamente contada, seja em filmes ou obras literárias, o melhor era mesmo que nos deixassem em paz. Ilusão, claro, porque a região precisa de divisas, e minha indignação com toda a exploração que sofremos (cuja conta vamos pagar ad infinitum) me faz desejar que fôssemos invisíveis”, complementa.
Terra de feitos épicos (e homens invisíveis)
Invisibilidade social parece ter sido sempre a marca dos garimpeiros de Serra Pelada. Mesmo que tenham produzido feitos épicos. “O garimpo tirou uma serra de um lado e colocou em outro. Isso não é pra qualquer um”, bate no peito Manoel Martins de Oliveira, um homem que chegou ao garimpo em dezembro de 1980. Dizia-se que o ouro de Serra Pelada pagaria a dívida externa brasileira. Mais de três décadas depois, Antonio Bernardo, o Godô, luta aos 64 anos, contra uma hanseníase que lhe insiste em pregar peças. A última foi uma ferida no rosto. O curativo imenso esconde a chaga. Pobreza e doença se tornaram companheiras dos ex-garimpeiros. Juntam-se à saudade, a uma melancolia resignada, a um bom humor de quem viu e viveu boas aventura e à incerteza dos dias que restam.
“A gente fez parte do Brasil. Eu sei disso”, diz o ex-garimpeiro que só atende pelo nome de Nick. É o pseudônimo que ele descobriu para dar vazão ao lado artista. Nick é pintor. Exibe os quadros com orgulho. A febre do ouro passou. Para ele não volta mais. Não?
Nos fundos da Loja Kaleny, bem no centro da vila de Serra Pelada, duas fotos chamam a atenção. Numa está a clássica imagem do formigueiro humano que foi o garimpo nos anos 80. Ao lado, uma foto com dois homens, sujos de lama da cabeça aos pés, outra imagem bastante difundida de Serra Pelada. É quase impossível reconhecer que o rapaz de 23 anos que posa com ar de esperança na foto, em um dia perdido de 1985, seja o mesmo proprietário da loja que vende de tudo um pouco. Cláudio Moraes tem hoje 49 anos e criou as duas filhas na vila de Serra Pelada. “Não enriqueci, ganhei problema de hérnia de disco, de coluna, mas sei que fiz parte de uma história bonita do Brasil”, diz. Cláudio Moraes está relativamente estabilizado. Não precisa diretamente do ouro do garimpo, mas quem disse que deixou de sonhar em voltar à ativa? “Daqui não arredo pé. Se esse garimpo voltar a dar ouro de novo, quero estar aqui”, afirma. Alguém registraria a cena?